Acórdão Nº 5037969-52.2022.8.24.0000 do Primeiro Grupo de Direito Criminal, 31-08-2022

Número do processo5037969-52.2022.8.24.0000
Data31 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeiro Grupo de Direito Criminal
Classe processualRevisão Criminal (Grupo Criminal)
Tipo de documentoAcórdão
Revisão Criminal (Grupo Criminal) Nº 5037969-52.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO

REQUERENTE: LEANDRO SOUZA DE JESUS REQUERIDO: 4ª Câmara Criminal

RELATÓRIO

Petição inicial: Trata-se de pedido de revisão criminal, formulado por Leandro Souza de Jesus, por meio da defensoria pública, em relação à sua condenação nos autos n. 0001447- 68.2014.8.24.0008, já findos, à pena de 7 anos de reclusão e 583 dias-multa, pela prática do crime de tráfico de drogas.

A defesa requer o afastamento do aumento relativo ao reconhecimento da agravante de reincidência calcado em condenação anterior pela prática de porte de drogas para consumo pessoal, ao argumento de que se revela desproporcional.

Em suas razões, aduz que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do HC 453.437, manifestou entendimento de que: "Se as contravenções penais, puníveis com pena de prisão simples, não geram reincidência, mostra-se desproporcional o delito do artigo 28 da Lei 11.343/06 configurar reincidência, tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade". Alega, ademais, que o Supremo Tribunal de Justiça, no julgamento do RHC 178.512, decidiu que: "não parece razoável que condenação anterior repercuta negativamente na dosimetria".

Funda o pedido com base no art. 621, inciso I, do Código de Processo Penal, que prevê a admissão de revisão: "quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos", argumentando, ainda, que a decisão afronta "a superveniência de entendimento jurisprudencial pacífico e relevante mais benéfico ao apenado".

Com base no exposto, pugna: "para que a fração de aumento em relação à reincidência na condenação proferida nos autos n. 0001447-68.2014.8.24.0008 seja redimensionada para 1/6, em decorrência do afastamento daquela aplicada nos autos n. 0010771- 92.2008.8.24.0008" (evento 1, DOC1).

Parecer da PGJ: O exmo. Procurador de Justiça Leonardo Felipe Cavalcanti Lucchese opinou pelo: "não conhecimento do pedido revisional formulado", por entender que a mudança de entendimento jurisprudencial não autoriza o ajuizamento de revisão criminal (evento 9, DOC1).

Documento eletrônico assinado por JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2528924v25 e do código CRC b7b58b73.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELOData e Hora: 10/8/2022, às 17:28:55





Revisão Criminal (Grupo Criminal) Nº 5037969-52.2022.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JÚLIO CÉSAR MACHADO FERREIRA DE MELO

REQUERENTE: LEANDRO SOUZA DE JESUS REQUERIDO: 4ª Câmara Criminal

VOTO

Como visto no relatório, trata-se de pedido de revisão criminal, formulado pelo apenado Leandro Souza de Jesus, por meio da defensoria pública, em relação à sua condenação nos autos n. 0001447- 68.2014.8.24.0008, já findos, à pena de 7 anos de reclusão e 583 dias-multa, pela prática do crime de tráfico de drogas (artigo 33, caput, da Lei 11.343/06).



1. ADMISSIBILIDADE

Inicialmente, cumpre frisar que o pedido de revisão criminal é instrumento processual de natureza excepcionalíssima, pois o que se pretende é desconstituir o manto da coisa julgada. As hipóteses de cabimento, assim, estão enumeradas no artigo 621 do Código de Processo Penal, abaixo:

Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.

Art. 622. A revisão poderá ser requerida em qualquer tempo, antes da extinção da pena ou após.

Parágrafo único. Não será admissível a reiteração do pedido, salvo se fundado em novas provas.

Além disso, segundo Renato Brasileiro: "Apesar de não constar expressamente do art. 621, prevalece o entendimento de que também se admite o ajuizamento de revisão criminal na hipótese de nulidade do processo, já que o art. 626, caput, do CPP, refere-se à anulação do processo como um dos disponíveis resultados da procedência do processo revisional" (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 3. ed - Salvador: JusPodivm, 2015, p. 1797).

No caso, como observado no relatório, a defesa alega afronta ao texto expresso da lei penal, por ter havido ilegalidade na aplicação da pena do requerente, por ofensa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como por haver entendimento superveniente jurisprudencial pacífico mais benéfico.

Considerando que a alegação trazida pela defesa se encaixa, em tese, entre as hipóteses admitidas pela doutrina e pela jurisprudência, com a devida vênia ao entendimento exposto no parecer ministerial, entendo que a presente revisão criminal comporta conhecimento, ao que passo à apreciação do mérito.



2. MÉRITO

Como se sabe, a alteração da pena em sede de revisão criminal somente é possível de maneira excepcional, nos casos de evidente contrariedade à lei ou à prova dos autos ou de teratologia, isto é, equívoco técnico ou ostensível ilegalidade. Sobre o ponto, colhe-se da jurisprudência desta Corte de Justiça:

REVISÃO CRIMINAL. REVISIONANDO CONDENADO PELA PRÁTICA DO CRIME TRÁFICO DE DROGAS PRIVILEGIADO (LEI 11.343/2006, ART. 33, § 4º) À PENA DE 4 (QUATRO) ANOS, 8 (OITO) MESES E 20 (VINTE) DIAS DE RECLUSÃO, EM REGIME INICIAL SEMIABERTO, BEM COMO AO PAGAMENTO DE 471 DIAS-MULTA. PRETENSÃO DE ALTERAÇÃO DA REPRIMENDA NA PRIMEIRA FASE DOSIMÉTRICA EM RAZÃO DA VALORAÇÃO NEGATIVA DO ART. 42 DA LEI DE DROGAS. CABIMENTO PARCIAL. NATUREZA DO ECSTASY QUE, AO CONTRÁRIO DO ALEGADO, É FUNDAMENTO IDÔNEO À MAJORAÇÃO. APLICAÇÃO DA FRAÇÃO DE 2/6 (DOIS SEXTOS) PELA NATUREZA E QUANTIDADE FUNDAMENTADA. AUSÊNCIA DE ERRO TÉCNICO, TERATOLOGIA OU ILEGALIDADE A ENSEJAR A ALTERAÇÃO DA REPRIMENDA. [...] (TJSC, Revisão Criminal (Grupo Criminal) n. 5008581-07.2022.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Ernani Guetten de Almeida, Segundo Grupo de Direito Criminal, j. 30-03-2022)

REVISÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO CRIME DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DA PENA PREVISTA NO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006. INADMISSIBILIDADE. REVISIONANDO REINCIDENTE. INEXISTÊNCIA DE ERRO TÉCNICO, TERATOLOGIA OU ILEGALIDADE NA DECISÃO ATACADA. REVISIONAL INDEFERIDA (TJSC, Revisão Criminal (Grupo Criminal) n. 5066262-66.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Ernani Guetten de Almeida, Segundo Grupo de Direito Criminal, j. 30-03-2022).

REVISÃO CRIMINAL - CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO PELOS CRIMES DE TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (LEI N. 11.343/06, ART. 33, "CAPUT", E ART. 35, "CAPUT"). DOSIMETRIA - PLEITO DE REVISÃO DA PENA INTERMEDIÁRIA - AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA - PRETENSÃO DE REDUÇÃO DO PATAMAR DE AUMENTO - ALEGADA AFRONTA AO PARÂMETRO DE UM SEXTO E AO CRITÉRIO PROGRESSIVO UTILIZADOS PELA JURISPRUDÊNCIA - DESCABIMENTO - AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE MANIFESTA OU TERATOLOGIA - MAGISTRADO QUE FUNDAMENTA O EMPREGO DE FRAÇÃO SUPERIOR NA MULTIRREINCIDÊNCIA E NA REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA DA REVISIONANDA. A reanálise da dosimetria em sede de revisão criminal somente é possível excepcionalmente, nos casos de evidente contrariedade à lei, à prova dos autos ou de teratologia. [...] REVISÃO CRIMINAL NÃO CONHECIDA (TJSC, Revisão Criminal (Grupo Criminal) n. 5024980-48.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Getúlio Corrêa, Segundo Grupo de Direito Criminal, j. 28-07-2021) (Grifo nosso)

Na hipótese, como visto no relatório, a defesa alega que a pena deve ser alterada em razão de flagrante desproporcionalidade, ao argumento de que a condenação pelo crime de porte de drogas para consumo pessoal não pode justificar o reconhecimento da agravante de reincidência, trazendo, em suas razões, precedentes do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.

No caso, concordo com a defesa.

É que, embora não estejamos diante de ostensível erro técnico ou flagrante ilegalidade, ou de evidente contrariedade à lei ou à prova dos autos, entendo estar diante de um aumento desproporcional da pena, para o qual não se pode simplesmente fechar os olhos, mesmo em sede de revisão criminal.

Explico.

Como se sabe, a infração penal tem como espécies: o crime, punido com pena corporal de detenção e reclusão; e a contravenção penal, punida com pena corporal de prisão simples - sendo esta a principal diferença entre os institutos.

Conforme o artigo 63...

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