Acórdão Nº 5029076-66.2023.8.24.0023 do Segunda Câmara Criminal, 23-05-2023

Número do processo5029076-66.2023.8.24.0023
Data23 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 5029076-66.2023.8.24.0023/SC



RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL


RECORRENTE: ANTONIO ALEXANDRE DE SA (RECORRENTE) ADVOGADO(A): HELIO BRESSANINI PEREIRA (OAB SC040323) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (RECORRIDO)


RELATÓRIO


Na Comarca da Capital, o Ministério Público ofereceu Denúncia em face de Antônio Alexandre de Sá, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal, em razão dos seguintes fatos (Evento 1, dos autos de origem):
No dia 5 de abril de 2020, por volta das 9h30min, na escadaria localizada na Servidão Moritz, Centro, nesta Capital, com vontade de fazê-lo, o denunciado matou a vítima Lucas Roberto dos Santos Monteiro, desferindo-lhe disparos de arma de fogo, cujos projéteis resultaram nos ferimentos descritos no laudo cadavérico incluso (Evento 6, LAUDO2). O denunciado matou o ofendido simplesmente porque ele estava andando pelado pelas ruas da comunidade, o que revela motivação fútil. A ação criminosa foi praticada mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, na medida em que o denunciado alvejou Lucas à queima-roupa, de inopino, impedindo-lhe qualquer reação.
Encerrada a instrução preliminar, foi julgado admissível o pleito formulado na Exordial e, em consequência, o Juízo a quo pronunciou Antônio Alexandre de Sá como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos II e IV, do Estatuto repressivo (Evento 162, dos autos de origem).
Irresignada, a Defesa interpôs Recurso em Sentido Estrito, em cujas Razões (Evento 204, dos autos de origem) requer a despronúncia, sob o argumento de que inexistem indícios suficientes quanto à autoria delituosa, aqui incluída a tese de que o disparo foi efetuado pela própria vítima durante luta corporal, caracterizando autolesão impunível, ou em decorrência da excludente de ilicitude da legítima defesa. Subsidiariamente, pleiteia a desclassificação da conduta imputada ao réu, para aquela de lesão corporal seguida de morte. Pugna, por fim, pelo afastamento das qualificadoras.
Apresentadas as Contrarrazões (Evento 208, do feito de origem), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de lavra da Exma. Sra. Dra. Rosemary Machado Silva, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do Recurso (Evento 9).
Este é o relatório

VOTO


O recurso merece ser conhecido, por próprio e tempestivo.
Pugna a Defesa, de início, pela despronúncia, sob o argumento de que os elementos de convicção produzidos não se mostram aptos à justificar a remessa do feito ao Conselho de Sentença.
Sem razão.
Destaca-se, desde já, que, em crimes da competência do Tribunal do Júri, como na hipótese, o Magistrado somente está autorizado a reconhecer provas da materialidade do crime e indícios de sua autoria, relegando a apreciação do mérito da causa ao Órgão constitucionalmente destinado à tal fim.
Assim, nesta fase, e não obstante os argumento defensivos, entende-se que vigora o brocardo in dubio pro societate, sendo defeso ao Juiz uma profunda valoração das provas amealhadas ao processo, cabendo-lhe, tão somente, o exame da viabilidade da acusação.
Acerca do assunto, manifestou-se esta Câmara no Recurso em Sentido Estrito de n. 5025633-30.2020.8.24.0018, de relatoria da Desembargadora Hildemar Meneguzzi de Carvalho, julgada em 16/02/2022:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. SENTENÇA DE PRONÚNCIA PELO COMETIMENTO DOS CRIMES DE HOMICÍDIO (ART. 121, § 2º, INCISO IV, DO CÓDIGO PENAL), PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 14, CAPUT, DA LEI N. 10.826/03) E COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO (ART. 344, C/C ART. 29), AMBOS DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA DE PRONÚNCIA. RECURSOS DOS TRÊS ACUSADOS. PRETENDIDA A ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA OU A IMPRONÚNCIA, EM RAZÃO DA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA DEMONSTRADOS POR MEIO DA PROVA TESTEMUNHAL PRODUZIDA NO FEITO. INCONGRUÊNCIAS QUE DEVEM SER DIRIMIDAS PELO CONSELHO DE SENTENÇA. ALMEJADO O AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO EMPREGO DE RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA. INVIABILIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE AUTORIZAM A SUA ADMISSÃO. PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DE JUSTIÇA DESFAVORÁVEL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (grifou-se)
No mesmo sentido, tem-se o Recurso em Sentido Estrito de n. 5007375-12.2022.8.24.0079, de relatoria do Desembargador Roberto Lucas Pacheco, julgado em 07/03/2023:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO QUALIFICADO (CP, ART. 121, § 2º, IV). PRONÚNCIA. RECURSO DEFENSIVO. DESPRONÚNCIA. INVIABILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE COMPROVA A MATERIALIDADE E APONTA INDÍCIOS SUFICIENTES DA AUTORIA. NECESSÁRIA SUBMISSÃO DA QUESTÃO À APRECIAÇÃO DO TRIBUNAL DO JÚRI. Se da análise perfunctória dos autos, sem aprofundada incursão na prova, vislumbrar-se a existência de elementos comprobatórios da materialidade, bem ainda de indícios suficientes da autoria delitiva, a decisão de pronúncia deve ser mantida, a fim de que o réu seja submetido ao crivo do Conselho de Sentença, a quem compete, soberanamente, por disposição constitucional, o julgamento dos crimes dolosos contra a vida (CF, art. 5º, XXXVIII, "d"). [...] RECURSO NÃO PROVIDO. (grifou-se)
Feitas tais considerações, proceder-se-á à análise quanto a existência de elementos mínimos a possibilitar a remessa do julgamento de mérito ao Tribunal do Júri.
Consta da Denúncia, em suma, que, na manhã de 05 de abril de 2020, na cidade de Florianópolis, o Recorrente, com evidente animus necandi, efetuou disparos de arma de fogo na direção do ofendido Lucas Roberto dos Santos Monteiro, atingindo-o por três vezes, sendo esta a causa da sua morte.
Dito isso, tem-se que a prova da materialidade e os indícios de autoria, no caso sub judice, encontram-se demonstrados por meio do Boletim de Ocorrência (Evento 1, Inquérito 1, fls. 4/6), Relatórios de Levantamento de Local de Crime de Homicídio (Evento 1, Inquérito 1, fls. 18/24) e de Inquérito (Evento 1, Inquérito 1, fls. 52/55) e Laudos Periciais Toxicológico (Evento 1, Inquérito 1, fls. 50/51) e Cadavérico (Evento 6, Laudo 2), todos dos autos de n. 5051086-12.2020.8.24.0023, bem como pelo Exame Pericial do Evento 23, dos autos de origem e pela prova oral até aqui colhida.
O Policial Civil Benhur Caldas Silveira, ouvido somente pela Autoridade Judiciária, relatou:
Estávamos de sobreaviso nesta data, eu, meu colega Fabiano e a Delegada Salete, fomos acionados pela PM, e fomos informados de um corpo já sem vida, já em óbito, nessa escadaria que o senhor acabou de citar. Chegamos ao local, na manhã do dia cinco de abril, nove e trinta foi o fato, localizamos o corpo, a PM, os socorristas, já tinham passado por lá, foi constatado o óbito, aí já iniciamos as diligências no local, descobrimos que ele morava a uns cinquenta, sessenta metros do local do homicídio, fomos até a casa, encontramos pessoas que moravam com ele, ele morava numa casa, dividia aluguel com mais três pessoas, se não me falha a memória, e aí parece que eles fizeram uma festa à noite, beberam, e de manhã ele saiu, tirou a roupa no interior da casa e no quintal, e saiu pra rua acessando essa escadaria. Aí, na escadaria, tava nu, não sei se tava em surto psicótico, ou se alucinação da bebida, se eu não me engano o laudo toxicológico deu que não havia etanol, mas ele tava nu na escadaria, e as testemunhas, algumas confirmaram isso aí. Ali na servidão não tem tráfico, não constatou-se tráfico no local, mas parece que na parte de cima sim, lá tem uma lixeira, na parte de cima da rua, e tinha alguém do tráfico por ali, e parece que abordaram ele, por ele estar nu na escadaria, e houve uma discussão entre o suspeito que está aí, o seu Antônio, né, e eu acredito que mais uma pessoa que nós não conseguimos identificar. Aí nós passamos a fazer diligências no local, com a viatura e fardado com a roupa da Polícia, né, caracterizado, eu acho que chegou alguém do tráfico no local, dias depois o seu Antônio, na presença do seu defensor, espontaneamente deslocou-se até essa Delegacia e confirmou que havia entrado em luta corporal com a vítima, e que, diz ele que nessa luta aí a vítima, nua, com a pistola na mão, pulou sobre ele, entraram em vias de fato, uma história que eu não consigo entender, e nessas vias de fato a vítima teria, ela mesmo, com a pistola, nua, puxado o gatilho e disparado contra ela três tiros. Ele veio, colocou isso no papel, na presença do seu advogado, livre e espontânea vontade, e a princípio a gente acredita que em parte seja verdade, não como ele contou, acredito que tenha mais uma pessoa envolvida, que ele sabe quem é, mas não chegou ao nosso alcance, e ele disse que traria, colocou em depoimento, que traria mais testemunhas pra cá, moradores locais, que confirmariam, corroborariam essa hipótese, as informações dele, mas até hoje ninguém chegou, e nós procuramos mais testemunhas, outras pessoas, e ninguém corroborou a história dele. Então, o que a gente sabe é que ele entrou em vias de fato com essa pessoa, e essa pessoa restou sem vida na escadaria. Pelo que nós constatamos lá, e testemunhos de pessoas que viviam na casa, e que eram amigos da pessoa lá, da vítima, ele não consumia droga, não consumia droga, parece que usava álcool, né, mas não cocaína, maconha, nada que o tráfico revendesse, então a gente, eu acredito que seja "uma ética", um ato moral dos traficantes locais, de não permitirem que essa pessoa andasse nua na rua, e aí entraram em discussão com ele, no calor da discussão acho que dispararam contra ele. Ele (réu) deu endereço próximo, nós voltamos lá depois na localidade, e o endereço que ele forneceu pra nós, nós não localizamos, até tem uma...

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