Acórdão Nº 5029902-18.2021.8.24.0038 do Segunda Câmara Criminal, 24-01-2023

Número do processo5029902-18.2021.8.24.0038
Data24 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Criminal Nº 5029902-18.2021.8.24.0038/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


APELANTE: ORLANDO DUNQUER JUNIOR (ACUSADO) ADVOGADO: RENAN SOARES DE SOUZA (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Orlando Dunquer Junior, dando-o como incurso nas sanções do art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.137/90, por 12 (doze) vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, em razão dos seguintes fatos:
[...] O denunciado, na condição de sócio-administrador de 'DUNQUER & CIA LTDA. EPP', CNPJ n. 05.265.430/0001-59 e Inscrição Estadual n. 25.443.968-3, estabelecida na Rua Itaiópolis, n. 547, Bairro América, em Joinville, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 140.636,59 (cento e quarenta mil seiscentos e trinta e seis reais e cinquenta e nove centavos)2 a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, montante superior ao valor do capital social integralizado da empresa3 , locupletando-se ilicitamente mediante esse tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação em DIMEs (Declarações do ICMS e do Movimento Econômico) dos meses de janeiro, fevereiro, março, abril, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2019, documentos geradores da Dívida Ativa n. 200002283754, inscrita em 07/05/2020. [...] (evento 1).
Sentença: o Juiz de Direito FELIPPI AMBROSIO julgou PROCEDENTE a denúncia para condenar Orlando Dunquer Junior ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto (art. 33, § 2º, "c" do CP), além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal (art. 49, § 1º do CP), por infração ao art. 2º, II da Lei nº 8137/90, em continuidade delitiva (art. 71, caput, do CP). A segregação corporal foi substituída por restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena privativa, em uma hora de tarefa por dia de condenação (art. 43, IV, nos termos do art. 46, ambos do CP) (evento 85).
Trânsito em julgado: a sentença transitou em julgado para o Ministério Público (evento 86).
Recurso de apelação de Orlando Dunquer Junior: a defesa, por meio da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, requereu, em síntese, a absolvição do recorrente, a) diante de alegada atipicidade da conduta, por não haver prova da contumácia ou dolo de apropriação, na forma do art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal; ou b) diante da atipicidade da conduta, por total ausência de materialidade, na forma do art. 386, inc. II, do Código de Processo Penal; ou c) em razão da causa supralegal de exclusão de culpabilidade, consistente na inexigibilidade de conduta diversa.
Subsidiariamente, quanto à dosimetria da pena aplicada, requereu sua revisão, com o afastamento do crime continuado (evento 99).
Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, postulando o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (evento 102).
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Jorge Orofino da Luz Fontes opinou pelo conhecimento e o desprovimento do recurso (evento 10 dos autos de Segundo Grau).
Este é o relatório

Documento eletrônico assinado por HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2884693v5 e do código CRC ca19e727.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOData e Hora: 24/1/2023, às 19:5:41
















Apelação Criminal Nº 5029902-18.2021.8.24.0038/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


APELANTE: ORLANDO DUNQUER JUNIOR (ACUSADO) ADVOGADO: RENAN SOARES DE SOUZA (DPE) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


VOTO


Trata-se de recurso de apelação interposto por Orlando Dunquer Junior ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto (art. 33, §2º, "c", do Código Penal), além do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, cada qual no valor mínimo legal (art. 49, § 1º do Código Penal), por reconhecer que praticou o crime previsto no art. 2º, inc. II, da Lei n. 8137/90, em continuidade delitiva (art. 71, caput, do Código Penal).
A segregação corporal foi substituída por restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena privativa, em uma hora de tarefa por dia de condenação (art. 43, inc. IV, nos termos do art. 46, ambos do Código Penal).

1 - Do juízo de admissibilidade
O recurso preenche os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual é conhecido.

2 - Do mérito
A defesa, por meio da Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, requereu, em síntese, a absolvição do recorrente, a) diante de alegada atipicidade da conduta, por não haver prova da contumácia ou dolo de apropriação, na forma do art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal; ou b) diante da atipicidade da conduta, por total ausência de materialidade, na forma do art. 386, inc. II, do Código de Processo Penal; ou c) em razão da causa supralegal de exclusão de culpabilidade, consistente na inexigibilidade de conduta diversa.
Assim está disposto o crime contra a ordem tributária previsto no art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.137/90, in verbis:
Art. 2º. Constitui crime da mesma natureza:
[...] II - Deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos.
[...] Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
João Luiz Coelho da Rocha, citado por Edmar Oliveira Andrade Filho, pontifica:
[...] não estamos aqui cuidando de ação delituosa assemelhada à apropriação indébita, como já se imputava à conduta da fonte pagadora que não recolhia o imposto ou a contribuição social retidas em nome de outrem, a fonte recebedora.
Disso, aqui, não se trata, porque não se cuida do responsável legal pelo tributo, como era e é ali a hipótese da fonte pagadora, falando agora o dispositivo, expressamente, no não-recolhimento de tributo ou contribuição social descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo da obrigação (tributária).
Bem, não há dúvidas então que nesse tipo criminal o legislador está se reportando ao débito tributário próprio não pago.
Supõe-se, assim, no seguimento da descrição tipológica, que o industrial, ao vender e acrescer, como de lei, o IPI, na fatura, assim como o comerciante, em sua venda, embutindo e discriminando o ICMS, e que não vierem a pagar, no prazo esses tributos, estarão cometendo ilícito penal.
Trata-se, enfim, e em resumo, de pena privativa de liberdade, por inadimplência de débito próprio. E, rigorosamente falando, o caso de punição por dívida.
O ilustre advogado termina sua exposição criticando o alcance do dispositivo legal sob análise, mas reconhece que: "A verdade é que a norma legal incriminadora existe e não nos parece haver barreira de inconstitucionalidade que a afronte". (ROCHA, João Luiz Coelho. A Lei n. 8.137 e a prisão pro débito tributário. Revista de Direito Mercantil, n. 87, p. 68, in: ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Crimes contra a ordem tributária e contra a previdência social. São Paulo: Atlas, 2009. p. 138)
Acerca da constitucionalidade de referida norma, o pretório Excelso já se manifestou, há tempos, acerca do tema:
É certo que o ordenamento constitucional brasileiro, em preceito destinado especificamente ao legislador comum, proíbe a instituição de prisão civil por dívida, ressalvadas as hipóteses de infidelidade depositária e de inadimplemento de obrigação alimentar (CF, art. 5º, LXVIII).
Observo, no entanto, que a prisão de que trata o art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, longe de reduzir-se ao perfil jurídico e à noção conceitual de prisão meramente civil, qualifica-se como sanção de caráter penal resultante, quanto à sua imponibilidade, da prática de comportamento juridicamente definido como ato delituoso.
A norma legal em questão encerra, na realidade, uma típica hipótese de prisão penal, cujos elementos essenciais permitem distingui-la, especialmente em função de sua finalidade e de sua natureza mesma, do instituto da prisão civil, circunstância esta que, ao menos em caráter delibatório, parece tornar impertinente a alegação de que o Estado, ao editar o art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90 (que define pena criminal, em decorrência da prática de delito contra a ordem tributária), teria transgredido, segundo sustentam os impetrantes, a cláusula vedatória inscrita no art. 5º, LXVII, da Carta Política, que proíbe - ressalvadas as hipóteses previstas no preceito constitucional em referência - a prisão civil por dívida.
[...] Assim sendo, tendo presente a relevante circunstância de que a norma legal, cuja constitucionalidade está sendo questionada incidenter tantum, definiu hipótese de sanção penal (penal criminal), por delito contra a ordem tributária, e considerando que o art. 2º, II, da lei n. 8.137/90, por isso mesmo, nenhuma prescrição veicula sobre o instituto da prisão civil por dívida, indefiro o pedido de medida liminar. (Liminar em Habeas Corpus n. 77.631/SC, rel. Min. José Celso de Mello Filho, j. em 3/8/1998)
Esta Corte não destoa: Apelação Criminal n. 0008944-92.2013.8.24.0033, de Itajaí, rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. em 27/9/2016; Apelação n. 0900365-83.2014.8.24.0005, de Balneário Camboriú, rela. Desa. Salete Silva...

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