Acórdão Nº 5025650-80.2022.8.24.0023 do Quarta Câmara Criminal, 02-06-2022

Número do processo5025650-80.2022.8.24.0023
Data02 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5025650-80.2022.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: JULIANA MARTINS SUBTIL (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca da Capital, o Órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Juliana Martins Subtil e Wagner Oro, imputando-lhes a prática do delito capitulado no art. 155, § 4º, IV, do Código Penal, pois, segundo consta na inicial:

No 3 de fevereiro de 2022, por volta das 18 horas e 11 minutos, na Avenida das nações, bairro Canasvieiras, nesta Capital, em comunhão de vontades e união de desígnios, os denunciados Wagner e Juliana subtraíram para si uma peça de picanha (avaliada em cerca de R$ 145,00) e colocaram dentro da mochila que o denunciado carregava.

Na saída do mercado, o denunciado Wagner passou a mochila para Juliana e saiu, porém foi abordado do lado de fora do estabelecimento. Minutos depois, a denunciada também saiu do estabelecimento na posse da mercadoria subtraída, ocasião em que também foi abordada por outro segurança do lado de fora do mercado, na posse da res furtiva.

Segundo consta, na data dos fatos, a Polícia Militar foi acionada, via COPOM, para atender ocorrência de furto no Supermercado Magia, de forma que ao chegarem no local os denunciados já estavam detidos pelos seguranças da loja, oportunidade que foram presos em flagrante (Evento 1, DENUNCIA1, autos originários).

Em relação ao corréu Wagner Oro, foi decretada a suspensão do curso do processo e do prazo prescricional, nos termos do art. 366 do Código de Processo Penal (Evento 102, DESPADEC1, autos originários).

Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar a ré ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por 1 (uma) medida restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, além do pagamento de 3 (três) dias-multa, fixados no mínimo legal, pela prática do crime previsto no art. 155, § 2º e § 4º, IV, c/c o art. 65, III, "d", todos do Código Penal (Evento 114, TERMOAUD1, autos originários).

Inconformada com a prestação jurisdicional, a ré interpôs apelação criminal, mediante a qual postulou a absolvição, sustentando a atipicidade material da conduta, diante da incidência do princípio da insignificância. Ainda, requereu o reconhecimento da prática de crime impossível, conforme prevê o art. 17 do Código Penal. No mais, sustentou que o cometimento do delito teria ocorrido em estado de necessidade, de modo que deveria ser aplicada a figura do furto famélico. Por fim, clamou pelo empego da causa de diminuição de pena da tentativa (Evento 133, RAZAPELA1, autos originários).

Apresentadas as contrarrazões (Evento 147, CONTRAZAP1, autos originários), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Hélio José Fiamoncini, manifestou-se pelo conhecimento e provimento do apelo, para "reconhecer a insignificância da conduta e absolver a apelante Juliana Martins Subtil" (Evento 10, PROMOÇÃO1).

Documento eletrônico assinado por SIDNEY ELOY DALABRIDA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2247058v16 e do código CRC bf07388c.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): SIDNEY ELOY DALABRIDAData e Hora: 13/5/2022, às 19:2:41





Apelação Criminal Nº 5025650-80.2022.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SIDNEY ELOY DALABRIDA

APELANTE: JULIANA MARTINS SUBTIL (RÉU) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Trata-se de apelação criminal interposta por Juliana Martins Subtil em face de sentença proferida pelo Magistrado a quo, que, ao julgar procedente o pedido formulado na denúncia, condenou-a ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por 1 (uma) medida restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, além do pagamento de 3 (três) dias-multa, fixados no mínimo legal, pela prática do crime previsto no art. 155, § 2º e § 4º, IV, c/c o art. 65, III, "d", todos do Código Penal.

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

1 Da pretensa aplicação do princípio da insignificância

A defesa busca a absolvição da apelante pela atipicidade material da conduta, com a incidência do princípio da insignificância.

Para tanto, alega que a "acusada é primária; o valor do produto não ultrapassa os vetores que vêm sendo reconhecidos rotineiramente; não houve violência ou grave ameaça; o produto foi recuperado (ausência de prejuízo ao estabelecimento comercial)", bem como que "a natureza do bem, por ser um bem alimentício, também reforça o entendimento sobre a insignificância" (Evento 133, RAZAPELA1, fl. 4).

A tese não merecem respaldo.

1.1 Pelo que se infere dos autos, no dia 3 de fevereiro de 2022, por volta das 18h11min, na Avenida das Nações, bairro Canasvieiras, em Florianópolis/SC, Juliana Martins Subtil e Wagner Oro, em união de desígnios e comunhão de esforços, ingressaram no "Supermercado Magia" e subtraíram para si 1 (uma) peça de picanha, avaliada em R$ 145,00 (cento e quarenta e cinco reais).

Embora incontestes, a autoria e materialidade delitivas emergem do auto de prisão em flagrante (Evento 1, P_FLAGRANTE1, fl. 2, autos do IP), boletim de ocorrência (Evento 1, P_FLAGRANTE1, fls. 3-4, autos do IP), auto de exibição e apreensão (Evento 1, P_FLAGRANTE1, autos do IP), auto de avaliação (Evento 1, P_FLAGRANTE1, fl. 12, autos do IP), das fotografias da ação delitiva (Evento 1, FOTO7-FOTO9, autos do IP), dos vídeos das câmeras de monitoramento do estabelecimento comercial (Evento 1, VÍDEO10-VÍDEO11), bem como da prova oral coligida.

Na etapa administrativa, Juliana afirmou que subtraiu o pedaço de carne pois estava com fome (interrogatório audiovisual, Evento 1, VÍDEO5, autos do IP).

Sob o crivo do contraditório, a ré declarou que veio do Rio Grande do Sul para trabalhar em Florianópolis, porém perdeu o emprego. Confirmou a autoria dos fatos, ressalvando, contudo, que foi presa ainda dentro do mercado, próximo ao caixa. Negou ter participado de outro furto na mesma data. Explicou que Wagner havia dito que, pela manhã, subtraíra outro pedaço de carne para vender na praia, porém consignou não deter conhecimento sobre a intenção de comercializar o produto por parte do corréu (interrogatório audiovisual, Evento 124, VÍDEO1).

Na etapa processual, a testemunha Geraldo Oliveira da Silva, funcionário do estabelecimento comercial, declarou que, na data dos fatos, na parte da manhã, recebeu um vídeo das câmeras de monitoramento do supermercado, nas quais o corréu Wagner aparecia furtando um pedaço de carne. Relatou que, nessa oportunidade, o acusado logrou êxito em se evadir na posse da res. Afirmou que, por esse motivo, durante a tarde, dobraram a atenção quanto ao monitoramento da loja. Disse que, nesse período, Wagner retornou ao estabelecimento a fim de furtar outra peça e que, lá dentro, o acusado se encontrou com a ré Juliana, que pegou outro pedaço de carne e passou para a mochila de Wagner. Declarou que, depois, Wagner e Juliana foram abordados do lado de fora do mercado em poder do alimento. Consignou que houve devolução apenas da carne furtada no período da tarde (depoimento audiovisual, Evento 124, VÍDEO1).

Perante o MM. Juiz, o policial militar Adam Fernandes Franco elucidou que, ao chegar no supermercado, percebeu que os dois réus já haviam sido detidos pelos seguranças. Expôs que os acusados confessaram que estavam furtando. Declarou que Wagner confirmou que, na parte da manhã, subtraíra outro produto no mesmo local e que estava vendendo as peças de carne na praia. Explicitou ter visualizado as imagens das câmeras de monitoramento, asseverando que os denunciados foram abordados na saída do estabelecimento, perto da porta e do estacionamento (depoimento audiovisual, Evento 124, VÍDEO1).

Em juízo, o policial militar Guilherme Marques Santana narrou que foram acionados via COPOM para atender a um furto no mercado "Magia". Disse que, ao chegar no local, encontraram o casal, que estava em um espaço reservado. Afirmou que, ao conversar com Geraldo, este relatou que o réu foi flagrado pelas câmeras de monitoramento colocando uma peça de picanha dentro da mochila (depoimento audiovisual, Evento 124, VÍDEO1).

1.2 Isso posto, o princípio da insignificância se insere no rol dos mecanismos que a moderna dogmática jurídico-penal elaborou para tornar efetiva a tarefa político-criminal de descriminalização, sem que se abandone a segurança jurídica do sistema.

Como decorrência dos postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima no direito penal, atua "como instrumento de interpretação restritiva do tipo penal, com o significado sistemático e político-criminal de expressão da regra constitucional do 'nullum crimen sine lege', que nada mais faz do que revelar a natureza subsidiária e fragmentária do direito penal" (MAÑAS, Carlos Vico. O princípio da insignificância como excludente da tipicidade no direito penal. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 56).

Funda-se, portanto, na concepção material do tipo penal, por meio da qual a tipicidade não se esgota no juízo lógico-formal de subsunção do fato à norma. Exige que a conduta nela enquadrável revele-se, ainda, ofensiva para o bem jurídico protegido pela lei penal, sem o que a intervenção criminal não se justifica.

Tendo por consequência a exclusão da tipicidade material, no âmbito do Pretório Excelso, alguns parâmetros foram estabelecidos para a sua aplicação, a saber: a) mínima ofensividade da conduta do agente, b) ausência de periculosidade social da ação, c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão...

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