Acórdão Nº 5037015-74.2020.8.24.0000 do Órgão Especial, 03-02-2021

Número do processo5037015-74.2020.8.24.0000
Data03 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoÓrgão Especial
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)
Tipo de documentoAcórdão










Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5037015-74.2020.8.24.0000/SC



RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS


AUTOR: Prefeito - MUNICIPIO DE CAPIVARI DE BAIXO - Capivari de Baixo RÉU: CAPIVARI DE BAIXO CAMARA MUNICIPAL


RELATÓRIO


O Prefeito do Município de Capivari de Baixo, com base no art. 85, inciso VII, da Constituição do Estado de Santa Catarina, e na Lei Estadual n. 12.069, de 27/12/2001, propôs a presente ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, para suspender os efeitos da Lei Municipal n. 2.044, de 28/9/2020, de origem parlamentar e, ao final, declarar a sua inconstitucionalidade por ofensa aos arts. 32, 50, § 2º, inciso IV, e 71, inciso II, da Constituição Estadual, bem como ao art. 50, incisos II, IV e X, da Lei Orgânica do Município de Capivari de Baixo.
Alega que a lei municipal impugnada, promulgada pelo Presidente da Câmara de Vereadores, impõe ao Poder Executivo a divulgação anual dos "demonstrativos de arrecadação e destinação dos recursos decorrentes de multas de trânsito aplicados no Município de CAPIVARI DE BAIXO SC" (art. 1º), indicando "a quem foram destinados os recursos arrecadados e quanto cada um aplicou em: educação de trânsito, sinalização, engenharia de trafego e de campo, fiscalização de trânsito, e outros" (art. 3º, inciso III).
Disse que o Município vem cumprindo rigorosamente a Lei Federal n. 12.527, de 18/11/2011, que "regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. , no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal", de modo que estão "disponíveis em seu sítio eletrônico os valores arrecadados e distribuídos às Polícias, conforme convênio firmado"; que, no entanto, o Município "não possui acesso a como as Polícias Civil e Militar utilizam os recursos repassados, não cabendo aquele a prestação de contas".
Aduz que a norma municipal impugnada "impacta na organização e funcionamento da Administração Municipal [...] o que, sem qualquer sombra de dúvida, obrigará o Poder Executivo a deslocar um servidor pra realizar a tarefa" e, além disso, traz "encargo financeiro sem ao menos relacionar a rubrica orçamentária atrelada".
Requereu o deferimento da medida cautelar dizendo que o "fumus boni iuris" está presente na "alta probabilidade do direito que traz ônus ao Município, posto que para a divulgação de informações referentes à aplicação de recursos de multas de trânsito há a necessidade de desolocar servidor para exercer a tarefa".
O "periculum in mora", por outro lado, reside no fato de que "com a vigência da citada lei a divulgação de informações referentes à aplicação de recursos de multas de trânsito necessitará de servidor específico para alimentar o sítio eletrônico (ante a forma detalhada exigida na norma) o que compromete, sobremaneira, a administração municipal, principalmente quanto ao planejamento de suas atividades".
Ao final, pugnou pela procedência do pedido deduzido nesta ação direta de inconstitucionalidade.
Indeferido o pedido de medida cautelar, o Presidente da Câmara de Vereadores prestou informações dizendo que o Projeto de Lei n. 034/2020 foi integralmente vetado pelo Chefe do Executivo Municipal, mas o veto foi derrubado pela Câmara e, então, foi promulgada a Lei n. 2.044, de 28/9/2020, do Município de Capivari de Baixo; que não há nenhuma inconstitucionalidade porque a lei questionada não é de iniciativa privativa do Prefeito, de sorte que, "além do Poder de Legislar também os vereadores possui o poder de fiscalização, o qual é exercido também pela aplicação da lei n. 2.044/2020", sobretudo porque a publicidade é um dos princípios que deve ser observado pela Administração Pública.
O Procurador-Geral do Município de Capivari de Baixo, por sua vez, sustenta que a Lei Municipal n. 2.044/2020, promulgada pelo Presidente da Câmara, é inconstitucional por vício de iniciativa, o que viola o princípio da separação dos poderes previsto no art. 32, da Constituição Estadual (art. 2º, da CF), e no art. 11, da Lei Orgânica do Município; que compete privativamente ao Prefeito, nos termos do art. 50, da Lei Orgânica Municipal, dispor sobre a organização e funcionamento da Administração Municipal; que, por isso, a Lei n. 2.044/2020, malfere "o art. 50 da Lei Orgânica do Município de Capivari de Baixo, assim como o arts. 50, § 2º, IV e 71, II, ambos da Constituição Estadual de Santa Catarina", razão pela qual deve ser declarada a sua inconstitucionalidade.
Com vista dos autos, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, com base em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Davi do Espírito Santo, opinou pela improcedência do pedido

VOTO


Há que se julgar improcedente o pedido deduzido nesta ação direta de inconstitucionalidade.
A Lei Municipal n. 2.044, de 28/9/2020, questionada nesta ação direta, dispõe sobre a divulgação de informações referentes à aplicação de recursos derivados de multas de trânsito aplicadas no Município de Capivari de Baixo, e está assim redigida:
"O PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE CAPIVARI DE BAIXO, ESTADO DE SANTA CATARINA, no uso de suas atribuições que lhe confere a legislação, faz saber a todos os habitantes deste Município que Câmara Municipal de Vereadores aprovou e Eu promulgo a seguinte lei:Art. 1º Fica assegurada a divulgação de demonstrativos de arrecadação e destinação dos recursos decorrentes de multas de trânsito aplicados no Município de CAPIVARI DE BAIXO SC.Art. 2º A divulgação será feita, anualmente, na página principal do site oficial da Prefeitura Municipal de CAPIVARI DE BAIXO SC.Art. 3º Os demonstrativos deverão conter pelo menos as seguintes informações:I - numero total de multas de transito aplicadas, mensalmente, detalhada pelo tipo de infração cometida;II - valor total arrecadado, mensalmente, com multas de transito, e;III - a quem foram destinados os recursos arrecadados e quanto cada um aplicou em: educação de trânsito, sinalização, engenharia de trafego e de campo, fiscalização de transito, e outros.Art. 3º Esta Lei entra em vigor 30 (trinta) dias apões a sua publicação".
O Prefeito do Município de Capivari de Baixo entende que a Lei n. 2.044/2020, de origem parlamentar, promulgada pelo Presidente da Câmara de Vereadores, é inconstitucional por ofensa aos arts. 32, 50, § 2º, inciso IV, e 71, inciso II, da Constituição Estadual (que correspondem, respectivamente, aos arts. , 61, § 1º, inciso II, alínea "c", e 84, inciso III, da CF), bem como ao art. 50, incisos II, IV e X, da Lei Orgânica do Município de Capivari de Baixo.
De outro lado, o Presidente da Casa Legislativa do Município sustenta que a lei questionada não é de iniciativa privativa do Prefeito, e que, "além do Poder de Legislar também os vereadores possui o poder de fiscalização, o qual é exercido também pela aplicação da lei n. 2.044/2020", sobretudo porque a publicidade é um dos princípios que deve ser observado pela Administração Pública.
Pois bem.
A Constituição Estadual, no que interessa ao deslinde da quaestio, estabelece o seguinte:
"Art. 32. São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
[...]
Art. 50. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
§ 1º A iniciativa popular de leis será exercida junto a Assembleia Legislativa pela apresentação de projeto de lei subscrito por no mínimo um por cento dos eleitores do Estado, distribuídos por pelo menos vinte Municípios, com não menos de um por cento dos eleitores de cada um deles.
§ 2º São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que disponham sobre:
I - a organização, o regime jurídico, a fixação ou modificação do efetivo da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros, o provimento de seus cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva; (Redação dada pela EC/38, de 2004).
II - a criação de cargos e funções públicas na administração direta, autárquica e fundacional ou o aumento de sua remuneração;
III - o plano Plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamento anual;
IV - os servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade, aposentadoria de civis, reforma e transferência de militares para a inatividade; (Redação dada pela EC/38, de 2004).
V - a organização da Procuradoria-Geral do Estado e da Defensoria Pública;
VI - a criação e extinção das Secretarias de Estado e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 71, IV. (NR) (Redação dada pela EC/38, de 2004).
[...]
Art. 71. São atribuições privativas do Governador do Estado:
I - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;
II - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição;
III - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;
IV - dispor, mediante decreto, sobre:
a) organização e funcionamento da administração estadual, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; e
b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos; (Redação do inciso IV e alíneas, dada pela EC/38, de 2004)".
ALEXANDRE DE MORAES, referindo-se à iniciativa privativa do Presidente da República, prevista no art. 61, § 1º, da Constituição Federal (art. 50, § 2º, inciso IV, da CE), ensina:
"As referidas matérias cuja discussão legislativa dependem da iniciativa privativa do Presidente da República (CF, art. 61, § 1º) são de observância obrigatória pelos Estados-membros que, ao disciplinar o processo legislativo no âmbito das respectivas Constituições estaduais, não poderão afastar-se da disciplina constitucional federal, sob pena de nulidade da lei"...

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