Acórdão Nº 5022824-41.2019.8.24.0038 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 15-09-2022

Número do processo5022824-41.2019.8.24.0038
Data15 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5022824-41.2019.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO

APELANTE: FLAVIO DEMETRIO RODRIGUES DOS SANTOS (RÉU) APELADO: AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. (AUTOR)

RELATÓRIO

FLAVIO DEMETRIO RODRIGUES DOS SANTOS interpôs recurso de apelação cível contra a sentença (evento 35, SENT1) que, nos autos da ação de busca e apreensão ajuizada por AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. em desfavor do ora apelante, julgou procedentes os pedidos formulados na inicial.

O dispositivo da sentença está assim redigido:

Ex positis, com fundamento no art. 3º do Dec.-lei 911/69, JULGO PROCEDENTE o pedido constante da ação de busca e apreensão nº 50228244120198240038, aforada por AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. contra FLAVIO DEMETRIO RODRIGUES DOS SANTOS, consolidando nas mãos da instituição financeira autora/credora fiduciária a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem alienado fiduciariamente, descrito na inicial, cuja apreensão liminar torno definitiva, facultando-lhe, a venda do mesmo nos termos do art. 2º, do Dec.-lei 911/69.

Restrição no sistema RENAJUD já baixada (evento 18).

Ante a sucumbência, CONDENO a parte ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes que fixo em 10 % (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 2º, do Novo Código de Processo Civil. Fica, porém, nos moldes do art. 98, § 3º, do NCPC, suspensa a exigibilidade de tais quantias, eis que defiro a justiça gratuita ao autor.

A parte ré opôs embargos de declaração (evento 40, EMBDECL1), os quais foram rejeitados (evento 43, SENT1).

Em suas razões de apelação (evento 50, APELAÇÃO1), a parte ré/apelante arguiu, em preliminar, que "o princípio do livre convencimento motivado ganha especial relevo no caso dos autos, diante da prova documental carreada pelas partes, que afasta a presunção relativa da veracidade dos fatos alegados pelo réu" (fl. 6 - grifo no original) e que a apresentação da cédula de crédito bancário original é imprescindível, razão pela qual a demanda "[...] deve ser extinta sem resolução do mérito, tendo em vista a falta de pressuposto, este, essencial para o trâmite da ação de busca e apreensão, ou ainda, pela eventualidade, seja o autor intimado para apresentar a cédula de crédito bancário original para aposição de carimbo de vinculação ao processo eletrônico" (fl. 8).

No mérito, defendeu, em síntese: a) a abusividade dos juros remuneratórios contratados e do custo efetivo total (CET); b) a ilegalidade da capitalização mensal dos juros; c) a ilegalidade da cobrança da tarifa de avaliação do bem e de registro do contrato; d) a ilegalidade do seguro prestamista, por se tratar de venda casada; e e) a abusividade do financiamento do valor do imposto sobre operações financeiras (IOF), não sendo oportunizado o pagamento à vista do imposto.

Ao final, postulou a concessão da gratuidade da justiça e pugnou pelo provimento do recurso e pela condenação do apelado ao pagamento dos ônus sucumbenciais.

O banco autor/apelado apresentou contrarrazões (evento 56, CONTRAZAP1), nas quais impugnou a gratuidade da justiça concedida à parte ré, bem como sustentou a existência de ofensa ao princípio da dialeticidade recursal no apelo interposto.

Os autos ascenderam a esta Corte.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença que julgou procedente, com fundamento no art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, a ação de busca e apreensão proposta por AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. em desfavor de FLAVIO DEMETRIO RODRIGUES DOS SANTOS, ora apelante.

Consigno que a presente demanda está embasada nas "Condições específicas de operação de crédito direto ao consumidor (CDC) - Veículos" n. [omissis]0391, firmada em 9-3-2019, com garantia de alienação fiduciária de um automóvel marca Fiat, modelo Siena HLX 1.8 MPI Flex 8V 4P, cor prata, ano/modelo 2008, placa MRX0495, chassi n. 9BD17241T83411097, Renavam 956861741 (evento 1, CONTR6).

O pedido liminar postulado pela instituição financeira autora foi deferido (evento 10, DESPADEC1) e houve o cumprimento da busca e apreensão do veículo pelo Sr. Oficial de Justiça (evento 17, CERT3).

O réu não apresentou contestação no momento oportuno (evento 22, CERT1), razão pela qual foram aplicados a ele, na sentença, os efeitos da revelia (evento 35, SENT1).

I Julgamento ultra petita - reconhecimento ex offício

Infere-se dos autos que o Julgador a quo, ao sentenciar o feito, julgou procedentes os pedidos formulados pela casa bancária credora para fins de consolidar a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem alienado fiduciariamente, cuja apreensão liminar tornou definitiva, facultando ao banco credor a venda do bem, nos termos do art. 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969. Não obstante, houve a análise, na sentença, acerca da abusividade das taxas de juros remuneratórios pactuadas na avença sub judice (evento 35, SENT1).

Ocorre que o Magistrado a quo também reconheceu na sentença que a peça de defesa apresentada pelo réu foi intempestiva e, diante disso, decretou a sua revelia.

Sabe-se que: "Tendo a contestação sido oferecida a destempo, considera-se não praticado o ato de resposta, devendo ser aplicado ao caso os efeitos da revelia dispostos no art. 319 da revogada Lei Adjetiva Civil (CPC/2015, art. 344)." (TJSC, Apelação Cível n. 0302965-71.2016.8.24.0033, de Itajaí, rel. Des. Robson Luz Varella, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 26-6-2018).

Assim, constata-se que a sentença proferida foi ultra petita nesse tocante, na medida em que "é vedado ao julgador conhecer de ofício da nulidade de cláusulas contratuais" (verbete n. 381 da Súmula do STJ).

Impende registrar que não se desconhece o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser cabível, em ação de busca e apreensão, a possibilidade de discussão acerca da legalidade de cláusulas contratuais. Porém, tais temas necessariamente devem ser apresentados como matéria de defesa. Nesse sentido:

CONTRATO BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. INOVAÇÃO RECURSAL. VEDAÇÃO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. DISCUSSÃO ACERCA DA LEGALIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS NO ÂMBITO DA DEFESA. POSSIBILIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. PRESSUPOSTO EVIDENCIADO. JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS.

1. É inviável a análise de matéria não suscitada no recurso especial e trazida posteriormente, como inovação recursal.

2. Em ação de busca e apreensão, é cabível a discussão acerca da legalidade das cláusulas contratuais como matéria de defesa.

3. Evidenciada a abusividade de encargos contratuais questionados e afastada a mora do devedor fiduciante, impõe-se a manutenção da improcedência do pedido de busca e apreensão.

4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no Resp n. 1170182/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j em 1/8/2011, grifei).

Ocorre que, no caso dos autos, conforme alhures referido, as matérias de defesa foram apresentadas pela parte ré intempestivamente (evento 26, CERT1)...

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