Acórdão Nº 5036501-97.2020.8.24.0008 do Primeira Câmara Criminal, 17-06-2021

Número do processo5036501-97.2020.8.24.0008
Data17 Junho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Execução Penal Nº 5036501-97.2020.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador PAULO ROBERTO SARTORATO

AGRAVANTE: ROBSON DA COSTA ALVES (AGRAVANTE) AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AGRAVADO)

RELATÓRIO

Trata-se de agravo em execução penal interposto pelo apenado Robson da Costa Alves, contra a decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Blumenau que, nos autos da Execução Provisória n. 0001170-76.2019.8.24.0008 (já em trâmite no Sistema Eletrônico de Execução Unificado - SEEU), indeferiu o pleito defensivo de progressão ao regime semiaberto, ao manter a fração de cumprimento de pena exigida para o benefício em 3/5 (três quintos), em relação ao crime hediondo pelo qual fora condenado, bem como indeferiu o pedido de remição ficta (Evento 61 dos autos da execução penal).

Nas razões de insurgência, a defesa afirma que a interpretação a ser dada às previsões contidas no art. 112 da Lei de Execução Penal, com as alterações promovidas pela Lei n. 13.964/19, é a de que a exigência de cumprimento da fração de 3/5 (três quintos) da pena - ou 60% (sessenta por cento) - deve ser aplicada apenas aos apenados reincidentes específicos em crime hediondo, destinando-se a fração de 2/5 (dois quintos) para os apenados com reincidência de natureza não específica, segundo entendimento jurisprudencial dominante.

Sustenta, assim, que o patamar de 40% (quarenta por cento), estabelecido no inciso V do art. 112 da Lei de Execução Penal, mostra-se aplicável ao caso em tela, por ser a sua reincidência genérica, não específica.

Ainda, pleiteia a remição ficta, sob a tese de interpretação pro homine, alegando que o apenado cumpre pena em estabelecimento Penitenciário Industrial, no qual poderia estar trabalhando, se não fosse a impossibilidade do labor por força maior, qual seja, a pandemia do novo coronavírus.

Sob esses argumentos, requer o conhecimento e o provimento do presente recurso, a fim de que seja reformada a decisão recorrida, alterando-se a fração de cumprimento de pena, para fins de progressão de regime, para 2/5 (dois quintos), e sendo-lhe concedida a remição ficta, pelos dias em que esteve impossibilitado de trabalhar (Evento 1 dos autos do agravo).

A decisão recorrida foi mantida pelo Juízo a quo (Evento 4 dos autos do agravo).

Em contrarrazões, o Ministério Público manifestou-se pelo conhecimento e não provimento do recurso (Evento 9 dos autos do agravo).

Após, os autos ascenderam a esta Superior Instância, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Dr. Francisco Bissoli Filho, opinado pelo parcial conhecimento do recurso e, na extensão conhecida, pelo parcial provimento, apenas para que seja reformada para 40% (quarenta por cento) a fração de cumprimento de pena exigida como requisito objetivo à progressão de regime (Evento 7 dos presentes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Cuida-se de agravo em execução penal interposto por Robson da Costa Alves, inconformado com a decisão que indeferiu os pedidos, por ele formulados, de concessão da remição ficta e de progress]ao ao regime semiaberto, em virtude da fração utilizada para a análise do requisito temporal necessário ao citado benefício.

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, o agravo de execução em tela merece conhecimento.

I - Do pedido de alteração da fração de cumprimento de pena para progressão de regime

In casu, compulsando-se os autos, vê-se que o PEC n. 0001170-76.2019.8.24.0008, que originou o presente recurso de agravo, trata da condenação do agravante às reprimendas de:

- 08 (oito) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 625 (seiscentos e vinte e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, pela prática do delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/06, proferida nos autos da ação penal n. 0001263-73.2018.8.24.0008, por fato ocorrido em 21/02/2018 (condenação ainda sem certidão de trânsito em julgado, diante do registro de pendência de julgamento de recurso especial, segundo dados constantes do Sistema E-proc). Na sentença condenatória, foi reconhecida a reincidência do acusado, em virtude da existência de quatro condenações pretéritas sofridas por ele, todas pelo cometimento de delitos comuns (Evento 10, fls. 29/30, dos autos do PEC), e

- 03 (três) anos de reclusão, em regime aberto, e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, em decorrência do cometimento do crime previsto no art. 16, caput, da Lei n. 10.286/03, levado a efeito na data de 15/08/2017. A condenação transitou em julgado no dia 23/07/2019 e, na sentença, não fora reconhecida a circunstância da reincidência (Evento 53 dos autos do PEC).

Portanto, o apenado fora condenado pela prática de crimes comuns e hediondo, e ostenta a condição de reincidente - não de natureza específica em relação a hediondez.

Acerca do requisito objetivo exigido à progressão de regime no cumprimento da reprimenda, o art. 112 da Lei de Execução Penal, na redação anterior à Lei n. 13.964/19, prescrevia que "A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão".

A Lei n. 11.464/07, que deu nova redação ao art. 2º, § 2º, da Lei n. 8.072/90 (Lei de Crimes Hediondos), introduziu regramento específico para a progressão de regime aos condenados por crimes hediondos e equiparados, atribuindo como critério objetivo o cumprimento da fração de 2/5 (dois quintos) da pena ao apenado primário e 3/5 (três quintos) ao reincidente.

A esse respeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça afirmava, ainda, que "[...] a reincidência é circunstância pessoal que interfere na execução como um todo. Sendo assim, a condição de reincidente, uma vez adquirida pelo sentenciado, estende-se sobre a totalidade das penas somadas, não se justificando a consideração isolada de cada condenação e tampouco a aplicação de percentuais diferentes para cada uma das reprimendas (HC n. 307.180/RS, Ministro Felix Fisher, Quinta Turma, DJe 13/5/2015)". (AgRg no Habeas Corpus n. 506.275/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. em 04/02/2020).

A Lei n. 13.964/19, ao editar tanto a Lei de Crimes Hediondos quanto o art. 112 da Lei de Execução Penal, trouxe novo tratamento à matéria, prevendo novos requisitos de ordem objetiva ao deferimento do benefício, a saber:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça; IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça; V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário; VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for: a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional; b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada; VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado; VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional (grifos não originais).

Segundo a defesa argumenta, a nova norma garantiria ao apenado a progressão de regime com o cumprimento de apenas 40% (quarenta por cento), ou 2/5 (dois quintos), da pena, já que a previsão contida no inciso VII do art. 112 da Lei de Execução Penal seria destinada somente àqueles que ostentem a condição de reincidentes na prática de crimes hediondos (ou seja, seria aplicável apenas às hipóteses de reincidência específica).

Em verdade, com o advento das alterações promovidas pela Lei n. 13.964/19, diferentes posicionamentos passaram a ser sufragados tanto na doutrina quanto na jurisprudência pátrias.

Este Relator, considerando a lacuna existente na atual redação dos incisos do art. 112 da Lei de Execução Penal e realizando uma interpretação sistemática e teleológica da nova legislação, partilhava, até então, da compreensão de que, tratando-se de réu reincidente e condenado pela prática de delito hediondo ou equiparado, o requisito objetivo à progressão, fosse à luz do regramento antigo, fosse com base na nova lei, só seria alcançado com o cumprimento de 60% (sessenta por cento), ou 3/5 (três quintos), da reprimenda.

Entendia que o referido requisito seria aplicável a qualquer agente reincidente que houvesse sido condenado pela prática de ilícito hediondo ou assemelhado - sobretudo porque, "[...] caso o legislador realmente tivesse a intenção em se referir apenas à reincidência específica para fins de progressão de regime, tal qual previsto no art. 112 da Lei de Execução Penal, por óbvio que assim faria expressamente, conforme sucedeu, por exemplo, com o art. 44, § 3º, do Código Penal, oportunidade em que consta de maneira expressa a disposição 'prática do mesmo crime" (TJSC - Agravo de Execução...

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