Acórdão Nº 5037296-24.2021.8.24.0023 do Quinta Câmara Criminal, 03-02-2022

Número do processo5037296-24.2021.8.24.0023
Data03 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5037296-24.2021.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER

APELANTE: SUEZIO APARICIO INACIO JUNIOR (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O representante do Ministério Público do Estado de Santa Catarina com atuação perante o Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da comarca da Capital ofereceu denúncia em face de Suézio Aparicio Inácio Júnior, dando-o como incurso nas sanções do art. 33, caput, da Lei de Drogas, pela prática do fato delituoso assim narrado:

No dia 3 de abril de 2021, por volta das 21h49, o denunciado Suézio Aparicio Inácio Júnior mantinha em depósito, no interior da sua residência (servidão Ana Antônia Martins, n. 431, bairro Ribeirão da Ilha), para fins de comércio ilícito, 3.699 comprimidos de MDMA (1.140,2 g) e 3 porções da erva maconha (86,5 g), além de uma balança de precisão, um rolo de plástico filme, uma seladora à vácuo e um aparelho celular, marca iPhone - usualmente empregado na negociação de drogas -, conforme auto de exibição e apreensão de fl. 30 e auto de constatação de fl. 32. Fato ocorrido nesta Capital.O ecstasy e a maconha são substâncias capazes de causar dependência física e psíquica, têm seu uso proscrito no território nacional (p. 32), e se destinavam ao comércio ilícito, como se verificou em razão da enorme quantidade de drogas apreendidas, somadas à apreensão de petrechos de preparo, e ainda, prévias denúncias dando conta da guarda de drogas naquele mesmo local, pelo denunciado (sic, fls. 1-2 do evento 1 da ação penal).

Encerrada a instrução, a Magistrada a quo julgou procedente o pedido formulado na inicial acusatória para condená-lo às penas de sete anos de reclusão, a ser resgatada em regime inicialmente fechado, e pagamento de quinhentos e oitenta e três dias-multa, individualmente arbitrados à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente à época do fato, por infração ao preceito do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006.

Inconformado, interpôs o réu recurso de apelação, por meio do qual aventa, preliminarmente, transgressão ao primado do juiz natural, uma vez que "[...] o Magistrado que proferiu o édito condenatório (evento 161) não foi o mesmo Magistrado que presidiu a audiência de instrução e julgamento (evento 115)" (sic, fls. 3 do evento 191 da ação penal).

Também no estágio prefacial, almeja o reconhecimento da invalidade das provas colhidas no procedimento policial por violação ao preconizado no art. 5º, XI, da Constituição Federal, ante a "ausência de fundadas razões para a busca domiciliar" (sic, fls. 4 do respectivo evento 191).

Ainda em sede preliminar, objetiva a declaração da inépcia da denúncia, pela não observância das formalidades previstas no art. 41 do Código de Processo Penal, pois narrou genericamente o delito que lhe foi atribuído.

No mérito, pretende a sua absolvição ao argumento de que inexistem nos autos substratos de convicção aptos para embasar o decreto condenatório, devendo incidir o princípio do in dubio pro reo na espécie.

No que diz respeito à dosimetria da pena, requer a incidência da fração de um sexto na segunda fase do cálculo em razão do reconhecimento da circunstância agravante da reincidência.

Ao final, postula a modificação do regime prisional para o semiaberto e a concessão do direito de recorrer em liberdade.

Em suas contrarrazões, o Promotor de Justiça oficiante pugna pela preservação da decisão vergastada.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Rui Arno Richter, opinou pelo conhecimento e desprovimento do reclamo.

É o relatório.

Documento eletrônico assinado por LUIZ CESAR SCHWEITZER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1764888v8 e do código CRC a76df6d8.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ CESAR SCHWEITZERData e Hora: 7/1/2022, às 17:11:32





Apelação Criminal Nº 5037296-24.2021.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ CESAR SCHWEITZER

APELANTE: SUEZIO APARICIO INACIO JUNIOR (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

Presentes os respectivos pressupostos de admissibilidade, conhece-se da irresignação e passa-se à análise do seu objeto.

Prefacialmente, suscita o recorrente a nulidade do feito por ofensa ao princípio da identidade física do juiz.

O pleito, entretanto, não merece prosperar.

A Lei 11.719/2008 introduziu o prefalado postulado no processo penal, acrescentando o § 2º ao art. 399 do Códex Instrumental, segundo o qual "o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença".

Contudo, o mencionado dispositivo não trouxe melhores explicitações sobre o cumprimento da regra, impondo-se, em casos tais, a aplicação subsidiária do art. 132 do Código de Processo Civil, outrora em vigor, que assim dispunha: "O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor."

No ponto, imperioso destacar a ressalva que faz o doutrinador Guilherme de Souza Nucci:

A edição do novo Código de Processo Civil eliminou qualquer previsão similar ao art. 132 do antigo CPC. Entretanto, pode-se continuar utilizando, pois incorporado pelos princípios gerais de direito, além de amplamente consagrado na jurisprudência, o previsto nesse dispositivo (Código de processo penal comentado. 17. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 1.008).

E Renato Brasileiro de Lima é claro ao demonstrar que este princípio não tem caráter absoluto:

[...] A título de exemplo, por mais que determinado magistrado tenha presidido a instrução probatória de determinado feito como titular de uma vara criminal de 1ª entrância, a partir do momento em que promovido para uma vara criminal de 2ª entrância, este juiz deixará de ter competência para o julgamento dos feitos por ele instruídos naquela vara criminal. Por consequência, sob pena de se admitir que um princípio com status de lei ordinária - identidade física do juiz (CPP, art. 399, § 2º) -, possa se sobrepor a um princípio com envergadura constitucional - juiz natural (CF, art. 5º, incisos XXXVII e LIII) -, não se pode admitir que um juiz que deixou de ter competência para o julgamento do processo em virtude de afastamento legal, logo, incompetente, seja compelido a julgar o feito pelo simples fato de ter presidido a instrução probatória (Código de processo penal comentado. 4. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: JusPODVIM, 2019, p. 1.139).

Portanto, o primado da identidade física do juiz é dotado de relatividade, na medida em que autorizada a permuta nas hipóteses de sucessão ou substituição de Magistrados.

A propósito, extrai-se da jurisprudência desta Corte:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE AGENTES E EMPREGO DE ARMA DE FOGO (ART. 157, §§ 2º, II, E 2º-A, I, NA FORMA DO ART. 70, TODOS DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSOS DEFENSIVOS.PRELIMINARES.[...]VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ (JUIZ NATURAL). NÃO OCORRÊNCIA. AUDIÊNCIA REALIZADA POR JUIZ DESIGNADO POR PORTARIA DA PRESIDÊNCIA PARA COOPERAR COM O TITULAR DA VARA. MAGISTRADO QUE PROLATOU A SENTENÇA DESIGNADO POR PORTARIA DA PRESIDÊNCIA PARA RESPONDER PELA VARA. ADEMAIS, PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO."O princípio da identidade física do juiz não é absoluto, admitindo exceções nas hipóteses em que a alteração do julgador mostrar-se justificada, como, por exemplo, em afastamentos autorizados, em situações de colaboração e de movimentação natural na carreira" (TJSC, Apelação Criminal n. 0011157-67.2014.8.24.0023, rel. Des. Paulo Roberto Sartorato, j. 20-09-2018).[...]Recursos conhecidos e não providos (Apelação Criminal n. 0011453-50.2018.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, j. 3-9-2019).

Assim, é de ser rechaçada a prefacial de nulidade.

Demais disso, também em sede preliminar, alega o insurgente que os policiais militares atuaram de forma arbitrária ao adentrarem a sua residência em situação que não se enquadrava nas hipóteses autorizadas pela Carta Magna, o que tornou ilícita a prova material, maculando, por conseguinte, a apreensão das substâncias encontradas no local e todos os atos processuais posteriores.

Contudo, novamente sem razão.

Isso porque, em todos os momentos em que prestaram seus depoimentos, aqueles esclareceram, em síntese, que receberam informações apontando que na moradia de Suézio Aparicio Inácio Júnior, localizada no Ribeirão da Ilha, estavam sendo armazenados entorpecentes destinados à narcotraficância, as quais se fortaleceram com a visualização de drogas e balança de precisão no interior do imóvel. Diante disso, os servidores estatais ingressaram no local, onde apreenderam os produtos tóxicos especificados a fls. 30 do evento 1.4 do inquérito policial.

Não se olvida, outrossim, que o crime sob análise é de natureza permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, de modo que, enquanto o agente mantiver sob sua guarda material estupefaciente, estará em estado de flagrância, o que permite que a sua prisão ocorra a todo tempo.

Nesse quadro, a entrada na residência em que estavam armazenadas as substâncias ilícitas não caracterizou a alegada violação de domicílio, pois patente o estado flagrancial, sendo exatamente esta a exceção prevista pela norma constitucional invocada pela defesa. Confira-se:

Art. 5º [...]XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;

A respeito da questão, releva transcrever o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO...

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