Acórdão Nº 5022115-86.2020.8.24.0000 do Grupo de Câmaras de Direito Público, 28-04-2021

Número do processo5022115-86.2020.8.24.0000
Data28 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoGrupo de Câmaras de Direito Público
Classe processualAção Rescisória (Grupo Público)
Tipo de documentoAcórdão










Ação Rescisória (Grupo Público) Nº 5022115-86.2020.8.24.0000/



RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA


AUTOR: CLAUDIR SOARES DE LIMA RÉU: MUNICÍPIO DE CHAPECÓ/SC


RELATÓRIO


Claudir Soares de Lima ajuizou ação rescisória em relação ao Município de Chapecó.
Relata que detém título executivo formado em relação à Fazenda Pública, tendo inclusive requerido o cumprimento de sentença.
Criticou, todavia, os encargos financeiros atribuídos pela decisão submetida à coisa julgada. Na fase de conhecimento obteve o reconhecimento quanto às diferenças remuneratórias omitidas pela municipalidade (durante o período em que esteve fora do serviço público indevidamente), mas então se atribuiu a correção monetária pela TR nos termos da Lei 11.960/09. Ocorre que posteriormente à estabilização daquele julgamento (havido em março de 2016), o Supremo Tribunal Federal, em setembro de 2017, reconheceu a inconstitucionalidade do indicador ao apreciar o Tema 810 da Repercussão Geral.
Não obstante a requisição de pagamento já expedida, sustentou que o montante se encontra defasado quando aplicado o índice eleito pela Suprema Corte, o IPCA-E.
Ponderou que por força da coisa julgada não pôde rediscutir esse capítulo da deliberação na fase executiva, tornando inevitável a utilização da via rescisória para sanar em concreto a inconstitucionalidade pronunciada pelo STF.
Quer a procedência do pedido rescisório para desconstituir o acórdão "que determinou a correção monetária dos valores pretéritos pela TR, buscando ver declarado o direito de receber os créditos devidamente corrigidos pelo IPCA-E, condenando o réu ao pagamento das diferenças apontadas, relativamente ao valor da verba principal e da verba de sucumbência, por conta do que foi definido pelo Supremo Tribunal Federal no RE n. 870.947/SE (Tema 810)".
O Município de Chapecó contestou.
Defendeu que o montante executado já se encontra atualizado pelo IPCA-E por expressa determinação do juízo da execução, o qual fixou que "a contar da inscrição em precatório e até o efetivo pagamento, a correção monetária observará a variação do IPCA-E (conforme decidido nas ADIs 4.357, 4.372 e 4.425)". Nesse caso, diversamente do alegado pela parte, o indicador não foi omitido, mas considerado no cálculo executivo.
Sustentou que, independentemente das conclusões assumidas pela Suprema Corte sobre a inconstitucionalidade da TR, deve no caso específico prevalecer a coisa julgada. Além disso, os efeitos daquela deliberação paradigma somente poderiam incidir sobre causas supervenientes, não se aplicando as conclusões lá adotada para as demandas em curso.
Impugnou, ainda, os cálculos apresentados pelo acionando, visto que "considera o valor de R$ 152.426,41, quando na verdade deixou de incluir o valor de R$ 15.426,41 a título de honorários, e deixou de mencionar que o valor efetivamente pago foi R$ 192.269,96, sendo que este já foi corrigido pelo IPCA desde a inscrição em precatório".
Houve réplica.
A Procuradoria-Geral de Justiça negou interesse na causa.
Ante a perspectiva de decadência do direito de propor ação rescisória, oportunizei manifestação.
O acionante trouxe que "o prazo decadencial incide do trânsito em julgado do tema 810 em 20/03/2020, ou ainda de declaração da declaração da inconstitucionalidade da TR pelo STF em 20/09/2017, ambos plenamente em vigor o Código de Processo Civil de 2015, devendo seguir as disposições nestes vigentes, especialmente a presente rescisão nos moldes do art. 535, III, §§5º e 8º do CPC/2015". Acrescentou ainda que, em se tratando de inconstitucionalidade de critério de correção monetária, a matéria é de ordem pública e pode ser tratada de ofício. Além do mais, os efeitos do julgado atingem situações pretéritas e mesmo na vigência do CPC de 1973 já era factível a rescisão da coisa julgada inconstitucional. Observa que o p. único, do art. 741 do referido diploma, aliás, teve sua constitucionalidade confirmada pelo STF.
Em seguida, afirmou que regra de direito intertemporal (art. 1.057 do CPC de 2015) determina qual diploma terá aplicação e qual o prazo decadencial a ser utilizado como parâmetro. Em todo caso, defendeu que na hipótese deverá ser observada a data do trânsito em julgado da decisão do STF (Tema 810), aplicando-se, por consequência o art. 525, § 12 c/c § 15, e o art. 535, §§ 5º e 8º, do CPC de 2015

VOTO


1. O acionante defende que o índice de correção monetária estabelecido no título executivo não está de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. A Corte, ao apreciar o Tema 810 da Repercussão Geral, considerou que a aplicação da TR é inconstitucional - critério utilizado para recompor a quantia à qual o acionante tinha direito. Estipulou, por outro lado, o IPCA-E como método de reajuste, já que o parâmetro legal (Lei 11.960/09) não estaria apto a adequadamente medir as oscilações monetárias.
Eis o que constou do título, transitado em julgado em 10 de março de 2016 (Evento 1, Certidão de Julgamento 9):
Assim, faz jus o autor ao pagamento dos vencimentos e demais vantagens inerentes ao cargo, que deixou de receber no período compreendido entre o ato de exoneração (novembro de 2008) e a sua reintegração ao cargo público.
Diante da procedência total dos pedidos formulados, inverte-se os ônus sucumbenciais, de forma que o Município réu deverá arcar com os honorários advocatícios devidos ao patrono do autor, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC, observada a isenção quanto ao pagamento das custas processuais.
As prestações devidas serão corrigidas pelo INPC, desde cada vencimento, até o advento da Lei n. 11.960/2009 (30/6/2009) e, a partir de 1º/7/2009, pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança. A contar da citação, os juros de mora e a correção monetária serão aplicados de forma conjunta, de acordo com os índices aplicáveis à referida aplicação financeira, nos moldes do que dispõe o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29.6.2009.
Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso do Município e ao reexame necessário; e dá-se provimento ao recurso do autor para condenar o réu ao pagamento dos vencimentos e demais vantagens inerentes ao cargo, no período compreendido entre o ato de exoneração (novembro de 2008) e a sua reintegração.
É verdade que posteriormente à formação da coisa julgada, por acórdão publicado em 20 de novembro de 2017, o STF proclamou seu veredicto no RE 870.947 relativamente aos juros e correção monetária, rejeitando recentemente, em 3 de outubro de 2019, os embargos de declaração que pretendiam a modulação dos efeitos da decisão.
A esse respeito, aliás, vale ressaltar recente decisão do Grupo de Câmaras de Direito Público que serenou a controvérsia no âmbito deste Tribunal de Justiça quanto à incidência imediata daquelas conclusões emanadas pela Suprema Corte.
Na AR 5008294-15.2020.8.24.0000, em suma, decidiu-se que para os títulos definitivamente formados em momento anterior à decisão do Supremo Tribunal Federal, é viável o manejo de ação rescisória para superação do índice tido pela Suprema Corte como inconstitucional. Eis o que constou da ementa formada na ocasião:
AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA (ART. 966, INCISO V, DO CPC). DIFERENÇAS DE PENSÃO GRACIOSA DEVIDAS PELA FAZENDA PÚBLICA. CRÉDITO DE NATUREZA ADMINISTRATIVA EM GERAL. ACÓRDÃO RESCINDENDO QUE DETERMINA A APLICAÇÃO DA TR COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE DA TR DECLARADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RE 870.947/SE, COM REPERCUSSÃO GERAL (TEMA 810). TÍTULO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO ANTERIOR À DECISÃO DO STF. RESCISÃO DO CAPÍTULO REFERENTE À TR (ART. 966, INCISO V, § 3º, C/C ARTS. 525, § 15, E 525, § 8º, DO CPC). POSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA TR PELO IPCA-E A PARTIR DE JULHO DE 2009, INCLUSIVE, PARA ADEQUAÇÃO AO TEMA 810/STF E AO TEMA 905/STJ. PEDIDO RESCISÓRIO PROCEDENTE.
Do mesmo modo, foram publicados os Enunciados XXVI e XVII do Grupo de Câmaras de Direito Público, os quais consolidam a jurisprudência do órgão fracionário sobre o assunto:
A) Enunciado XXVI
Se a decisão exequenda transitou em julgado em momento posterior à publicação da decisão que declarou inconstitucional o art. 5º da Lei n. 11.960/09 para correção monetária (Tema n. 810 do STF), ocorrida em 20.11.17, o título executivo será inexigível no ponto, devendo ser adotada em cumprimento de sentença a legislação vigente em relação aos consectários legais (art. 525, § 12, e art. 535, § 5º, ambos do CPC/15).
B) Enunciado XXVII
Se a decisão exequenda transitou em julgado em momento anterior à publicação da decisão que declarou inconstitucional o art. 5º da Lei n. 11.960/09 para correção monetária (Tema n. 810 do STF), ocorrida em 20.11.17, é preciso respeitar a coisa julgada já operada (Tema n. 905 do STJ), sendo possível a sua alteração somente por recurso próprio ou ação rescisória, no prazo do § 8º do art. 535 do CPC/15.
Pela pertinência ao presente caso, convém ainda reproduzir o voto lavrado pelo eminente Desembargador Jaime Ramos, redator do acórdão:
O índice de correção monetária das condenações impostas à Fazenda Pública, estava previsto no art. 1º-F, da Lei Federal n. 9.494, 10/9/1997, com redação dada pelo art. 5º, da Lei Federal n. 11.960, de 29/6/2009:
"Art. 1º-F. Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança".
Os índices oficiais de remuneração da caderneta de poupança, a que se refere o dispositivo acima, são compostos pela TR, para a correção monetária, na forma da Lei Federal n. 8.177/1991, que estabelece regras para a desindexação da economia...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT