Acórdão Nº 5022115-88.2020.8.24.0064 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 01-02-2022

Número do processo5022115-88.2020.8.24.0064
Data01 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5022115-88.2020.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ CARLOS CARSTENS KOHLER

APELANTE: HUDNY GERMANO DE MACEDO (AUTOR) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Hudny Germano de Macedo interpôs Apelação Cível (Evento 50, APELAÇÃO1, autos de origem) contra a sentença prolatada pela Magistrada oficiante na 3ª Vara de Direito Bancário da Região Metropolitana de Florianópolis - doutora Ana Luisa Schmidt Ramos - nos autos da ação revisional que move o Recorrente em face do Banco Pan S.A., cuja parte dispositiva restou vazada nos seguintes termos:

ANTE O EXPOSTO, julgo improcedentes os pedidos.

Condeno a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários, estes arbitrados em R$ 2.000,00 (art. 85, § 8º, do CPC), cuja exigibilidade suspendo por força da Justiça Gratuita. Os honorários serão atualizados pelo INPC, do arbitramento, e acrescidos de juros simples de 1% a.m., do trânsito em julgado.

(Evento 33, SENT1, autos de origem, grifos nos original).

Foram opostos Embargos de Declaração pelo Autor (Evento 38, EMBDECL1, autos de origem), os quais foram rejeitados (Evento 43, SENT1, autos de origem).

Em suas razões recursais, o Apelante advoga, em compêndio, que: a) "[...] o custo efetivo total de 30,25% a.a. deve, juntamente com a taxa de juros de 20,87% a.a., ser analisado para fins de revisão contratual, pois trata-se do valor efetivamente cobrado em contrato"; b) "[...] é abusivo o modo como vêm sendo cobrados os valores referentes ao débito da parte Autora, pois há incidência de juros inconstitucionais e também capitalização mensal dos juros, o que configura o anatocismo, devendo ser adequado de acordo com os ditames legais e constitucionais"; c) "[...] devem ser anuladas e afastadas as cobranças relativas a "Tarifa de Cadastro no valor de R$ 652,00 (seiscentos e cinquenta e dois reais), Registro de contrato no valor de R$ 174,12 (cento e setenta e quatro reais e doze centavos), Tarifa de avaliação do bem no valor de R$ 408,00 (quatrocentos e oito reais)""; d) "[...] configura venda casada a prática das instituições financeiras de impor ao consumidor a contratação de seguro com determinada seguradora [...]"; e) "[...] diante a má-fé da Instituição Ré em não permitir à possibilidade do pagamento do IOF a vista, requer a devolução em dobro dos valores cobrados à maior"; f) "[...] permanecendo saldo favorável ao demandante após a compensação dos valores pagos com os valores em aberto, é plenamente justificável o deferimento da repetição do indébito"; g) "[...] pugna desde já pela [...] devolução em dobro das quantias cobradas indevidamente por parte da instituição bancária Ré"; e h) "[...] a condenação do apelado ao pagamento das custas e honorários".

As contrarrazões foram apresentadas (Evento 58, CONTRAZAP1, autos de origem).

Empós, os autos ascenderam a este grau de jurisdição, sendo distribuídos para esta relatoria por prevenção em razão do processo n. 5010012-13.2021.8.24.0000/TJSC (Evento 1).

É o necessário escorço.

VOTO

Primeiramente, conheço do Recurso porque satisfeitos os requisitos de admissibilidade.

Esclareço, por oportuno, que a decisão recorrida se subsome ao regramento processual contido no Novo Código de Processo Civil, porquanto a publicidade do comando judicial prolatado pelo Estado-Juiz se deu em 26-5-21, isto é, já na vigência do CPC/15.

1 Do Inconformismo

1.1 Dos juros remuneratórios

Ventila o Apelante que os juros remuneratórios são abusivos.

Pois bem.

Acerca do assunto, extraio o posicionamento da "Corte da Cidadania" em sede de julgamento das questões idênticas que caracterizam a multiplicidade de recursos - Recurso Especial n. 1.061.530/RS, julgado em 22-10-08, relatado pela Ministra Nancy Andrighi - com o seguinte teor:

I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.

ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto.

(grifei).

Da atenta leitura do excerto suso transcrito, exsurge que o Superior Tribunal de Justiça não impede a revisão das taxas de juros remuneratórios contratadas, mas apenas alerta que tal só poderá ocorrer em relações de consumo e desde que a abusividade fique cabalmente demonstrada ante as nuances do caso concreto.

Diante disso, a análise quanto à existência de abusividade continua sendo possível e, para que aconteça, mostra-se necessária a utilização de algum parâmetro objetivo, de modo a assegurar até mesmo a segurança jurídica.

Brota que a observância à taxa média de mercado veiculada pelo Banco Central é imperativa, vez que revestida da objetividade, transparência e confiança exigíveis.

Sendo assim, caso o percentual estipulado no negócio particular seja inferior à taxa média praticada em mercado, deverá permanecer, por ser mais benéfica ao consumidor.

Já na hipótese de suplantar o teto publicado pelo Banco Central, deverão ser observadas as peculiaridades do caso concreto para se definir acerca da existência de abusividade.

Registro que este Órgão Colegiado segue o entendimento consolidado no sentido de admitir a margem de tolerância de 10% (dez por cento) da média divulgada pelo Bacen, sendo que importa desproporcionalidade e abusividade ao consumidor, taxa de juros fixada a maior.

Calha registrar que na hipótese vertente a Instituição Financeira sequer verteu qualquer explicação e muito menos justificativa para que a taxa de juros remuneratórios se afastasse da média de mercado.

Aliás, não se deve perder de vista que o ônus probatório acerca de tal situação era exclusivamente de sua alçada, porquanto tem acesso a todas as avenças que celebrou, cujas situações pessoais das partes devedoras divirjam daquela ostentada pela Requerente.

Assim sendo, uma vez verificada a abusividade dos juros compensatórios, devem ser os encargos contratados readequados para o equivalente à taxa média correspondente.

Tendo em vista consulta ao site do Banco Central do Brasil (http://www.bcb.gov.br) é possível verificar as taxas de juros praticadas em mercado para a modalidade das avenças sub examine, qual seja, "operações de crédito com recursos livres - pessoas físicas - aquisição de veículos" quando celebrado o pacto originariamente - 6-9-18 (Evento 1, CONTR5, autos de origem) - eram de 22,17% a.a. e 1,68% a.m., consoante se extrai das séries temporais ns. 20749 e 25471, respectivamente.

Por terem os Contendores estipulado esses encargos em 20,87% a.a. e 1,59% a.m., ou seja, em percentuais que sequer atingem a taxa média de mercado, inexiste a abusividade urdida, devendo a sentença ser mantida incólume.

1.2 Do anatocismo

Agita o Autor que a capitalização de juros é ilegal.

Sem razão.

Ab initio é preciso enfatizar que o caso concreto diz respeito à Cédula de Crédito Bancário, tornando indispensável trazer à baila a Lei n. 10.931/04, que, em seu inciso I do § 1º do art. 28, encarta a seguinte regra:

§ 1º Na Cédula de Crédito Bancário poderão ser pactuados:

I - os juros sobre a dívida, capitalizados ou não, os critérios de sua incidência e, se for o caso, a periodicidade de sua capitalização, bem como as despesas e os demais encargos decorrentes da obrigação.

(grifei).

Além da legislação específica, acerca do tema também há posicionamento proclamado pela "Corte da Cidadania" em sede de julgamento repetitivo no Recurso Especial n. 973.827/RS, de relatoria da Ministra Maria Isabel Gallotti, julgado em 8-5-12, com o seguinte teor:

[...] 3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC:

- 'É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.'

- 'A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada'. [...]

(destaquei).

A leitura tanto da Lei n. 10.931/04 quanto do julgamento repetitivo suso permite concluir que há possibilidade de cobrança da capitalização, considerando-se estar expressamente avençada a cobrança do anatocismo quando verificado que a taxa de juros anual é superior ao duodécuplo da taxa mensal.

Vale ainda ressaltar que qualquer alegação acerca da constitucionalidade da Medida Provisória n. 1.963-17/00 (em vigor como MP n. 2.170-36/01) cai por terra frente à adoção do posicionamento pacificado pela "Corte da Cidadania", não se devendo perder de vista que a controvertida constitucionalidade está sob o enfoque do Excelso Pretório.

In casu, vislumbro o enquadramento ao posicionamento alhures apontado, porquanto presente indicação dos percentuais mensal e anual dos juros remuneratórios, devendo ser considerada, portanto, expressa a previsão de estipulação do cômputo exponencial de juros.

Dessarte, ausente abusividade na cobrança do anatocismo nas operações sub examine, a sentença profligada permanece intangível sobre o tema.

1.3 Das tarifas

Pretende o Recorrente o afastamento das seguintes cobranças: a) tarifa de cadastro; b) tarifa de registro de contrato; e c) tarifa de avaliação do bem.

1.3.1 Da tarifa de cadastro

Defende o Apelante que a cobrança da aludida tarifa é abusiva.

O Reclamo merece agasalho.

Primeiramente, a respeito das tarifas administrativas, existe entendimento emanado pelo Superior...

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