Acórdão Nº 5028064-40.2021.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 29-09-2022

Número do processo5028064-40.2021.8.24.0038
Data29 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5028064-40.2021.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: LURDES ALVES BORGES (AUTOR) APELADO: BANCO PAN S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Lurdes Alves Borges interpôs recurso de apelação cível, em face da sentença proferida pelo juiz substituto, Dr. Danilo Silva Bittar, da Unidade Estadual de Direito Bancário, que julgou improcedentes os pedidos da "ação declaratória de nulidade de ato jurídico, devolução de valores cobrados indevidamente em dobro e danos morais", ajuizada em face do Banco Pan S/A, nos seguintes termos:

A parte autora acima nominada ajuizou a presente ação declaratória c/c pedido de indenização contra a instituição financeira ré requerendo, em síntese, a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais e devolução em dobro dos valores cobrados a título de cartão de crédito consignado (RMC).

Citada, a parte ré apresentou contestação, na qual defendeu a existência da contratação e a regularidade dos descontos. Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos.

Em seguida, a parte autora apresentou réplica, requerendo, entre outros, o julgamento antecipado do mérito.

É o relatório. Decido.

[...]

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido inicial e decreto extinto o feito com resolução do mérito, o que faço com fulcro no art. 487, I, do CPC.

Porque sucumbente, a parte autora arcará com as custas e despesas processuais, bem como com os honorários advocatícios, ora fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa (CPC, art. 85, §§ 2º e 6º). Observe-se, porém, a gratuidade judicial concedida (CPC, art. 98, § 3º).

Publique-se. Registre-se. Intime-se. (evento 29/1G)

Em suas razões recursais, sustentou, em síntese: a) o contrato é inválido, pois foi ludibriada pela casa bancária, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada; b) a forma como o desconto é realizado torna o valor recebido impagável, na medida em que apenas dá conta dos encargos incidentes, não representando efetiva amortização; c) a ausência de uso do cartão e as transferências por TED comprovam que a consumidora foi enganada; d) diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, a qual representa nítida venda casada, pois não recebeu, tampouco utilizou o cartão de crédito; e) o contrato deve ser desconstituído, com a respectiva suspensão dos descontos em sua folha de pagamento e a devolução em dobro da quantia indevidamente cobrada, ou, alternativamente, a conversão do crédito contrato em operação de empréstimo pessoal consignado; f) em razão do ato ilícito praticado, o banco deve ser condenado ao pagamento de danos morais. Ao final, pugnou pelo provimento do recurso para, em reforma da sentença, julgar procedentes os pedidos da ação. (evento 34/1G)

Contrarrazões do recorrido, pugnando pelo não provimento do recurso. (evento 37/1G)

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça e foram distribuídos a esta relatoria por sorteio.

Este é o relatório.

VOTO

1. Do exame de admissibilidade do recurso

Inicialmente, registre-se que a demanda foi ajuizada já com fundamento processual no Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este o diploma processual que deverá disciplinar o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Dito isso, tem-se que o recurso deve ser conhecido porquanto presentes os requisitos de admissibilidade, razão pela qual passa-se à análise das teses recursais.

2. Fundamentação

2.1 (Ir)regularidade da operação contratada entre as partes

Sustenta a autora-recorrente a invalidade da operação pactuada com a casa bancária, na medida em que teria sido por ela ludibriada, pois pretendia contratar unicamente empréstimo pessoal consignado, e não saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada, sendo que, ao tempo da contratação, possuía margem consignável.

Contudo, razão não assiste à recorrente.

A princípio, necessário destacar que a própria autora, na inicial, reconhece que buscou crédito junto à instituição financeira demandada, apenas afirmando que pretendia a contratação de empréstimo consignado no lugar da utilização de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC).

As operações de empréstimo consignado e de cartão de crédito com reserva de margem consignável encontram-se previstas na Lei n. 10.820/03, que assim disciplina (redação vigente ao tempo da contratação):

Art. 1º. Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições financeiras e sociedades de arrendamento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1º. O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil, até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 2º. O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os fins do caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os fins do § 1º deste artigo.

[...]

Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 1º Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre:

I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1o;

II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento;

III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei;

IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias;

V - o valor dos encargos a serem cobrados para ressarcimento dos custos operacionais a ele acarretados pelas operações; e

VI - as demais normas que se fizerem necessárias.

[...]

§ 5º Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015)

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015)

§ 6º A instituição financeira que proceder à retenção de valor superior ao limite estabelecido no § 5o deste artigo perderá todas as garantias que lhe são conferidas por esta Lei. (Incluído pela Lei nº 10.953, de 2004)

Em relação aos aposentados e pensionistas do INSS, tais operações ainda se encontram reguladas pela Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/08, que, ao tempo da contratação, estabelecia da seguinte forma:

[...]

Art. 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que: (Alterado pela IN INSS/PRESS nº 39, de 18/06/2009).

[...] § 1º Os descontos de que tratam o caput não poderão exceder o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor da renda mensal do benefício, considerando que o somatório dos descontos e/ou retenções não exceda, no momento da contratação, após a dedução das consignações obrigatórias e voluntárias: (Nova redação dada pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

I - até 30% (trinta por cento) para as operações de empréstimo pessoal; e (Incluído pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

II - até 5% (trinta por cento) para as operações de cartão de crédito. (Incluído pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

[...]

Art. 12. A identificação do limite de 35% (trinta e cinco por cento) de que trata o § 1º do art. 3º dar-se-á após a apuração das seguintes deduções: (Nova redação dada pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015)

I - consignações obrigatórias: contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social; pagamento de benefícios além do devido; imposto de renda; e pensão alimentícia judicial;

II - consignações voluntárias: mensalidades de associações e demais entidades de aposentados/pensionistas legalmente reconhecidas, desde que autorizadas por seus filiados.

§ 1º Na hipótese de coexistência de descontos do inciso I do caput, com o empréstimo pessoal e/ou cartão de crédito, prevalecerão os descontos previstos inciso I do caput. (Nova redação dada pela IN INSS/PRES nº 80, de 14/08/2015 )

§ 2º A consignação ou retenção recairá somente sobre as...

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