Acórdão Nº 5035639-82.2022.8.24.0000 do Quinta Câmara de Direito Público, 13-09-2022

Número do processo5035639-82.2022.8.24.0000
Data13 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5035639-82.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador HÉLIO DO VALLE PEREIRA

AGRAVANTE: HENRIQUE CARRINHO JUNIOR AGRAVADO: MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ/SC

RELATÓRIO

Henrique Carrinho Júnior agrava de decisão pela qual se rejeitou a exceção de pré-executividade por si oposta em execução fiscal movida pelo Município de Balneário Camboriú para cobrança de créditos relativos ao Plano Comunitário de Pavimentação do exercício de 2009.

Sustenta a possibilidade de arguir a inconstitucionalidade da Lei Municipal 337/1975, que fundamenta a cobrança, em exceção de pré-executividade por se tratar de matéria de ordem pública. Cita que em outro processo que envolve as mesmas partes (autos n. 0800176- 68.2012.8.24.0005), a execução foi extinta ante a declaração de inconstitucionalidade de tal norma. Cita julgados deste Tribunal nesse sentido. Pede a extinção da execução.

Foi deferida a gratuidade (evento 4).

Em contrarrazões, a Fazenda Pública impugna a concessão da gratuidade de justiça sob argumento de que o executado não comprovou sua hipossuficiência, pois "a mera declaração de miserabilidade, não tem o condão de presumir satisfatoriamente a insuficiência de recursos". Destaca que deve ser observado o critério objetivo de três salários-mínimos previsto na Resolução 11/2018, do Conselho da Magistratura deste Tribunal. Dessa forma, a parte não faz jus ao benefício uma vez que "o imóvel objeto da dívida em execução é de valor, pois está em Balneário Camboriú, e deve ser utilizado como objeto de avaliação".

Defende que as teses arguidas pelo excipiente "dependem da apreciação de muitos documentos, certidões registros, o que significa produção de provas, itens estes que não se coadunam com uma exceção de pré-executividade, conforme já definido no TEMA 104, vinculativo, do STJ".

A dívida não envolve contribuição de melhoria, havendo quanto aos casos em que este Tribunal declarou, em controle difuso, a inconstitucionalidade da Lei Municipal 337/1975. Trata-se de negócio jurídico celebrado entre o executado e a sociedade de economia mista municipal, a Compur, para viabilizar a pavimentação asfáltica, quando há adesão da grande maioria dos moradores. Nos termos dos arts. 13 e 14 da Lei 337/1975, a empresa emite títulos cambiais para cobrar os serviços dos beneficiários e quando eles não são resgatados, o Município os reembolsa à Compur e inscreve o débito em dívida ativa para efetuar a cobrança judicial.

VOTO

1. Quem se afirma necessitado tem em seu favor presunção de veracidade.

Apenas em caso de fundada dúvida, que deverá decorrer de aspectos concretos, não de meros preconceitos, é que se deverá colocar em xeque a postulação. Além do mais, quem se beneficia da gratuidade é o autor, não o seu núcleo familiar, de sorte que um integrante da família não deve ser chamado a arcar com custos de processo que não lhe diga respeito imediatamente.

De fato, a Constituição Federal, em seu art. 5º, LXXIV, prevê que "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos".

Já o Código de Processo Civil diz o seguinte:

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.

§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.

§ 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça.

A norma processual civil, assumindo feição nitidamente liberal, consagra uma presunção de hipossuficiência a todos aqueles que assim declararem. A diretriz constitucional, é verdade, consagra o direito à assistência jurídica gratuita aos que comprovarem a pobreza. O preceito, todavia, não deve ser taxativamente delimitado apenas a partir de uma interpretação literal; é norma de eficácia contida e pode ter seu espectro de incidência conformado pela lei infraconstitucional. O Código de Processo Civil optou prestigiar - talvez sendo muito indulgente, é verdade - a boa-fé do indivíduo que se identifica como pobre, bastando, para tanto, sua manifestação nesse sentido. Isso se insere no âmbito de liberdade do legislador. Essa técnica deve ser observada. Afinal, não se poderia negar vigência à disposição sem a correspondente declaração de inconstitucionalidade.

Naturalmente, a presunção relativa pode ser afastada, mas se partindo do pressuposto de que existam elementos nos autos que desaconselhem assegurar a imunidade. Não se poderia inverter a lógica e exigir, ex ante, a comprovação sem indícios de que o requerente dispõe de recursos para litigar.

De todo modo, a descrição relativa à atual situação financeira vivenciada pelo agravante tem indicativos de precariedade econômica, sem nenhum elemento que aponte em sentido contrário. O fato de o imóvel estar localizado em Balneário Camboriú, não é suficiente para demonstrar sua capacidade econômica e perspectiva oposta deveria ter sido revelada pelo Município, mas não o fez.

Além disso, a exceção de pré-executividade prescinde do recolhimento de custas e a gratuidade de justiça foi conferida apenas para esta fase recursal (art. 98, § 5º, do CPC), inclusive para prestigiar o acesso à Justiça.

Creio que aqui, ausente elementos que revelem a verdadeira dimensão da capacidade econômica do postulante, seja conveniente prestigiar a presunção de veracidade que lhe favorece e conferir a gratuidade almejada. A negativa, a propósito, somente há de prosperar quando houver elementos concretos que retratem uma condição financeira bastante distinta daquela afirmada, o que aqui não se verificou.

Nesse sentido, já decidimos nesta Câmara:

A) AGRAVO DE INSTRUMENTO - GRATUIDADE - PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DAS AFIRMAÇÕES VINDAS DE PESSOAS FÍSICAS - GARANTIA CONSTITUCIONAL - ACESSO À JURISDIÇÃO QUE DEVE SER FACILITADO - SITUAÇÃO CONCRETA QUE AINDA BENEFICIA OS POSTULANTES.

1. A Constituição...

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