Acórdão Nº 5026709-21.2022.8.24.0018 do Primeira Câmara Criminal, 01-12-2022

Número do processo5026709-21.2022.8.24.0018
Data01 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5026709-21.2022.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ALBERTO CIVINSKI

AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVANTE) AGRAVADO: TIAGO DA SILVA (AGRAVADO) ADVOGADO: RENAN SOARES DE SOUZA

RELATÓRIO

Pronunciamento judicial agravado: o juiz de direito Gustavo Emelau Marchiori, da 3ª Vara Criminal da comarca de Chapecó, ao realizar a soma das penas pertinentes ao reeducando Tiago da Silva, aplicou a uma das condenações por crime equiparado a hediondo o patamar de cumprimento de 40% (2/5) da pena para fins de fruição de benefícios, nos seguintes termos:

Vistos para Decisão.

Trata-se de processo de execução das penas privativas de liberdade impostas ao(a) reeducando(a) TIAGO DA SILVA, atualmente recolhido na(o) Complexo Penitenciário de Chapecó.

Vieram os autos conclusos para análise da soma de penas.

É o breve escorço. Decido.

I. Da adoção dos cálculos do sistema SEEU.

Em primeiro lugar convém destacar que este magistrado, assim como a maioria dos juízes catarinenses, sempre adotaram o sistema proporcional de contagem da pena cumprida, referendado pelo E . TJSC, por entenderem que o art. 76 do Código Penal não se aplica ao concurso de duas condenações à pena de reclusão, ainda que decorrentes de crimes de natureza diversa (comum e hediondo), devendo-se somar as reprimendas e executá-las simultaneamente. Este entendimento, inclusive, ainda é utilizado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme recente decisão, proferida em 15.09.2022 no HC 769.677, de relatoria do Min. Reynaldo Soares da Fonseca.

Todavia, com a edição da Resolução Conjunta n. 1/2021 do GP/CGJ, foi implementado, no âmbito do Poder Judiciário de Santa Catarina, o Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU) como sistema-padrão para tramitação das execuções penais no primeiro grau de jurisdição, cuja metodologia de cálculo impõe que o tempo de prisão, na execução simultânea de penas de diferentes natureza, deve ser deduzido primeiramente do crime mais gravoso (hediondo) e, após o seu cumprimento integral, do crime de natureza comum.

Diante disso, mesmo com grande celeuma sobre o tema, o Egrégio Tribunal Catarinense, neste ano, praticamente pacificou seu entendimento a respeito do assunto e, a despeito do posicionamento individual de alguns Desembargadores, a exemplo do Desembargador Sérgio Rizelo, passou a adotar, na integralidade, o SEEU para o cálculo dos benefícios da execução penal, com fundamento, essencialmente, no princípio da segurança jurídica, tendo em vista a uniformização proporcionada pelo sistema (TJSC, Agravo de Execução Penal n. 5003891-97.2021.8.24.0022, rel. Salete Silva Sommariva, rel. designado (a) Sérgio Rizelo, Segunda Câmara Criminal, julgado em 16.11.2021).

Assim, considerando a implementação do sistema por determinação do Conselho Nacional de Justiça na ampla maioria dos tribunais do País e, à vista da necessidade de aprimoramento da gestão da informação no âmbito da execução penal, tornando seu trâmite processual mais célere, transparente, eficiente e, sobretudo, uniforme (Resolução n. 280/2019 do CNJ), este magistrado, revendo o posicionamento antes adotado, mas mantendo o entendimento pessoal quanto ao cálculo proporcional do cumprimento da pena, passo a adotar o sistema SEEU, cujos parâmetros serão utilizados a todos benefícios da execução penal para cálculos doravante realizados.

II. Da soma das penas.

Ao compulsar o caderno processual, observando a nova condenação apresentada, nota-se que o(a) reeducando(a) cumpre o quantum de 21 (vinte e um) anos, 10 (dez) meses e 27 (vinte e sete) dias de pena privativa de liberdade, sendo que desse total:

a) 2 (dois) anos e 27 (vinte e sete) dias são relativos a crime(s) comum(ns) cometido(s) antes do advento da Lei n. 13.964/2019;

b) 4 (quatro) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias são relativos a crime(s) comum(ns) cometido(s) sem violência à pessoa ou grave ameaça, após o advento da Lei n. 13.964/2019 e na condição de reincidente (art. 35 da Lei n. 11.343/2006);

c) 8 (oito) anos e 2 (dois) meses são relativos a crime(s) hediondo(s) ou equiparado(s) cometido(s) após o advento da Lei n. 11.464/2007 e antes do advento da Lei n. 13.964/2019, na condição de reincidente genérico;

d) 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias são relativos a crime(s) hediondo(s) ou equiparado(s) cometido(s) após o advento da Lei n. 13.964/2019, sem resultado morte e na condição de reincidente específico;

Iniciou o resgate da reprimenda em 17.07.2015, não registra dias de interrupção e conta, ainda, com 58 (cinquenta e oito) dias de remição homologados em seu favor, anteriores ao atual marco.

A data-base processual, por sua vez, é o dia 16.10.2021, porque corresponde à falta grave praticada pelo reeducando, consistente na prática de novo crime, ocasião em que foi preso preventivamente e ingressou no regime fechado.

Assim, até o marco o(a) reeducando(a) cumpriu 6 (seis) anos, 5 (cinco) meses e 5 (cinco) dias relativos ao crime(s) hediondo(s) ou equiparado(s) cometido(s) antes do advento da Lei n. 13.964/2019, oportunidade em que a ele restava cumprir:

a) 2 (dois) anos e 27 (vinte e sete) dias (1/6 = 4 meses e 4 dias);

b) 4 (quatro) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias (20% ou 1/5 = 10 meses e 15 dias);

c) 1 (um) ano, 8 (oito) meses e 25 (vinte e cinco) dias (40% ou 2/5 = 8 meses e 10 dias);

d) 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias (60% ou 3/5 = 4 anos, 4 meses e 14 dias);

O regime a ser fixado é o fechado, em face de assim prever a nova condenação (sequencial 150.1, autos 0000636-10.2016.8.24.0018, SEEU, em 6-10-2022).

Recurso de Agravo de Execução Penal: o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por meio do Promotor de Justiça Cyro Luiz Guerreiro Júnior, interpôs recurso e argumentou que a reincidência é condição pessoal que afeta a totalidade da pena, de modo que deve refletir seus efeitos sobre todos os crimes. Assim, também no cálculo da pena a cumprir referente ao processo crime 0002734-02.2015.8.24.0018 (8 anos e 2 meses de reclusão), deveria ser aplicado o patamar de 60%, pois se refere a crime equiparado a hediondo.

Requereu o conhecimento e provimento do presente recurso para que seja reformada a decisão agravada, "para o fim de aplicação de 60% (3/5), para todos os crimes hediondos ou equiparados a hediondo a que cumpre o apenado - ou seja, nos autos dos processos-crimes 5028561-17.2021.8.24.0018 e 0002734-02.2015.8.24.0018 - haja vista que o apenado é reincidente específico" (evento 1, eproc2G, em 6-10-2022).

Contrarrazões: o apenado Tiago da Silva, por intermédio da Defensoria Pública estadual, impugnou os argumentos apresentados, aduzindo que: "é demasiadamente prejudicial ao agravado o reconhecimento da reincidência na fase da execução, cuja condição não fora analisada oportunamente durante o trâmite da ação penal pelo juízo sentenciante. O reconhecimento extemporâneo viola flagrantemente os princípios da non reformatio in pejus e da coisa julgada".

Postulou a manutenção da decisão objurgada (evento 11, eproc2G, em 14-10-2022).

Juízo de retratação: o juiz de direito Gustavo Emelau Marchiori manteve a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos (evento 1, eproc2G, em 21-10-2022).

Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o procurador de justiça Francisco Bissoli Filho manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso, sem prejuízo, no entanto, da "concessão da ordem de habeas corpus, a fim de que, para os fins de soma e/ou unificação das penas impostas ao agravado, o Juízo a quo considere, em relação à Ação Penal n. 0008036-12.2015.8.24.0018, o quantum de 6 (seis) anos, 9 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, conforme o acórdão proferido no evento 113 desses mesmos autos" (evento 15, eproc2G, em 8-11-2022).

Este é o relatório.

VOTO

O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido. E, em atenção ao princípio tantum devolutum quantum appellatum, a apreciação limita-se aos argumentos expostos em sede recursal.

A progressão de regime da pena privativa de liberdade, como se sabe, permite a transferência do condenado para um regime menos gravoso, a fim de que possa comprovar o seu senso de responsabilidade e aptidão à vida em liberdade, porquanto a finalidade da Lei de Execução Penal é a ressocialização do apenado.

O referido benefício está previsto no art. 112 da Lei de Execução Penal, que, nos termos da redação dada pela Lei 10.792, de 1º de dezembro de 2003, assim previa:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão.

Com o advento da Lei 11.464/2007, foi admitida expressamente a progressão de regime aos condenados por crimes hediondos, determinando como critério objetivo para esses delitos e a eles equiparados o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se primário, e 3/5 (três quintos), se reincidente (Lei 8.072/1990, art. 2º, § 2º), mantendo-se a fração do art. 112 da LEP quando o crime hediondo foi praticado antes da entrada em vigor da referida legislação.

Oportunamente, firmou-se posicionamento no sentido de que, a progressão de regime para os condenados por crime hediondo dar-se-á, se o sentenciado for reincidente, após o cumprimento de 3/5 da pena, ainda que a reincidência não seja específica em crime hediondo ou equiparado, pois a Lei dos Crimes Hediondos não faz distinção entre a reincidência comum e a específica, conforme informativo 563 da jurisprudência do STJ (vide: STJ, AgRg no HC 521.434/SP, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. em 1-10-2019, v.u.; AgRg no HC 460.910/PR, Rel...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT