Acórdão Nº 5020809-82.2020.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Público, 24-08-2022

Número do processo5020809-82.2020.8.24.0000
Data24 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Público
Classe processualAção Rescisória (Grupo Público)
Tipo de documentoAcórdão
Ação Rescisória (Grupo Público) Nº 5020809-82.2020.8.24.0000/

RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETO

AUTOR: CARMEM ELISE NECKEL ADVOGADO: PAULINHO DA SILVA (OAB SC014708) RÉU: MUNICÍPIO DE CHAPECÓ-SC MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RELATÓRIO

Trata-se de ação rescisória ajuizada por Carmem Elise Neckel contra o Município de Chapecó com o objetivo de rescindir o acórdão proferido pela Segunda Câmara de Direito Público, da relatoria do eminente Desembargador João Henrique Blasi, nos autos n. 0009600-02.2010.8.24.0018, transitado em julgado em 11.3.14, com fundamento nos arts. 525, § 15º e 535, § 8º, do CPC/15.

Para tanto, narrou que "obteve o benefício do adicional de regência de classe, porém os valores pretéritos foram corrigidos pela TR na forma da Lei 11.960/2009. A decisão rescindenda determinou a correção monetária destes valores pela TR na forma da Lei n 11.960/09" (evento 1, petição inicial 1, fl. 2).

Alegou que se utilizado o IPCA-E como fator de correção, obteria em seu favor uma diferença de R$ 3.631,58, corrigido até 06.05.2020.

Argumentou que o título executivo judicial foi constituído em 11.03.2014 e, em razão da coisa julgada, necessita da ação rescisória para reformar a decisão que aplicou a TR, visto que o STF, no Tema 810 "declarou a inconstitucionalidade da Taxa Referencial para correção monetária dos valores das condenações impostas à Fazenda Pública e elegeu o IPCA-E como índice adequado" (evento 1, petição inicial 1, fls. 2/3).

Finalizou requerendo "seja julgada a procedência da presente ação, para o fim de rescindir a Sentença e/ou Acórdão e proceder a reforma de seu resultado determinando a correção monetária através do IPCA-E, do valor principal e da sucumbência" (evento 1, petição inicial 1, fl. 9).

Citado, o Município de Chapecó ofereceu contestação arguindo a decadência, sob o argumento de que "A referida sentença restou integralmente confirmada pelo acórdão do E. Tribunal, este que transitou em julgado em 1º/8/2012. Destaca-se que a certidão juntada ao Evento 1 - CERTJULG3, dando conta de que o trânsito teria ocorrido em 11/03/2014, refere-se a outro processo judicial, autuado sob o n°018.13.024274-5" (evento 47, contestação 1, fl. 3).

Afirmou que o trânsito em julgado ocoreru na vigência do CPC/73 e, por isso "não se aplica ao caso o disposto no art. 535, III, §§ 5º e 8º, do CPC/2015, que excepciona o termo inicial da contagem do prazo da ação rescisória ao trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso, em face do disposto no art. 1.057 do CPC" (evento 47, contestação 1, fl. 3), requerendo a improcedência do pedido.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio da Procuradora Eliana Volcato Nunes, deixou de se manifestar acerca do mérito (evento 46, Parecer 1).

É o breve relato.

VOTO

1. Da competência para julgamento da ação rescisória:

A competência para o julgamento da presente ação rescisória é deste órgão colegiado, nos termos do art. 64, III, 'b', do Regimento Interno deste Tribunal, segundo o qual "Compete aos grupos de câmaras de direito civil, de direito comercial e de direito público, observadas as áreas de especialização: (...) III - processar e julgar: (...) b) a ação rescisória de acórdão de câmara do respectivo grupo;".

Logo, considerando que a demanda foi ajuizada com o intuito de rescindir acórdão proferido pela Segunda Câmara de Direito Público, nos autos da apelação cível n. 2012.022933-9, em que foi relator o eminente Desembargador João Henrique Blasi (evento 1, anexo 9, fl. 22), resta evidenciada a competência deste Grupo para a análise do feito.

