Acórdão Nº 5037778-58.2020.8.24.0038 do Terceira Câmara Criminal, 10-08-2021

Número do processo5037778-58.2020.8.24.0038
Data10 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5037778-58.2020.8.24.0038/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5037778-58.2020.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: ANDRE ROBERTO LUCIANO (ACUSADO) ADVOGADO: RAFAEL FELICIO (OAB SC032476) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Na Comarca de Joinville, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia em face de André Roberto Luciano (com 35 anos à época) pela prática, em tese, das condutas criminosas previstas nos art. 33, caput, da Lei 11.343/2006 e art. 12, caput, da Lei 10.826/2003, em razão dos fatos assim narrados (evento 1):

[...] No dia 26 de setembro de 2020, o denunciado guardava, sem autorização, para fins de comércio, na residência abandonada localizada na Rua Aurora, 96, Bairro Guanaraba, e também na sua residência localizada na Rua Nilto Morbis, 78, Bairro Itaum, ambas nesta cidade, fracionados em vinte e duas porções, 11.049g (onze mil e quarenta e nove gramas) de Maconha, substância capaz de causar dependência física e psíquica conforme Portaria 344/98 da ANV/MS.

Naquele dia, por volta das 10h50min, policiais militares dirigiram-se à primeira residência mencionada em virtude da existência de informações indicando o local como ponto de guarda e venda de drogas.

No local, os policiais apreenderam quase 10.000g (dez mil gramas) de Maconha, distribuídos em vinte e uma porções, o valor de R$ 477,00 (quatrocentos e setenta e sete reais) em espécie auferidos pelo denunciado com a atividade ilícita, uma faca com resquícios de Maconha, balança de precisão utilizada para pesagem da droga, embalagens plásticas e, ainda, dois aparelhos celulares utilizados no desempenho da traficância.

Ainda neste imóvel, foram apreendidos oito munições intactas calibre .38, de uso permitido, eficientes para o fim que se destinam, que eram guardadas no local pelo denunciado, sem autorização e em desacordo com a determinação legal.

Na sequência, em buscas na segunda residência mencionada, onde reside o denunciado, os policiais militares apreenderam o restante da droga destinada ao comércio por ele e, ainda, uma arma de fogo do tipo espingarda, marca CBC, calibre .32, número de série "333319", eficiente para o fim que se destina, de uso permitido, que o denunciado mantinha sob sua guarda no local sem possuir registro, portanto, em desacordo com o disposto no art. 5º, caput, da Lei 10.826 de 2003 [...].

Sobreveio sentença em que a peça acusatória oferecida em desfavor de André Roberto Luciano foi julgada procedente, em cuja parte dispositiva assim constou (evento 78):

[...] julgo procedente a denúncia para condenar André Roberto Luciano ao cumprimento das penas privativas de liberdade de cinco anos e dez meses de reclusão, em regime inicial fechado, e de dois anos de detenção, em regime aberto, mais os pagamentos de quinhentos e oitenta e seis dias-multa e de outros vinte dias-multa nos valores unitários mínimos respectivos (art. 43 da Lei nº 11343/06 e art. 49, § 1º do CP), tudo por infração ao art. 33, caput, da Lei nº 11343/06 e duas infrações ao art. 12 da Lei nº 10826/03, no concurso material a que alude o art. 69, caput, do CP. Deixo de substituir as penas por restritivas, ou conceder sursis, conforme a fundamentação. Custas isentas, porque defiro a gratuidade (v. TJSC, Consulta nº 2008.900074-3, da Corregedoria-Geral da Justiça, Rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben).

Mantenho a prisão cautelar e não permito recurso em liberdade, porque permaneceu preso durante toda a tramitação e persistem os fundamentos declinados nos eventos 10 e 64 do inquérito policial nº 5035745-95.2020.8.24.0038, caso em que "não configura ilegalidade a remissão, na sentença, aos motivos do ato que implicara a prisão preventiva, dada a ausência de alteração do quadro fático-processual desde a data da decretação da referida medida" (STF, HC nº 101248/CE, Rel. Min. Luiz Fux), afinal, "não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer solto quando permaneceu segregado durante a persecução criminal, se persistentes os motivos para a preventiva" (STJ, HC nº 396974/BA, Rel. Min. Jorge Mussi).

Decreto o perdimento em favor da União dos valores, arma e demais bens apreendidos (art. 63, caput, da Lei nº 11343/06 e art. 91, II, "a" do CP) [...].

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelação (evento 85). Em suas razões recursais, pugnou pela adequação da capitulação jurídica prevista no art. 12, caput, para a disposta no art. 14, caput, ambos da Lei 10.826/2003, referente às munições calibre .38, já que foram apreendidas em residência alheia/abandonada destinada apenas ao comércio espúrio (evento 87).

A defesa de André Roberto Luciano também recorreu (evento 90). Em suas razões recursais, sustentou, em preliminar, a nulidade do processo ante a ilicitude das provas decorrentes da ausência de fundadas razões da prática de crime permanente, prévia determinação judicial ou autorização do proprietário a relativizar a inviolabilidade de domicílio.

No mérito, sustentou a insuficiência probatória acerca da prática dos crimes previstos nos art. 12, caput, da Lei 10.826/2003, por 2 (duas) vezes, na forma do art. 69 do Código Penal, e art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, razão por que a absolvição ante a aplicação do princípio do in dubio pro reo é de rigor.

De forma subsidiária, requereu a aplicação do disposto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, na terceira fase dosimétrica, no patamar máximo de 2/3 (dois terços), adequação do regime inicial de cumprimento e substituição da pena corporal por restritivas de de direitos.

Por fim, requereu a concessão da justiça gratuita (evento 129).

Contrarrazões nos eventos 131 e 134.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, em que opinou pelo conhecimento dos recursos, afastamento da preliminar e provimento tão somente do interposto pelo Ministério Público (evento 9).

Documento eletrônico assinado por ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1212858v12 e do código CRC f1d6bb74.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ERNANI GUETTEN DE ALMEIDAData e Hora: 11/8/2021, às 17:18:46





Apelação Criminal Nº 5037778-58.2020.8.24.0038/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5037778-58.2020.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ERNANI GUETTEN DE ALMEIDA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR) APELANTE: ANDRE ROBERTO LUCIANO (ACUSADO) ADVOGADO: RAFAEL FELICIO (OAB SC032476) APELADO: OS MESMOS

VOTO

O recurso defensivo preenche os requisitos de admissibilidade em parte, razão pela qual deve ser parcialmente conhecido.

O recurso do Ministério Público deve ser conhecido, já que preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Recurso defensivo

Preliminar

A defesa sustenta a nulidade do processo ante a ilicitude das provas decorrentes da ausência de fundadas razões da configuração de flagrante de crime permanente, prévia determinação judicial ou autorização do proprietário a relativizar a inviolabilidade de domicílio.

No entanto sem razão.

Conforme se verá, a apreensão de 11.038g (onze mil gramas e trinta e oito decigramas) em 22 (vinte e duas) porções, e 1 (uma) arma de fogo calibre .32, e 8 (oito) munições calibre .38, nos imóveis localizados na rua Aurora, 96, bairro Guanaraba, e rua Nilto Morbis, 78, bairro Itaum, ambas na cidade de Joinville, decorreu de informações pretéritas dando conta de que o apelante praticava o tráfico de drogas e que utilizava um imóvel exclusivamente para depósito.

Em razão disso, constataram que, no dia dos fatos, na rua Aurora, 96, bairro Guanaraba, endereço destinado ao depósito, visualizaram seu automóvel no local, constataram forte odor de maconha, entraram no terreno e foram recebidos pelo apelante, que admitiu o uso de droga e a existência de outras porções no endereço, parte delas que poderiam ser visualizadas da porta da residência, em forma de tijolos, que estavam sendo fracionadas naquele momento.

Ele franqueou a entrada no local, apontou a existência de determinada quantidade da substância no banheiro e, no quarto, localizou-se as munições de calibre .38. Em razão da configuração de flagrante e da informação prestada pelo apelante de que possuía outras porções e arma de fogo, dirigiram-se à residência localizada na rua Nilto Morbis, 78, bairro Itaum, em que, de fato, foram apreendidas substância da mesma natureza e 1 (uma) espingarda calibre .32.

Ressalte-se, inclusive, que embora tenha sustentado em juízo a tese de que não autorizou a entrada dos agentes públicos no local, o apelante permaneceu em silêncio na fase indiciária, ocasião em que poderia ter alegado a suposta ilegalidade da prisão em flagrante.

A propósito, não se olvida que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento mediante repercussão geral do Recurso Extraordinário 603.616/RO, de relatoria do Exmo. Min. Ministro Gilmar Mendes, definiu que "a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas "a posteriori", que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados''.

A Lei 13.869/2019 tipificou a violação da garantia da inviolabilidade de domicílio como crime de abuso de autoridade, ressalvando de forma expressa, no art. 22, § 2º, do mesmo diploma legal, que: "não haverá crime se o ingresso for para prestar socorro, ou quando houver fundados indícios que indiquem a necessidade do ingresso em razão de situação de flagrante delito ou de desastre''.

No entanto, na hipótese, diante dos fundados indicativos da...

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