Acórdão Nº 5030191-59.2022.8.24.0023 do Quinta Câmara de Direito Público, 30-08-2022

Número do processo5030191-59.2022.8.24.0023
Data30 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5030191-59.2022.8.24.0023/SC

RELATORA: Desembargadora DENISE DE SOUZA LUIZ FRANCOSKI

APELANTE: AEA MARGINAL TIETE DISTRIBUIDORA DE MATERIAIS ELETRICOS EIRELI (IMPETRANTE) ADVOGADO: VITOR KRIKOR GUEOGJIAN (OAB SP247162) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Cuida-se de mandado de segurança impetrado por AEA MARGINAL TIETE DISTRIBUIDORA DE MATERIAIS ELETRICOS EIRELI em face do DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA - ESTADO DE SANTA CATARINA, requerendo afastar ato supostamente ilegal, relativo à exigência de recolhimento de ICMS, tocante à diferencial de alíquotas (DIFAL), em operações interestaduais de compra de mercadorias, envolvendo consumidores finais não contribuintes do imposto.

Foi proferida sentença cuja parte dispositiva apresenta a seguinte redação (evento 30, SENT1):

"Ante o exposto, confirmo a liminar e, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, CONCEDO a segurança pleiteada para DETERMINAR que o impetrado se abstenha de exigir da parte impetrante o diferencial de alíquota de ICMS (DIFAL), nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto, no Estado de Santa Catarina, até que a lei complementar federal nº 190/2022 seja plenamente eficaz (a partir do exercício de 2023), observando-se a anterioridade nonagesimal e anual.

3.1. Todavia, nos termos da decisão proferida nos autos nº 5010518-52.2022.8.24.0000/SC, ficam SUSPENSOS OS EFEITOS da liminar concedida e da presente sentença, até o trânsito em julgado da presente ação, salvo sobrevindo determinação em contrário (art. 4º, §9º, da Lei nº 8.437/92 e a Súmula nº 626 do STF).

Saliento, ademais, que "(...) o presente efeito suspensivo é aplicável igualmente às situações em que se concedeu a medida liminar ou tutela provisória para suspender a exigibilidade do DIFAL mediante o depósito do montante integral do tributo, como verificado no Mandado de Segurança n. 5025449-88.2022.8.24.0023/SC." (ev. 3, autos nº 5010518-52.2022.8.24.0000/SC, grifou-se).

3.2. Sobrevindo julgamento definitivo da Suspensão de Liminar ou, ainda, do mérito das ADIs acima referidas, juntem-se o respectivo acórdão nos autos, intimem-se as partes para manifestação e voltem conclusos para análise.

3.3. Comunique-se acerca da presente sentença, com urgência, nos autos nº 5010518-52.2022.8.24.0000.

3.4. O ente público é isento do pagamento da taxa de serviços judiciais.

3.5. Sem honorários advocatícios (art. 25, Lei n. 12.016/2009; Súmulas nº 105 do STJ e nº 512 do STF).

3.6. Decorrido o prazo de recurso, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina para reexame necessário (Lei 12.016/09, art. 14, § 1º).

3.7. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

3.8. Certificado o trânsito em julgado e observadas as formalidades legais, ARQUIVEM-SE os autos definitivamente."

O impetrado interpôs o presente recurso, alegando, em síntese, que (evento 37, APELAÇÃO1):

a) a sentença é extra petita porque não requerida na inicial a aplicação do princípio da anterioridade à Lei Federal n. 190/2022, o que deve ser excluído da sentença;

b) a sentença está equivocada ao determinar a postergação da aplicação da Lei Complementar n. 190/2022, bem como a compensação de créditos não atingidos pela prescrição.

Afirmou que o STF concluiu que as leis estaduais após a EC 87/2015 são válidas, apenas ficaram com a eficácia sobrestada a partir do exercício de 2022, enquanto não editada lei complementar nacional (no caso, a LC n. 190/2022).

Dessa forma, argumentou que a legislação pretérita (Lei Estadual n. 16.853/2015, que alterou a redação do artigo 4º da Lei n. 10.297/1996) tem imediata aplicação desde 5-1-2022, quando editada a LC n. 190/2022, porquanto apenas trata de normas gerais, não se aplicando a anterioridade tributária anual ou nonagesimal, haja vista que de pleno conhecimento dos contribuintes desde a produção de seus efeitos, em 1º-1-2016.

Sustentou que a anterioridade tributária deve ser observada apenas nas leis estaduais que efetivamente instituem o ICMS-DIFAL, e que o entendimento de que se aplica a anterioridade tributária à LC n. 190/2022 importa isenção heterônoma, sobre a qual há vedação no sistema jurídico (art. 151, III, da CF).

c) o mandado de segurança não é via adequada para "buscar a produção de efeitos patrimoniais pretéritos, uma vez que não é substitutivo de ação de cobrança" (fl. 34 do recurso).

