Acórdão Nº 5032667-08.2023.8.24.0000 do Primeira Câmara Criminal, 06-07-2023

Número do processo5032667-08.2023.8.24.0000
Data06 Julho 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualHabeas Corpus Criminal
Tipo de documentoAcórdão










Habeas Corpus Criminal Nº 5032667-08.2023.8.24.0000/SC



RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO


REPRESENTANTE LEGAL DO PACIENTE/IMPETRANTE: CÉSAR CASTELLUCCI LIMA (Impetrante do H.C) PACIENTE/IMPETRANTE: PEDRO HENZEL NETO (Paciente do H.C) IMPETRADO: Juízo da Vara Criminal da Comarca de Camboriú


RELATÓRIO


Trata-se de habeas corpus impetrado pelo advogado César Castellucci Lima em favor de Pedro Henzel Neto, tendo como autoridade coatora o Juízo da Vara Criminal da Comarca de Camboriú/SC que, nos autos da ação penal n. 5002597-28.2021.8.24.0113, em sede de segundo juízo de admissibilidade da denúncia, manteve o recebimento da peça acusatória ofertada pelo Ministério Público em face do paciente, e a prisão preventiva outrora decretada em razão do suposto envolvimento nos crimes de tráfico interestadual de drogas e organização criminosa.
Aponta o impetrante, em suma, que relevantes alterações processuais, ocorridas desde dezembro de 2022, indicam a desnecessidade da medida extrema. Nesse contexto, aduz que "A superveniente declaração da inadmissibilidade parcial das provas da denúncia que tornou-se inepta [...], aliada à manifesta nulidade absoluta das interceptações telefônicas (objeto do HC 5023567-29.2023.8.24.0000), cumulada com a absolvição sumária de alguns denunciados, multiplicada pela verificada inexistência de perigo concreto gerado pelo estado de liberdade extramuros do jovem paciente, pelo menos desde o momento em que colocado em prisão domiciliar, cumulada com sua primariedade, família constituída, residência fixa em bem de raiz e atividade empresarial, demonstram a ausência de risco à ordem pública, desde que saiu do presídio de Itajaí/SC aos 17.02.2022".
Argumenta que além da ausência de risco à ordem pública, não há perigo para a instrução processual, porque as testemunhas da acusação são policiais e o paciente jamais os ameaçou.
Pondera que diante da nulidade absoluta do processo, e amparado em lição do Supremo Tribunal Federal, orientou o paciente a retirar a tornozeleira eletrônica e a deixar no escritório de advocacia, permanecendo em local seguro até o poder judiciário decidir acerca da nulidade do feito. no ponto, sustenta que o tempo de prisão processual em processo manifestamente nulo não pode ser restituído. por isso, alega que resta afastada a necessidade da custódia cautelar para garantia da aplicação da lei penal.
Outrossim, afirma que os fundamentos do aditamento à denúncia e do decreto da prisão preventiva são praticamente os mesmos, e que validar tal situação seria admitir que toda deflagração de ação penal, de forma automática e obrigatória, ensejaria a segregação. Com isso, aduz que, em relação específica ao paciente, não restou demonstrado concreto o risco da sua liberdade, configurando-se em condenação e cumprimento de pena antecipadas.
Por tais razões, assevera que, contemporaneamente, desapareceram os motivos que justificam a prisão preventiva outrora decretada em processo evidentemente nulo, impondo-se sua revogação. De forma subsidiária, considerando o atual cenário do caderno processual e o lapso temporal transcorrido desde o ano de 2021, somado à ausência de reiteração delitiva, busca a substituição da custódia por medidas cautelares diversas, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal.
De mais a mais, visando infirmar o substrato probatório dos autos, arrazoa que inexiste base empírica de que o paciente cedeu, voluntariamente, seu endereço eletrônico (e-mail) ao corréu Peterson ou à empresa Rinen, desconhecendo o cadastro do seu e-mail no referido estabelecimento, que comercializa produtos utilizados na fabricação de drogas sintéticas. De todo modo, afirma que o paciente era inimputável na data de aquisição do produto destinado à produção de drogas.
Nesse norte, salienta que não há prova de que o produto Helional, entregue na residência da genitora do paciente, tenha sido por ele adquirido, recebido ou transportado. Ainda, no tocante aos monitoramentos, indica que o paciente possui vínculo sanguíneo com o corréu Reovaldo, que é seu irmão, justificando-se as visitas e reuniões em razão da proximidade familiar.
Assim sendo, especialmente porque ausentes os motivos que ensejaram a prisão preventiva, postula a concessão da ordem, a fim de que seja revogada ou, subsidiariamente, substituída por medidas cautelares diversas, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal (Evento 1, Petição Inicial 1).
A Procuradoria Geral de Justiça lavrou parecer por intermédio do Exmo. Dr. Ernani Dutra, manifestando-se pelo conhecimento do writ e denegação da ordem (Evento 11).
Na sequência, o impetrante apresentou impugnação ao parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, no qual, fundamentalmente, reiterou os argumentos do writ (Evento 13).
É o relatório

VOTO


Adianto que o writ não comporta deferimento.
De plano, ressalta-se que a ação de habeas corpus não se destina à discussão do mérito da imputação, reservada ao crivo do juiz natural da causa, até porque seu procedimento célere e simplificado não permite a produção e a análise aprofundada do conteúdo probatório, tampouco possibilita a participação efetiva de todos os sujeitos do processo originário. Dessa forma, no presente mandamus será analisada apenas a legalidade no que se refere à prisão outrora decretada.
No caso em apreço, verifica-se do caderno processual que, na data de 21-06-2021, a Magistrada a quo converteu a prisão temporária do paciente em preventiva, apresentando fundamentação no sentido de demonstrar existência de prova da materialidade e indícios de autoria, bem como necessidade da medida extrema para garantia da ordem pública, da aplicação da lei penal, e por conveniência da instrução criminal.
Tal deliberação, além de assegurar o preenchimento dos requisitos indispensáveis previstos nos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal, examinou a questão de forma individual e pormenorizada em relação a cada acusado. Confira-se as justificativas que ensejaram a custódia do paciente:
II. Como já destacado nas decisões dos eventos 42 e 333 dos autos n. 5001881-98.2021.8.24.0113, que determinaram as prisões temporárias dos investigados, assim como suas prorrogações, extrai-se dos autos do inquérito policial que após a Operação Psytrance, na qual foi descoberto um laboratório de drogas sintéticas na cidade de Rio dos Cedros/SC, aportaram informações na Divisão de Investigações Criminais de Balneário Camboriú - DIC, acerca de um segundo laboratório, o qual estaria instalado nesta cidade de Camboriú/SC e que teria, como seus integrantes, dentre outras pessoas, os denunciados Peterson Miguel Souza Rozini, Jair da Silva Junior, Jonathan Ricardo Paulo, Natali Amanda de Carvalho Vieira, Luiz Felipe da Silva Loch e Sergio Cesar da Melo Junior.
A fim de verificar a veracidade destas informações, a equipe do Setor de Narcóticos daquela Divisão realizou, inicialmente, diligências de monitoramento dos suspeitos e de consulta as fontes abertas e fechadas de informação, apurando-se, a partir disso, que os suspeitos possuiam antecedentes criminais pela prática do crime de tráfico de drogas sintéticas, e que alguns deles supostamente realizavam as compras de diversos equipamentos de laboratório e de grandes quantidades de produtos químicos utilizados na produção dessas drogas, conforme destacado no Relatório de Informação acostado no evento 1 dos autos acima mencionados.
Com base nos referidos elementos, a Autoridade Policial representou pela interceptação telefônica e telemática dos terminais e e-mails vinculados aos investigados (Representação nº 12/DIC-BC/2020), medida cautelar que se estendeu por quatro temporadas e possibilitou a angariação de novas informações acerca da suposta prática criminosa (Autos n. 5001095.88.2020.8.24.0113), o que também foi possível a partir da prisão de alguns dos investigados, como ocorreu com Jair da Silva Junior (APF nº 461.20.0009 - Autos nº 5011058-56.2020.8.24.0005), e da análise dos aparelhos celulares apreendidos (Relatórios de Análise do evento 1, já citado).
Como destacou a representante Ministerial, a primeira representação apresentada pela Autoridade Policial, em 18/02/2020, tinha como investigados as pessoas de Peterson, Jair, Jonathan, Natali, Luiz Felipe, Sérgio Cesar, Denise, Reovaldo e Leticia (vide ofício 165/2020/EDP - Representação n. 12/DIC-BC/2020), sendo que durante o acompanhamento das interceptações deferidas na 1ª Temporada, obtiveram-se indícios de participação dos investigados Karla, Kalu, Deivid, Patricia e Juliana, os quais desde então também passaram a ser interceptados e investigados (vide ofício 715/2020/EDF - Representação nº 12/DIC-BC/2020 - Complemento II).
Ato contínuo, com o deferimento e andamento da segunda temporada de interceptações e quebras, obtiveram-se novos indícios de que mais agentes pudessem estar envolvidos nas práticas criminosas aqui discutidas, como seriam os casos de Raissa, Gabriel Davio, José Luiz e Pedro (vide ofício 965/2020/EDF - Representação n. 12/DIC-BC/2020 - Complemento III).
Já na terceira temporada de interceptações, surgiram informações que davam conta de que a pessoa de Edenilson Luis da Silva seria, supostamente, o investigado Gustavo Machado Palma, o qual teria feito uso de nome falso para realizar a locação do sítio em que instalado o laboratório para a produção dos entorpecentes, local este posteriormente descoberto pela Policia Militar.
Já na última temporada de interceptações surgiram indícios de participação dos denunciados Emerson, Alessandra, Guilherme, Ronei, Fernando, Kauna e Juciel.
Ademais, como já exposto nas decisões outrora citadas, há indícios de que o grupo criminoso possua caráter interestadual, já que realizada técnica de ação controlada na cidade de Brasília/DF, numa ação conjunta da DIC-BC e da Coordenadoria da Repressão às Drogas (CORDs) da Polícia Civil do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT