Acórdão Nº 5032449-31.2021.8.24.0038 do Quinta Câmara de Direito Comercial, 22-09-2022

Número do processo5032449-31.2021.8.24.0038
Data22 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5032449-31.2021.8.24.0038/SC

RELATORA: Desembargadora SORAYA NUNES LINS

APELANTE: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU) APELADO: PEDRO DA COSTA (AUTOR)

RELATÓRIO

PEDRO DA COSTA ajuizou "ação declaratória de nulidade de ato jurídico, devolução de valores cobrados indevidamente em dobro e danos morais" contra BANCO SANTANDER S.A., por meio da qual requer a declaração de inexistência da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável; a repetição em dobro do montante descontado indevidamente; e a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais. Para tanto, alegou que i) contratou um empréstimo consignado com a parte ré; ii) por meio do pacto, vem sofrendo descontos excessivos em seu benefício previdenciário, sob a denominação "reserva de margem consignável"; iii) referida cobrança está relacionada a suposto cartão de crédito; iv) não contratou a aquisição de cartão de crédito da parte ré, tampouco autorizou os descontos; v) a cobrança é ilícita e configura a prática de venda casada (evento 1, INIC1).

Recebida a petição inicial, deferiu-se a gratuidade da justiça (evento 5, DESPADEC1).

Citada, a instituição financeira apresentou contestação (evento 13, CONT1) e juntou documentos.

Houve réplica (evento 17, RÉPLICA1).

Sentenciando (evento 20, SENT1), o Juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na exordial, nos seguintes termos:

Pelo exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo PROCEDENTE EM PARTE os pedidos formulados por PEDRO DA COSTA contra BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. e, em consequência, i) declaro a ilegalidade da reserva de margem consignável no benefício previdenciário da parte autora; ii) condeno o réu à restituição dos valores debitados do benefício previdenciário da parte autora, quantia essa que deverá ser corrigida monetariamente pelo INPC-IBGE, a partir da data do desembolso, com incidência de juros moratórios desde a citação, mediante compensação, tudo a ser apurado em execução de sentença. Eventuais valores obtidos com o mútuo e passíveis de compensação deverão observar o mesmo índice de correção monetária, ou seja, o INCP-IBGE a partir da data do desembolso; iii) condeno a instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 8.000,00 (oito mil reais), valor este acrescido de correção monetária a partir do arbitramento e juros de mora desde o evento danoso (18.02.2017, evento n. 1, extrato n. 9); iv) determino que o banco requerido se abstenha de efetuar limitação à margem crédito da parte autora a título de reserva de margem de cartão de crédito (RMC), devendo comprovar nos autos, em 15 dias, o cancelamento da limitação acima citada, sob pena de multa diária de R$ 200,00, limitada ao montante de R$ 25 mil. O termo inicial para incidência da multa será após o trânsito em julgado e deverá observar a súmula 410 do STJ.

Em virtude da sucumbência recíproca, as custas processuais deverão ser suportadas na proporção de 80% pelo réu e 20% pelo autor, arbitrando-se os honorários em 10% do valor atualizado da condenação, cabendo 80% desse montante ao procurador do autor e 20% ao procurador do banco réu. Todavia, deferidos os benefícios da gratuidade de justiça a parte autora, suspendo a exigibilidade das referidas verbas em relação a esta por cinco anos, conforme art. 98, § 3º do CPC.

Inconformado com a prestação jurisdicional, o banco requerido interpôs recurso de apelação (evento 30, APELAÇÃO1), no qual postulou: a) preliminarmente, a extinção do feito em virtude da decadência; b) a legalidade do contrato celebrado e dos descontos efetuados junto ao benefício previdenciário da parte autora, tendo o contratante aderido expressamente aos serviços de cartão de crédito consignado; c) a inexistência de abalo moral indenizável; d) o descabimento da repetição de indébito, e) a diminuição do quantum fixado a título de indenização e f) o afastamento da penalidade multa.

Apresentadas contrarrazões (evento 33, CONTRAZAP1).

Após, vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

Cuida-se de recurso de apelação cível interposto pelo BANCO SANTANDER S.A. contra a sentença prolatada pelo Juízo da 2º Vara de Direito Bancário que, nos autos da "ação declaratória de nulidade de ato jurídico, devolução de valores cobrados indevidamente em dobro e danos morais", julgou parcialmente procedentes os pedidos exordiais.

Presentes os requisitos de admissibilidade, passa-se à análise da quaestio.

1. Da preliminar da decadência

Prefacialmente, aduziu a instituição financeira o reconhecimento da decadência, defendendo que "o prazo para anulação do negócio jurídico com base no vício de consentimento em erro ou dolo é de quatro anos da data da sua celebração, de acodo com que dispõe o art. 178, inciso II, do Código Civil".

Contudo, a insurgência não merece amparo.

Isso porque, primeiramente, não se revela aplicável o instituto da decadência, uma vez que a presente demanda visa a reparação dos danos decorrentes dos descontos indevidamente lançados em benefício previdenciário, sujeita ao Código de Defesa do Consumidor, de modo que se aplica ao caso o prazo prescricional quinquenal, consoante o disposto no art. 27 do referido diploma legal, in verbis:

Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

O prazo prescricional, nas ações declaratórias de inexistência de débito cumuladas com pedidos de repetição de indébito e indenização por danos morais, tem como termo inicial a data do último desconto realizado no benefício previdenciário do consumidor, visto que se trata de contrato de prestações continuadas. Ademais, aplica-se aos referidos casos o prazo quinquenal supracitado. Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HARMONIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes (AgInt no AREsp n. 1.412.088/MS, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 27-8-2019, sem destaques no original).

E desta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. RELAÇÃO DE CONSUMO. PRAZO QUINQUENAL QUE SE INICIA NA DATA EM QUE OCORRIDO O ÚLTIMO DESCONTO. EXEGESE DO ARTIGO 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E ENTENDIMENTO ADOTADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONSUMIDOR QUE PRETENDIA OBTER EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. EFETIVAÇÃO DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). DESCONTOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DESTINADOS AO PAGAMENTO MÍNIMO INDICADO NA FATURA DO CARTÃO, RESULTANDO NA CONTRATAÇÃO DE CRÉDITO ROTATIVO. FORMA DE ADIMPLEMENTO E TAXA DE JUROS INCOMPATÍVEIS COM A MODALIDADE CONSIGNADA. PRÁTICA ABUSIVA. ADEQUAÇÃO DO CONTRATO QUE SE IMPÕE. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR. MINORAÇÃO DO QUANTUM. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5002480-15.2021.8.24.0282, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 10-02-2022).

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE DESCONTO MENSAL CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANO MORAL. CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC). PRESCRIÇÃO...

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