Acórdão Nº 5020301-82.2020.8.24.0018 do Segunda Câmara Criminal, 06-07-2021

Número do processo5020301-82.2020.8.24.0018
Data06 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5020301-82.2020.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador SÉRGIO RIZELO


APELANTE: JULIANA FINGER FELCHILCHER (RÉU) ADVOGADO: ALEXANDRE SANTOS CORREIA DE AMORIM (OAB SC011253) APELANTE: AIRTON GUIMARAES (RÉU) ADVOGADO: EZEQUIAS MAYER DUARTE (OAB SC041327) ADVOGADO: THIAGO YUKIO GUENKA CAMPOS (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na Comarca de Chapecó, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Juliana Finger Felchilcher e Airton Guimarães, imputando-lhes a prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06, nos seguintes termos:
Na madrugada do dia 30 de agosto de 2020, por volta das 00h10min., integrantes da Polícia Militar local receberam informações no sentido que na Rua Corruíra, Bairro Efapi, nesta cidade e comarca, "haveria tráfico de drogas", deslocando-se aqueles imediatamente até o local informado (Boletim de Ocorrência de fl. 6 do evento 1).
Por sua vez, já no local, compreendendo "um pequeno condomínio e alguns apartamentos" (fl. 18 do evento 1), frise-se, situado na Rua Corruíra, Bairro Efapi, nesta cidade e comarca, os policiais encontraram a porta do apartamento alvo de delação aberta, ocasião em que constataram a presença dos aqui denunciados Juliana Finger Felchilcher e Airton Guimarães ("[...] ao chegar próximo ao apartamento onde seria o local da abordagem, além de ser uma porta de vidro, ela estava aberta", fl. 17 do evento 1).
Ato contínuo, diante da presença policial, a aqui denunciada Juliana Finger Felchilcher já atuando sob inegável elo subjetivo e conversão para a mesma diretiva, projetando-se a conduta de ambos os denunciados para idêntico fim e no mesmo contexto, tentou se desfazer "de um invólucro, posteriormente identificado como cocaína" (Boletim de Ocorrência de fl. 6 do evento 1).
Na ocasião, promovida imediata abordagem e busca no interior do apartamento pertencente e/ou utilizado pelos denunciados, os policiais lograram êxito em encontrar e apreender "60,80 gramas de cocaína" (cuja quantidade, natureza e seguinte fracionamento/individualização sabidamente poderia render inúmeras porções, pedras e buchas, para venda, entrega e fornecimento para indistintos usuários, dependentes e viciados em geral) (Boletim de Ocorrência de fls. 5-13, Auto de Exibição e Apreensão de fl. 14 e Laudo de Constatação de fl. 16, todos do evento 1), que os denunciados Juliana Finger Felchilcher e Airton Guimarães, sob inegável elo subjetivo e conversão para a mesma diretiva, projetando-se a conduta de ambos para idêntico fim e no mesmo contexto, atuando em manifesta demonstração de ofensa à saúde pública, adquiriram, mantinham sob posse e detenção, traziam consigo, guardavam e na oportunidade buscaram ocultar ("[...] quando nos aproximamos já visualizamos a feminina (ora denunciada Juliana Finger Felchilcher), que ao ver que a guarnição estava no local tentou se desfazer do invólucro que depois foi constatado que era cocaína", fl. 17 do evento 1) e ocultavam, contendo substância tóxica entorpecente ou mesmo causadora de dependência física ou psíquica conhecida como "cocaína", em situação típica de comércio e mercancia de entorpecentes, sem qualquer espécie de autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Do mesmo modo, ainda porventura da mencionada diligência policial, logrou-se êxito em também encontrar e apreender em poder e na posse dos denunciados "uma balança de precisão" (objeto justamente utilizado e destinado à preparação, produção ou mesmo individualização e fracionamento de drogas, visando o comércio e mercancia de drogas) ("[...] a balança de precisão ela (ora denunciada Juliana Finger Felchilcher) conseguiu acertar a janela e jogou no terceiro piso [...] depois encontramos em baixo no térreo", fl. 17 do evento 1), além da quantia de "R$ 2.370,15", "1 Smartphone, marca Motorola" e "1 Smartphone, marca Samsung" (Boletim de Ocorrência de fls. 5-13 e Auto de Exibição e Apreensão de fl. 14, ambos do evento 1).
Segundo Laudo Pericial de Constatação de fl. 16 do evento 1, os materiais apreendidos e analisados consistem em "Item 1 - 01 (uma) porção de substância branca petrificada fragmentada, acondicionada em embalagem de plástico branco, apresentando a massa bruta de 60,1g (sessenta gramas e um decigrama); Item 2 - 01 (uma) balança portátil de cor prata, em funcionamento descontrolado, marca 'B-Max', apresentando resíduos de pó branco [...] O material do item 1 apresentou resultado compatível com a substância química Cocaína. O material do item 2, por se tratar de resíduo, não foi analisado para preservar a amostra para o exame de laudo definitivo".
Não é por demais reforçar que a ação dos denunciados Juliana Finger Felchilcher e Airton Guimarães, altamente ofensiva à saúde pública e coletividade em geral, era levada a efeito aproveitando-se aqueles do local de indicada residência e das facilidades de se tratar de Bairro populoso (Bairro Efapi), notadamente para a venda, guarda, fornecimento e comercialização de substâncias entorpecentes ou mesmo causadoras de dependência física e/ou psíquica, visando, pois, à perpetuação do tráfico de entorpecentes, e auferindo lucro fácil e indevido às custas da desagregação social e da degradação pessoal alheia.
Por fim, os policiais militares conduziram os denunciados Juliana Finger Felchilcher e Airton Guimarães à repartição policial para as providência de estilo (Evento 1, doc2).
Concluída a instrução, o Doutor Juiz de Direito André Milani julgou procedente a exordial acusatória e condenou Juliana Finger Felchilcher e Airton Guimarães à pena individual de 5 anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, e 500 dias-multa, pelo cometimento do delito previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/06 (Evento 113).
Insatisfeitos, Juliana Finger Felchilcher e Airton Guimarães deflagraram recursos de apelação.
Nas razões de insurgência, Juliana Finger Felchilcher objetiva a decretação da sua absolvição sob a alegação de insuficiência probatória para sua condenação, atribuindo a si a qualidade de mera usuária de entorpecentes.
De forma subsidiária, requer a redução da pena no maior patamar previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, ao sustentar que preenche os requisitos legais para a concessão da benesse.
Ainda, pugna pela "mantença do regime aberto e da substituição, por ser esta a única forma clara de justiça" (Evento 148).
Airton Guimarães, por sua vez, aduz a ilicitude das provas produzidas nos autos, ante a alegação de violação de domicílio, requerendo o desentranhamento de todas as derivadas do flagrante, e a consequente decretação da sua absolvição por anemia probatória.
Caso não seja acolhida a preliminar, postula o reconhecimento da figura privilegiada do crime de tráfico de entorpecentes, argumentando que "obstar o reconhecimento da causa de diminuição de pena do §4º do art. 33 da Lei 11.343/06, por ocasião da prática anterior de ato infracional e pela existência de ação penal em andamento, ofende frontalmente os princípios constitucionalmente estabelecidos da proporcionalidade, do non bis in idem e da individualização da pena" (Evento 166).
O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu contrarrazões pelo conhecimento e desprovimento dos reclamos (Evento 170).
A Procuradoria de Justiça Criminal, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Paulo Roberto Speck, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento dos apelos (Evento 6)

VOTO


Os recursos preenchem os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, razão pela qual devem ser conhecidos.
1. O Apelante Airton Guimarães requer a decretação da nulidade do feito por suposta violação de domicílio.
Não se desconhece o posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido de que "A entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é arbitrária. Não será a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, que justificará a medida. Os agentes estatais devem demonstrar que havia elementos mínimos a caracterizar fundadas razões (justa causa) para a medida" (RE 603.616, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 5.11.15).
Sabe-se, ainda, que a mera existência de denúncia anônima somada à fuga do agente (STJ, AgRg no HC 585.150, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 4.8.20), ou a informação de que o agente tivera envolvimento anterior com tráfico de drogas (STJ, RHC 126.092, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca j. 23.6.20), são insuficientes para autorizar o ingresso forçado em residência alheia.
A propósito, em 2.3.21, o Superior Tribunal de Justiça deliberou:
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. FLAGRANTE. DOMICÍLIO COMO EXPRESSÃO DO DIREITO À INTIMIDADE. ASILO INVIOLÁVEL. EXCEÇÕES CONSTITUCIONAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. INGRESSO NO DOMICÍLIO. EXIGÊNCIA DE JUSTA CAUSA (FUNDADA SUSPEITA). CONSENTIMENTO DO MORADOR. REQUISITOS DE VALIDADE. ÔNUS ESTATAL DE COMPROVAR A VOLUNTARIEDADE DO CONSENTIMENTO. NECESSIDADE DE DOCUMENTAÇÃO E REGISTRO AUDIOVISUAL DA DILIGÊNCIA. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. PROVA NULA. ABSOLVIÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. 1. O art. 5º, XI, da Constituição Federal consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, ao dispor que "a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial". 1.1 A inviolabilidade de sua morada é uma das expressões do direito à intimidade do indivíduo, o qual, sozinho ou na companhia de seu grupo familiar, espera ter o seu espaço íntimo preservado contra devassas indiscriminadas e arbitrárias, perpetradas sem os cuidados e os limites que a excepcionalidade da ressalva a tal franquia constitucional exige. 1.2. O direito à...

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