Acórdão Nº 5019286-52.2019.8.24.0038 do Segunda Câmara de Direito Público, 08-02-2022

Número do processo5019286-52.2019.8.24.0038
Data08 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5019286-52.2019.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

APELANTE: COMFLORESTA CIA CAT. DE EMPR. FLORESTAIS (IMPETRANTE) APELADO: JUAREZ TIRELLI GOMES DOS SANTOS (IMPETRADO) APELADO: INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE DE SANTA CATARINA (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por COMFLORESTA CIA CAT. DE EMPR. FLORESTAIS contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Joinville, Dr. Roberto Lepper, que, em mandado de segurança impetrado contra ato do GERENTE DO INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE -- IMA (autos n. 5019286-52.2019.8.24.0038), denegou a segurança pleiteada por considerar o acerto do ato perpetrado pela autoridade ambiental e a ausência de direito líquido e certo a respaldar a pretensão mandamental.

A sentença restou vazada nos seguintes termos (evento 31, 1G):

"Vistos etc.

COMFLORESTA COMPANHIA CATARINENSE DE EMPREENDIMENTOS FLORESTAIS, pessoa jurídica de direito privado, com sede na rua Benjamin Constant, nº 2.815, bairro Glória, em Joinville, impetrou MANDADO DE SEGURANÇA contra ato praticado pelo GERENTE DO INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE - IMA objetivando que a autoridade dita coatora se abstenha de exigir a recomposição de faixa marginal de área de preservação permanente de 30 (trinta) metros para a exploração florestal de sua propriedade rural consolidada, com a manutenção do patamar mínimo de 20 (vinte) metros previsto no Código Florestal.

Notificada, a autoridade prestou informações (Evento 17), dizendo que não há ilegalidade no ato administrativo questionado porque a exigência de recuperação de área de proteção permanente encontra-se devidamente fundamentada, enquadrando-se nos percentuais permitidos pela legislação de regência.

A representante do Ministério Público opinou pela denegação da segurança (Evento 27).

É o relatório. D E C I D O.

Em conformidade ao disposto no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, 'o Mandado de Segurança é a ação constitucional destinada 'a proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça' (art. 1º da Lei n. 12.016/2009)' (STJ - Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 59.281/SP, Segunda Turma, unânime, rel. Min. Francisco Falcão, j. em 5.3.2020).

Volta-se a impetrante contra a exigência de alteração do projeto de recomposição da faixa marginal de curso d'água para 30 (trinta) metros a fim de viabilizar a exploração florestal de sua propriedade rural. Diz que a autoridade apontada coatora agiu ao arrepio da lei, bem como violou os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade ao desprezar entendimentos manifestados em pareceres anteriores, os quais defendiam, para casos análogos, o limite de 20 metros para a recuperação da área de preservação.

O Código Florestal, ao permitir a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008, estabeleceu que 'para os imóveis rurais com área superior a 4 (quatro) módulos fiscais que possuam áreas consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d'água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais: (...) II - nos demais casos, conforme determinação do PRA, observado o mínimo de 20 (vinte) e o máximo de 100 (cem) metros, contados da borda da calha do leito regular' (grifei) (Art. 61-A, § 4º, inc. II).

Por seu turno, o Decreto nº 7.830/12, que regulamenta dispositivos do Código Florestal e estabelece normas de caráter geral aos Programas de Regularização Ambiental, preconiza que:

'§ 4º Para fins do que dispõe o inciso II do § 4º do art. 61-A da Lei nº 12.651, de 2012, a recomposição das faixas marginais ao longo dos cursos d'água naturais será de, no mínimo:

'I - vinte metros, contados da borda da calha do leito regular, para imóveis com área superior a quatro e de até dez módulos fiscais, nos cursos d'água com até dez metros de largura; e

'II - nos demais casos, extensão correspondente à metade da largura do curso d'água, observado o mínimo de trinta e o máximo de cem metros, contados da borda da calha do leito regular' (o grifo é meu).

A exigência de observância de, no mínimo, trinta metros de recomposição ambiental para imóveis com áreas superiores a dez módulos fiscais, caso da área de propriedade da impetrante, amolda-se ao limite previsto na legislação de regência.

Aliás, ainda que não efetivamente implantado, no âmbito estadual, o Programa de Regularização Ambiental (PRA), regulamentado pelo supracitado Decreto Federal, o Código Florestal estabelece que a metragem mínima prevista será aquela que for aplicável no âmbito do programa (a saber: 'nos demais casos, conforme determinação do PRA, observado o mínimo de 20 (vinte) e o máximo de 100 (cem) metros). Daí porque inaplicar-se os dispositivos do Decreto nº 7.830/12 em decorrência da não implantação do PRA resultaria no afastamento, também, da regra prevista no artigo 61-A, § 4º, inc. II, do Código Florestal, o que levaria, então, à observância da regra geral que regulamenta a área de preservação permanente existente no entorno de cursos d'água (mínimo de 30 metros - Código Florestal, art. 4º).

Vale destacar que, 'ao contrário do que ocorre, por exemplo, na legislação urbanística, as normas ambientais são, por vezes, muito genéricas, não estabelecendo padrões específicos e determinados para esta ou aquela atividade. Nestes casos, o vazio da norma legal é geralmente preenchido por exame técnico apropriado, ou seja, pela discricionariedade técnica, deferida à autoridade' (Édis Milaré, apud Frederico Amado, 'Direito Ambiental', 11 ed., Salvador: Juspodivm, 2020, pág. 162). Nessa toada, a existência de pareceres técnicos anteriores, que deram pela faixa a ser recomposta em outro patamar (20 metros), não vincula a decisão a ser tomada pela autoridade ambiental, que, no caso, amparou-se em exame técnico e observou o limite previsto em lei.

Em face disso, resplandece o acerto do ato perpetrado pela autoridade ambiental e a ausência de direito líquido e certo a respaldar a pretensão mandamental. Dito isso, denego a segurança vindicada.

Custas pela impetrante.

Honorários incabíveis (LMS, art. 25).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se."

Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta, em síntese, que a imposição pelo IMA, através do Ofício n. 692/2019, da necessidade de correção do projeto de recomposição florestal apresentado pela empresa impetrante, a fim de considerar uma área de preservação permanente de 30 metros -- e não 20 -- seria ilegal e indevida, já que o programa de Regularização Ambiental Estadual anda não estaria regularmente instituído, demais disso o Decreto Federal n. 7.830/12 seria inaplicável ao caso vertente, pois seria uma ampliação nos parâmetros estabelecidos pela Lei 12.651/2012, novel Código Florestal.

Aduz, ainda, haver violação ao princípio da confiança e segurança jurídica, afirmando que a medida não seria razoável e proporcional (evento 41, 1G).

Com as contrarrazões (evento 51), ascenderam os autos a esta Corte, sendo distribuídos a este Relator.

O Exmo. Procurador de Justiça Dr. Alexandre Herculano Abreu lavrou parecer, opinando "pelo conhecimento e desprovimento do recurso, mantendo-se hígida a sentença vergastada" (evento 16, 2G).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto satisfeitos os pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade.

Cuida-se de mandamus impetrado por empresa que atua no ramo de empreendimentos florestais, contra ato coator que exigiu a recomposição vegetal de 30 metros ao longo de cursos d'água, em imóvel onde a parte impetrante cultiva o plantio de pinus sp. (Fazenda Itaperiú V, Registro CAR n. SC-4202107-18DDAABBC641434CA03CD5073756C2F0).

Sobreveio sentença denegando a segurança pleiteada, por considerar o acerto do ato perpetrado pela autoridade ambiental e a ausência de direito líquido e certo a respaldar a pretensão mandamental.

Mal contente, sustenta a apelante, em síntese, que a imposição pelo IMA, através do Ofício n. 692/2019, da necessidade de correção do projeto de recomposição florestal apresentado pela empresa impetrante, a fim de restaurar área de preservação permanente de 30 metros -- e não 20 -- seria ilegal e indevida. Argumenta que o Programa de Regularização Ambiental - PRA ainda não estaria regularmente instituído no Estado de Santa Catarina. Alega que o Decreto Federal n. 7.830/2012 seria inaplicável ao caso, pois seria uma ampliação nos parâmetros estabelecidos pela Lei 12.651/2012.

Analisando detidamente os elementos contidos no caderno processual, denota-se que o imóvel em que a impetrante mantém plantio de pinus sp. possui mais de 10 módulos fiscais, como, aliás, o próprio impetrante/apelante descreve, in verbis (Evento 30 - PET1, fl. 4): "o imóvel analisado no caso possui 57,09 módulos fiscais [...]".

O Código Florestal -- Lei n. 12.651/2012 --, ao se referir à recuperação de Área de Preservação Permanente, no seu art. 61-A, dispõe, in verbis:

"Art. 61-A. Nas...

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