Acórdão Nº 5024977-13.2020.8.24.0038 do Quarta Câmara Criminal, 08-12-2022

Número do processo5024977-13.2020.8.24.0038
Data08 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5024977-13.2020.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: TIAGO MACHADO JARDIM (ACUSADO) E OUTRO ADVOGADO: FERNANDO ALFREDO SIQUEIRA TEIXEIRA (OAB SC044772) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca de Joinville, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Tiago Machado Jardim, Rafael Machado Jardim e Maria Cristina Dias Machado Jardim, imputando-lhes a prática do delito capitulado no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por 6 (seis) vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:

Os denunciados, na condição de sócios-administradores de "NUCLEOMASTER MONTAGEM DE ELETRÔNICOS LTDA. ME", CNPJ n. 10.844.557/0001-62 e Inscrição Estadual n. 25.635.201-1, estabelecida na Avenida Almirante Jaceguay, n. 1500, Bairro Costa e Silva, em Joinville, deixaram de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 83.276,61 (oitenta e três mil duzentos e setenta e seis reais e sessenta e um centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santo Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação em DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, maio e junho de 2018, documentos geradores da Dívida Ativa n. 19044006285, inscrita em 04/07/2019 (Evento 1, DENUNCIA2, autos originários - com grifos).

O feito foi suspenso e cindido em relação ao denunciado Rafael Machado Jardim, na forma do art. 366 do Código de Processo Penal (Evento 60, DESPADEC1, autos originários).

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedentes os pedidos formulados na denúncia, para condenar Tiago Machado Jardim e Maria Cristina Dias Machado Jardim, cada qual, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, fixados no mínimo legal, substituída a sanção corporal por prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena privativa, em uma hora de tarefa por dia de condenação, pela prática do crime previsto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, por 6 (seis) vezes, em continuidade delitiva (Evento 141, SENT1, autos originários).

Inconformados com a prestação jurisdicional, os réus interpuseram apelação criminal, mediante a qual postularam, em preliminar, a extinção do feito, por entender que os delitos em exame foram praticados em continuidade delitiva com aqueles apurados em outros processos.

No mérito, requereram a absolvição por ausência de dolo, pois "não tinham como objetivo principal, fundamental, locupletar-se dos valores dos impostos em benefício próprio, mas no máximo, a postergação do desembolso, uma vez que culposamente, assumiram o risco de produzir o resultado".

Por fim, almejaram a revisão da penas, a fim de que sejam individualizadas de acordo com o grau de culpabilidade de cada agente, em atenção ao art. 5º, XLVI, da Constituição Federal. Ainda, pleitearam "que seja levado em consideração as condições dos réus, sua participação, grau de conhecimento, situação familiar, de idade e outros para que a pena seja aplicada de modo proporcional e razoável e que possa ser a medida correta de justiça".

Por fim, haja vista a precária condição financeira, postularam a readequação da pena de multa e o deferimento da gratuidade de justiça (Evento 155, APELAÇÃO1, autos originários).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 161, CONTRAZAP1, autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do reclamo (Evento 9, PROMOÇÃO1).

VOTO

1 Ab initio, deixa-se de conhecer do pleito de concessão do benefício da justiça gratuita, porquanto "a condição de hipossuficiente do apenado deve ser examinada pelo juízo a quo, quando da apuração das custas finais" (TJSC, Apelação Criminal n. 0001311-59.2016.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. em 13/12/2018).

No mesmo norte:

APELAÇÕES CRIMINAIS. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO QUALIFICADO (ART. 155 § 1º e § 4º, INCS. I E II, DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INCONFORMISMO DEFENSIVO. REQUERIDA JUSTIÇA GRATUITA. PLEITO A SER EFETUADO E APRECIADO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO PELO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO [...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0000661-78.2018.8.24.0074, de Trombudo Central, rel. Des. Alexandre d'Ivanenko, Quarta Câmara Criminal, j. em 7/3/2019).

E ainda:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE TRÂNSITO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ART. 306, CAPUT, DO CTB). DECISÃO CONDENATÓRIA INCONFORMISMO DA DEFESA. [...] PAGAMENTO DAS CUSTAS. PEDIDO DE ISENÇÃO. REQUERIMENTO A SER EFETUADO E APRECIADO APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO PELO JUÍZO DA CONDENAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO (TJSC, Apelação Criminal n. 0000150-43.2013.8.24.0046, de Palmitos, rel. Des. José Everaldo Silva, Quarta Câmara Criminal, j. em 4/10/2018).

No mais, porque presentes os requisitos de admissibilidade, conhece-se do reclamo.

2 Em preliminar, os apelantes buscam a extinção do presente feito, uma vez que as condutas em análise teriam sido praticadas, em continuidade delitiva, com crimes apurados em outras ações penais.

Aduzem que "a mera análise dos processos quanto aos períodos a que se referem, já demonstra claramente que se tratam de períodos seguidos, ou seja, que são um vinculado ao outro, mas que foram por assim dizer, fracionados, por razões administrativas e por terem sido gerados por DIMEs e Declaração de Dívida Ativa diversas, porém, tratam-se, por óbvio de ações contínuas" (Evento 155, APELAÇÃO1, fl. 4, autos originários).

Sem razão.

Em consulta ao sistema Eproc/1G, verifica-se que os acusados foram denunciados e condenados em outras três ações penais, contudo, ainda que os feitos compartilhem da imputação da mesma infração penal, retratam termos de inscrição em dívida ativa e períodos de ocorrência distintos. Veja-se:

a) autos n. 09018541720188240038 - meses de janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro e outubro de 2017, documentos geradores da Dívida Ativa n. 18001544180, de 6/5/2018;

b) 09013362720188240038 - fevereiro, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2016, documentos geradores da Dívida Ativa n. 17000945379, de 6/4/2017;

c) 0905867-25.2019.8.24.0038 - junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2013, documentos geradores da Dívida Ativa n. 16010961328, de 20/12/2016.

Demais disso, os processos tramitam em momentos processuais e estágios distintos e avançados, de modo a reclamar a incidência da regra prevista no art. 82 do Código de Processo Penal e do entendimento consolidado na Súmula 235 do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "a conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado".

A propósito, Renato Brasileiro de Lima ensina que, "se um dos processos já foi sentenciado, não mais haverá razão para a reunião dos processos, na medida em que o objetivo maior da conexão/continência - simultaneus processus como fator de produção probatória mais eficaz e de se evitar julgamentos conflituosos - não mais será passível de ser atingido" (Manual de processo penal: volume único. 7. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2019. p. 589).

Sobre o tema, colhe-se da jurisprudência da Corte de Cidadania:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SONEGAÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CRIME SOCIETÁRIO. [...] REUNIÃO DE PROCESSOS. CONEXÃO. SÚMULA 235/STJ. [...] 6. A reunião de ações penais conexas não é obrigatória quando distintas as fases processuais ou uma delas já tiver sido sentenciada. Súmula 235/STJ (AgRg no REsp n. 1.113.323, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 17/3/2016).

Desse modo, "a conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado (Súmula 235 do STJ), nada impedindo a reunião ulterior para o efeito se soma ou unificação das penas (art. 82 do CPP) no Juízo de Execução Penal [...]" (TJSC, Apelação Criminal n. 0900040-36.2018.8.24.0016, de Capinzal, rel. Des. Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Quarta Câmara Criminal, j. em 12/3/2020).

Sendo assim, é inviável a extinção do feito ou a reunião dos processos.

De outro lado, eventual continuidade delitiva poderá ser postulada perante o Juízo da Execução, a quem compete promover a soma e unificação das penas aplicadas (arts. 66, III, "a", e 111, ambos da Lei n. 7.210/84).

Ademais, vale consignar que este Tribunal já enfrentou a matéria, quando do julgamento de recursos interpostos pelos acusados, referentes a outras ações penais:

APELAÇÃO CRIMINAL. DELITO CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA EM CONTINUIDADE DELITUOSA (ART. 2º, INCISO II, DA LEI N. 8.137/90 C/C ART. 71 DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO.REQUERIMENTO DE CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO. NÃO CONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. PRELIMINARES. PEDIDO PARA RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. IMPOSSIBILIDADE. TRANSCURSO DE LAPSO TEMPORAL INSUFICIENTE ENTRE OS MARCOS INTERRUPTIVOS, CONSIDERANDO O PERÍODO EM QUE O FEITO E O CURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL PERMANECERAM SUSPENSOS, COM FULCRO NO ART. 89, DA LEI 9.099/95. PLEITEADA A EXTINÇÃO DO FEITO EM RAZÃO DA CONTINUIDADE ENTRE OS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIAS E OUTROS PROCESSOS INSTAURADOS INDIVIDUALMENTE. INVIABILIDADE. FATOS E NOTIFICAÇÕES FISCAIS DIVERSAS. ADEMAIS, IMPOSSIBILIDADE DE CONEXÃO ENTRE OS FEITOS QUANDO UM DELES JÁ CONTA COM SENTENÇA CONDENATÓRIA. PRECEDENTES. PREFACIAIS AFASTADAS.MÉRITO. PLEITO ABSOLUTÓRIO SOB A TESE DE AUSÊNCIA DE DOLO E DIFICULDADES FINANCEIRAS. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO DEVIDAMENTE COMPROVADOS. APELANTES QUE, NA QUALIDADE DE ADMINISTRADORES DA PESSOA JURÍDICA, DEIXARAM...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT