Acórdão Nº 5022816-59.2022.8.24.0038 do Primeira Câmara Criminal, 18-08-2022

Número do processo5022816-59.2022.8.24.0038
Data18 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5022816-59.2022.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVANTE) AGRAVADO: MARCOS AURELIO PADILHA (AGRAVADO) ADVOGADO: IVAN SÉRGIO BONFIM (OAB PR037879)

RELATÓRIO

Pronunciamento judicial agravado: o juiz de direito João Marcos Buch, da 3ª Vara Criminal da comarca de JOINVILLE, não reconheceu a falta grave imputada ao apenado Marcos Aurélio Padilha, acolhendo sua justificativa para não retornar da saída temporária em 19-11-2021 (sequencial 76.1 dos autos originários, em 1-4-2022).

Recurso de Agravo de Execução Penal: o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por meio da promotora de justiça Barbara Elisa Heise, interpôs recurso e argumentou "que as justificativas apresentadas pelo apenado não devem ser acolhidas, pois o não retorno na data aprazada demonstra que ele não está comprometido com a execução da pena, sobretudo porque não existem provas que possam embasá-las".

Requereu o conhecimento e provimento do presente recurso a fim de reformar a decisão impugnada para reconhecer que a conduta praticada pelo apenado configura a falta grave prevista no art. 50, II, da Lei de Execução Penal (evento 1, eproc1G, em 1-6-2022).

Contrarrazões: o apenado Marcos Aurélio Padilha, por intermédio de seu Defensor constituído, impugnou os argumentos apresentados sob o fundamento de que com a concessão do benefício foi para cidade de Curitiba, no Estado do Paraná, porém na data do seu retorno não havia quem o levasse até Joinville, bem como que não possuía dinheiro para contratar o transporte até o estabelecimento prisional.

Com base nisso, alegou que o seu retorno voluntário demonstra sua boa vontade em dar cumprimento à pena que lhe foi imposta e que durante o gozo da benesse não se envolveu com atividades ilícitas.

Postulou a manutenção da decisão objurgada (evento 8, eproc1G, em 11-7-2022).

Juízo de retratação: o juiz de direito João Marcos Buch manteve a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos (evento 10, eproc1G, em 25-7-2022).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Pedro Sérgio Steil manifestou-se pelo conhecimento e parcial provimento do recurso (evento 9, eproc2G, em 29-7-2022).

Este é o relatório.

VOTO



O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido. E, em atenção ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, a apreciação limita-se aos argumentos expostos em sede recursal.

É sabido que a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, sob o rito de recurso repetitivo, do Recurso Especial 1.378.557/RS, decidiu que, "para o reconhecimento da prática de falta disciplinar, no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado" (REsp 1378557/RS, Terceira Seção, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. em 23-10-2013, m.v.).

Ainda, de acordo com o referido entendimento sufragado no Superior Tribunal de Justiça, é incumbência do

[...] diretor do estabelecimento prisional apurar a conduta do detento, identificá-la como falta leve, média ou grave, aplicar as medidas sancionatórias que lhe compete, no exercício de seu poder disciplinar, e, somente após esse procedimento, quando ficar constatada a prática de falta disciplinar de natureza grave, comunicar ao juiz da Vara de Execuções Penais para que decida a respeito das referidas sanções de sua competência, sem prejuízo daquelas já aplicadas pela autoridade administrativa. [...] somente se for reconhecida a prática de falta disciplinar de natureza grave pelo diretor do estabelecimento prisional, é que será comunicado ao juiz da execução penal para que aplique determinadas sanções, que o legislador, excepcionando a regra, entendeu por bem conferir caráter jurisdicional. Portanto, a competência do magistrado na execução da pena, em matéria disciplinar, revela-se limitada à aplicação de algumas sanções, podendo, ainda, quando provocado, efetuar apenas controle de legalidade dos atos e decisões proferidas pelo diretor do presídio, em conformidade com o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF/1988, art. 5º, inciso XXXV) (REsp 1378557/RS, Terceira Seção, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. em 23-10-2013, m.v.). (grifou-se)

