Acórdão Nº 5021029-26.2021.8.24.0039 do Sexta Câmara de Direito Civil, 19-07-2022

Número do processo5021029-26.2021.8.24.0039
Data19 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5021029-26.2021.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO

APELANTE: IRACEMA RAMOS MARINHO (AUTOR) ADVOGADO: Marconi Tadeu Branco Ramos (OAB SC007464) ADVOGADO: GERSON PALMA ARRUDA (OAB SC014192) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) ADVOGADO: SIGISFREDO HOEPERS (OAB SC007478) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório de sentença:

IRACEMA RAMOS MARINHO, devidamente qualificado, ingressou com a presente Ação Declaratória de Nulidade Contratual c/c Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais contra BANCO BMG S.A, também qualificado, alegando que é aposentada pelo INSS e, ao emitir extrato de seu benefício previdenciário por volta do mês de abril/2021, foi surpreendida com a descoberta de um cartão de crédito consignado averbado ao seu benefício previdenciário, o qual alega desconhecer. Narra que, ao apurar o fato em ação de produção antecipada de provas, constatou que a relação contratual seria embasada em contrato que a autora nega ter contratado, alegando se tratar de falsificação de assinatura. Entende que houve falha da instituição financeira na prestação do serviço e que sofreu danos morais e materiais.

Ao final requereu a concessão de tutela de urgência para o fim de determinar a imediata suspensão dos descontos relacionados a tal contrato, sob pena de multa, bem como a procedência dos pedidos, para o fim de se declarar a inexistência de relação jurídica entre as partes, bem como determinar a devolução em dobro de todos os valores descontados de seu benefício previdenciário com relação a tal contrato, além de condenar a casa bancária ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de indenização por danos morais. Requereu ainda a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, com a inversão do ônus da prova, e os benefícios da justiça gratuita.

Recebida a inicial, foi deferida a liminar.

O réu opôs embargos de declaração contra essa decisão, os quais foram rejeitados, sendo então interposto agravo de instrumento contra a decisão.

Em contestação, o réu arguiu preliminares de falta de interesse de agir e invocou a decisão proferida pela Turma de Uniformização das Turmas de Recursos do TJSC sobre a matéria. No mérito, defendeu a regularidade da contratação em todos os seus termos e destacou que houve disponibilização do valor à consumidora. Impugnou todos os pedidos autorais e, ao final, pugnou pelo julgamento de improcedência.

Houve réplica.

Deferida a produção de prova pericial grafotécnica, o réu não informou interesse no adiantamento dos honorários periciais.

É o relatório.



A parte dispositiva é do seguinte teor:

Isto posto, nos autos de Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais nº 50194022120208240039, em que é AUTORA IRACEMA RAMOS MARINHO, e RÉU BANCO BMG S.A, INDEFIRO o pedido de expedição de ofício (ev. 44), e ato contínuo, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, no que CONFIRMO a liminar deferida no ev. 8, tornando-a definitiva, DECLARO a inexistência de contratação do contrato n. 13631170 (ev. 1/7), bem como CONDENO o réu à devolução em dobro à autora de todos os valores já descontados de seu benefício previdenciário com relação a tal contrato, devendo incidir correção monetária pelo INPC/IBGE (CGJ/SC) desde a data de cada desconto, e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação; ainda, CONDENO o réu ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) à autora a título de indenização por danos morais, devendo incidir correção monetária pelo INPC/IBGE (CGJ/SC) a partir do arbitramento (Súmula 362/STJ) e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar do evento danoso (Súmula 54/STJ), isto é, do desconto da primeira parcela.

Ante a sucumbência recíproca, CONDENO ambas as partes ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios (art. 86, caput, do CPC), os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação, na forma do art. 85, § 2º, do CPC, divididas as obrigações na proporção de 20% suportadas pela autora e 80% suportadas pelo réu.

P. R. I.

Comunique-se imediatamente ao D. Relator do Agravo de Instrumento n. 5000765-71.2022.8.24.0000.

Transitado em julgado, expeça-se alvará do valor depositado em subconta (ev. 6/3) ao banco.

Após, arquive-se.



Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a parte ré manejou recurso de apelação (evento 56), aduzindo, em breve síntese, que: (i) "a contratação foi comprovada no evento 14.3, mediante a juntada do termo de adesão nº 51252274, vinculado ao cartão de crédito n.º 5259.xxxx.xxxx.6720, firmado pela parte demandante junto ao recorrente em 02/03/2018"; (ii) "no referido documento, há expressa autorização para reservar a margem e efetuar descontos para garantia do pagamento do valor mínimo da fatura, em caso de utilizando do cartão ou realização de saques"; (iii) "os serviços foram legalmente anuídos por aquela, inexistindo ilícito"; (iv) "o autor realizou UM SAQUE AUTORIZADO no valor de R$ 4.332,00, em 07/03/2018, cujo valor foi depositado em conta nominal da autora"; (v) "é incontestável que a parte autora recebeu proveito econômico em razão da contratação"; (vi) "deve ser determinada a devolução, pela parte autora, dos créditos por ela recebidos, devidamente acrescidos de juros e correção monetária, permitindo ainda, a compensação com o valor da condenação"; (vii) preliminarmente, deve-se reconhecer a prescrição da pretensão para indenização de danos morais e materiais; (viii) a autora não comprovou os fatos constitutivos de seu direito, nos termos do disposto no art. 373, I, do CPC; (ix) não há se falar em anulação do negócio jurídico diante da regular contratação de operação de cartão de crédito com reserva de margem consignável pela autora; (x) "O nobre julgador singular entendeu que o contrato firmado entre as partes é abusivo, pois caracterizou venda casada"; (xi) "já restou comprovado que a parte autora contratou cartão de crédito consignado/telesaque, bem como recebeu o valor em decorrência da contratação do telesaque. Ainda, autorizou a reserva de margem em sua folha de pagamento. Assim não há o que se falar em abusividade na contratação"; (xii) "NÃO HÁ QUALQUER ILEGALIDADE NA MODALIDADE DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL"; (xiii) as cobranças efetuadas são legais, bem como o saque mediante utilização do cartão de crédito consignado; (xiii) inexistem danos morais no caso em exame, sobretudo porque não comprovados; (xiv) sucessivamente, se mantida a condenação ao pagamento de verba indenitária, o quantum deve ser reduzida, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade; (xv) os juros moratórios são devidos a partir do momento em que se tornou líquida a obrigação e, caso assim não se entenda, devem incidir a partir da citação; (xvi) não há se falar em repetição em dobro dos valores indevidamente cobrados.

Igualmente inconformada, a autora manejou apelação (evento 63), aduzindo, em suma, que: (i) "sendo reconhecido a existência dos danos morais, a sua fixação em valor menor do que o sugerido na inicial, não importa em sucumbência reciproca, aplicando-se a Súmula 326 do STJ, devendo ser afastada a condenação daapelante nos ônus sucumbências, devendo ser redistribuído e ser o mesmo suportado unicamente pelo apelado"; (ii) o valor fixado a título de danos morais deve ser majorado; (iii) "a elevação e adequação dos honorários sucumbenciais para esta fase recursal".

Contrarrazões foram apresentadas pela autora no evento 69 e pelo réu no evento 70.

Após, por sorteio/vinculação, os autos vieram-me conclusos na data .

É, na essência, o relatório necessário. Passo a decidir.

VOTO

Como visto, trata-se de recursos de apelação cível interpostos por ambas as partes, desafiando sentença de parcial procedência dos pedidos deduzidos nos autos da presente "ação declaratória de nulidade por falsidade de assinatura de termo de adesão cartão de crédito consignado/proposta de contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado/cédula de crédito bancário c/c repetição do indébito e danos morais", ajuizada por Iracema Ramos Marinho em desfavor de Banco BMG S/A.

Isso dito, embora seja próprio e tempestivo, o reclamo manejado pela casa bancária comporta apenas parcial conhecimento, uma vez que as razões do reclamo referentes à (i) abusividade do contrato, (ii) venda casada, (iii) ausência de ilegalidade de contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável, bem como (iv) licitude do saque feito mediante a utilização do referido cartão encontram-se dissociadas dos fundamentos encartados no "decisum" impugnado, violando o princípio da dialeticidade.

Isso porque, no caso em exame, não se discute a legalidade da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável. A autora, em verdade, argumenta que jamais contratou a referida operação financeira - perspectiva sobre a qual a sentença foi exarada.

Eventuais discussões relativas à validade/legalidade da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável, portanto, refogem aos limites da lide, pelo que não se conhece do apelo manejado pela casa bancária no vértice.

Assim sendo, conhece-se parcialmente do recurso interposto pela ré.

Considerando que as demais teses recursais confrontam efetivamente o disposto na sentença e o teor dos autos, deve o recurso do réu ser parcialmente conhecido. O apelo manejado pela autora, por seu turno, restará prejudicado, como a frente se verá.

Passa-se, pois, ao enfrentamento das teses recursais.



1. Da prescrição

Prosseguindo à análise do reclamo, argumenta o banco recorrente que o prazo prescricional aplicável à hipótese é o de 3 (três) anos (art. 206, § 3.º, inc. V, do CC) a fluir do fato causador do dano, situação que fulmina o direito autoral.

Sem razão o recorrente.

In casu, acerca da temática em escopo - prescrição -, trago à baila lição do professor Flávio...

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