Acórdão Nº 5024218-35.2022.8.24.0020 do Primeira Câmara de Direito Civil, 14-03-2024

Número do processo5024218-35.2022.8.24.0020
Data14 Março 2024
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5024218-35.2022.8.24.0020/SC



RELATOR: Desembargador EDIR JOSIAS SILVEIRA BECK


APELANTE: ELISIANE CORREA (AUTOR) APELANTE: BANCO PAN S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Adota-se o relatório e transcreve-se o dispositivo da sentença apelada:
ELISIANE CORREA formulou pedidos de natureza declaratória e condenatória contra BANCO PAN S.A., alegando, em síntese, que é pensionista do INSS e identificou no extrato de empréstimo consignado a existência de um contrato que não formalizou. Sustentando a ilegalidade da operação, pediu: a) declaração da inexistência da relação jurídica; b) cessação imediata dos débitos; c) repetição em dobro dos valores debitados; d) condenação do réu ao pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais decorrentes da conduta.
Regularmente citado, o réu apresentou contestação, alegando que a contratação foi regular e, por isso, inexiste dever de devolver os valores recebidos em dobro e de indenizar.
Houve réplica.
Em decisão de saneamento, foram afastadas as preliminares aventadas, delimitados os pontos controvertidos, distribuído o ônus da prova e determinada a realização de perícia grafotécnica.
Entretanto, a prova não foi realizada, pois o réu, a quem o ônus fora atribuído, desistiu da sua produção.
(...)
Ante o exposto, julgo procedente em parte o pedido para: a) declarar a inexistência de relação jurídica contratual entre as partes litigantes; b) condenar o BANCO PAN S.A. a restituir os valores descontados do benefício previdenciário de titularidade de ELISIANE CORREA, com correção monetária (INPC) e juros de mora de 1% ao mês desde a data de cada desconto; c) determinar à parte autora a devolução ao réu do valor depositado, corrigido pelo INPC desde a data de sua disponibilização, ficando autorizada a compensação com os valores da condenação.
Para descontos realizados até o dia 30/3/2021, a repetição do indébito deverá ser feita de forma simples e, a partir dessa data, de forma dobrada (art. 42, parágrafo único, do CDC).
Diante da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das despesas processuais (art. 82, § 2º, do CPC) e dos honorários advocatícios equivalentes a 10% do valor atualizado da causa (art. 85, § 2º, do CPC e Súmula n. 14 do STJ), na proporção de 50% cada (art. 86, caput, do CPC), vedada a compensação (art. 85, § 14, do CPC).
A exigibilidade das despesas processuais e dos honorários advocatícios está suspensa com relação à parte ativa, durante o prazo extintivo de 5 anos, uma vez que concedo os benefícios da justiça gratuita, na forma do art. 98, § 3º, do CPC.
Acrescenta-se que a parte ré interpôs recurso de apelação sustentando a ocorrência de prescrição ou de decadência, a regularidade da contratação e a legalidade dos descontos, bem como da compensação de eventual condenação com os valores depositados em favor da parte autora e redução dos honorários advocatícios.
Em seu apelo, a parte autora requereu a procedência dos pedidos de devolução dobrada dos valores descontados, indenização por dano moral, além de não compensação dos valores creditados e majoração dos honorários de advogado.
Houve contrarrazões pela parte autora

VOTO


A parte ré alegou preliminarmente ocorrência de prescrição e decadência.
Reza o artigo 178, inciso I, do Código Civil: "É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: (...) II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico".
Na espécie, o pleito inaugural resume-se a pretensão de natureza indenizatória e repetição de indébito, sem pleito de reconhecimento de anulação de contrato por "erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão".
Quanto à prescrição, foi apreciada e afastada na decisão saneadora (evento 28) e, dela intimada por de seu procurador, a parte ré se manteve inerte.
A propósito:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO APELO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA REQUERIDA. 1. As matérias de ordem pública, como prescrição e decadência, podem ser analisadas a qualquer tempo nas instâncias ordinárias. Todavia, quando decididas no bojo do despacho saneador, sujeitam-se a preclusão consumativa, caso não haja impugnação no momento processual oportuno. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1542001/DF, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 07/11/2019, DJe 12/11/2019).
Portanto, em que pese tratar-se de matéria de ordem pública é possível reconhecer a preclusão quando a questão não é impugnada em momento oportuno.
Quanto à regularidade do contrato celebrado, retira-se do decreto recorrido no que aqui interessa:
A parte autora almeja o reconhecimento da nulidade do contrato de empréstimo consignado em discussão, negando a contratação e a autenticidade da assinatura aposta no instrumento.
Diante da negativa de contratação, inviável exigir do demandante a produção de prova negativa, ou seja, de que não houve contratação. Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart explicam:
Se o ônus da prova for considerado na perspectiva da posição das partes, esse será do autor, que terá de provar a inexistência dos fatos constitutivos do direito. Se o ônus da prova for pensado na dimensão do interesse na demonstração dos pressupostos fáticos para a incidência da norma relativa ao direito discutido, o ônus da prova será do réu, a quem incumbirá a prova da existência dos fatos constitutivos, pois a coisa julgada material, ao qualificar eventual decisão de improcedência, confere ao réu os mesmos efeitos que obteria se a ação declaratória fosse positiva. Caso o ônus da prova seja deixado ao autor, admitir-se-á que o direito do réu seja declarado sem que ele tenha produzido prova, ou, pior, que o direito do réu seja declarado apenas porque o autor não conseguiu provar a inexistência dos fatos constitutivos. Além disso, é impossível ao autor provar a inexistência de todos os possíveis fatos constitutivos do direito do réu, uma vez que os fatos constitutivos de um direito são somente do natural conhecimento daquele que se diz seu titular. Como é óbvio, uma ação declaratória negativa, pode ser proposta a partir dos fatos afirmados pelo réu, mas nunca daqueles que ele ainda pode alegar. (Prova e convicção de acordo com o CPC de 2015. 3. ed. São Paulo: Thomson Reuters RT, p. 209-210)
Por essa razão, recai sobre o réu, na condição de fornecedor e detentor de todos os registros das operações efetuadas, o ônus de comprovar que houve pessoalmente a adesão ao serviço.
Nesse sentido, "[...] a negativa de contratação configura o fato negativo indefinido, pois o consumidor não dispõe de meios de revelar que nunca formalizou a avença. Neste contexto, competia ao demandado, e somente a ele, evidenciar, cabalmente, a realização do negócio jurídico com a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT