Acórdão Nº 5034840-38.2020.8.24.0023 do Quarta Câmara Criminal, 01-07-2021

Número do processo5034840-38.2020.8.24.0023
Data01 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualRecurso em Sentido Estrito
Tipo de documentoAcórdão










Recurso em Sentido Estrito Nº 5034840-38.2020.8.24.0023/SC



RELATOR: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKO


RECORRENTE: ELISEU PEREIRA DA SILVA (ACUSADO) RECORRENTE: KEVIN WILLIAN DOS SANTOS OLIVEIRA (ACUSADO) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Trata-se de recursos em sentido estrito interpostos pelos acusados Kevin Willian dos Santos Oliveira e Eliseu Pereira da Silva, inconformados com a decisão interlocutória mista proferida pelo Juízo da Vara do Tribunal do Júri da comarca da Capital, que julgou admissível a denúncia e os pronunciou para julgamento pelo Tribunal do Júri, por infração ao art. 121, § 2º, incs. I e IV do Código Penal; art. 244-B, § 2º, da Lei 8.069/1990; e art. 2º da Lei 12.850/2013 (em relação ao primeiro acusado), e ao art. 121, §2º, incs. I e IV, do Código Penal; e art. 244-B, §2º, da Lei 8.069/1990 (segundo acusado).
Em suma, o recorrente Kevin Willian dos Santos Oliveira, assistido pela Defensoria Pública, argumentou o seguinte nas razões do recurso: [a] "ao contrário do que asseverou o Parquet em suas alegações finais, as provas testemunhais colhidas são insuficientes à uma eventual decisão de pronúncia"; [b] "é sabido que não é possível adotar suposições no processo penal, devendo haver elementos de prova robustos e suficientes para comprovar a denúncia apresentada pelo Órgão de Acusação"; [c] "terminada a instrução processual e verificando-se pelo seu contexto a inexistência de elementos hábeis a vincular o acusado à prática do delito de homicídio tentado, por três vezes, não há o que alicerce sua submissão a julgamento perante o Júri Popular, razão pela qual a despronúncia é medida que se impõe, nos moldes do art. 414 do Cânone Processual Penal"; [d] "não há provas de que as vítimas pertenciam a organizações criminosas nem que os acusados pertençam. Nota-se, portanto, que não há elementos suficientes de prova que confirme a motivação sustentada pela acusação"; [e] "não há provas que esclareçam a dinâmica dos fatos e demonstrem de forma suficiente que a vítima ficou impossibilitada de se defender"; [f] "para comprovação do injusto, como impõe a redação legislativa seria necessário que o acusado corrompesse ou facilitasse a corrupção de menor para que praticasse delitos. Apesar disso, não se verificou nos autos intercepção telefônica, conversas ou qualquer depoimento oral capaz de comprovar em primeiro lugar, a participação de menores no delito, e em segundo, a atuação do acusado em aliciar o adolescente para a prático de delitos, o que é requisito expresso do artigo"; [g] "o Parquet estadual apontou enquanto crime conexo o delito de participação em organização criminosa, no entanto, conforme observado não se comprova cabimento em tal alegação. A justificativa para o delito, conforme apontado pelo Ministério Público, seria pela dívida de drogas e não pela participação em organização criminosa diversa da que o acusado supostamente participaria, ou que o delito teria sido provocado por eventual comando de líder da organização".
Arrematou pedindo o provimento do recurso com vista à despronúncia, inclusive em relação aos crimes conexos ou, subsidiariamente, ao afastamento das qualificadoras (Evento 323).
Por sua vez, o recorrente Eliseu Pereira da Silva, assistido por defensores constituídos, alegou o seguinte nas razões do seu recurso: [a] "é incontroverso para a acusação e a defesa que Eliseu não fez parte das agressões à vítima - sua participação, segundo o parquet, limitou-se a atos verbais e, por fim, ao transporte de um corréu ao encontro fatal. Ao contrário do que se ilustrou extra processualmente, no entanto, a instrução do feito demonstrou claramente a total ausência de elementos contra Eliseu. Os indícios carreados em ser desfavor, nos depoimentos dados na fase inquisitorial, foram derruídos em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, o que deveria ter sido levado em conta - e não foi - na decisão combatida"; [b] "a sentença combatida se apoia em três dos dez depoimentos (o que significa 30% das provas acostadas ao feito) para pronunciar o réu. Em segundo lugar, como consequência lógica, os outros sete depoimentos dados em juízo (ou seja: 70% das provas dos autos), que descartam a hipótese da acusação, foram ignorados pelo MPSC e também na decisão de pronúncia, o que atenta contra a melhor elucidação dos fatos. Em terceiro lugar, dos três depoimentos mencionados na sentença em desfavor de Eliseu, NENHUM dá indícios de sua participação nos fatos: apenas ilustram que Eliseu possivelmente estaria nos arredores do local (o que é evidente, pois ali reside), e que um motoqueiro não identificado teria transportado Kevin. Nada mais"; [c] "conforme fartamente comprovado nos depoimentos em juízo, portanto, em uma análise fria e detalhada, depreende-se a impossibilidade de cogitar-se qualquer participação de Eliseu no delito de homicídio, diante da ausência de quaisquer indícios nesse sentido"; [d] "dos dez depoimentos dados em juízo, portanto, apenas dois mencionam a existência de uma moto no local (e são contraditórios entre si e também em cotejo com a tese acusatória)"; [e] "uma vez que não existem indícios suficientes de autoria em relação ao acusado, haja vista que foram desqualificados na instrução processual, não há possibilidade de pronúncia".
Concluiu requerendo o provimento do recurso, para reformar a decisão impugnada e, assim, despronunciar o acusado Eliseu Pereira da Silva (Evento 346).
Com as contrarrazões (Eventos 331 e 373 ), e mantida a decisão impugnada por seus fundamentos em atenção ao preconizado no art. 589 do Código de Processo Penal (Evento 375), os autos ascenderam a este Tribunal.
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Odil José Cota, que se manifestou pelo conhecimento e não provimento dos recursos (Evento 11 - parecer 1).
Nesta instância, a defesa constituída do recorrente Eliseu Pereira da Silva veio aos autos do presente recurso e requereu a revogação da prisão preventiva ou a substituição desta por medidas cautelares alternativas (Evento 19 - pet.1)

VOTO


Os recursos em sentido estrito concentram as condições objetivas (cabimento, adequação, tempestividade e inexistência de fatos impeditivos ou extintivos do direito recursal) e as subjetivas (interesse jurídico e legitimidade) de admissibilidade, motivo por que devem ser conhecidos.
Verifica-se dos autos que o Ministério Público do Estado de Santa Catarina (MPSC) ofereceu denúncia contra KEVIN WILLIAN DOS SANTOS OLIVEIRA, JOSÉ ADENILDO FERREIRA e ELISEU PEREIRA DA SILVA, imputando aos dois primeiros a prática dos crimes previstos no art. 121, §2º, incs. I e IV, do Código Penal; art. 244-B, §2º, da Lei 8.069/1990; e art. 2º da Lei 12.850/2013, e ao último a prática dos crimes previstos no art. 121, §2º, incs. I e IV, do Código Penal; e art. 244-B, §2º, da Lei 8.069/1990, em razão dos seguintes atos ilícitos descritos na peça acusatória e no respectivo aditamento (Eventos 1 e 59):
1 - O homicídio duplamente qualificado
No dia 19 de janeiro de 2020, por volta das 22h50min, na estrada Intendente Antônio Damasco, Ratones, nesta Capital, em frente ao estabelecimento "ki Lanches", juntamente com o adolescente Bruno Henrique Cordeiro dos Santos, vulgo "BH", mediante prévio concurso de agentes entre si, os denunciados mataram a vítima Elias da Silva. Com o objetivo de adquirir entorpecentes, usuária, a vítima deslocou-se até próximo a conhecido ponto de traficância, localizado na servidão Pedreira Joaquim, em Ratones, na companhia de seu amigo Luiz Felipe Botega, vulgo " Velhinho". Como a vítima tinha uma dívida pendente com os donos da "boca", ficou aguardando na parte de baixo do morro, enquanto seu amigo subiu para fazer a compra das drogas. Luiz Felipe foi atendido pelo denunciado Kevin, então chefe do tráfico local. Neste momento, no entanto, o denunciado Eliseu subiu o moro com uma motocicleta e avisou aos demais que a vítima Elias se encontrava próximo, na estrada geral do Ratones, aguardando o seu amigo e que a droga era para ser usada por ele também. Em função disso, diante da dívida do ofendido, o denunciado Kevim pegou o dinheiro de Luiz Henrique e desferiu-lhe um soco em represália. Luiz Henrique conseguiu fugir, no entanto. Ato contínuo, os denunciados Kevin e José Adenildo, na companhia do adolescente Bruno Henrique, desceram o morro, encontraram a vítima e agrediram-na com vários chutes e socos, desferidos indistintamente. Os agressores deixaram a vítima caída no chão e voltaram para a "boca". Neste instante, o denunciado Eliseu os instigou a matar a vítima, dizendo que se permanecesse viva iria entregá-los para a polícia. Assim, com vontade de matar, os denunciados Kevin e José Adenildo, juntamente com o adolescente Bruno Henrique, novamente desceram o morro, encontraram a vítima em frente ao "Ki Lanches", agrediram-na com novos socos e pontapés e, em seguida, desferiram-lhe várias facadas, provocando-lhe os ferimentos descritos parcialmente no boletim de ocorrência e exame em local de 1 crime (fls. 4-6 e 34, Evento 1, Inquérito 1) , os quais foram a causa da sua morte. O denunciado Eliseu concorreu para o crime, dando a localização do ofendido e instigando os demais denunciados a matá-lo, ciente de que esta é uma prática comum no submundo da traficância, em caso de dívida não quitada. Além disso, na segunda empreitada, Eliseu transportou com sua moto um dos agressores, até onde a vítima estava, embora não tenha participado diretamente das agressões.
O homicídio foi duplamente qualificado. (1) O motivo do crime foi torpe, uma vez que os denunciados Kevin e José Adenildo mataram a vítima devido a uma dívida de drogas , o que era de conhecimento do denunciado Eliseu. (2) O crime também foi executado de modo a dificultar a defesa do ofendido. Juntamente com o adolescente Bruno...

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