Acórdão Nº 5025707-41.2020.8.24.0000 do Câmara de Recursos Delegados, 28-07-2021

Número do processo5025707-41.2020.8.24.0000
Data28 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoCâmara de Recursos Delegados
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão










AGRAVO INTERNO EM Agravo de Instrumento Nº 5025707-41.2020.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador SALIM SCHEAD DOS SANTOS


AGRAVANTE: TRANSCOIMB TRANSPORTES DE CARGAS LTDA AGRAVANTE: NESTOR PEDRO BAUM (Espólio) AGRAVADO: Juízo da 1ª Vara da Comarca de Imbituba (Espólio)


RELATÓRIO


Transcoimb Transportes de Cargas Ltda., com base no artigo 1.021 do Código de Processo Civil, interpôs o presente agravo interno contra a decisão da 3ª Vice-Presidência desta Corte de Justiça que, amparada em precedente do Supremo Tribunal Federal [ARE n. 748.371 RG/MT - (Tema 660)], negou seguimento ao recurso extraordinário (evento 53).
Em suas razões, a empresa agravante sustenta o equívoco da decisão agravada, não se subsumindo o caso à aplicação do Tema 660 do STF. Ressalta, nesse sentido, que não é necessária a análise prévia da adequada aplicação das normas infraconstitucionais, uma vez que o princípio do livre acesso à justiça se consubstancia no direito de acessar a justiça e se defender em qualquer grau de jurisdição, sem qualquer obstrução ou embaraço por parte do Estado-juiz. Faz outras considerações, a respeito da matéria discutida nos autos e, por fim, requer o provimento do presente agravo interno, para viabilizar o processamento do recurso extraordinário interposto (evento 62).
Intimada, a parte agravada deixou de apresentar contrarrazões (evento 65).
Em sede de juízo de retratação, foi mantida a decisão agravada e determinou-se o encaminhamento do agravo interno à Secretaria da Câmara de Recursos Delegados, para oportuna inclusão em pauta, nos termos do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça (evento 68)

VOTO


1. Imperativo anotar, ab initio, que o artigo 1.030, inciso I, e suas alíneas "a" e "b", do Código de Processo Civil, determinam o seguinte:
Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá: I - negar seguimento:
a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral;b) a recurso extraordinário ou a recurso especial interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos.
O § 2º do artigo 1.030 do diploma processual, por sua vez, estabelece que "da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo interno, nos termos do art. 1.021" e, não havendo retratação, como neste caso, o agravo será levado "a julgamento pelo órgão colegiado, com inclusão em pauta" (artigo 1.021, § 2º, do CPC).
2. No mérito, há que se negar provimento ao agravo interno.
A 3ª Vice-Presidência deste Tribunal de Justiça negou seguimento ao recurso extraordinário quanto à alegada violação ao artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, porque o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do [ARE n. 748.371 RG/MT - (TEMA 660)], reconheceu que se trata de matéria sem repercussão geral, quando necessário o exame de legislação infraconstitucional.
O Agravo em Recurso Extraordinário utilizado como paradigma pela decisão agravada, está assim ementado:
Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal. Julgamento da causa dependente de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais. Rejeição da repercussão geral. (STF - ARE n. 748.371 RG/MT (TEMA 660), Rel. Ministro Gilmar Mendes, julgado em 06/06/2013, DJe 1º/08/2013 ).
Dos fundamentos do voto extrai-se:
Inicialmente, verifico que o recurso extraordinário fundou-se em suposta violação ao princípio da ampla defesa, em virtude da ausência de intimação para manifestação acerca de cálculos referentes à purgação da mora que fora requerida.
Sobre o tema, relembro que a ampla defesa possui densidade constitucional, portanto admite, em situações excepcionais de manifesto esvaziamento do princípio, o acesso à jurisdição desta Suprema Corte, por meio de recurso extraordinário.
A propósito, assinalou a Corte Constitucional alemã: Na interpretação do direito ordinário, especialmente dos conceitos gerais indeterminados (Generalklausel), devem os tribunais levar em conta os parâmetros fixados na Lei Fundamental. Se o tribunal não observa esses parâmetros, então ele acaba por ferir a norma fundamental que deixou de observar; nesse caso, o julgado deve ser cassado no processo de recurso constitucional (Verfassungsbeschwerde).
Não há dúvida, por outro lado, de que essa orientação prepara algumas dificuldades, podendo converter a Corte Constitucional em autêntico Tribunal de revisão.
É que, se a lei deve ser aferida em face de toda a Constituição, as decisões hão de ter a sua legitimidade verificada em face da Constituição e de toda a ordem jurídica. Se se admitisse que toda decisão contrária ao direito ordinário é uma decisão inconstitucional, ter-se-ia de acolher, igualmente, todo e qualquer recurso constitucional interposto contra decisão judicial ilegal.
Por essas razões, procura o Tribunal formular um critério que limita a impugnação das decisões judiciais mediante recurso constitucional. Sua admissibilidade dependeria, fundamentalmente, da demonstração de que, na interpretação e aplicação do direito, o Juiz desconsiderou por completo ou essencialmente a influência dos direitos fundamentais, que a decisão se revela grosseira e manifestamente arbitrária na interpretação e aplicação do direito ordinário ou, ainda, que se ultrapassaram os limites da construção jurisprudencial. Não raras vezes, observa a Corte Constitucional que determinada decisão judicial afigura-se insustentável, porque assente numa interpretação objetivamente arbitrária da norma legal (Sie beruth vielmehr auf schlechthin unhaltbarer und damit objektiv willkürlicher Auslegung der angewenderen Norm).
Embora o modelo de controle de constitucionalidade exercido pelo Bundesverfassungsgericht revele especificidades em relação ao modelo brasileiro, é certo que a ideia de que a não-observância do direito ordinário pode configurar uma afronta ao próprio direito constitucional tem aplicação também entre nós.
Ressalte-se, ainda, que, no Brasil, os possíveis abusos cometidos na aplicação da lei como o afastamento completo de sua incidência podem configurar ofensa direta ao art. 97 da Constituição e à Súmula Vinculante 10 desta Corte, ensejando até mesmo a propositura de reclamação constitucional.
Não obstante todas essas premissas, verifico que a controvérsia no caso sob exame limita-se à suposta má aplicação da legislação infraconstitucional, sobretudo do Código de Processo Civil.
Registro que o Supremo Tribunal Federal tem, reiteradamente, negado seguimento monocraticamente a casos como este [...].
Ocorre que a repercussão geral, como sistemática de racionalização do julgamento de recursos extraordinários por meio da seleção de processos paradigmas de controvérsias, possibilita à Corte fixar diretriz sobre os temas controvertidos, para que o entendimento seja replicado nos processos repetitivos, pelos tribunais de origem.
Portanto, é preciso que o Supremo Tribunal Federal transponha a dificuldade de julgamentos monocráticos individualizados de processos repetitivos, cuja consequência é sempre a não admissibilidade, para racionalizar o julgamento dessas demandas...

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