Em outras palavras, no âmbito da execução penal, a atribuição de apurar a conduta faltosa do detento, assim como realizar a subsunção do fato à norma legal, ou seja, verificar se a conduta corresponde à uma falta leve, média ou grave, é do diretor do presídio, em razão de ser o detentor do poder disciplinar. Ao Judiciário, portanto, cabe apenas aferir a legalidade do procedimento e, se for o caso, aplicar as sanções que exigem observância à cláusula de reserva de jurisdição.

O respectivo posicionamento foi, inclusive, sumulado por aquela Corte de Justiça, conforme o enunciado 533 da súmula de jurisprudência do STJ, segundo a qual, "Para o reconhecimento da prática de falta disciplinar, no âmbito da execução penal, é imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por advogado constituído ou defensor público nomeado".

Há muito este relator vem se posicionando no sentido de que, para o reconhecimento de falta grave cometida por reeducando que não se encontra submetido à autoridade prisional, é desnecessária a instauração de procedimento administrativo disciplinar, bastando a realização de audiência de justificação, solenidade que assegura o direito de defesa ao apenado. (vide: Agravo de Execução Penal 0000397-43.2019.8.24.0004, de Araranguá, de minha relatoria, Primeira Câmara Criminal, j. 21-3-2019, v.u.).

Contudo, o Supremo Tribunal Federal foi além e no julgamento do Recurso Extraordinário 972.958/RS, em sede de repercussão geral (Tema 941), fixou a tese de que "a oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena." (RE 972.598/RS, Rel. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, j. em 4-5-2020, m.v.).

Com isso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça vem readequando-se ao entendimento vinculante proferido pela Suprema Corte:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM REPERCUSSÃO GERAL. ADEQUAÇÃO. REJULGAMENTO DO RECURSO.1. Nos termos dos arts. 1.030, II, e 1.040, II, do CPC/2015, deve o órgão julgador reapreciar o recurso cuja conclusão divergiu da orientação do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral.2. Hipótese em que a Corte Constitucional, no julgamento do RE n. 972.598 RG/RS, sob a sistemática da repercussão geral, firmou o entendimento de que "a oitiva do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público, afasta a necessidade de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD), assim como supre eventual ausência ou insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena" (Tema 941/STF).3. Levando-se em conta que, no caso concreto, a falta grave foi aplicada mediante a realização de audiência de justificação, com oitiva do apenado na presença do Ministério Público e de defensor, não há que se falar em Processo Administrativo Disciplinar para a respectiva apuração.4. Superada a orientação firmada no recurso representativo de controvérsia ( Resp 1.378.557/RS), bem como na Súmula 533 do STJ.5. Agravo regimental provido, em juízo de retratação, para não conhecer do habeas corpus, mantendo, assim, o acórdão proferido pela Corte de origem, que reconheceu a falta grave praticada pelo apenado (fuga empreendida em 18/2/2017, com recaptura em 21/2/2017 na Comarca de Pitanga/PR). (AgRg no HC 442.560/PR, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 02/03/2021, v.u.) (grifou-se)

PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. HOMOLOGAÇÃO DE FALTA GRAVE. INEXISTÊNCIA DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. RE 972.598/RS. REPERCUSSÃO GERAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.1. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, ao apreciar o Tema n. 941 (RE n. 972.598/RS, Relator Ministro Roberto Barroso, j. 4/5/2020, ata de julgamento publicada em 12/5/2020), fixou a tese de que, havendo a ouvida do apenado perante o Juízo da Execução, em audiência de justificação, com a presença do defensor e do Ministério Público, não se exige a realização de prévio Procedimento Administrativo Disciplinar, o que supriria, inclusive, eventual ausência...

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