Enfatizou que "as vantagens pecuniárias asseguradas em Sentença/Acórdão concessivos de Mandado de Segurança somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial (§ 4º. do art. 14 da Lei federal 12016/2009 c/c art. 1º da Lei 5.021/66, norma revogada pela art. 29), posto que não se pode olvidar que o writ não é substitutivo de ação de cobrança nos termos da Súmula n. 269 do STF, bem com os efeitos patrimoniais em relação a períodos pretéritos à impetração do mandado de segurança esbarram comando da Súmula 271 do STF" (fl. 34 do recurso).

Desse modo, argumentou que "o efeito da coisa julgada produzida no mandamus deverá ser ex nunc, ou seja, a partir de sua impetração, tal como há muito assentado pelo Supremo Tribunal Federal ao editar os Enunciados 269 e 271 de sua Súmula de jurisprudência, posto que a via mandamental não comporta a devolução de valor pago indevidamente" (fl. 34 do recurso)

Pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso nos termos expostos no apelo.

Formulou pedido de prequestionamento acerca dos dispositivos legais mencionados no recurso.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 44, CONTRAZAP1) e os autos não foram encaminhados para a Procuradoria-Geral de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

A) Não prospera a assertiva de que a sentença foi "extra petita", porque foi expressamente referido na inicial do mandado de segurança que a Lei Complementar (LC) n. 190/2022 estaria submetida à anterioridade anual e nonagesimal, conforme se reproduz da peça exordial:

"Cabe salientar que o ICMS não é exceção aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, de acordo com o parágrafo primeiro, do art. 150, da CF. Assim ambos os princípios devem ser respeitados o que, na espécie, significa a entrada em vigor da LC 190/22 somente em 2023, indevida assim a cobrança de DIFAL em 2022." (fl. 4 da inicial).

E, ainda que assim não fosse, não há sentença "extra petita" quando o magistrado observa a legislação aplicável ao caso, mesmo que não aventado pelas partes.

Sobre o tema:

AGRAVO POR INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE BLUMENAU. IMPUGNAÇÃO PARCIALMENTE ACOLHIDA.INSURGÊNCIA DA PARTE EXEQUENTE.JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. SUBSUNÇÃO DA NORMA AO CASO CONCRETO. ANÁLISE QUE CABE AO JULGADOR. PREFACIAL RECHAÇADA.[...]. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS ARBITRADOS. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5015296-65.2022.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Carlos Adilson Silva, Segunda Câmara de Direito Público, j. 21-06-2022) (Grifou-se).

E: Agravo de Instrumento n. 5016890-17.2022.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 12-07-2022.

Portanto, afasta-se a mencionada prefacial.

B) Sobre o assunto tratado nos autos, nada obstante a repercussão geral da matéria pelo Supremo Tribunal Federal, através do Recurso Extraordinário n. 1287019, Tema 1093 ("necessidade de edição de lei complementar visando a cobrança da Diferença de Alíquotas do ICMS - DIFAL nas operações interestaduais envolvendo consumidores finais não contribuintes do imposto, nos termos da Emenda Constitucional n. 87/2015") e Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5469, era firme o entendimento deste Tribunal no sentido da legalidade na eventual cobrança do diferencial de alíquotas do ICMS (DIFAL), pelo Estado de Santa Catarina, com fundamento no Convênio ICMS n. 93/2015 e na Lei Estadual n. 16.853/2015.

Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. ICMS. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA (DIFAL) INTRODUZIDA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL 87/2015 E REGULAMENTADA PELO CONVÊNIO ICMS N. 93/2015. INSTITUIÇÃO POR MEIO DA LEI ESTADUAL N. 16.853/2015. IMPOSTO DEVIDO PELO COMERCIALIZADOR QUANDO O DESTINATÁRIO FINAL NÃO É CONTRIBUINTE. AUSÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR NÃO ELIDE A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5023120-11.2019.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Júlio César Knoll, Terceira Câmara de Direito Público, j. 02-03-2021)

E ainda: Apelação n. 5001721-23.2019.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. 09-02-2021.

Contudo, a matéria de repercussão geral do Recurso Extraordinário n. 1287019 (Tema 1093) foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal no dia 24 de fevereiro de 2021, em que ficou definida a seguinte tese jurídica:

"A cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais"

E a ementa, em que se verifica que foram modulados os efeitos da decisão, assim foi redigida:

Recurso extraordinário. Repercussão geral. Direito tributário. Emenda Constitucional nº 87/2015. ICMS. Operações e prestações em que haja a destinação de bens e serviços a consumidor final não contribuinte do ICMS localizado em estado distinto daquele do remetente. Inovação constitucional. Matéria reservada a lei complementar (art. 146, I e III, a e b; e art. 155, § 2º, XII, a, b, c, d e i, da CF/88). Cláusulas primeira, segunda, terceira e sexta do Convênio ICMS nº 93/15. Inconstitucionalidade. Tratamento tributário diferenciado e favorecido destinado a microempresas e empresas de pequeno porte. Simples Nacional. Matéria reservada a lei complementar (art. 146, III, d, e parágrafo único, da CF/88)...

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