Acórdão Nº 5025269-27.2022.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Público, 02-05-2023

Número do processo5025269-27.2022.8.24.0038
Data02 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5025269-27.2022.8.24.0038/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5025269-27.2022.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ FERNANDO BOLLER


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELADO: EVERTON LUIZ LIBERATO (RÉU)


RELATÓRIO


Cuidam-se de Embargos de Declaração opostos por Ministério Público do Estado de Santa Catarina, em objeção ao aresto que conheceu e negou provimento à Apelação Cível n. 5025269-27.2022.8.24.0038, interposta contra a sentença prolatada pelo magistrado Renato Luiz Carvalho Roberge - Juiz de Direito titular da 1ª Vara da Fazenda Pública da comarca de Joinville -, na Ação Civil Pública n. 5025269-27.2022.8.24.0038, ajuizada contra Everton Luiz Liberato.
Fundamentando sua insurgência, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina argumenta que:
[...] ao negar provimento ao Apelo manejado pelo Ministério Público e manter a sentença que rejeitou parte dos pedidos autorais sob o fundamento de que o "[...] pagamento de indenizações específicas por abalo moral, ambiental e animal, não prospera, porquanto são dissecações do dano moral coletivo" (evento 16, RELVOTO1, p. 4), bem como, ao não reconhecer a autonomia da pretensão indenizatória pelo dano "animal" como decorrência do sofrimento individual suportado pela canina, omitiu-se em relação aos arts. 2º, caput e § 3º, e 3º, I, do Decreto n. 24.645/34 [...].
[...] a Constituição Federal, além de consagrar a proteção da função ecológica da fauna como bem jurídico tutelado para as presentes e futuras gerações, estabeleceu uma regra autônoma, proibindo a submissão dos animais à prática de maus tratos. Fica claro, então, a existência de distinção entre os ramos do Direito Animal e do Direito Ambiental, pois que atuam como disciplinas independentes.
[...] o art. 2º, caput e § 3º, do Decreto n. 24.645/34 estabelece a tutela jurisdicional cível do animal não-humano mediante representação pelos seus substitutos legais, pelos membros das sociedades protetoras de animais e, também, pelo Ministério Público.
[...] a interpretação conjunta dos arts. 2º, caput e § 3º, e 3º, I, do Decreto n. 24.645/34 permite inferir a viabilidade da pretensão deduzida na demanda originária em relação ao pedido de indenização, pelo sofrimento ao qual foi submetido o animal não-humano que veio a óbito em razão do ato ilícito e cruel praticado pelo réu.
[...] a Lei n. 12.854/03, de Santa Catarina, que institui o "Código Estadual de Proteção aos Animais", proíbe expressamente a prática de agressão física aos animais que ocasione qualquer sofrimento, dano ou condições inaceitáveis para a sua existência (art. 2º, I). Não bastasse, o mesmo diploma considera que "cães e gatos ficam reconhecidos como seres sencientes, sujeitos de direito, que sentem dor e angústia, o que constitui o reconhecimento da sua especificidade e das suas características face a outros seres vivos" (art. 34-A).
[...] a omissão do aresto se verifica no ponto em que esse colendo colegiado, sem considerar a incidência dos arts. 2º, caput e § 3º, e 3º, I, do Decreto n. 24.645/34, afastou a capacidade de ser parte do animal não-humano submetido à crueldade, deixando de tratá-lo como detentor do direito fundamental à vida e existência dignas, autônomo e independente do seu valor ecológico.
Nestes termos, lançando prequestionamento das matérias, brada pelo conhecimento e provimento dos aclaratórios.
Desnecessária a intimação de Everton Luiz Liberato (art. 1.023, § 2º do CPC).
É, no essencial, o relatório

VOTO


Consoante o disposto no art. 1.022 da Lei n. 13.105/15, são cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material.
A respeito, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery pontuam que:
Os embargos declaratórios têm finalidade de completar a decisão omissa ou, ainda, de aclará-la, dissipando obscuridades ou contradições. Não têm caráter substitutivo da decisão embargada, mas sim integrativo ou aclaratório. Prestam-se também à correção de erro material. Como regra, não têm caráter substitutivo, modificador ou infringente do julgado (nesse sentido, os embargos têm sido recebidos pela jurisprudência como agravo interno - v. Comentários. CPC 1021). Não mais cabem quando houver dúvida na decisão (CPC/1973 535 I, redação da L 8950/94 1º).1
Não divergem Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, para quem os embargos de declaração:
[...] Visam a aperfeiçoar as decisões judiciais, propiciando uma tutela jurisdicional clara e completa. Os embargos declaratórios não têm por finalidade revisar ou anular decisões judiciais (STJ, 2ª Turma, EDcl no Resp 930.515/SP, rel. Min. Castro Meira, j. 02/10/2007, DJ 18/10/2007, p. 338).2
Na espécie, o reclamo do Ministério Público do Estado de Santa Catarina não se mostra pertinente, visto que consubstancia mero inconformismo com a solução da demanda, contrastando com o fundamento decisório patenteado, evidenciando latente pretensão de adequação do julgado ao seu interesse.
Em razão de sua natureza estrita, os embargos de declaração não se prestam à rediscussão do tema já suficientemente debatido no aresto verberado, pelo simples fato da parte embargante discordar das suas conclusões.
Além disso, a matéria apontada nos aclaratórios foi enfrentada no acórdão combatido, de forma clara e objetiva.
Senão, veja-se:
[...]
Consoante consignado na sentença, não se desconhece que a morte de animal caracteriza dano ao meio ambiente equilibrado (direito difuso), sendo causa de grande comoção social apta a configurar o dano moral coletivo, nos termos do art. 225 da CF/88.
Todavia, no que diz respeito à possibilidade de analisar o direito animal como direito autônomo, nesse tópico trago à lume a interpretação lançada pelo Desembargador Odson Cardoso Filho, quando do julgamento da congênere Apelação n. 0900655-20.2018.8.24.0018, que replico, justapondo-a em meu voto, nos seus precisos termos, como razão de decidir:
A controvérsia cinge-se, em primeiro momento, à (im)prescritibilidade da pretensão de indenização por dano moral ambiental coletivo.
[...]
Como bem delineado pelo Órgão Ministerial em suas razões (Ev. 47 - 1G), assim como pela Procuradoria-Geral de Justiça em seu parecer (Ev. 7), a imprescritibilidade da reparação do dano ambiental há muito encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL - DIREITO AMBIENTAL- AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL. PEDIDO GENÉRICO. ARBITRAMENTO DO QUANTUM DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE - SÚMULAS 284/STF E 7/STJ.1.É da competência da Justiça Federal o processo e julgamento de Ação Civil Pública visando indenizar a comunidade indígena Ashaninka-Kampa do rio Amônia.2. Segundo a jurisprudência do STJ e STF trata-se de competência territorial e funcional, eis que o dano ambiental não integra apenas o foro estadual da Comarca local, sendo bem mais abrangente espraiando-se por todo o território do Estado, dentro da esfera de competência do Juiz Federal.3. Reparação pelos danos materiais e morais, consubstanciados na extração ilegal de madeira da área indígena.4. O dano ambiental além de atingir de imediato o bem jurídico que lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os integrantes do Estado, espraiando-se para toda a comunidade local, não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal ocasionado.5. Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano.6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal.7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer, considera-se imprescritível o direito à reparação.8. O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.9. Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação, havendo elementos suficientes nos autos. Precedentes do STJ.10. Inviável, no presente recurso especial modificar o entendimento adotado pela instância ordinária, no que tange aos valores arbitrados a título de indenização, por incidência das Súmulas 284/STF e 7/STJ.11. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido. (STJ, Recurso Especial n. 1.120.117/AC, rela. Min. Eliana...

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