Acórdão Nº 5031754-60.2022.8.24.0000 do Quinta Câmara Criminal, 07-07-2022

Número do processo5031754-60.2022.8.24.0000
Data07 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Habeas Corpus Criminal Nº 5031754-60.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ NERI OLIVEIRA DE SOUZA

PACIENTE/IMPETRANTE: GABRIELLE MULLER GONCALVES (Paciente do H.C) REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: JORDANO SCHMIDT AVILA HANSEL (Impetrante do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca de Florianópolis

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado pelo advogado Jordano Schmidt Avila Hansel, em favor de Gabrielle Muller Goncalves, presa preventivamente e denunciada pela suposta prática do crime descrito no art. 2º, § 2º e § 4º, I e IV, da Lei n. 12.850/2013.

Em síntese, o impetrante afirma que a paciente está sofrendo constrangimento ilegal em virtude de ato supostamente ilegal praticado pelo Juízo da Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca de Florianópolis na ação penal n. 5063829-83.2022.8.24.0023, que decretou a sua prisão preventiva.

Para tanto, sustenta que os requisitos autorizadores da segregação cautelar previstos no art. 312 e art. 313 do Código de Processo Penal não se fazem presentes, bem como que a decisão está pautada em meras suposições, porquanto não encontra amparo nos elementos probatórios coligidos e baseou-se na gravidade do delito.

Aduz que a denúncia é genérica e pondera acerca do mérito, no sentido de que "a paciente não está envolvida de forma alguma com organizações criminosas, tampouco com tráfico de drogas, conforme bem salienta a ausência de prova material, efetiva e eficaz de sua participação."

Aponta, inclusive que o decreto preventivo visa antecipar eventual reprimenda a ser fixada, afrontando o princípio da homogeneidade, pois "patente a ilegalidade da prisão preventiva quando a medida cautelar for mais severa do que eventual pena aplicada ao final do processo."

Argumenta que Gabrielle é primária, possui bons predicados sociais e labor lícito, encontrando-se segregada apenas em virtude desta ação penal, cujas investigações referem-se a fatos apurados no decorrer do ano de 2020, circunstância que não evidencia a necessidade da prisão a priori.

Discorre sobre o vínculo empregatício da paciente, atuando esta como recepcionista de uma academia (evento 1 - carteira de trabalho 2; declaração 6) e, como se encontra afastada do serviço, corre o risco de ficar desempregada, motivo pelo qual, pugna seja posta imediatamente em liberdade, ou mediante fixação de medidas cautelares diversas da prisão, pois não oferece qualquer risco à ordem pública, comprometendo-se a cumpri-las integralmente e, ainda, cooperar com a instrução criminal.

Nesses termos, justifica estarem presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, motivo pelo qual requer seja provida a liminar, a fim de revogar os comandos constritivos e, por fim, a concessão definitiva da ordem. Alternativamente, busca a "conversão da prisão preventiva em prisão domiciliar, com autorização para o labor externo" (evento 1).

Indeferido o pedido liminar e dispensadas informações (evento 66), a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer lavrado pela Excelentíssimo Procurador de Justiça Sr. Dr. Francisco Bissoli Filho, manifestou-se pela denegação da ordem (evento 70).

É o breve relato.

VOTO

Ab initio, imperioso relembrar que o habeas corpus é remédio constitucional que visa tutelar a liberdade corpórea do indivíduo, o seu direito de locomoção. Não é ele, pois, instrumento adequado para se antecipar a possível condenação, cingindo sua análise tão somente à ilegalidade ou não de ato constritivo de liberdade de locomoção.

Sendo assim, a alegação sobre eventuais provas da inocência ou de que a prisão preventiva não guarda a necessária homogeneidade com o resultado final do processo, não devem ser conhecidas.

In casu, insofismável que determinadas questões envolvem exame exaustivo de provas, cujo trabalho é pertinente ao magistrado a quo, que julgará o mérito da ação penal.

Neste sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

Revela-se inviável a análise de eventual pena ou regime a serem aplicados em caso de condenação, a fim de determinar possível desproporcionalidade da prisão cautelar, uma vez que tal exame deve ficar reservado ao Juízo de origem, que realizará cognição exauriente dos fatos e provas apresentados no caso concreto. (RHC 110.434/MG, Rel. Min. Felix Fischer, Quinta Turma, j. 23-04-2019, DJe 03-05-2019).

E o entendimento deste Tribunal de Justiça não destoa:

HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. PRÁTICA, EM TESE, DOS CRIMES PREVISTOS NO ART. 157, § 2º, II, E § 2º-A, DO CP E 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/06 (ESTE EXCLUSIVAMENTE NO QUE TANGE AO PACIENTE P. H. DE O. B.). PRETENSA REVOGAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADO CONSTRANGIMENTO ILEGAL POR PARTE DO JUÍZO. (...) III - É MANIFESTAMENTE INSUBSISTENTE A ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA HOMOGENEIDADE, POIS O HABEAS CORPUS NÃO É VIA ADEQUADA PARA SE ANTECIPAR A POSSÍVEL CONDENAÇÃO E PROJETAR PROVÁVEL PENA. QUESTÃO JURÍDICA DE NATUREZA CAUTELAR QUE É ORIENTADA POR PRESSUPOSTOS PRÓPRIOS, DIVERSOS DAQUELES QUE ORIENTAM A FORMAÇÃO DO JUÍZO DE CONDENAÇÃO E SUBSEQUENTE INDIVIDUALIZAÇÃO DA REPRIMENDA. (Habeas Corpus Criminal n. 5055296-44.2021.8.24.0000, rel. Júlio César Machado Ferreira de Melo, Terceira Câmara Criminal, j. 26-10-2021).

