Acórdão Nº 5026848-15.2019.8.24.0038 do Segundo Grupo de Direito Criminal, 23-02-2022

Número do processo5026848-15.2019.8.24.0038
Data23 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegundo Grupo de Direito Criminal
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Tipo de documentoAcórdão
Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5026848-15.2019.8.24.0038/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

EMBARGANTE: LUCIANO RICARDO LOFFLER (RÉU) EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

Luciano Ricardo Löffler aforou o presente recurso de embargos infringentes contra acórdão do recurso de apelação criminal n. 5026848-15.2019.8.24.0038, originado da egrégia Terceira Câmara Criminal (evento 15), que, por votação unânime, negou provimento ao recurso interposto pela defesa, vencido o Exmo. Des. Júlio César Machado Ferreira de Melo que, de ofício, aplicava o regime aberto para o cumprimento da pena, sem substituição.

O embargante busca, em síntese, a prevalência do voto vencido do Exmo. Sr. Des. Júlio César Machado Ferreira de Melo que, de ofício, aplicava o regime inicialmente aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade, sem, contudo, realizar a substituição por penas restritivas de direitos (evento 21).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. José Eduardo Orofino da Luz Fontes, que se manifestou pelo conhecimento e indeferimento do recurso (evento 31).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1782565v3 e do código CRC ab5f790e.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFERData e Hora: 31/1/2022, às 15:58:58





Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5026848-15.2019.8.24.0038/SC

RELATORA: Desembargadora CINTHIA BEATRIZ DA SILVA BITTENCOURT SCHAEFER

EMBARGANTE: LUCIANO RICARDO LOFFLER (RÉU) EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

O recurso deve ser conhecido, visto que presentes os requisitos de admissibilidade.

O embargante busca, em breve síntese, a prevalência do voto vencido que, de ofício, aplicava o regime aberto para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade (evento 21).

Estes foram os fundamentos apresentados no voto vencido pelo Exmo. Sr. Desembargador Júlio César Machado Ferreira de Melo:

[...]

O art. 33 do Código Penal preconiza, em seu parágrafo segundo, alínea "c", que "o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto"; em seguida, no parágrafo terceiro, estabelece que "a determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código". Há espaço na lei, portanto: tanto para o entendimento que prevaleceu no presente julgamento, como para este que defendo.

Aliás, em apoio às razões de decidir, valho-me dos fundamentos constantes em excelente artigo publicado na Revista da ESMESC, com o título "Fixação de regime mais brando para cumprimento inicial da pena privativa de liberdade", de autoria de Laura Costa e Poliana Costa, abaixo:

3.3. Critérios para a fixação do regime inicial mais brando

Seguindo a linha do raciocínio dogmático penal do sistema de garantias e não apenas como fixação normativa do poder punitivo, propõe-se a fixação de regime mais brando (aberto) nas hipóteses em que a pena cominada implica em regime mais rigoroso, a teor do § 2º do art. 33 do Código Penal.

Inicialmente, cumpre salientar que, de acordo com o § 3º do mesmo dispositivo, a determinação do regime inicial de cumprimento da pena será feita em observância aos critérios previstos no art. 59 do Código Penal. Da redação do dispositivo, doutrina e jurisprudência, conclue-se que as circunstâncias judiciais devem ser levadas em consideração no estabelecimento da pena necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime.

Esse, aliás, corresponde ao entendimento das Cortes Superiores no sentido de que a "fixação do regime inicial de cumprimento da pena não está condicionada somente ao quantum da reprimenda, mas também ao exame das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, conforme remissão do art. 33, § 3º, do mesmo diploma legal." (BRASIL, 2013).

Tal entendimento é reiteradamente utilizado como justificativa para fixação de regime mais gravoso do que aquele previsto em lei, na hipótese de existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis.

[...]

Tal fundamento explanado nos referidos julgados decorre do entendimento de que a pena deve ser suficiente para atender às finalidades de reprovar e prevenir o delito, pois esse é o critério estabelecido pelo art. 59 do Código Penal.

A aferição da suficiência do regime nas hipóteses de agravamento se dá com base na valoração negativa de circunstâncias judiciais, as quais demonstrariam a insuficiência do regime positivo, diante das peculiaridades daquele caso concreto.

Observa-se que não é a simples existência de circunstâncias judiciais valoradas negativamente que autoriza o agravamento do regime, mas sim o juízo de necessidade e suficiência desse regime para atender às finalidades de reprovação e prevenção do delito (MALGARIN, 2015, p. 49).

Contudo, no sentido de que o juiz poderá deixar de lado o regime objetivamente fixado pela lei quando observar que regime menos gravoso é suficiente para atender às finalidades da pena, não é o entendimento firmado nas cortes superiores (BRASIL, 2012).

Verifica-se que o mesmo critério da necessidade e suficiência deveria ser utilizado tanto para agravar, quanto para abrandar o regime.

Nesse diapasão, colhe-se julgado recente do Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

[...]

Portanto, se o regime legal não é adequado aos fins da pena, já que, no caso concreto, tem a potencialidade de não apenas interromper a reinserção na comunidade que já vem ocorrendo, mas também de aprimorar práticas delitivas, não há como sustentar sua aplicabilidade no caso concreto, sem mácula à proporcionalidade e à própria dignidade humana.

[...]

Nessas circunstâncias, a fixação de regime mais brando não se trata de opção discricionária, mas sim de um imperativo, com fulcro na orientação de que a determinação do regime será feita em obediência aos critérios do art. 59 do Código Penal.

Trata-se, na verdade, de conferir efetiva aplicabilidade ao § 3º do art. 33 do Código Penal como forma de conjugar a necessidade e a suficiência às duas funções atribuídas à pena.

Não se prega que o regime aberto seja utilizado como regra, afastando as diretrizes estabelecidas no art. 33, § 2º, do Código Penal. Ao contrário, inegável que a determinação do regime mais brando dependa de decisão fundamentada e deva encontrar substrato em elementos concretos constantes dos autos, os quais evidenciem que a fixação do regime legal pode representar a obtenção da finalidade inversa que espera da pena, interrompendo o processo, já em andamento, de reinserção na sociedade.

Trata-se, portanto, de atuação tendente a atenuar o rigor repressivo por meio da fixação de regime de cumprimento mais brando do que o legal, desde que presentes circunstâncias judiciais favoráveis, fazendo-se necessária a ponderação dos seguintes requisitos: a) violação da dignidade no atual sistema carcerário; b) malefícios de potencial dessocialização; c) efetivo risco que a não segregação representa à sociedade; e d) atual condição de integração com a sociedade. (MALGARIN, 2015, p. 53) [...] (COSTA, Laura; COSTA, Poliana. Fixação de regime mais brando para cumprimento inicial da pena privativa de liberdade. Revista da ESMESC. Volume 27, n. 33 (2020), p. 257. Disponível em: << https://revista.esmesc.org.br/re/article/view/233>>. Acesso em 01/12/2021) (Grifo nosso)

Como disposto, o mesmo critério da "necessidade e suficiência" deveria ser utilizado: tanto para agravar, quanto para abrandar o regime.

Noto, que, ao fazer menção "a recente julgado deste Tribunal de Justiça", as autoras do artigo referem-se a um processo de minha relatoria, cuja ementa, dada a importância e similitude do tema, abaixo transcrevo:

APELAÇÃO CRIMINAL. RÉUS SOLTOS. AMBOS CONDENADOS POR ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE PESSOAS (ART. 157, §2º, II, DO CP) E UM DELES CONDENADO POR FALSA IDENTIDADE (ART. 307 DO CP). RECURSOS DA DEFESA E DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RECURSO DA DEFESA: MÉRITO. INSURGÊNCIAS QUANTO AO ROUBO: PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS OU RECONHECIMENTO DA TENTATIVA. INSURGÊNCIAS QUANTO À FALSA IDENTIDADE: ALEGADA ATIPICIDADE DA CONDUTA PELO DIREITO DE AUTODEFESA. DOSIMETRIA. PEDIDO DE APLICAÇÃO DA ATENUANTE APÓS A TERCEIRA FASE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. [...] RECURSO DA ACUSAÇÃO: DOSIMETRIA. PEDIDO DE REFORMA DO REGIME INICIAL, DO ABERTO PARA O SEMIABERTO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. REGIME INICIAL. "O preceito inscrito no art. 33, § 2º, "b", do Código Penal não obriga o magistrado sentenciante, mesmo tratando-se de réu sujeito a pena não superior a oito anos de prisão, a fixar, desde logo, o regime penal semiaberto" (STF, HC 125589 AgR, julgado em 19/05/2015). Na hipótese, considerando que a escolha pelo regime mais brando que o correspondente à pena aplicada restou devida e adequadamente fundamentada pelo Magistrado a quo, não há razões para alteração do regime. (TJSC, Apelação Criminal n. 0027317-41.2012.8.24.0023, da Capital, rel. Júlio César M. Ferreira de Melo, Terceira Câmara Criminal, j. 16-10-2018) (Grifo nosso)

Extrai-se, a saber, do inteiro teor do julgado:

[...] 2) Recurso da Acusação: da alegada necessidade de fixação do regime inicial semiaberto

Requer a Acusação tão somente a fixação do regime inicial semiaberto para cumprimento da pena.

Sustenta, nesse sentido, que ambos os acusados foram condenados a 5 anos e 4 meses de reclusão, patamar que, em atenção ao estabelecido no art. 33, § 2º, b, do CP, imporia a fixação do regime inicial semiaberto (fls. 585/588).

O pedido não comporta acolhimento.

Isso porque...

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