Acórdão Nº 5024462-52.2022.8.24.0023 do Segunda Câmara de Direito Público, 13-12-2022

Número do processo5024462-52.2022.8.24.0023
Data13 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5024462-52.2022.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ADILSON SILVA

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: SOUFER INDUSTRIAL LTDA. (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta pelo Estado de Santa Catarina contra sentença proferida pelo juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Florianópolis que, em mandado de segurança impetrado contra ato tido como ilegal praticado pelo Diretor de Administração Tributária, concedeu a segurança pleiteada na inicial para "determinar que o impetrado se abstenha de exigir da parte impetrante o diferencial de alíquota de ICMS (DIFAL), nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto, no Estado de Santa Catarina, até que a lei complementar federal nº 190/2022 seja plenamente eficaz (a partir do exercício de 2023), observando-se a anterioridade nonagesimal e anual".

Extrai-se da parte dispositiva:

"Ante o exposto, confirmo a liminar e, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, CONCEDO a segurança pleiteada para DETERMINAR que o impetrado se abstenha de exigir da parte impetrante o diferencial de alíquota de ICMS (DIFAL), nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto, no Estado de Santa Catarina, até que a lei complementar federal nº 190/2022 seja plenamente eficaz (a partir do exercício de 2023), observando-se a anterioridade nonagesimal e anual.

3.1. Todavia, nos termos da decisão proferida nos autos nº 5010518-52.2022.8.24.0000/SC, ficam SUSPENSOS OS EFEITOS da liminar concedida e da presente sentença, até o trânsito em julgado da presente ação, salvo sobrevindo determinação em contrário (art. 4º, §9º, da Lei nº 8.437/92 e a Súmula nº 626 do STF).

Saliento, ademais, que "(...) o presente efeito suspensivo é aplicável igualmente às situações em que se concedeu a medida liminar ou tutela provisória para suspender a exigibilidade do DIFAL mediante o depósito do montante integral do tributo, como verificado no Mandado de Segurança n. 5025449-88.2022.8.24.0023/SC." (ev. 3, autos nº 5010518-52.2022.8.24.0000/SC, grifou-se).

3.2. Sobrevindo julgamento definitivo da Suspensão de Liminar ou, ainda, do mérito das ADIs acima referidas, juntem-se o respectivo acórdão nos autos, intimem-se as partes para manifestação e voltem conclusos para análise.

3.3. Comunique-se acerca da presente sentença, com urgência, nos autos nº 5010518-52.2022.8.24.0000.

3.4. O ente público é isento do pagamento da taxa de serviços judiciais.

3.5. Sem honorários advocatícios (art. 25, Lei n. 12.016/2009; Súmulas nº 105 do STJ e nº 512 do STF).

3.6. Decorrido o prazo de recurso, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina para reexame necessário (Lei 12.016/09, art. 14, § 1º).

3.7. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

3.8. Certificado o trânsito em julgado e observadas as formalidades legais, ARQUIVEM-SE os autos definitivamente."

Em suas razões recursais, o ente público suscita a preliminar de nulidade da decisão por ser extra petita, na medida em que o pedido de postergação pelo princípio da anterioridade não teria sido formulado na inicial pela parte impetrante.

Ademais, quanto ao mérito, questiona o marco temporal definido na sentença para a exigência do DIFAL, sustentando que o tributo pode ser exigido já no exercício de 2022, considerando a publicação da Lei Complementar n. 190, de 05-01-2022, sendo inaplicável o princípio da anterioridade tributária.

Também defende que a via mandamental não é adequada para se buscar a produção de efeitos patrimoniais pretéritos, uma vez que não é substitutivo de ação de cobrança, razão pela qual a sentença também contrariou o entendimento consolidado nos enunciados 269 e 271 da Súmula de jurisprudência do STF (evento 43, 1G).

Apresentadas as contrarrazões (evento 59, 1G), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça, sendo distribuídos a este Relator.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça deixou de intervir no mérito da causa.

É o relatório.

VOTO

1. Admissibilidade:

Embora existam processos mais antigos pendentes sob minha relatoria, o presente julgamento não caracteriza violação ao art. 12 do CPC, diante da flexibilização da obrigatoriedade de a jurisdição ser prestada conforme a ordem cronológica, consoante inovação da Lei n. 13.256/16, que retirou o caráter absoluto da regra.

Referida modificação traz melhoria da gestão de gabinete, permitindo a apreciação imediata de demandas repetitivas, visando desafogar a distribuição de processos, cada vez mais exacerbada neste Tribunal.

Com efeito, afigura-se cabível o presente recurso, porquanto tempestivo e preenchidos os requisitos de admissibilidade previstos nos arts. 1.009 e seguintes do CPC.

Ademais, está dispensado o reexame necessário na forma do art. 496, § 4º, II, CPC.

2. Mérito:

2.1 Preliminar de sentença extra petita:

De plano, tem-se que a decisão não foi extra petita ao tratar sobre o princípio da anterioridade.

Há, na verdade, controvérsia jurídica sobre o termo inicial da vigência da legislação que regulamentou a cobrança do tributo, qual seja, a Lei Complementar n. 190/22.

Assim "como bem destacou a Exma. Denise de Souza Luiz Francoski, em caso análogo ao presente, '(...) não há sentença 'extra petita' quando o magistrado observa a legislação aplicável ao caso, mesmo que não aventado pelas partes' (TJSC, Apelação/Remessa Necessária n. 5030191-59.2022.8.24.0023, Quinta Câmara de Direito Público, j. 30-08-2022)" (TJSC, Apelação / Remessa Necessária n. 5049279-83.2022.8.24.0023, rela. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti, Quarta Câmara de Direito Público, j. 06-10-2022).

A adoção de tal fundamento pelo magistrado não importa em julgamento extra petita, pois ele não está adstrito aos fundamentos trazidos pelas partes, mas sim ao objeto da lide.

Diante desse contexto, tem-se que "a decisão que acolhe ou indefere o pleito contido nos limites estabelecidos na petição inicial, ainda que por fundamento diverso, não excede os contornos da lide, pois estes não são estabelecidos pela causa de pedir, mas pelo objeto" (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5013181-71.2022.8.24.0000, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. em 03-05-2022).

É assente a jurisprudência do STJ:

"[...] 1. Consoante cediço no STJ, não há falar em julgamento extra petita quando o julgador - adstrito às circunstâncias fáticas da demanda (causa de pedir remota) e ao pedido constante nos autos - procede à subsunção normativa com amparo em fundamentos jurídicos diversos dos esposados pelo autor e refutados pelo réu, o que se coaduna com as máximas contidas nos brocardos iura novit curia e da mihi factum dabo tibi jus. (...)" (STJ, REsp 1.747.956/SP, rel. p/ Acórdão Min. Luis Felipe Salomão, j. em 15-06-2021, DJe 30-08-2021)

2.2 Marco temporal para a exigência do DIFAL:

Quanto ao marco temporal para a exigência do DIFAL, de início, registra-se que a questão já havia sido antes apreciada por este colegiado, mas em sede de agravo:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA DO ICMS NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS (DIFAL). INDEFERIMENTO DA LIMINAR. NECESSIDADE DE LEI COMPLEMENTAR FEDERAL ESPECÍFICA PARA COBRANÇA DA EXAÇÃO. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STF (TEMA 1.093). LEI COMPLEMENTAR QUE SOBREVEIO NO ANO DE 2022. NECESSIDADE, TODAVIA, DE OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE ANUAL E NONAGESIMAL. REQUISITOS AUTORIZADORES DA MEDIDA DE URGÊNCIA PRESENTES. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO." (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5006202-93.2022.8.24.0000, rel. Cid Goulart, Segunda Câmara de Direito Público, j. 15-03-2022).

Todavia, os contornos finais da matéria em discussão ainda serão definidos pelo STF.

A questão atinente à cobrança do diferencial de alíquota do ICMS é objeto das ADI´s 7.066 e 7.070, sem ordem de suspensão nacional dos processos: a primeira com pedido de suspensão dos efeitos da norma, a fim de que sejam observadas a anterioridade nonagesimal e do exercício financeiro seguinte, como defende a contribuinte; e a segunda objetivando a cobrança desde a publicação da Lei Complementar n. 190, de 05-01-2022, sem sujeição ao princípio da anterioridade, como defende o Fisco.

Após decisão proferida por esta Segunda Câmara de Direito Público no Agravo de Instrumento n. 5006202-93.2022.8.24.0000 foi apreciada liminar no âmbito das ADI's ns. 7066, 7070 e 7075.

Cabe destacar excerto da decisão liminar do Relator, Min. Alexandre de Moraes:

"Trata-se de um conjunto de Ações Direta de Inconstitucionalidade, todas com pedido de medida cautelar, propostas pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos, ABIMAQ (ADI 7066), pelo Governador do Estado de Alagoas (ADI 7070), pelo Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Produtos Siderúrgicos, SINDISIDER (ADI 7075) e pelo Governador do Estado do Ceará (ADI 7078), nas quais se questiona a Lei Complementar 190/2022, no que altera a Lei Complementar 87/1996 (Lei Kandir) para tratar da cobrança do ICMS nas operações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto, em vista do que foi decido pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no julgamento da ADI 5469, no sentido de que as alterações da Emenda Constitucional 87/2015 dependeriam de regulamentação por lei complementar.

(...)

É o relatório. Decido.

(...)

Superada a questão preliminar, passa-se ao exame dos pedidos de concessão de medida cautelar formulados.

(...)

A CORTE apreciou matéria relacionada à instituição do diferencial de alíquota de ICMS no julgamento do RE 1.287.019-RG, Relator para acórdão o Ministro DIAS TOFFOLI, julgado sob o rito da repercussão geral (Tema 1093), fixou tese no sentido de que:

"A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais."

Naquela mesma oportunidade, julgou-se a ADI 5469, também da...

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