Acórdão Nº 5031587-43.2022.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 30-06-2022

Número do processo5031587-43.2022.8.24.0000
Data30 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5031587-43.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: RODRIGO PACHECO GONCALVES (Impetrante do H.C) PACIENTE/IMPETRANTE: GUILHERME SILVEIRA DA FONTOURA (Paciente do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca de Florianópolis

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, sem pedido liminar, impetrado pelo defensor Rodrigo Pacheco Gonçalves, em favor de Guilherme Silveira da Fontoura, afirmando estar ele sofrendo constrangimento ilegal em virtude de ato supostamente ilegal praticado pelo Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca de Florianópolis na ação penal n. 5063829-83.2022.8.24.0023, que decretou a sua prisão preventiva.

Em princípio, o impetrante afirma que "o juízo - ora Autoridade Coatora -, ignorou a inimputabilidade do Paciente, porquanto o mesmo, quando da ocorrência dos supostos fatos não possuía 18 (dezoito) anos completos, pelo que não poderia sequer estar sendo julgado em conjunto com os demais acusados indicados na exordial proposta pelo Ministério Público", o que fere o previsto no art. 27 do Código Penal e art. 121, § 5º, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Prossegue dizendo que os argumentos utilizados pelo juízo a quo para justificar a prisão do paciente não são suficientes, eis que inexiste fundamentação concreta acerca da necessidade da medida, bem como ausentes os requisitos autorizadores da segregação cautelar previstos nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal.

Argumenta que, no seu entender, "é necessário desconstituir a necessidade de prisão preventiva ao Paciente, tendo em vista que pautada em denúncia que imputa de forma genérica aos 58 (cinquenta e oito) acusados os diversos delitos capitulados".

Entende, ainda, ser cabível a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, uma vez que "as condições pessoais demonstram que (o paciente) é um jovem de 19 (dezenove) anos, com bons antecedentes, trabalho lícito e residência fixa".

Nesses termos, requer a concessão da ordem, a fim de relaxar a constrição preventiva e determinar a remessa do feito ao Juízo competente. Alternativamente, requer a concessão da ordem para "revogar a prisão preventiva ou, subsidiariamente, impor medidas cautelares diversas da prisão, nos moldes do artigo 319 do Código de Processo Penal, concedendo a liberdade através da imediata expedição de alvará de soltura" (evento 1).

Dispensadas informações (evento 9), a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pelo Excelentíssimo Procurador de Justiça Sr. Dr. Francisco Bissoli Filho, manifestou-se pela denegação da ordem (evento 13).

É o breve relato.

VOTO

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do writ.

Ab initio, quanto à questão da inimputabilidade aventada pelo impetrante, vislumbro equivocada, porquanto se trata de crime permanente, assim, embora as investigações tenham iniciado enquanto o paciente era menor de 18 (dezoito) anos - no ano de 2020 -, por óbvio, tem-se que o delito se estendeu durante os anos seguintes - 2021 e 2022 -, conforme apontaram as conversas extraídas a partir da quebra de sigilo telefônico constantes na investigação, portanto, neste período, o ora paciente já havia atingido a maioridade penal, sendo inteiramente imputável.

Nesse viés, bem pontuou o douto Procurador de Justiça: "[...] o Relatório Técnico Operacional n. 179/PMSC/2022, constante no evento 621 dos autos principais, o qual descreve com detalhes diversas conversas do paciente que corroboram a continuidade da sua participação na organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense nos anos de 2021 e 2022, quando já havia atingido a maioridade penal, sendo, por conseguinte, inteiramente imputável."

A respeito, colaciono julgado desta Corte:

HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADO PELA SUPOSTA PARTICIPAÇÃO NA PRÁTICA DE CRIME DE INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA (ARTIGO 2º, §§ 2º E 4º, I E IV, DA LEI N. 12.850/2013).- INIMPUTABILIDADE. ENTENDIMENTO DE QUE A PARTICIPAÇÃO DO PACIENTE NA DITA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ESTÁ BASEADA EM PROVAS COLHIDAS QUANDO ADOLESCENTE. NÃO OCORRÊNCIA. CONQUANTO A DECISÃO VERGASTADA EFETIVAMENTE MENCIONE FATOS OCORRIDOS EM 2019, APONTA A EXISTÊNCIA DE VESTÍGIOS DA PRÁTICA DE CRIME PERMANENTE, QUE SE ESTENDEU ATÉ A DETENÇÃO DO PACIENTE EM 30 DE JULHO DE 2021, QUANDO JÁ HAVIA ATINGIDO A MAIORIDADE PENAL, SENDO, DESTARTE, INTEIRAMENTE IMPUTÁVEL. "DADA A NATUREZA PERMANENTE DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, NÃO HÁ FALAR EM AUSÊNCIA DE CONTEMPORANEIDADE QUANDO DEMONSTRADOS INDÍCIOS DE QUE GRUPO CRIMINOSO AINDA ESTAVA EM OPERAÇÃO NA DATA DE CUMPRIMENTO DE MANDADO DE PRISÃO CAUTELAR" (STJ, AGRG NO RHC N. 133.877/PR, REL. MIN. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, J. 04/05/2021).[...]- WRIT CONHECIDO. ORDEM DENEGADA. (Habeas Corpus Criminal n. 5045401-59.2021.8.24.0000, rel. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Primeira Câmara Criminal, j. 16-09-2021).

Logo, não há que se falar em constrangimento ilegal ante a hipótese de inimputabilidade.

Pois bem.

Extrai-se dos autos que o paciente responde à ação penal n. 5063829-83.2022.8.24.0023 que tramita perante a Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca de Florianópolis, por suposta prática dos crimes tipificados no art. 2º, §§ 2º, 3º e 4º, I e IV, da Lei n. 12.850/2013.

Após requerimento da autoridade policial e manifestação do representante do Ministério Público, o juízo a quo converteu a prisão temporária em preventiva com base na garantia da ordem pública, consubstanciada na gravidade concreta do delito ante o modus operandi da conduta, o que fez sob o seguinte fundamento (evento 17 - autos n. 5063829-83.2022.8.24.0023):

[...] 22. Trato, neste ponto, da representação pela decretação da prisão preventiva dos acusados Gabriel Schroeder, Suellen Cristina da Silva, Wesley Magalhães, Michael Magalhães, Vanessa Valsalete Matias, Deivid Buchele dos Santos, Valter Paulo Magalhães, Ederson Euclides dos Santos, Gabrielle Francine da Silva, João Carlos Gomes Daniel, Daniela Conceição Gonçalves, Maria da Silva Pires Sabino Moreira, Fábio da Silva Moreira, Camila Aparecida Oliveira Doarte, Fabrício Couto dos Santos, Andriele de Jesus, Rendrius Pinheiro de Jesus, Caetano Demski Carbone, João Vítor dos Santos Satti Valério, Luiz Eduardo Schneider Barbosa, Carlos Henrique Rodrigues Lopes, Darlise Contreira Rodrigues, Kimberly Pinto Gonzaga, Guilherme Silveira da Fontoura, Bianca Gonçalves dos Santos de Souza, Bruna Daiane Domingos Santos, Gabrielle Muller Gonçalves, Nathália Moraes Ávila Marques, Nilva Gomes Moraes, Amanda Luísa da Silva, Taywan Nunes da Silva, Jonathan Volaco, Adriano Balthazar dos Santos, Cristhyan Andrey da Silva, Júlio César Santos Moraes, Júlio Marcos da Silva, Júlio David dos Passos Machado, Edimar Belmiro, Victor Coutinho Medeiros, German Gabriel Villarruel, Vlanderson Lima Tavares, José Felipe Araújo Xavier, Matheus Traversa Serena, Brayan da Silva Pereira, Maurício Orides Coelho Lima, Gean Moreira Lopes, Leonardo Schein Pfeuffer, João Marcos Daeski, Maycon Seberino, Daniel Cruz Oliveira, Karolliny Marques Silveira, Weverson dos Santos Acosta, Desirée Castro Magalhães, Rafael Carbone, Wilson Ribeiro Martins, João Vítor Pereira, Kaique Iure Morais e Yorran Terra Sosa Giraldez formulada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina no evento 1, parecer 2.

No caso concreto, trata-se de investigação relacionada ao Procedimento Investigatório Criminal n. 06.2020.00002458-8 instaurado para apurar a prática do crime de participação em organização criminosa por integrantes do Primeiro Grupo Catarinense (PGC), com atuação no bairro de Canasvieiras, na cidade de Florianópolis.

Registra-se que, nos autos originários n. 5043363-39.2020.8.24.0023, restou deferido por este Juízo três períodos de interceptações telefônicas que possibilitou a identificação de diversos supostos integrantes do grupo e seus envolvimentos com a realização do tráfico de drogas e crimes afins.

Posteriormente, também nos autos originários, restou deferida a medida de busca e apreensão em diversos endereços dos então investigados, que resultou na apreensão de alguns aparelhos celulares, que foram alvos de relatório de extração de dados após o devido deferimento judicial pela quebra de sigilo de dados.

A partir dos dados extraídos dos aparelhos eletrônicos, identificou-se uma série de fatos novos ligando os investigados com a organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense (PGC) e com a suposta prática do crime de tráfico de drogas, entre outros crimes graves.

Sobre o Primeiro Grupo Catarinense, como já registrado em outros feitos que tramitam nesta Vara Criminal da Região Metropolitana de Florianópolis, a organização criminosa, à qual os acusados estariam vinculados, surgiu em 2003 a pretexto de se rebelar contra as condições carcerárias dos detentos na Penitenciária da Capital, muito embora essa revolta, de maneira absolutamente ilegítima, tenha voltado seu foco para a prática de crimes. Pelo que se tem conhecimento, o grupo possui um estatuto que rege suas atividades e uma estrutura de hierarquia e poder bem definidos.

O Primeiro Ministério é composto por 05 (cinco) integrantes, eleitos por integrantes do grupo criminosa, com vitaliciedade no cargo. O Segundo Ministério tem número variado e é composto por indivíduos que estejam detidos na Penitenciária de São Pedro de Alcântara. Segue a estrutura com os Sintonias e os Disciplinas, responsáveis por colocar em prática os desígnios do grupo e exercer o comando das regiões em que estabelecida a facção.

Para a consecução de seus objetivos se organizam para a prática dos mais diversos ilícitos, especialmente tráfico de entorpecentes e crimes patrimoniais. Parte do "lucro" da atividade criminosa é destinada para a própria facção em forma de "dízimo". Esses valores financiam a compra de "matéria prima" (leia-se: drogas e armas), além da manutenção da família dos integrantes presos e até mesmo pagamento de defesa técnica.

A...

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