Acórdão Nº 5023631-90.2021.8.24.0038 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 06-10-2022

Número do processo5023631-90.2021.8.24.0038
Data06 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5023631-90.2021.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO

APELANTE: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU) APELADO: TEREZINHA NATALIA DE PAULA LOPES (AUTOR)

RELATÓRIO

BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. interpôs recurso de apelação cível contra a sentença (evento 19, SENT1) que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na "ação declaratória de nulidade de ato jurídico, devolução de valores cobrados indevidamente em dobro e danos morais" ajuizada por TEREZINHA NATALIA DE PAULA LOPES, ora apelada, em desfavor do banco apelante, cujo dispositivo foi redigido nos seguintes termos:

III - Pelo exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados por TEREZINHA NATALIA DE PAULA LOPES contra BANCO OLE BONSUCESSO CONSIGNADO S.A. e, em consequência, i) declaro a ilegalidade da reserva de margem consignável no benefício previdenciário da parte autora; ii) condeno o réu à restituição dos valores debitados do benefício previdenciário da parte autora, quantia essa que deverá ser corrigida monetariamente pelo INPC-IBGE, a partir da data do desembolso, com incidência de juros moratórios desde a citação, mediante compensação, tudo a ser apurado em execução de sentença. Eventuais valores obtidos com o mútuo e passíveis de compensação deverão observar o mesmo índice de correção monetária, ou seja, o INCP-IBGE a partir da data do desembolso; iii) condeno a instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 10 mil reais, valor este acrescido de correção monetária a partir do arbitramento e juros de mora desde o evento danoso (17.02.2017, evento n. 1, extrato n. 5); iv) determino que o banco requerido se abstenha de efetuar limitação à margem crédito da parte autora a título de reserva de margem de cartão de crédito (RMC), devendo comprovar nos autos, em 15 dias, o cancelamento da limitação acima citada, sob pena de multa diária de R$ 200,00, limitada ao montante de R$ 25 mil. O termo inicial para incidência da multa será após o trânsito em julgado e deverá observar a súmula 410 do STJ.

Em virtude da sucumbência recíproca, as custas processuais deverão ser suportadas na proporção de 80% pelo réu e 20% pelo autor, arbitrando-se os honorários em 10% do valor atualizado da condenação, cabendo 80% desse montante ao procurador do autor e 20% ao procurador do banco réu. Todavia, deferidos os benefícios da gratuidade de justiça a parte autora, suspendo a exigibilidade das referidas verbas em relação a esta por cinco anos, conforme art. 98, § 3º do CPC.

Corrija-se o polo passivo, conforme evento 13 contestação 1.

Publique-se. Registre-se. Intime-se. Transitada em julgado e mantida esta sentença em eventual sede recursal, cumpram-se eventuais providências pendentes e arquivem-se os autos.

Em suas razões recursais (evento 31, APELAÇÃO1), o banco réu/apelante alegou, em preliminar, que o direito da parte autora ao ressarcimento pelos supostos danos morais resta prescrito, nos termos do art. 206, § 3º, V do Código Civil. Alegou, também, a decadência da pretensão inaugural. No mérito, sustentou, em síntese: a legalidade da contratação; a existência de autorização legislativa para oferta do saque no cartão consignado; a ausência de quitação do pacto e a legalidade dos descontos; e a ausência de danos morais indenizáveis. Subsidiariamente, caso mantida a condenação em indenização por danos morais, pugnou pela revisão dos juros moratórios incidentes sobre indenização por dano moral para que tenha como termo início a decisão que os fixar ou mesmo a decisão que os mantiver ou reduzir (acórdão). Ao final, pugnou pelo provimento do recurso para reformar a sentença, acolhendo as preliminares suscitadas, e uma vez estas sendo afastadas, requereu que sejam julgados improcedentes os pleitos iniciais. Alternativamente, no caso de manutenção da decisão, requereu afastamento da condenação em indenização por danos morais, ultrapassada esta, requereu a redução do valor fixado e revisto a forma de atualização desta.

Apresentadas as contrarrazões (evento 36, CONTRAZ1), os autos ascenderam a esta Corte.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

I - Preliminares

1 Da prescrição e decadência

O banco réu/apelante alegou a prescrição e a decadência da pretensão autoral.

Antecipo que razão não lhe assiste.

A presente demanda possui natureza condenatória e de ressarcimento dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais decorrentes da falha na prestação do serviço bancário, ante o não cumprimento do dever de informação. Em casos tais, entende-se pela não incidência do instituto da decadência, mas apenas da possibilidade de prescrição, que, no caso, é de 5 (cinco) anos, nos termos do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor.

Além disso, o termo inicial do prazo prescricional é a data do último pagamento/desconto indevido, por se tratar de prestações de trato sucessivo.

Nesse sentido, colhem-se precedentes deste Colegiado:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE REVISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. PREFACIAIS DE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. REJEIÇÃO. APLICABILIDADE AO CASO TÃO SOMENTE DO PRAZO PRESCRICIONAL ESTABELECIDO NO ART. 27 DO CDC. CONTRATO COM PRESTAÇÕES MENSAIS, CONTÍNUAS E SUCESSIVAS. TERMO INICIAL DE CINCO ANOS QUE FLUI A PARTIR DO ÚLTIMO DESCONTO EFETUADO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. [...] (Apelação n. 5005077-16.2021.8.24.0036, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Jaime Machado Junior, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 27-01-2022, grifei).

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO COMERCIAL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇAO DE INDÉBITO E INDENIZACÃO POR DANOS MORAIS. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO CONSUMIDOR PARA PAGAMENTO MÍNIMO DE FATURA DE CARTÃO DE CRÉDITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. CONTRARRAZÕES. AVENTADA PRESCRIÇÃO DA AÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PRETENSÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS PELO CONSUMIDOR QUE SE EXTINGUE EM CINCO ANOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 27 DO CDC. QUINQUÊNIO NÃO ESCOADO. PREJUDICIAL REFUTADA. VENTILADA A DECADÊNCIA DO DIREITO À ANULAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO. PRAZO DECADENCIAL DO ART. 178 DO CC NÃO APLICÁVEL À AÇÃO DECLARATÓRIA E CONDENATÓRIA. ADEMAIS, PRESTAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO, COM A RENOVAÇÃO DO PRAZO MÊS A MÊS. DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADA. [...] (Apelação n. 5002630-67.2020.8.24.0011, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Rodolfo Tridapalli, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 17-2-2022, grifei).

No caso em apreço, o contrato juntado aos autos foi firmado em 9-3-2016.

De acordo com os extratos juntados na contestação, os pagamentos por meio de desconto na folha de pagamento ocorreram desde 10-5-2016 até, ao menos, 10-7-2021, de forma mensal e contínua (evento 13, DOCUMENTACAO5).

Por outro lado, a demanda foi ajuizada em 31-5-2021, não havendo falar, portanto, em prescrição.

Preliminares afastadas.

II - Mérito

1 Do contrato de cartão de crédito consignável

Cinge-se a controvérsia acerca da contratação de empréstimo consignado pela via de cartão de crédito, por meio do qual é permitido ao banco credor a retenção de valores mediante reserva de margem consignável (RMC) em benefício previdenciário.

Inicialmente, necessário referir que o desconto denominado "reserva de margem consignável" (RMC) é o "limite reservado no valor da renda mensal do benefício para uso exclusivo do cartão de crédito" (art. 2º, XIII, da Instrução Normativa n. 28/INSS/PRES, de 16 de maio de 2008).

E tal desconto possui previsão legal, conforme disposto no art. 6º da Lei n. 10.820/2003, com a redação dada pela Lei n. 13.172/2015:

Art. 6º. Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1º e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de...

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