Acórdão Nº 5031917-23.2022.8.24.0038 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 21-03-2024

Número do processo5031917-23.2022.8.24.0038
Data21 Março 2024
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5031917-23.2022.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador ROCHA CARDOSO


APELANTE: L. M. COSTA FARIA & CIA LTDA (RÉU) APELADO: ACCESS GLOBAL LOGISTICS TRANSPORTE INTERNACIONAL LTDA (AUTOR)


RELATÓRIO


Tratam os autos de recurso de apelação interposto em face de sentença que julgou procedentes os pedidos deduzidos na ação de cobrança.
Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:
ACCESS GLOBAL LOGISTICS TRANSPORTE INTERNACIONAL LTDA ajuizou a presente ação pelo procedimento comum contra L. M. COSTA FARIA & CIA LTDA, aduzindo, em síntese, a contratação de seus serviços para organização de transporte marítimo internacional de carga exportada pela ré entre o Porto de Navegantes, no Brasil, e o Porto de Houston, nos Estados Unidos. Esclareceu ainda que, nada obstante entregue a carga no destino, não foi lá retirada pela destinatária. Por fim, informou sobre a falta de pagamento do custo do transporte e demais despesas. Daí o pedido de cobrança. Procuração e documentos vieram aos autos.
Citada, a ré ofereceu resposta em forma de contestação e nela arguiu a preliminar de imprestabilidade da juntada de documentos em língua estrangeira desacompanhados da tradução respectiva, a ilegitimidade passiva e a falta de interesse de agir para cobrança de demurrage e detention, enquanto no mérito discorreu sobre a inexistência de obrigação legal ou contratual a autorizar a cobrança pretendida pela autora. Por fim, pugnou a improcedência, ou o chamamento ao processo da transportadora Contlog Logística e Comércio Exterior.
Houve réplica.
Sobreveio a juntada de documento pela autora, acerca do qual se manifestou a ré.
O dispositivo da decisão restou assim redigido:
Diante do exposto, julgo procedente o pedido para condenar a ré ao pagamento, em favor da autora, da importância de US$ 37.734,82 (trinta e sete mil, setecentos e trinta e quatro dólares norte-americanos e oitenta e dois centavos), convertida à moeda corrente nacional na data do efetivo pagamento e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação (v. TJSC, AC nº 0018354-48.2011.8.24.0033, de Itajaí, Rel. Des. Jaime Machado Junior). Arca a ré, ainda, com as custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do proveito econômico obtido pela autora (art. 85, § 2º do CPC).
Irresignada, a empresa ré interpôs recurso (evento 36 autos origem) sustentando, em apertada síntese, a) nulidade da sentença por ter sido proferida em sede de julgamento antecipado sem oportunizar a produção de provas e cerceando o direito de defesa; b) ilegitimidade passiva ad causa, visto que não integrou as negociações, muito menos assinou documentos que a pudessem colocar na condição de garante, e que a responsabilidade pelos prejuízos são de exclusividade da empresa importadora e adquirente dos produtos comercializados; c) falta de interesse processual da parte autora para pleitear a cobrança de despesas que não provou ter antecipado; d) inépcia da petição inicial, na medida em que a parte autora fundamentou sua ação com base em documentos redigidos em língua estrangeira, os quais não foram traduzidos para a língua portuguesa como manda o parágrafo único do art. 192 do CPC; e) no mérito, busca pela improcedência do pedido de cobrança por não ser a apelante a responsável pelas despesas, no que deve prevalecer a pacta sunt servanda, dado que o contrato foi firmado com a incoterm ex works, condição que era de conhecimento da apelada e que anuiu com os riscos do negócio.
As contrarrazões ao apelo foram oferecidas (evento 42 autos origem).
Vieram conclusos.
Este é o relatório

VOTO


Versam os autos sobre cobrança no valor de US$ 37.734,82, à título de "collect fee", "detention", "demurrage" e "abandono", por conta de transporte marítimo internacional de mercadorias da RÉ para o exterior, carga essa acondicionada no Contêiner n. CXRU1326300 e conforme Conhecimento de Transporte n. ACCESS21C01607.
Cediço que o ordenamento processual confere ao julgador a qualidade de destinatário da prova, cumprindo ao Magistrado o indeferimento das diligências desnecessárias à composição da controvérsia, em observância ao princípio do livre convencimento motivado, previsto no art. 131 do CDC antecedente: "O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento" - cujo conteúdo corresponde, em parte, aos artigos 369, 370 e 371 do novo Digesto Processual.
Segundo ensinamento do professor Humberto Theodoro Júnior, "por se tratar de garantia fundamental, não pode agir o juiz de maneira excessivamente rígida no indeferimento de pedido de prova", e, portanto, apenas "quando se evidenciar o descabimento ou a inutilidade da prova, é que sua inadmissão será legítima", concluindo que, além "desse quadro, configura-se o cerceamento do direito à ampla defesa, cuja consequência refletirá sobre a decisão que resolver o mérito da causa, acarretando-lhe a nulidade" (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. 58ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 876).
No caso em tela, não há que se acolher a tese de nulidade da sentença por cerceamento de defesa em decorrência do julgamento antecipado da lide; isso porque todas as provas existentes nos autos são suficientes para a correta compreensão e deslinde do feito.
Nessa linha:
APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO BANCO EMBARGADO. CERCEAMENTO DE DEFESA EM RAZÃO DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. MATÉRIA A SER DISCUTIDA UNICAMENTE DE DIREITO. PROVAS SUFICIENTES PARA JULGAMENTO DO FEITO. SENTENÇA MANTIDA. PLEITO EM CONTRARRAZÕES. CONDENAÇÃO DA PARTE APELANTE POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO ACOLHIMENTO. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO DE RECORRER. HIPÓTESES DO ART. 80 DO CPC NÃO VERIFICADAS NO CASO CONCRETO.RECURSO NÃO PROVIDO.(TJSC, Apelação n. 0300730-28.2019.8.24.0001, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Roberto Lucas Pacheco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. em 2-6-2022, grifou-se).
Rechaça-se, assim, a proemial aventada de cerceio de defesa.
Diz a parte recorrente não ter integrado as negociações, muito menos assinado documentos que pudessem a colocar na condição de garante, razão pela qual entende ser parte ilegítima para figurar no feito, já que a responsabilidade pelos prejuízos são de exclusividade da empresa importadora e adquirente dos produtos comercializados.
A legitimidade ad causam, tida pelo ordenamento processual civil vigente se tratar de uma das condições da ação, é a qualidade indispensável para que o autor e o réu figurem no polo ativo e passivo do processo, ou seja, é um atributo jurídico conferido para se atuar na lide, travando-se, assim, discussão envolvendo determinada situação jurídica.
Prediz o art. 17 do Código de Ritos:
Art. 17. Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade.
Para HorácioWanderlei Rodrigues:
A legitimidade para a causa, também denominada legitimidade ad causam, é a condição da ação que consiste na titularidade do direito instrumental de ação a ser utilizado para deflagrar o processo (Teoria geral do processo / Eduardo de Avelar Lamy. - 5. ed. rev. e atual. - São Paulo: Atlas. 2018, p.143).
Na presente situação, contrariamente à argumentação tecida pela parte recorre, detém ela legitimidade passiva ad causam respondendo pela ação de cobrança no valor de US$ 37.734,82, a título de " collect fee", "detention", "demurrage" e "abandono" (evento 1, fatura 7, autos origem), por conta de transporte marítimo internacional de mercadorias por ela produzida e remetida ao exterior em vista de negócio jurídico por ela firmado.
Ainda que venha a recorrente sustentar não ter participado efetivamente da negociação envolvendo o transporte da mercadoria ao exterior, imputando a responsabilidade à empresa adquirente dos produtos, deve prevalecer o entendimento perfilado pelo magistrado em sua bem lançada sentença de ser aplicável ao caso a teoria da asserção, onde essa "... defende que as questões relacionadas às condições da ação, como a legitimidade passiva, são aferidas à luz do que o autor afirma na petição inicial, adstritas ao exame da possibilidade, em tese, da existência do vínculo jurídico-obrigacional entre as partes, e não do direito provado. 2. O interesse processual é representado pelas ideias de necessidade e utilidade. A necessidade está atrelada à existência de litígio, ou seja, de um conflito de interesses resistido. A utilidade está presente sempre que a tutela jurisdicional for apta a fornecer ao autor alguma vantagem, proveito" (TJDFT, Acórdão 1256870, 00347872720168070001, Relator: HECTOR VALVERDE, 5ª Turma Cível, j. em 17/6/2020, publicado no PJe: 26/6/2020).
Do STJ se colhe que, "À luz da teoria da asserção, o exame aprofundado das circunstâncias da causa, a fim de verificar a ilegitimidade da parte, constitui julgamento de mérito" (AgInt no AREsp 861.548/MA, Relator Ministro LÁZARO...

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