2. Do julgamento da presente ação rescisória com resolução do mérito (teoria da asserção):

O direito de ação (dentre eles, o direito à propositura de ação rescisória) pode ser estudado sob a ótica de diferentes correntes doutrinárias, dentre as quais estão a "teoria eclética" e a "teoria da asserção". Ambas as teorias foram consolidadas para separar o que se entende por direito material e direito processual, a fim de destacar que o direito de ação trata de uma ciência autônoma, atinente ao ramo do direito processual civil.

Mesmo antes da vigência do Código de Processo Civil de 2015, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que o nosso ordenamento jurídico adotou a "teoria da asserção", que se diferencia da "teoria eclética" no que tange ao momento em que essas "condições da ação" serão verificadas pelo magistrado. E tal conjuntura influencia diretamente no resultado do julgado, que poderá ser proferido com ou sem resolução do mérito.

Em suma, para a "teoria da asserção", se o magistrado é capaz de verificar a carência das condições da ação através de uma análise sumária, a solução adequada será o proferimento de decisum sem resolução do mérito, extinguindo o feito com fulcro no art. 485 do CPC/15.

Por outro lado, se esta constatação depender de uma análise mais aprofundada dos fatos ou do direito envolvidos na demanda, na verdade a verificação de tais requisitos passará a se dar na esfera do próprio mérito processual, devendo o magistrado proferir decisão com resolução do mérito, seja pela procedência ou pela improcedência dos pedidos (art. 487, I, do CPC/15).

Outrossim, "segundo a jurisprudência do STJ, 'as condições da ação (...) devem ser aferidas in status assertionis, ou seja, à luz exclusivamente da narrativa constante na petição inicial' (AgRg no AREsp n. 655.283/RJ, rel. Min. Luis Felipe Salomão)" (STJ, AgInt nos EDcl no REsp n. 1.760.178/RS, rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, j. 30.3.20).

Logo, ainda que não reste verificada a presença do vício do inciso V, do art. 966 do CPC/15 apontado pelo autor, o julgamento deverá se dar com resolução do mérito (isto é, pela procedência ou improcedência da ação rescisória), já que a verificação do enquadramento da demanda nas aludidas hipóteses dependerá justamente da análise das matérias de direito e fato alegadas no mérito da lide, o que, pela teoria da asserção, acarreta o julgamento com resolução do mérito.

3. Do prazo para a interposição da ação rescisória:

Na vigência do CPC/73, o art. 495 disciplinava que "O direito de propor ação rescisória se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão".

Já no CPC/15, como regra geral "o direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo" (art. 975, caput, do CPC/15), prazo de ajuizamento que possui natureza decadencial. Entretanto, na hipótese da "rescisória escondida" prevista no § 8º do art. 535 do CPC/15, o "prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal".

E da análise dos autos dos autos n. 2012.022933-9, verifica-se que a decisão rescindenda transitou em julgado em 1º.8.2012 (evento 1, anexo 9, fl. 34), ou seja, na vigência do Código de Processo Civil de 1973 e antes da declaração de inconstitucionalidade do Supremo Tribunal Federal, ocorrida em 20.11.17.

Assim, deve-se respeitar a regra de direito intertemporal prevista no art. 1.057 do CPC/15, segundo a qual, "O disposto no art. 525, §§ 14 e 15 , e no art. 535, §§ 7º e 8º , aplica-se às decisões transitadas em julgado após a entrada em vigor deste Código, e, às decisões transitadas em julgado anteriormente, aplica-se o disposto no art. 475-L, § 1º , e no art. 741, parágrafo único, da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973" (grifou-se).

Sendo assim, os §§ 7º e 8º do art. 535 do CPC/15 não se aplicam às decisões transitadas em julgado na vigência da antiga codificação, conforme decidiu a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 04.05.2021:

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NA AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO. TERMO A QUO. ACÓRDÃO RESCINDENDO. TRÂNSITO EM JULGADO. VIGÊNCIA DO CPC/1973. REGRAS...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT