Acórdão Nº 5018839-47.2020.8.24.0000 do Sétima Câmara de Direito Civil, 04-02-2021

Número do processo5018839-47.2020.8.24.0000
Data04 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão










Agravo de Instrumento Nº 5018839-47.2020.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA


AGRAVANTE: FABRICIO HINGHAUS AGRAVADO: CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A.


RELATÓRIO


Fabrício Hinghaus interpôs recurso de agravo de instrumento contra decisão interlocutória (evento 17 dos autos de origem) proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da comarca de Rio do Sul que, na ação indenizatória autuada sob o n. 5003546-69.2020.8.24.0054 que ajuizou em desfavor de Celesc Distribuição S.A., determinou providências à parte agravante a fim de que comprove a submissão da pretensão a prévio requerimento de indenização na via administrativa, sob pena de extinção do feito.
Para melhor elucidação da matéria debatida dos autos, transcreve-se trecho da fundamentação da decisão recorrida:
Verifico que a proposição desa demanda deu-se ainda em 2020, posterior ao período de novembro de 2019, período em que a requerida passou a disponibilizar ao usuário um eficiente meio de pagamento por via administrativa em caso de perda de fumo por insuficiência de energia elétrica, ex vi do acordo firmado na ação civil pública n. 0900068-44.2018.8.24.0035.
A esta iniciativa salutar foi dada ampla publicidade em rádios da região e em outros meios de comunicação, conforme se verifica, por exemplo, no seguinte link da internet: https://www.celesc.com.br/listagem-noticias/celesc-facilita-ressarcimento-por-danos-a-fumicultores-catarinenses.
Contudo, da análise dos autos, verifica-se que o autor não se valeu de referido meio, o qual se apresenta como mais célere, eficaz e menos custoso que a demanda judicial, para verificar se sua pretensão poderia mostrar-se viável, estando a ré disponível para a resolução por via administrativa e amigável.
Portanto, a meu ver, ainda não há pretensão resistida necessária ao delineamento de uma das condições da ação, a saber: o interesse de agir.
Com efeito, o autor não demonstrou que interagiu minimamente em relação à requerida, seja por ação, omissão ou em comportamento anterior da requerida evidentemente contrário à sua pretensão.
Ora, a parte autora não faz alusão a existência de requerimento administrativo prévio (não se está a exigir aqui o esgotamento das vias administrativas, que isso fique bem claro), tampouco menciona que, apesar do requerimento, a parte requerida omitiu-se e não forneceu a resposta em prazo razoável, que é de 90 dias segundo o manual de Procedimentos da requerida, ou se o requerimento foi efetuado e negado dentro do prazo pela concessionária.
Dessa forma, condiciona-se, nesta decisão e para o presente caso concreto, o direito de ação da parte perante ao Poder Judiciário de Santa Catarina à demonstração de uma lide viável, ou seja, de uma pretensão resistida, cuja força motriz decorre do prévio requerimento administrativo.
Com efeito, se do requerimento houver consenso - pagamento administrativo -, alcançada estará a almejada pacificação social e a ingerência deste Poder na relação jurídica descrita na inicial mostra-se despicienda, o que contribuirá sobremaneira para o bom funcionamento desta Vara Cível, que tem recebido muitos processos desta natureza com a mesma causa, bem como para o próprio de Tribunal de Justiça, que recebe milhares de recursos em pretensões desta estirpe.
Aliás, é forte em tais razões que a doutrina e a jurisprudência de vanguarda (vide os exemplos das ações que veiculavam benefícios previdenciários e ações de DPVAT) já se propuseram a rever o dogma da prioridade da decisão adjudicada pelo Estado em conflitos que envolvem direitos disponíveis.
Nesse sentido:
A par dessa (crescente) interação da Justiça estatal com outros órgãos, agentes e instâncias preordenados à resolução de conflitos, vale ressaltar que a própria opção pela judicialização do conflito não é (nem deve ser) facilitada (no senso em que uma percepção desavisada ou defasada pode sugerir), mas, ao contrário, fica a depender do atendimento a quesitos de existência e validade, assim da ação (condições) como do processo (pressupostos) e do próprio Juízo (isenção, imparcialidade), a par de certas exigências específicas complementares, como a notificação ao inquilino, nas locações por prazo indeterminado (Lei 8.245/1991, art. 46, § 2.º); o protesto do título cambial para caracterizar a impontualidade do devedor; a emissão do decreto de utilidade pública para a ação de desapropriação (Dec.-lei 3.365/1941, art. 13). É dizer, hoje a jurisdição já se descolou da vetusta conotação monopolizada estatal, para, numa perspectiva progressista, consentir uma acepção de perfil expansivo e includente, assim receptivo a outros agentes, órgãos e instâncias, e em certos casos até presumindo sua intervenção, pondo à calva que o escopo de pacificação dos conflitos com justiça não é, nem deve ser, apanágio exclusivo da função judicial do Estado. (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Acesso à justiça: condicionantes legítimas e ilegítimas. São Paulo: RT, 2011, .p. 200).
Pela mesma razão o Tribunal de Justiça de Santa Catarina consolidou o posicionamento na Súmula 37 do Grupo de Câmaras de Direito Civil: Em analogia ao que ficou definido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário n. 631.240, nas ações de cobrança ajuizadas após o respectivo julgamento (3.9.2014), faz-se necessário prévio requerimento administrativo de pagamento do Seguro DPVAT, sem o que não se faz presente o interesse processual.
De outro lado, acaso haja resposta negativa ou postura omissiva à pretensão inicial formulada administrativamente, só então há que se falar em lesão a direito, legitimando a intervenção do Judiciário.
A ausência de requerimento administrativo prévio, ipso facto, implica vício congênito da demanda capaz de impedir a análise de mérito in statu assertionis, uma vez que, na espécie, não há nenhuma interação prévia, de modo que não é possível aferir se surgiu para o interessado o próprio direito de ação, consistente na afirmação de lesão ou ameaça de lesão a um direito.
Por tal razão, visando assegurar ao jurisdicionado a solução de sua pretensão num bom equilíbrio entre o custo e benefício, e sua dirimência em tempo razoável, e evitando a extinção precipitada da demanda, suspendo o presente feito pelo prazo 120 dias, a fim de que a parte autora leve a efeito o competente pedido do ressarcimento de danos pelo novel procedimento administrativo adotado pela concessionária Celesc, devendo comunicar nestes autos o resultado da diligência (se houve pagamento; se não houve resposta dentro do prazo estipulado ou se houve resposta negativa ao pedido).
A ausência de comunicação nos moldes do parágrafo acima, escoado o prazo de 120 dias de suspensão, implicará extinção do feito por ausência de uma das condições da ação.
Aguarde-se em cartório.
Intime-se o autor (grifado no original).
Em suas razões recursais (evento 1) a parte agravante sustenta, em síntese, que "se não há qualquer norma que faça está exigência aos consumidores, o que existe é tão somente uma transação entre a agravada e o Ministério Público de Santa Catarina, que possibilita que o requerimento seja analisado na via administrativa pela agravada, a qual se comprometeu em disponibilizar meios necessários para tanto. Não fosse apenas isso, o princípio da inafastabilidade do poder judiciário, previsto no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, aduz que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. " Deste modo, jamais poderia ser editada uma norma que negasse o acesso do consumidor ao judiciário, pois isto implicaria na violação do dito princípio, ademais, a transação homologada pelo juízo da 1ª Vara da Comarca de Ituporanga não tem o condão de tornar legal a exigência de prévio requerimento administrativo" (evento 1, doc. 1, p. 10).
Requer, ao fim, a suspensão dos efeitos da decisão recorrida, a fim de dar prosseguimento ao feito, e, ao final, a reforma do decisum.
Recebido o inconformismo,...

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