Acórdão Nº 5028849-71.2023.8.24.0930 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 03-08-2023

Número do processo5028849-71.2023.8.24.0930
Data03 Agosto 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5028849-71.2023.8.24.0930/SC



RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN


APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: IVO DA SILVA (AUTOR)


RELATÓRIO


1.1) Da inicial
IVO DA SILVA ajuizou Ação Declaratória e Indenizatória em face de BANCO BMG S.A alegando, em síntese, que buscou a casa bancária para realizar um mútuo bancário na modalidade de empréstimo consignado mas, para sua surpresa e sem seu conhecimento, fora pactuado um contrato de cartão de crédito consignado, com inclusão de reserva de margem consignável em seu benefício previdenciário. Falou, ainda, que a conduta do Banco lhe causou prejuízos materiais e morais.
Assim, pleiteou a concessão da tutela de urgência antecipada para que a parte ré se abstenha de reservar margem consignável (RMC) destinada ao cartão de crédito e de efetuar o respectivo desconto em seu benefício previdenciário.
Pugnou pela declaração de nulidade do negócio jurídico, pela repetição do indébito e pela condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Por fim, acostou documentos, requerendo a concessão da justiça gratuita e a procedência dos pedidos inaugurais.
1.2) Da contestação
Citada, a parte ré ofereceu contestação (evento 11) alegando, preliminarmente, a conexão, a ocorrência de prescrição e decadência.
No mérito, defendeu que a parte autora solicitou a emissão de cartão de crédito, sendo lícitas todas as cláusulas pactuadas, bem como sua contratação. Falou sobre a legalidade do cartão de crédito com margem consignável, da inexistência de responsabilidade civil e de danos morais. Por fim, reiterou sobre a inexistência de prova do dano moral e pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais.
1.3) Do encadernamento processual
Concedido o pedido de justiça gratuita (evento 4) e deferido o pedido de tutela de urgência antecipada.
Embargos declaratórios opostos pelo réu (evento 11), os quais foram rejeitados (evento 13).
Manifestação sobre a contestação (evento 24).
1.4) Da sentença
Prestando a tutela jurisdicional, o Dr. ROMANO JOSE ENZWEILER proferiu sentença resolutiva de mérito (evento 26), nos seguintes termos:
Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos deduzidos na inicial desta "ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c repetição do indébito e indenização por danos morais" movida por IVO DA SILVA em face de BANCO BMG S.A para:
a) declarar a nulidade do contrato objeto da presente ação, retornando as partes ao status quo ante;
b) determinar à parte autora que proceda a devolução ao Banco réu do valor tomado emprestado, com correção monetária pelo INPC, a partir da data do crédito;
c) determinar à Instituição Financeira que proceda a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente do benefício da parte demandante, assim como outros pagamentos eventualmente realizados, os quais devem ser corrigidos monetariamente pelo INPC a partir da data do efetivo desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% a.m. (um por cento ao mês), nos termos do art. 406 do Código Civil c/c 161, § 1º, do CTN desde a citação, em consonância com o disposto no art. 405 do CC c/c art. 240 do CPC, oportunizada a compensação dos créditos e débitos (368 do Código Civil);
d) condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais à parte autora, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que deverá ser corrigido pelo INPC, desde a presente data (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, a contar da data da inclusão dos descontos no benefício previdenciário da parte autora.
Confirmo a tutela de urgência deferida nos autos.
Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
1.5) Dos Embargos de Declaração
A parte ré ofertou Embargos de Declaração (evento 30), que foram rejeitados (evento 32).
1.6) Do recurso
Irresignada, a parte ré interpôs recurso de Apelação Cível (evento 41), alegando, inicialmente, a conduta temerária do procurador da parte autora, a ocorrência de prescrição e decadência. No mérito, reiterou a existência do pacto e a legalidade do contrato de cartão de crédito consignado, bem como a ausência de danos morais e de valores a repetir. Alternativamente, discorreu sobre a necessidade de minorar a indenização fixada e falou que a devolução deve ser na forma simples. Assim, requereu a reforma do julgado.
1.7) Das contrarrazões
Presente (evento 48).
É o relatório

VOTO


2.1) Do objeto recursal
A discussão é sobre a validade do negócio jurídico entabulado entre as partes.
2.2) Do juízo de admissibilidade
Conheço em parte do recurso, pois a preliminar de conduta temerária do procurador da parte contrária constitui inovação recursal, não constando da contestação, o que obsta a análise.
Na parte conhecida, presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, recolhido o devido preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.
2.3) Das prejudiciais de mérito
2.3.1) Da prescrição
A discussão neste processo diz respeito essencialmente ao prazo prescricional aplicável a pretensão de declaração de inexistência de débito, cumulada com pedido de indenização por danos morais, originárias de contratos de reserva de margem consignáveis - RMC.
Pois bem, é indiscutível que tanto a pretensão declaratória, quanto o pedido condenatório, seja por repetição de indébito, seja por indenização por danos morais, advém da tese de inadimplemento contratual, decorrente de vício de consentimento, isto é, possuem a mesmo origem.
Sobre a prescrição nestas hipóteses, o Superior Tribunal de Justiça, por certo tempo, aplicou dois entendimentos distintos, um tomando o prazo quinquenal, consoante citado na decisão combatida, e outro com base no prazo decenal, na forma do artigo 205 do Código Civil.
Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, colocou fim a celeuma e uniformizou a incidência da prescrição decenal para responsabilidade civil contratual.
Vejamos:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL.INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS.I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual.II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador.III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual.IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico.V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado.VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do Código Civil).Embargos de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT