Acórdão Nº 5021220-11.2020.8.24.0038 do Terceira Câmara Criminal, 28-03-2023

Número do processo5021220-11.2020.8.24.0038
Data28 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5021220-11.2020.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador LEOPOLDO AUGUSTO BRÜGGEMANN


APELANTE: FABRICIO CERQUEIRA XAVIER (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na comarca de Joinville, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Rafael Soares Barros e Fabricio Cerqueira Xavier, dando-os como incursos nas sanções do artigo 157, § 2º, incisos I e II (duas vezes) do Código Penal, pela prática das condutas assim descritas na inicial acusatória:
1 - No dia 18 de agosto de 2017, por volta das 11h45min, os denunciados RAFAEL SOARES BARROS e FABRÍCIO CERQUEIRA XAVIER, agindo em comunhão de esforços com outro indivíduo não identificado, foram até a loja Visual Veículos, situada na Rua [...], Bairro Boa Vista, Joinville, ocasião em que, mediante grave ameaça, exercida com emprego de duas armas de fogo, anunciaram o assalto às vítimas Luan Carlos Figueiredo Schimidt e Ricardo Cléber da Silva, e então as amarram e as trancaram no banheiro.
Na sequência, os denunciados e seu comparsa subtraíram um telefone celular, modelo J5, marca Samsung, de propriedade da vítima Luan Carlos Figueiredo Schimidt, um telefone celular, marca Samsung Packet, além de dois notebooks, um automóvel Citroën/C4 hatch, ano 2011, um automóvel Citroën/C4 Grand Picasso, ano 2012 e 1 (um) automóvel GM/Cruze sedan, ano 2012, de propriedade da vítima Jorge Francesconi. Logo após, evadiram-se do local na posse tranquila da res.
2 - No dia 23 de agosto de 2017, por volta das 11h45min, os denunciados RAFAEL SOARES BARROS e FABRÍCIO CERQUEIRA XAVIER, agindo em comunhão de esforços com outro indivíduo não identificado, retornaram à loja Visual Veículos, ocasião em que, mediante grave ameaça, exercida com emprego de duas armas de fogo, anunciaram o assalto às vítimas Jorge Francesconi, Luan Figueiredo Schimidt e outras três pessoas que lá estavam, conduziram-nas até o escritório, amarraram-nas e as trancaram no local.
Na sequência, os denunciados e seu comparsa subtraíram um automóvel Honda/New Civic, ano 2009, um Honda/Civic, ano 2011 e um automóvel Citroën/C4, ano 2011, além de três telefones celulares, marca IPhone, um relógio de pulso technos, R$ 1.500,00, em espécie, dois notebooks, marcas Lenovo e Vaio, e um pendrive, de propriedade da vítima Jorge Francesconi. Logo após, evadiram-se do local na posse tranquila da res.
Ressalta-se que, na ocasião, os denunciados contaram com apoio de mais pessoas, porquanto um automóvel Citroën/C4 Pallas estava ao lado de fora, durante a empreitada criminosa, dando cobertura (ev. 9.1).
Houve a cisão do processo em relação ao denunciado Rafael Soares Barros, o qual restou processado e condenado nos autos n. 0002207-48.2019.8.24.0038.
Concluída a instrução do feito, a denúncia foi julgada procedente para condenar Fabrício Cerqueira Xavier às penas de 11 (onze) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e pagamento de 32 (trinta e dois) dias-multa, por infração ao art. 157, § 2.º, I e II, por duas vezes, em concurso formal (art. 70, caput), e art. 157, § 2.º, I e II, na forma continuada, nos termos do art. 71, parágrafo único, todos do Código Penal. Foi-lhe concedido o direito de apelar em liberdade (ev. 184.1).
Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação, no qual requereu, em preliminar, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, em razão de ter sido operada fundamentação da dosimetria de apenas um dos delitos. No mérito, restringiu-se à pena irrogada, pleiteando pela redução da sanção-base para o mínimo legal, por considerar inidônea a valoração das circunstâncias do crime; pelo incremento da pena em apenas 1/3 (um terço) em função das majorantes, observada a Súmula 443 do STJ e art. 68, parágrafo único, do Código Penal; bem como pelo reconhecimento da continuidade delitiva, nos termos do art. 71, caput, do CP (ev. 193.1).
Juntadas as contrarrazões (ev. 197.1), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes, opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, a fim de que seja aplicada a regra do artigo 71, caput, do Código Penal, em relação a todos os fatos criminosos e, de ofício, pela modificação da pena de multa estabelecida (ev. 11.1).
Este é o relatório

VOTO


Trata-se de recurso de apelação contra decisão que julgou procedente a denúncia e condenou o acusado às sanções previstas pelo art. 157, § 2.º, I e II, por duas vezes, em concurso formal (art. 70, caput), e art. 157, § 2.º, I e II, na forma continuada, nos termos do art. 71, parágrafo único, todos do CP.
O recurso é de ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade.
1 Nulidade da sentença por cerceamento de defesa
A defesa do apelante argui a nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, alegando que fora realizada a dosimetria de apenas um dos crimes.
Razão não lhe assiste.
Assim, fundamentou o magistrado singular ao realizar a operação respectiva: "Passo à aplicação da pena (art. 68, caput, do CP), sendo que realizarei a dosimetria de um dos roubos, porque são idênticos, sendo que posteriormente incluirei as regras do concurso formal e crime continuado" (ev. 184.1, grifou-se).
Como bem fundamentado na sentença, fora realizada a dosimetria de apenas um dos roubos, porque se tratam de delitos idênticos.
Logo, não há divergências nas etapas de individualização da pena cominada a cada um dos crimes, uma vez que as circunstâncias fáticas e legais que ensejaram o seu aumento ou diminuição são as mesmas, sendo prescindível, dessa forma, a realização do cálculo dosimétrico individual para cada delito.
Nesse contexto, não há falar em cerceamento de defesa, já que toda a fundamentação do cálculo dosimétrico foi realizado para cominação da reprimenda dos crimes em discussão, nos termos do art. 68 do Código Penal.
A propósito:
RECURSO ESPECIAL. PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1.º DA LEI N.º 8.137/90). [...] CONTINUIDADE DELITIVA. CRIMES IDÊNTICOS E COMETIDOS EM CIRCUNSTÂNCIAS SIMILARES. CÁLCULO DOSIMÉTRICO INDIVIDUAL PARA CADA CONDUTA. DESNECESSIDADE. OBSERVADAS AS DIRETRIZES DO ART. 68 DO CÓDIGO PENAL. [...] 1.16. Tratando-se de crimes idênticos e cometidos em circunstâncias idênticas ou similares, desnecessária a dosimetria de cada delito para, depois, aplicar o aumento, seja porque não alterará a sanção final, seja porque não há qualquer prejuízo, tendo em vista que foram observadas as diretrizes do art. 68 do Código Penal. [...] 3. Recursos especiais parcialmente conhecidos e, nessa extensão, desprovidos. (REsp n. 1.848.553/MG, relª. Minª. Laurita Vaz, Sexta Turma, j. 2/3/2021).
Assim, não observado qualquer prejuízo à defesa, uma vez que demonstrado ter sido realizada a correta individualização da pena, não resta configurado o alegado cerceamento de defesa.
Sobre o assunto, mutatis mutandis, já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO TENTADO. LESÃO CORPORAL CULPOSA. NULIDADE. DECISÃO QUE DESIGNOU O INTERROGATÓRIO DO RECORRENTE VIA VIDEOCONFERÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. EFETIVO PREJUÍZO NÃO VISUALIZADO. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Esta Corte Superior de Justiça possui assente jurisprudência no sentido de que, em obediência ao principio pas de nullité sans grief, que vigora plenamente no processo penal pátrio (art. 563 do Código de Processo Penal - CPP), não se declara nulidade de ato se dele não resulta demonstrado efetivo prejuízo para a parte.
2. O Magistrado de primeiro grau, em obediência ao disposto no § 2º do art. 185 da Lei n. 11.900/2009, apresentou fundamentação apta a justificar a necessidade da adoção do interrogatório do recorrente pelo sistema de videoconferência, notadamente para se evitar a delonga na prestação jurisdicional, considerando sobretudo os problemas constantes na escolta de réu preso. Precedentes desta Corte.
3. Não se verifica, na hipótese dos autos, a alegada nulidade, tendo em vista que o recorrente não logrou êxito em demonstrar efetivo prejuízo à sua defesa com a realização do interrogatório pelo sistema de videoconferência, tendo em vista que foi devidamente assistido por defensor público durante o referido interrogatório e, inclusive, nos atos processuais subsequentes, não se evidenciando, por conseguinte, prejuízo efetivo para a defesa.
4. Agravo regimental improvido. (AgRg no RHC 110.019/AL, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 21/05/2019, grifou-se).
Arreda-se, portanto, a preliminar.
2 Redução da pena-base
A defesa busca a redução da pena-base para o mínimo legal, sob a alegação de que inidôneo os fundamentos utilizados para valoração das circunstâncias do crime, pois inerentes ao tipo penal.
Sem razão.
Colhe-se da sentença:
[...] Analisadas as circunstâncias judiciais desta primeira fase (art. 59, caput, do CP), vê-se que as circunstâncias são graves, em razão dos agentes terem restringido a liberdade das vítimas, ainda que de forma momentânea, além de terem amarrado-as, o que denota maior gravidade da conduta e impõe o aumento da pena-base na fração de 1/6, ficando em 4 anos e 8 meses de reclusão, com 11 dias-multa (ev. 184.1, grifou-se).
Ora, não há dúvidas de que as circunstâncias do crime extrapolam a normalidade do tipo penal, porquanto o acusado e seus comparsas amarraram as vítimas e as deixaram no banheiro, a fim de retardar o pedido de ajuda, tanto que não conseguiram acionar a polícia de imediato, o que ocorreu somente após uma das vítimas conseguir se soltar.
Nesse sentido, colhe-se desta Corte:
APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIME DE ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO CONCURSO DE AGENTES PRATICADO EM CONCURSO FORMAL COM CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES. ART. 157, § 2°, II, DO CÓDIGO PENAL E ART. 244-B, CAPUT, DA LEI N. 8.069/1990, NA FORMA...

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