Portanto, deixo de conhecer do writ neste ponto.

Outrossim, registro que é pacífico o entendimento desta Corte de que a insurgência afeta à concessão da prisão domiciliar deve ser apreciada, num primeiro momento, pelo Juízo singular, sob pena de supressão de instância, circunstância que não ocorreu no presente caso.

Nesse sentido, este Tribunal julgou: Habeas Corpus Criminal n. 5019000-86.2022.8.24.0000, rel. José Everaldo Silva, Quarta Câmara Criminal, j. 05-05-2022; Habeas Corpus Criminal n. 5013943-24.2021.8.24.0000, rel. Júlio César Machado Ferreira de Melo, Terceira Câmara Criminal, j. 13-04-2021; e Habeas Corpus Criminal n. 5015400-91.2021.8.24.0000, rel. Sidney Eloy Dalabrida, Quarta Câmara Criminal, j. 13-05-2021.

Logo, deixo também de conhecer da ordem neste ponto.

Passo ao mérito da impetração.

Extrai-se dos autos que a paciente Gabrielle Muller Gonçalves responde à ação penal n. 5063829-83.2022.8.24.0023 que tramita na Vara Criminal da Região Metropolitana da Comarca de Florianópolis, por suposta prática dos crimes tipificados no art. 2º, § 2º e § 4º, I e IV, da Lei n. 12.850/2013.

Após requerimento da autoridade policial e manifestação do representante do Ministério Público, o juízo a quo converteu a prisão temporária em preventiva com base na garantia da ordem pública, consubstanciada na gravidade concreta do delito ante o modus operandi da conduta, o que fez sob o seguinte fundamento (evento 17 - autos n. 5063829-83.2022.8.24.0023):

[...] 22. Trato, neste ponto, da representação pela decretação da prisão preventiva dos acusados Gabriel Schroeder, Suellen Cristina da Silva, Wesley Magalhães, Michael Magalhães, Vanessa Valsalete Matias, Deivid Buchele dos Santos, Valter Paulo Magalhães, Ederson Euclides dos Santos, Gabrielle Francine da Silva, João Carlos Gomes Daniel, Daniela Conceição Gonçalves, Maria da Silva Pires Sabino Moreira, Fábio da Silva Moreira, Camila Aparecida Oliveira Doarte, Fabrício Couto dos Santos, Andriele de Jesus, Rendrius Pinheiro de Jesus, Caetano Demski Carbone, João Vítor dos Santos Satti Valério, Luiz Eduardo Schneider Barbosa, Carlos Henrique Rodrigues Lopes, Darlise Contreira Rodrigues, Kimberly Pinto Gonzaga, Guilherme Silveira da Fontoura, Bianca Gonçalves dos Santos de Souza, Bruna Daiane Domingos Santos, Gabrielle Muller Gonçalves, Nathália Moraes Ávila Marques, Nilva Gomes Moraes, Amanda Luísa da Silva, Taywan Nunes da Silva, Jonathan Volaco, Adriano Balthazar dos Santos, Cristhyan Andrey da Silva, Júlio César Santos Moraes, Júlio Marcos da Silva, Júlio David dos Passos Machado, Edimar Belmiro, Victor Coutinho Medeiros, German Gabriel Villarruel, Vlanderson Lima Tavares, José Felipe Araújo Xavier, Matheus Traversa Serena, Brayan da Silva Pereira, Maurício Orides Coelho Lima, Gean Moreira Lopes, Leonardo Schein Pfeuffer, João Marcos Daeski, Maycon Seberino, Daniel Cruz Oliveira, Karolliny Marques Silveira, Weverson dos Santos Acosta, Desirée Castro Magalhães, Rafael Carbone, Wilson Ribeiro Martins, João Vítor Pereira, Kaique Iure Morais e Yorran Terra Sosa Giraldez formulada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina no evento 1, parecer 2.

No caso concreto, trata-se de investigação relacionada ao Procedimento Investigatório Criminal n. 06.2020.00002458-8 instaurado para apurar a prática do crime de participação em organização criminosa por integrantes do Primeiro Grupo Catarinense (PGC), com atuação no bairro de Canasvieiras, na cidade de Florianópolis.

Registra-se que, nos autos originários n. 5043363-39.2020.8.24.0023, restou deferido por este Juízo três períodos de interceptações telefônicas que possibilitou a identificação de diversos supostos integrantes do grupo e seus envolvimentos com a realização do tráfico de drogas e crimes afins.

Posteriormente, também nos autos originários, restou deferida a medida de busca e apreensão em diversos endereços dos então investigados, que resultou na apreensão de alguns aparelhos celulares, que foram alvos de relatório de extração de dados após o devido deferimento judicial pela quebra de sigilo de dados.

A partir dos dados extraídos dos aparelhos eletrônicos, identificou-se uma série de fatos novos ligando os investigados com a organização criminosa Primeiro Grupo Catarinense (PGC) e com a suposta prática do crime de tráfico de drogas, entre outros crimes graves.

Sobre o Primeiro Grupo Catarinense, como já registrado em outros feitos que tramitam nesta Vara Criminal da Região Metropolitana de Florianópolis, a organização criminosa, à qual os acusados estariam vinculados, surgiu em 2003 a pretexto de se rebelar contra as condições carcerárias dos detentos na Penitenciária da Capital, muito embora essa revolta, de maneira...

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