Acórdão Nº 5018934-19.2021.8.24.0008 do Quinta Câmara Criminal, 03-03-2022

Número do processo5018934-19.2021.8.24.0008
Data03 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5018934-19.2021.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

APELANTE: RAPHAEL FERNANDO DE CASTRO MACHADO (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na Comarca de Blumenau, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia contra Raphael Fernando de Castro Machado, dando-o como incursa nas sanções do art. 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90, por seis vezes, conforme os seguintes fatos descritos na inicial acusatória, in verbis (evento 1, denúncia 1):

"O denunciado Raphael Fernando de Castro Machado, na época dos fatos, exercia a função de sócio e administrador da empresa Supermercado Wan-Dall Eireli EPP, com endereço comercial na rua Guilherme Poerner, n. 736, Passo Manso, Blumenau/SC.

Na condição de sócio e administrador da referida empresa, o denunciado deliberava, entre outras questões, sobre o pagamento, supressão ou redução de tributos devidos ao Estado de Santa Catarina.

Nos períodos junho/2016, julho/2016, agosto/2016, setembro/2016, outubro/2016 e novembro/2016 o denunciado passou a praticar atos ilegais contra a fiscalização tributária, sonegando o tributo ICMS, apropriando-se de maneira ilegal de valores destinados ao fisco e pagos pelos adquirentes dos produtos que comercializava. A apropriação levada a efeito pelo denunciado beneficiava a ele próprio e a empresa.

Para tanto, em cada período elencado acima, o denunciado determinou que a empresa Supermercado Wan-Dall Eireli EPP deixasse de efetuar, total ou parcialmente, o recolhimento do ICMS relativo às operações/prestações tributáveis, as quais foram escrituradas pelo próprio contribuinte no Livro Registro de Apuração do ICMS e declarado na Guia de Informação e Apuração de ICMS e/ou DIME (Declaração do ICMS e do Movimento Econômico), cuja cópia segue anexa nestes autos.

O valor do imposto reconhecido como devido, quando do vencimento, não foi recolhido e a importância declarada acabou por não ingressar aos Cofres do Erário Estadual. Ao não recolher os valores referentes ao imposto incidente sobre operações tributáveis devidos aos cofres públicos, dentro do prazo legal, o denunciado causou prejuízo aos Cofres Públicos e a toda coletividade.

Em assim sendo, agindo reiteradamente, o denunciado determinou que a empresa deixasse de recolher aos cofres públicos, em suas condutas delituosas anteriormente descritas, a importância de R$ 84.069,89 (oitenta e quatro mil, sessenta e nove reais e oitenta e nove centavos) com a multa e juros, ao Fisco Estadual, recursos estes que deveriam ser aplicados em proveito de toda a sociedade catarinense.

Nos casos em tela, a Secretaria de Estado da Fazenda, com base nos dados extraídos do Sistema de Administração Tributária - SAT, mediante as informações prestadas, voluntariamente e espontaneamente, pelo próprio contribuinte, constata eletronicamente a ocorrência da sonegação e, automaticamente, inscreve em dívida ativa o tributo sonegado e seus acréscimos legais, nos termos do artigo 62, parágrafo único, da Lei n. 5.983/81.

Assim, não há qualquer diligência pessoal da autoridade fazendária no local onde encontra-se o contribuinte, pois toda a análise é realizada por meio eletrônico e automatizado pelo sistema da Fazenda, motivo pelo qual não é necessária a oitiva de auditor fiscal. O ato fiscal é materializado na certidão de dívida ativa emitida".

Encerrada a instrução, a magistrada a quo proferiu sentença julgando procedente a denúncia, nos seguintes termos (evento 65):

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na denúncia e, em consequência, CONDENO o acusado RAPHAEL FERNANDO DE CASTRO MACHADO ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 9 (nove) meses de detenção, a ser cumprida em regime inicialmente aberto, a qual substituo por uma reprimenda restritiva de direitos (art. 44, §2º, CP), consistente em prestação de serviços à comunidade em instituição conveniada com este juízo, a ser indicada na fase da execução, à razão de 01 (uma) hora por dia de condenação, durante todo o período da pena, sem prejuízo do pagamento de 15 (quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido até o efetivo pagamento, por infração ao art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990, por seis vezes, na forma do art. 71 do Código Penal.

Condeno o réu, ainda, ao pagamento das custas processuais.

Deixo de fixar o valor mínimo da indenização a que alude o art. 387, IV, do CPP, uma vez que inexistem nos autos elementos neste particular. Ademais, não houve pedido expresso do Ministério Público na exordial acusatória, o que violaria os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Inexistindo qualquer motivo para a decretação da prisão preventiva, concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade (art. 387, parágrafo único, CPP), mormente por ter sido fixado o regime inicial aberto e substituída a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos".

Em evento 75, rejeitou-se os embargos de declaração opostos pelo apelante.

Inconformado da sentença condenatória, o réu interpôs apelação criminal por intermédio de defensor constituído. Em suas razões recursais, preliminarmente, requereu a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, porquanto lhe fora negado o requerimento da juntada de prova emprestada. No mérito, pugnou pela sua absolvição ao defender a atipicidade da conduta por entender que o delito em questão não estaria descrito no tipo penal evidenciando-se, tão somente, mera inadimplência fiscal por falta de condições financeiras, o que revelaria a excludentes de ilicitude e culpabilidade (estado de necessidade e inexigibilidade de conduta diversa) e na ausência de dolo (evento 81).

Em contrarrazões, o Mistério Público manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 92).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Rogério A. da Luz Bertoncini, opinando pelo conhecimento e desprovimento do apelo (evento 12 destes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conhece-se do recurso e, à luz do princípio tantum devolutum quantum apellatum, passo a analisar unicamente as insurgências deduzidas.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Raphael Fernando de Castro Machado, contra a decisão de primeira instância que o condenou à pena privativa de liberdade de 09 (nove) meses de detenção, no regime aberto, e ao pagamento de 15 (quinzes) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituída por prestação de serviço à comunidade, em razão da prática do delito tipificado no artigo 2º, inciso II, da Lei n. 8.137/90 (por seis vezes).

1. Preliminar.

Pretende o requerente a nulidade processual por cerceamento de defesa ante a afronta aos preceitos constitucionais da ampla defesa e contraditório (art. 5º, inciso LV da Constituição Federal), tendo em vista a negativa do juízo em determinar a juntada de prova emprestada da Ação Penal n. 0903400-66.2019.8.24.0008, consistentes em depoimentos testemunhais e extratos bancários - aos autos originários, o que corroboraria a tese da ausência de dolo e das excludentes de culpabilidade e ilicitude.

Contudo, verifica-se que a decisão impugnada está em conformidade com as recomendações legais atinentes ao caso, e não merece reforma.

In casu, o tema foi tese de enfrentamento pelo douto Procurador de Justiça em parecer de evento 12 destes autos, e para prestigiar o trabalho realizado, utilizo-me da sua fundamentação como razões de decidir:

"De início, a defesa sustenta que o processo encontra-se contaminado por conter nulidade por cerceamento de defesa, uma vez que a Juíza a quo indeferiu seu pedido de prova emprestada e juntada de extratos bancários.

Não merece razão.

Isso porque, no rito sumário não existe a fase de requerimento de novas diligências ao término da audiência de instrução, portanto, o apelante deveria pugnar pela produção dessas provas em sede de resposta à acusação, visto que, não decorreram de fatos novos.

É o que estabelece o artigo 531 do Código de Processo Penal:

DO PROCESSO SUMÁRIO Art. 531.

Na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 30 (trinta) dias, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se, finalmente, ao debate. (grifo nosso)

A propósito, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. 1. MANDAMUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 2. DILIGÊNCIAS COMPLEMENTARES. RITO SUMÁRIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. 3. DILIGÊNCIAS INDICADAS PELO AGRAVANTE. NECESSIDADE NÃO SURGIDA DURANTE A INSTRUÇÃO. INVIABILIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO. 4. PROVA JUNTADA PELO MP. PRINCÍPIO DA COMUNHÃO DAS PROVAS. AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE. 5. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. [...] 2. De uma simples leitura do...

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