Acórdão Nº 5022630-18.2021.8.24.0023 do Quarta Câmara de Direito Público, 10-11-2022

Número do processo5022630-18.2021.8.24.0023
Data10 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5022630-18.2021.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador DIOGO PÍTSICA

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: INTER LINK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO DE MOVEIS LTDA (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Na comarca da Capital, Inter Link do Brasil Industria e Comércio de Móveis Ltda. impetrou mandado de segurança contra ato do Secretário da Fazenda do Estado de Santa Catarina.

À luz dos princípios da economia e celeridade processual, por sintetizar de forma fidedigna, adoto o relatório da sentença (Evento 39, 1G):

INTER LINK DO BRASIL INDUSTRIA E COMERCIO DE MOVEIS LTDA, já qualificada, impetrou Mandado de Segurança contra ato dito como coator perpetrado pelo SECRETÁRIO DE ESTADO DA FAZENDA DE SANTA CATARINA. Sustenta, em suma, que atua no comércio e fabricação de móveis em geral em madeira, realizando operações que destinam mercadorias ao exterior. Logo, recolhe ICMS à Fazenda Estadual relativo à circulação de mercadorias, com exceção daquelas destinadas ao exterior, nos termos do art. 155, § 2°, da Constituição Federal. Alega, porém, que amparada na norma da LC 87/96 a autoridade coatora deixa de compensar o ICMS que incide sobre os bens de uso e consumo, ou seja, que não se agregam ou são consumidos no processo de industrialização dos bens destinados ao exterior, o que, na sua ótica, viola a não cumulatividade do tributo. Assim, pugna pela concessão da segurança para determinar que a autoridade coatora se abstenha de limitar o direito de escriturar, manter e aproveitar os créditos de ICMS incidentes nos bens de uso e consumo empregados nas mercadorias destinadas à exportação, bem como declarar o direito de creditar-se e utilizar-se do ICMS decorrente da aquisição dos referidos bens relativos aos últimos 5 (cinco) anos de atividade empresarial (ev. 1).

Constatada, de plano, a prerrogativa de foro em relação ao Secretário de Estado da Fazenda de Santa Catarina, indicado como autoridade coatora na inicial, o presente Juízo declarou incompetência absoluta, determinando a remessa dos autos ao TJSC (ev. 07).

Intimada da decisão terminativa, a parte impetrante emendou a inicial, a fim de retificar o polo passivo, para constar "Diretor de Administração Tributária - DIAT" (ev. 11).

Em evento 13, acolheu-se a emenda à exordial e foi determinada a regularização da representação judicial, que foi satisfeita em evento 18.

A autoridade coatora foi notificada (ev. 37) e deixou de prestar informações no prazo legal.

Intimado (ev. 31), o órgão de representação judicial da autoridade coatora, qual seja, o Estado de Santa Catarina, requereu o ingresso na lide e prestou informações (ev. 32), pontuando, preliminarmente, a inexistência de ato coator e a inadequação da via mandamental para a proteção do direito pleiteado. No mérito, aduziu que o art. 20 da Lei Complementar n. 87/96 admite expressamente o aproveitamento, como crédito fiscal, do imposto que incidiu sobre a entrada de mercadorias destinadas ao uso e consumo do estabelecimento ou à interação ao ativo permanente, todavia, os efeitos do dispositivo estariam submetidos a limitação temporal descrita no art. 33, inciso I, da referida norma. Em seguida, impugnou a inconstitucionalidade arguida pela impetrante. Argumentou, também, que o uso ou consumo de bens não integram o produto final, logo, não haveria de falar em operação subsequente e, portanto, o que compensar ou aproveitar. Por fim, contestou a pretensão de efeito pretérito a segurança, bem como a incidência da taxa Selic para correção monetária. Ao final, requereu a extinção sem resolução do mérito, em razão do acolhimento das preliminares e, no mérito, a denegação da ordem.

O Ministério Público manifestou-se pela ausência de interesse público relevante a justificar sua intervenção nos autos (ev. 35).

Devidamente instruída, a lide foi julgada nos termos retro (Evento 39, 1G):

Pelo exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, CONCEDO a segurança para DECLARAR o direito líquido e certo da parte impetrante de:

a) escriturar, manter e aproveitar os créditos de ICMS relativos às mercadorias por ele adquiridas com incidência do imposto e destinadas ao uso e consumo por seus estabelecimentos produtivos, na proporção da receita líquida das operações de exportação, conforme dispõe o artigo 155, § 2o, inciso X, alínea "a", da Constituição da República (com a redação da EC n. 42/2003).

b) escriturar os créditos apurados nos 5 (cinco) anos anteriores à impetração, em proporção ao valor das vendas realizadas ao mercado externo, verificado o percentual que representam no total de vendas (ou saídas) do estabelecimento. A atualização dos créditos deverá ser atualizada pela taxa Selic, desde a época que poderiam ser escriturados, observado o disposto no art. 170-A do CTN quanto à compensação.

Oficie-se à autoridades coatora e à pessoa jurídica interessada, dando-lhes ciência da concessão da segurança, em conformidade com o artigo 13, caput, da Lei n. 12.016/2009, ressalvado o cumprimento após o trânsito em julgado.

Honorários advocatícios incabíveis na espécie (Súmulas n. 105 do STJ e n. 512 do STF).

Sem custas (LCE n. 156/97, art. 33).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Decorrido o prazo de recurso, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina para reexame necessário (Lei 12.016/09, art. 14, § 1º).

Irresignado, o ente federado recorreu (Evento 49, 1G). Argumentou que: a) "nada obstante as disposições do art. 20 da LC 87/96, certo é que atualmente os bens de uso e consumo do estabelecimento ainda não geram direito a crédito do ICMS, para abater do imposto devido, frente à limitação temporal em vigor nos termos do art. 33"; b) "somente a partir de 1º de janeiro de 2033 é que as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento darão direito de crédito"; c) "a postergação do creditamento imposta pela legislação infraconstitucional vigente não importa em violação ao princípio constitucional da não-cumulatividade do ICMS e tampouco ofensa ao princípio da anterioridade"; d) "as operações para o exterior, apesar de imunes, não afastam o direito ao crédito do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação"; e) "quanto ao crédito extemporâneo e efeito pretérito do mandado de segurança para escriturar e aproveitar os créditos de ICMS no período que antecede a impetração, observado o prazo de cinco anos, olvidando que o writ não é substitutivo de ação de cobrança"; e f) "inexistindo previsão legal, não é lícito ao Judiciário autorizar a incidência de correção monetária, porque, assim agindo, estaria legislando e, consequentemente, substituindo o legislador em matéria que é da competência exclusiva do Poder Legislativo".

Com contrarrazões (Evento 65, 1G), os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do reclamo e remessa necessária (Evento 9, 2G).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual merece conhecimento.

Recebo-o em seus efeitos legais.

Sentença que se sujeita à remessa necessária, conforme artigo 14, § 1º, da Lei n. 12.016/09.

Historiando os fatos, em rápida pincelada, o mandado de segurança foi impetrado com o objetivo de obter autorização para escriturar, manter e aproveitar os créditos de ICMS oriundos das mercadorias por adquiridas pela empresa impetrante e destinadas ao uso e consumo que não se agregam ou são consumidos no processo de industrialização dos bens destinados ao exterior.

Propala o Estado que o writ of mandamus não pode fazer o papel de ação de repetição de indébito, sob pena de convertê-lo em ação de cobrança, contrariando as Súmulas 269 e 271 do STF.

Entretanto, "ao contrário do que defende o Estado, não se busca a repetição em si, mas o reconhecimento do direito à compensação" (TJSC, Apelação n. 5069317-87.2020.8.24.0023, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 17-5-2022).

Agiu bem o juízo sentenciante ao declarar o direito da impetrante à compensação do crédito tributário indevidamente recolhido a maior, uma vez que o pleito exordial não versa sobre repetição de indébito e sim sobre creditamento, sendo que o mandamus não é abominável para postular este último.

Julgados variados advertem-nos de que mandado de segurança "não pode fazer o papel de ação de repetição de indébito, sob pena de convertê-lo em ação de cobrança e contra as Súmulas 269 e 271 do STF. Só que, ao contrário do que defende o Estado, não se busca a repetição em si, mas o reconhecimento do direito à compensação" (TJSC, Apelação n. 5069317-87.2020.8.24.0023, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 17-5-2022).

A Corte Cidadã não discrepa, de que "o reconhecimento do direito à compensação de indébitos recolhidos antes da impetração do mandamus, e não fulminados pela prescrição, não induz em concessão de efeito patrimonial pretérito, o que é vedado pela Súmula 271 do STF, tampouco há transfiguração do instrumento em substitutivo da ação de cobrança, uma vez que não há discussão acerca dos valores a serem compensados, providência esta adstrita à esfera administrativa" (STJ, AgInt no REsp n. 1.953.445/RS, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF5), Primeira Turma, j. 21-3-2022).

Nesse sentir, em julgado de minha relatoria:

APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. TEMA N. 176 DO STF. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA EFETIVAMENTE CONSUMIDA. ORDEM CONCEDIDA. DIREITO À COMPENSAÇÃO. RECURSO DO ESTADO. REPORTADA ILEGITIMIDADE ATIVA DA IMPETRANTE. JUSTIFICADA IMPOSSIBILIDADE DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO. DEFENDIDA CARÊNCIA DE NORMA HÁBIL À COMPENSAÇÃO. TESES AFASTADAS. REFUTADA INCIDÊNCIA DA...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT