Acórdão Nº 5036982-15.2020.8.24.0023 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 17-11-2022

Número do processo5036982-15.2020.8.24.0023
Data17 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 5036982-15.2020.8.24.0023/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5036982-15.2020.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA

APELANTE: OI S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL (RÉU) ADVOGADO: EVERALDO LUÍS RESTANHO (OAB SC009195) APELADO: CLOTILDES INDELICIA GONCALVES (AUTOR) ADVOGADO: MAIKO ROBERTO MAIER (OAB SC031939)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida pelo Juízo de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Florianópolis (Dr. Marcelo Elias Naschenweng), na ação de adimplemento contratual (subscrição das ações da telefonia fixa e móvel) proposta por Clotildes Indelicia Gonçalves contra Oi S/A em Recuperação Judicial, a qual acolheu julgou a pretensão inicial procedente.

A Brasil Telecom S.A. (OI S.A. defende, em suas razões, que:

a) inexiste irregularidades nas emissões das ações decorrentes dos Contratos da modalidade PCT - Recurso Repetitivo Nº 1.391.089/rs - Precedente do STJ: Resp 1.742.233/SP

b) o VPA a ser utilizado para os cálculos da Telefonia Celular, deverá ser apurada a quantidade de ações a que a parte autora teria direito, quando efetuado o cálculo com base no balancete do mês do primeiro ou único pagamento;

c) "o cálculo dos dividendos deve ter como limite a data utilizada como cotação para indenizar as ações, pois a partir desta data o autor não tem mais direito às ações, passando do status de acionista para credor, assim, não sendo possuidor das mesmas, não há dividendos a serem pagos, já que estes são provenientes do número de ações" (p.13)

Pautou pelo provimento do recurso de apelação.

Embora devidamente intimada, a parte deixou transcorrer in albis o prazo para apresentação das contrarrazões.

Este é o relatório.

VOTO

I. Admissibilidade

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

II. Breve elucidação da matéria

(a) Origem das demandas judiciais de subscrição de ações

O setor de telecomunicações, no País, sempre foi explorado direta e exclusivamente pela União, na forma da Lei nº 4.117, de 27 de agosto de 1962.

O estabelecimento do controle estatal sobre o sistema de telecomunicações se consolidou com a criação do Ministério das Comunicações em 1967 e da empresa Telecomunicações Brasileiras S.A. (Telebrás) em 1972.

Com o objetivo de oferecer um melhor serviço no mercado de consumo, foi editada a Lei das Telecomunicações, nº 9.472, de 16 de julho de 1997, durante o governo do então Presidente Fernando Henrique Cardoso e, em 1998, o Sistema Telebrás foi privatizado, transformando-se em 12 companhias - divididas por regiões do País - que foram levadas a leilão, além da própria Telebrás.

São elas:

(1) Telesp Participações S.A. (mudou inicialmente para Telecomunicações de São Paulo S.A. - TELESP, atual Telefônica Brasil S.A.);

(2) Tele Centro Sul Participações S.A. (atual Brasil Telecom S.A.);

(3) Tele Norte Leste Participações S.A., que cindiu e formou a Contax Participações S.A.;

(4) Embratel Participações S.A.;

(5) Telesp Celular Participações S.A. (atual Vivo Participações S.A);

(6) Tele Sudeste Celular Participações S.A. (incorporada à Vivo Participações S.A.);

(7) Telemig Celular Participações S.A. (incorporada à Vivo Participações S.A.);

(8) Tele Sul Participações S.A. (atual Tim Participações S.A.);

(9) Tele Nordeste Celular Participações S.A. (incorporada pela Tele Sul Participações S.A.);

(10) Tele Leste Celular Participações S.A. (incorporada à Vivo Participações S.A.);

(11) Tele Centro Oeste Celular Participações S.A. (subsidiária da Vivo Participações S.A.); e,

(12) Tele Norte Celular Participações S.A.

Dentre as companhias que surgiram, destaca-se a Tele Centro Sul Participações S.A., que veio a incorporar a Telesc S.A., atualmente Brasil Telecom S.A. (OI S.A.).

Porém, mesmo antes do marco da privatização no País, a União, ainda que de forma deficitária, tentava impulsionar o crescimento do setor.

Para tanto, oferecia aos consumidores o direito ao uso de um terminal telefônico, cujos contratos, de adesão, igualmente garantiam uma participação acionária em contrapartida à integralização de um capital na companhia.

Estes contratos eram regulados por Portarias Ministeriais (Portarias nº 86/91 e 117/91) e na época existiam dois planos de financiamento utilizados: o Plano de Expansão - PEX e a Planta Comunitária de Telefonia - PCT.

Basicamente, ao passo que o primeiro estabelecia a utilização de uma linha telefônica, a segunda forma de pactuação voltava-se à implementação ou à extensão de toda uma rede de telefonia por uma comunidade. Ambas as formas, todavia, se davam mediante a integralização de um capital à companhia.

Em resumo, o contrato de participação financeira, no sistema de telefonia até então vigente, continha dois objetos distintos: a habilitação de uma (ou várias) linha telefônica e a subscrição de ações da empresa de telefonia.

Importante observar que este sistema de negociação (linha telefônica + direito às ações da companhia) surtiu efeitos até a edição da Portaria nº 261/97 do Ministério das Comunicações, a qual passou a estabelecer:

Art. 2º. (...) a partir de 05 de maio de 1997, a tomada de assinatura do serviço telefônico público fica condicionada ao pagamento da tarifa de habilitação, ressalvado o disposto no art. 4º desta Portaria.(...)Art. 4º. Até 30 de junho de 1997, os pretendentes assinantes, por sua livre escolha, poderão optar, na tomada de assinatura do serviço telefônico público, pela sistemática da participação financeira.Art. 5º. Após 30 de junho de 1997, a sistemática da participação financeira não mais se aplicará à tomada de assinatura do serviço telefônico público. Portanto, a partir de 30 de junho de 1997, os adquirentes de linha telefônica passaram a pagar apenas uma tarifa básica de habilitação, para adesão ao serviço correspondente, não mais adquirindo ações da companhia. Com efeito, conquanto as linhas telefônicas oferecidas antes desta modificação tivessem sido entregues na época, as ações das empresas de telefonia não foram emitidas em nome dos seus titulares, na forma estabelecida pela Lei das S.A., nº 6.404, de 15.12.1976, que, em seu art. 170, estabelece: "depois de realizados ¾ (três quartos), no mínimo, do capital social, a companhia pode aumentá-lo mediante subscrição pública ou particular de ações".

Some-se a isto que, em tais contratos, embora imediato o oferecimento da linha, a integralização das ações era diferida no curso tempo para momento posterior ao exercício social então vigente (normalmente 12 meses após).

Todavia - e considerando que o número de ações a que faria jus o adquirente da linha telefônica era obtido mediante a divisão do capital por ele aportado pelo valor patrimonial das ações da companhia, apurado em balancete mensal da data da negociação (art. 176 da Lei das S.A.) -, o País foi assolado, em tal período, com grande inflação.

Em consequência disto, na data do aporte do capital à companhia, o adquirente da linha telefônica teria um número maior de ações do que veio a ocorrer meses após o investimento.

Diante de tal quadro e da negligência da Telebrás S.A. (até 30 de junho de 1997), milhares de usuários de linhas telefônicas optaram por se socorrer do Poder Judiciário para reaverem as ações a que faziam jus ou, na impossibilidade de subscrição, indenização pelos prejuízos sofridos na época.

Tal indenização, vale destacar, compreendia rubricas como:

* dividendos (parcela do lucro líquido dividida entre os acionistas no final do exercício social - art. 202 da Lei das S.A. - nº 6.404/76);

* juros sobre capital próprio (rendimentos pagos aos acionistas, com base no lucro oriundo de investimentos dos exercícios anteriores da empresa, sobre o qual incide Imposto de Renda ao investidor, sem tributação à companhia - art. 9 da Lei nº 9.249/95); e,

* eventuais bonificações regularmente aprovadas [em dinheiro ou em novas ações (bônus de subscrição), em razão do aumento de capital com a incorporação de reservas próprias - art. 75 da Lei das S.A.], tudo com o acréscimo dos consectários legais.

De tais demandas, ainda surgiram outras.

É que algumas das 12 grandes companhias que foram criadas, em 1998, por ocasião da privatização do Sistema Telebrás, cindiram, ao longo do tempo, suas estruturas para melhor conduzir as telefonias fixa e móvel.

A Lei das S.A., nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, estabelece que "a cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão".

O § 5º do referido dispositivo ainda prevê que "as ações integralizadas com parcelas de patrimônio da companhia cindida serão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT