Acórdão Nº 5035293-34.2022.8.24.0000 do Primeira Câmara Criminal, 11-08-2022

Número do processo5035293-34.2022.8.24.0000
Data11 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualConflito de Jurisdição
Tipo de documentoAcórdão
Conflito de Jurisdição Nº 5035293-34.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador ARIOVALDO ROGÉRIO RIBEIRO DA SILVA

SUSCITANTE: Juízo da Vara de Direito Militar da Comarca da Capital - Eduardo Luz SUSCITADO: Juízo da Vara Única da Comarca de Herval d Oeste

RELATÓRIO

Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo juízo da VARA DE DIREITO MILITAR DA COMARCA DA CAPITAL, nos autos da ação penal n. 0900009-09.2016.8.24.0235, em virtude da decisão declinatória proferida pelo juízo da COMARCA DE HERVAL D'OESTE.

Argumenta que a remessa ocorreu com erronia, porquanto "a ação penal foi ajuizada para apurar, em tese, a prática de crime previsto na antiga lei de abuso de autoridade", porém, emerge do contexto dos fatos narrados, "a conduta insculpida no art. 21 da Lei de Contravenções Penais, ou seja, a contravenção penal de vias de fato", o que afasta a competência da Justiça especializada. Ao arremate, pugna pela cassação da decisão (Evento n. 1).

O incidente ascendeu a este egrégio Tribunal e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Procurador Hélio José Fiamoncini, opinou pelo conhecimento e desprovimento do conflito, para que seja declarada a competência do juízo suscitante (Evento n. 11).

Este é o relatório.

VOTO

O incidente merece ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

Em proêmio, antes de adentrar na contrariedade basilar, pontuo que entendi despicienda a requisição de informações, nos termos dos §§ 3º e 4º do artigo 166 do CPP, porquanto o processo na origem está em meio eletrônico e tenho como suficiente a prova documental que dele se extrai.

Discute-se, nos presentes autos, qual o juízo competente para processar e julgar a ação penal n. 0900009-09.2016.8.24.0235, deflagrada em razão da suposta prática de crimes de abuso de autoridade (artigos 3º, alínea "i", e 4º, alínea "h", da Lei n. 4.898/1965).

Narra a denúncia acusatória (Evento n. 19 da ação penal epigrafada, com grifos inexistentes no original):

Em 22 de janeiro de 2016, por volta das 15h00min, na rua Major Santos, n. 117, Centro desta cidade e comarca, o denunciado, Ricardo Luiz Borges de Castilhos, policial militar, praticou abuso de autoridade, atentando contra a incolumidade física de Ivanor da Costa, além de praticar ato lesivo à honra da vítima.

Na oportunidade, o denunciado, no exercício de sua função, abordou a vítima por estar trafegando em via pública com sua esposa na carona, que estava sem capacete. Inadvertidamente, Ricardo irritou-se com a vítima, passando a ofendê-la, em abuso de poder, dizendo: "Seu moleque folgado. Tá abusando e passando na nossa frente sem capacete?".

Ato contínuo, após entrarem em um escritório localizado nas imediações, a vítima começou a gravar um vídeo em seu celular, momento em que o denunciado começou a agredi-lo fisicamente, agarrando-o pelo pescoço e chegando a arranhar a vítima, além de empurrá-lo, ao tempo em que tentava retirar o celular da mão de Ivanor. Simultaneamente, afirmava que quem mandava no local era ele [...].

O feito, inicialmente processado no Juízo Criminal Comum, na Comarca de Herval d'Oeste, foi remetido à Justiça Castrense na Comarca da Capital, em face de mudança legislativa.

Perante o juízo suscitado, o representante do Ministério Público alegou (Evento n. 71 da ação penal):

[...]

I. Do crime previsto no artigo 4º alínea "h" da Lei n. 4.898/65:

O referido artigo previa o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência legal.

Ocorre que, com a entrada em vigor da Lei n. 13.869/19, ao que tudo indica, ocorreu verdadeira abolição tácita da figura típica incriminadora acima descrita.

Porquanto, analisando a recente norma jurídica, não há qualquer figura típica que se assemelhe ao dito crime apurado no presente procedimento.

Ademais, ainda que se enquadre em um dos tipos penais de crimes contra a honra previstos no Código Penal, verifica-se que decorreu o prazo de 6 (seis) meses para oferecimento da queixa crime.

Portanto, requer-se a extinção da punibilidade do agente nesse ponto.

II. Do crime previsto no artigo 3º alínea "i" da Lei n. 4.898/65:

Novamente, a Lei n. 13.869/2019 dispõe sobre os crimes de abuso de autoridade e revogou a antiga legislação (Lei n. 4.898/65) que tratava do tema, tipificando novas condutas como crime de abuso de autoridade, e deixando de tipificar diversos crimes já previstos na Lei anterior.

Em vista desse quadro, a doutrina tem falado da existência de crimes de abuso de autoridade lato sensu e stricto sensu...

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