Acórdão Nº 5037500-74.2020.8.24.0000 do Quarta Câmara de Direito Civil, 13-10-2022

Número do processo5037500-74.2020.8.24.0000
Data13 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5037500-74.2020.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA

AGRAVANTE: ROGUER INCORPORADORA E ADMINISTRADORA LTDA AGRAVADO: CLAUDETE DAMAZIO DA SILVA

RELATÓRIO

Roguer Incorporadora e Administradora LTDA. interpôs agravo de instrumento de decisão da juíza Caroline Bundchen Felisbino Teixeira, da 2ª Vara Cível da comarca de Joinville, que, no evento 8, DESPADEC1 dos autos da ação de anulação de negócio jurídico c/c indenização por danos materiais e pedido liminar n° 5032513-75.2020.8.24.0038, movida por Claudete Damazio da Silva, indeferiu o seu pedido de tutela provisória de urgência formulado em sede reconvencional, por intermédio do qual buscava a reintegração de posse do geminado identificado pelo nº 7, alegando que a autora "tomou posse e lá reside junto com sua companheira" (evento 5, PET1, p. 23/origem), e afastou a prefacial de incompetência em razão de cláusula arbitral.

Sustentou, preliminarmente, a incompetência da justiça estadual para processamento e julgamento da demanda, em virtude da existência de cláusula compromissória no contrato que se busca rescindir. Neste ponto, insistiu que "não há como se defender a tese de relação de consumo, isso porque a agravante que adquiriu os imóveis, e não o contrário. O fato de o pagamento ter sido prometido com imóvel não atrai para a agravante a qualidade de prestadora de serviços. A agravante foi a adquirente do bem principal do contrato, de modo que o entendimento empossado de que o fato de construir as casas que seriam o pagamento não coloca a agravada como consumidora. Veja-se ainda que para a caracterização do contrato de consumo está ligada ao consumidor adquirir o bem como destinatário final, defende a agravante a tese de que a agravada não adquiriu três imóveis como consumidor final. Também não há que se falar em contrato de adesão, pois os autos claramente não discutem tal espécie de contrato. Neste sentido necessário que se afaste a relação de consumo tal qual foi reconhecida e que ocorra a extinção do processo por conta da incompetência do mesmo para o julgamento, o que se requer" (evento 1, INIC1, p. 3-4).

No mérito, argumentou "que existem penhoras não levantadas pela agravada na matrícula do imóvel até o momento, que o agravante entregou imóvel e um geminado para a agravada que invadiu outros três imóveis de propriedade do agravante. Certo que existe obrigação da agravada na baixa das penhoras a agravante não entregou os outros imóveis até a regularização da matrícula (conforme o contrato firmado entre as partes), a mesma invadiu três imóveis além do entregue (fato incontroverso nos autos principais). Diante das invasões, que caracterizam exercício arbitrário das próprias razões, é necessário o deferimento de medida de reintegração de posse em caráter liminar. Como bem assinalado na r. decisão, a propriedade de imóvel é matéria de direito real, e, a legítima proprietária do bem é a agravante, de modo que a invasão do imóvel pelos motivos lançados pela agravada é ilegal e deve ser repelida. A agravante não se nega a entrega dos imóveis, desde que seja observadas as cláusulas do contrato que tratam da baixa das penhoras (ou seja a agravada exige o cumprimento do contrato quando não cumpriu seu dever primário de baixa de restrições na matrícula do mesmo). De toda sorte assinalada que com as penhoras lançadas o agravante não conseguiu vender imóveis na propriedade nem realizar o desdobro dos mesmos. Todos que querem comprar um geminado na propriedade da agravada não podem realizar financiamentos, nem terão o registro na matrícula até a baixa das penhoras, o que gera prejuízos de diversas ordens à agravante e impede a venda de geminados, sendo que as famílias que adquiriram imóveis no local os adquiriram através de contratos de promessa de compra e venda e aguardam a solução do problema para o registro de suas propriedades" (evento 1, INIC1, p. 4-6).

Pediu a concessão de tutela antecipada recursal a fim de que seja deferida "a reintegração de posse todos os imóveis invadidos, e não tão somente aqueles que a agravante conseguiu reintegrar antes da propositura da ação, e com a reabertura do prazo para entrega após a regularização da matrícula, tal qual foi pactuado no contrato de compra e venda" (evento 1, INIC1, p. 6).

Por meio da decisão de evento 7, DESPADEC1 indeferi a antecipação da tutela recursal.

Não foram apresentadas contrarrazões.

VOTO

1 Admissibilidade

O recurso é cabível (artigo 1.015, I, do Código de Processo Civil), tempestivo, e a ausência de recolhimento do preparo decorre da gratuidade concedida pela juíza singular à recorrente por meio da decisão de evento 8, DESPADEC1/origem.

Preenchidos os requisitos previstos nos artigos 1.016 e 1.017 do Código de Processo Civil, conheço do recurso.

2 Mérito

O presente recurso diz com decisão que afastou a prefacial de incompetência em razão de cláusula arbitral e indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência formulado em sede reconvencional, por intermédio do qual a ora agravante buscava a reintegração de posse do geminado identificado pelo nº 7.

A togada singular assim decidiu (evento 8, DESPADEC1):

Trata-se de "ação de anulação de negócio jurídico c/c indenização por danos materiais e pedido liminar" intentada por Claudete Damazio da Sulva contra Jan Roguer Souza Júnior e Roguer Incorporadora e Administradora Ltda, em que pretende a parte autora, em sede de tutela antecipada, ordem para que a requerida se abstenha de efetuar qualquer ingerência no empreendimento, incluindo a percepção de eventuais valores, venda de imóveis, cobrança ou envio de notificações a qualquer dos ocupantes e residentes, bem como aos inquilinos da demandante.

Antes mesmo da análise da petição inicial, a demandada ofertou contestação e reconvenção, oportunidade em que requereu, também a título de antecipação dos efeitos da tutela, sua reintegração na posse do geminado identificado pelo n. 7, no qual a autora/reconvinda reside.

Tanto na inicial quanto na contestação/reconvenção, as partes tratam da cláusula compromissória, a parte ativa pretendendo seja desconsiderada e a passiva, com base nela seja declarada a incompetência do juízo.

1. Cláusula compromissória:

A preliminar de incompetência em razão de cláusula arbitral, aventada pela ré/reconvinda, não merece prosperar.

Acerca do tema, a jurisprudência pátria tem sedimentado o entendimento de que o teor da cláusula de arbitragem em contratos de adesão envolvendo relação consumerista não afasta a via judicial para reconhecimento do direito discutido entre as partes.

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos REsp 1169841/RJ, e REsp 1.189.050/SP, já teve a oportunidade de se manifestar no sentido de que "a instauração da arbitragem pelo consumidor vincula o fornecedor, mas a recíproca não se mostra verdadeira, haja vista que a propositura da arbitragem pelo solicitante depende da ratificação expressa do oblato vulnerável, não sendo suficiente a aceitação da cláusula realizada no momento da assinatura do contrato de adesão".

No caso em tela, a autora preferiu buscar diretamente o Poder Judiciário em detrimento do juízo arbitral, demonstrando desinteresse no procedimento especial, circunstância que afirma a competência deste juízo para processar e julgar a lide.

Em caso semelhante, a mesma Corte Superior compreendeu que "a atitude da recorrente (consumidora) de promover o ajuizamento da ação principal perante o juízo estatal evidencia, ainda que de forma implícita, a sua discordância em submeter-se ao procedimento arbitral, não podendo, pois, nos termos do art. 51, VII, do CDC, prevalecer a cláusula que impõe a sua utilização, visto ter-se dado de forma compulsória" (REsp 1628819/MG, Terceira Turma, DJe 15/03/2018).

Dessa forma, por nenhuma perspectiva pode-se conferir obrigatoriedade à cláusula compromissória em discussão, contida num contrato de consumo, sem as formalidades necessárias e sem o consentimento posterior da consumidora para a instauração de procedimento arbitral.

Afasto, portanto, a prefacial de incompetência em razão de cláusula arbitral.

2.Tutela de urgência:

As tutelas de urgência, decorrentes do princípio da efetividade, visam a proporcionar a tutela efetiva de todos os direitos da parte, seja no campo material ou processual. São, portanto, mecanismos processuais colocados à disposição do Estado-Juiz que lhe permite impulsionar a atividade jurisdicional de forma a garantir a utilidade da sentença, sua aptidão para o direito reconhecido, bem como a efetividade concreta do direito tutelado.

Mais especificamente, a tutela de urgência na modalidade antecipada/satisfativa provisional (CPC, art. 303) pressupõe o cumprimento dos requisitos previstos no art. 300, caput, do Código de Processo Civil, que devem estar demonstrados de forma clara e objetiva na petição da parte que a requer: a) a probabilidade de existência do direito material; b) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo; e c) inexistência de risco...

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