Acórdão Nº 5022543-19.2021.8.24.0005 do Primeira Câmara Criminal, 31-05-2022

Número do processo5022543-19.2021.8.24.0005
Data31 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5022543-19.2021.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: WALDECY ANDRIEL VIEIRA (ACUSADO) ADVOGADO: SAMUEL SIQUEIRA SANTANA RODRIGUES (OAB SC041148) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia perante o juízo da comarca de BALNEÁRIO CAMBORIÚ em face de Waldecy Andriel Vieira, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, em razão dos seguintes fatos:

No dia 24 de novembro de 2021, por volta das 23h30min, em Balneário Camboriú/SC, o denunciado WALDECY ANDRIEL VIEIRA transportava e mantinha em depósito, sem autorização e/ou em desacordo com qualquer determinação legal e regulamentar, para fins de tráfico ilícito de entorpecentes, aproximadamente 2kg (dois quilogramas) da substância entorpecente conhecida como Crack e 1kg (um quilograma) da droga popularmente conhecida como Cocaína, conforme consta do Auto de Prisão em Flagrante que a esta denúncia serve de base.

Na ocasião, uma guarnição da Polícia Militar recebeu informações de que o denunciado Waldecy Andriel Vieria utilizava o veículo VW/POLO AF, placas RDT-8E18, para realizar o tráfico de drogas nesta cidade. Diante disso, em rondas pela rua Hermógenes de Assis Feijó, nesta cidade, os policiais visualizaram o denunciado transitando pelo local, momento em que realizaram acompanhamento e posterior abordagem.

Em revista veicular, os agentes localizaram embaixo do compartimento do pneu estepe 1kg (um quilograma) de Crack, que o denunciado WALDECY transportava, para fins do tráfico ilícito.

Em seguida, após o denunciado informar da existência de mais entorpecentes, a guarnição da polícia dirigiu-se até a residência do denunciado, situada na Rua Domingos Eleutério Pinheiro, 176, nesta cidade, local em que os policiais militares encontraram mais 1kg (um quilograma) de Cocaína e 1kg (um quilograma) de Crack, que o denunciado mantinha em depósito para a mercancia ilícita, além de 1 (uma) máquina de cartão de crédito

Desse modo, vê-se que o Denunciado trazia consigo e mantinha em depósito, sem autorização e em desacordo com qualquer determinação legal e regulamentar, para fins de tráfico ilícito, as drogas vulgarmente conhecidas como Cocaína e Crack, capaz de causar dependência física e psíquica em seus usuários, de posse proscrita em todo o território nacional, por força da Portaria n. 344/98, da SVS/MS e subsequentes alterações (evento 1, eproc1G, em 13-12-2021).

Sentença: a juíza de direito Nayana Scherer julgou procedente a denúncia para condenar Waldecy Andriel Vieira pela prática do crime previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos, 2 (dois) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 417 (quatrocentos e dezessete) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, negando-lhe o direito de recorrer em liberdade (evento 64, eproc1G, em 9-3-2022).

Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público.

Recurso de apelação de Waldecy Andriel Vieira: a defesa interpôs recurso de apelação, no qual sustentou que:

a) "a narrativa que a droga fora encontrada em compartimento do estepe do veículo, somente existe, porquanto os policiais militares no afã de incriminar o apelante Waldecy, criaram para 1) ingressar em sua residência e, 2) fazer com que o carro do apelante Josué fosse perdido em favor da União";

b) as circunstâncias da ação policial e da apreensão do material entorpecente são questionáveis, não permitindo a conclusão acerca da prática da narcotraficância pelo apelante;

c) "a quantidade e natureza da droga foram utilizadas na terceira fase da dosimetria para reduzir a benesse do privilégio em seu patamar mínimo, e desta forma, afastando a legalidade na obtenção da suposta droga encontrada na residência do acusado, resta visível a necessidade de diminuir a pena aplicada no máximo legal, qual seja, o percentual de 2/3 de redução da pena fixada";

d) "a baixa renda que restou comprovada através do depoimento pessoal do acusado, assim como, das testemunhas que alegaram ser o réu de família simples, postula o réu a concessão do benefício da gratuidade da justiça";

e) "ainda que o acusado tenha permanecido preso durante todo o processo, a prisão provisória decorrente de sentença condenatória não transitada em julgado é medida excepcional, que deve ser justificada concretamente de acordo com os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal".

Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, de modo a absolvê-lo da conduta narrada na denúncia, reconhecendo-se a ilicitude das provas obtidas a partir do ingresso dos policiais na residência do apelante. Subsidiariamente, pugnou pela desclassificação da conduta para o crime de posse par consumo próprio, a aplicação da minorante atinente ao tráfico em sua fração máxima, restituição dos bens apreendidos. Postulou, ainda, o deferimento da justiça gratuita e a concessão do direito de recorrer em liberdade (evento 11, eproc2G, em 19-4-2022).

Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que:

a) "Da análise dos autos, constata-se que a atuação dos Agente Públicos se deu dentro dos limites legais estabelecidos, havendo fundada suspeita pra entrada na residência do recorrente, consubstanciada nas informações antes recebidas e a prévia apreensão de entorpecentes com o apelante, sem que este esclarecesse sua origem - contenta-se em alegar que foram ali 'plantadas'";

b) "As testemunhas de acusação, quais sejam, os policiais militares, mencionaram de forma contundente a participação do apelante no tráfico de drogas, com ele foi apreendida considerável quantidade de drogas - 2kg de crack e 1kg de cocaína -, depois mais entorpecentes em sua residência - 1kg de cocaína e 1kg de crack, circunstâncias estas que invertem o ônus da prova, cabendo ao apelante demonstrar que tal droga não o pertencia, o que deixou de fazer, como de igual modo não trouxe justificativa plausível para possuir drogas em casa";

c) "Inviável desconsiderar-se a natureza e a quantidade dos entorpecentes apreendidos, que devem ser levados em consideração na dosimetria da pena, como fez a magistrada sentenciante";

d) "a manutenção da sua segregação pelos próprios fundamentos que a ensejaram faz-se necessária, resguardando-se em especial a ordem pública, nos termos do disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal".

Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 14, eproc2G, em 28-4-2022).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Humberto Francisco Scharf Vieira opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (evento 17, eproc2G, em 10-5-2022).

Este é o relatório que passo ao Excelentíssimo Senhor Desembargador Revisor.

Documento eletrônico assinado por CARLOS ALBERTO CIVINSKI, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2268963v6 e do código CRC 39cb7976.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CARLOS ALBERTO CIVINSKIData e Hora: 31/5/2022, às 20:22:7





Apelação Criminal Nº 5022543-19.2021.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

APELANTE: WALDECY ANDRIEL VIEIRA (ACUSADO) ADVOGADO: SAMUEL SIQUEIRA SANTANA RODRIGUES (OAB SC041148) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Do juízo de admissibilidade

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

Da questão preliminar

A defesa requer o reconhecimento da ilicitude das provas obtidas a partir do ingresso dos policiais na residência do apelante, ao argumento de que a busca e apreensão ocorreu de forma ilegal, sem a prévia expedição de mandado judicial ou mesmo verificação de efetiva justa causa para a diligência.

Todavia, contrariamente ao que foi aduzido pela defesa, não há falar em ilegalidade da atuação policial, muito menos do ingresso na residência do agente que culminou na descoberta de mais drogas além daquelas já encontradas em seu poder na busca pessoal.

De plano, cumpre destacar que o delito de tráfico de drogas, nas modalidades "trazer consigo", "guardar" e "manter em depósito" constitui crime permanente, cuja consumação prolonga-se no tempo.

Consequentemente, nos termos do art. 303 do Código de Processo Penal, observa-se que "nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência".

Portanto, o agente estará em situação de flagrante delito, hipótese autorizadora da entrada em domicílio alheio, ainda que desprovido de comando judicial ou da anuência do proprietário, por exceção constitucionalmente prevista (artigo 5º, inciso XI, da CF).

A propósito, é entendimento do Superior Tribunal de Justiça que "o crime de tráfico ilícito de entorpecentes é de natureza permanente, ficando o agente em estado de flagrância enquanto não cessada a permanência, o que autoriza a entrada dos policiais militares no imóvel, que se deu após informações anônimas de que o denunciado guardava/tinha em depósito, para posterior comercialização, substâncias entorpecentes em sua residência" (HC 338.978, de Minas Gerais, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. em 17/11/2015).

A este respeito do tema, cita-se precedente do Supremo Tribunal Federal:

A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e...

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