Acórdão Nº 5038374-25.2021.8.24.0000 do Terceira Câmara de Direito Público, 16-11-2021

Número do processo5038374-25.2021.8.24.0000
Data16 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualAgravo de Instrumento
Tipo de documentoAcórdão
Agravo de Instrumento Nº 5038374-25.2021.8.24.0000/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

AGRAVANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA AGRAVADO: MUNICÍPIO DE FRAIBURGO/SC

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo Estado de Santa Catarina contra decisão que, nos autos da Ação Civil Pública com Requerimento de Tutela de Urgência Antecipada n. 5000336-66.2021.8.24.0024, afastou o pedido de inclusão da União no processo e remessa dos autos à Justiça Federal.

Sustenta, em apertada síntese, que os autos originários tratam de pedido de fornecimento de medicamento cuja "tecnologia não está incorporada ao SUS"; que o medicamento é padronizado para doenças não diagnosticadas para o agravado; que a União deve compor a lide a fim de ressarcir os custos suportados pelo Estado; que os fármacos têm registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, contudo, isso não afasta a necessidade de a União integrar o processo; que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF e do Superior Tribunal de Justiça - STJ, no caso como o dos autos, é no sentido de que estes devem ser endereçados à Justiça Federal; que o STF deu por totalmente superado o entendimento de que cabe ao autor decidir contra quem irá propor a ação.

Requereu, por isso, a concessão do efeito suspensivo para que a União seja incluída no polo passivo, com a consequente remessa dos autos à Justiça Federal; e, ao final. o provimento do recurso.

Por fim, destacou "com o escopo de prequestionar a matéria e, assim, possibilitar eventual interposição de recursos excepcionais aos Tribunais Superiores, requer a expressa manifestação sobre todos os dispositivos aqui citados, além dos artigos 102, inciso I, alínea "a", inciso III, alínea "a", 109, inciso I, 196, 197, 198 (caput e incisos I e II), da Constituição Federal; artigo 6º, inciso I, alínea "d", artigo 7º, incisos II, IX (alínea "b"), e XIII, artigo 19-M, inciso I, artigo 19-P, inciso I, artigo 19-Q, caput, e parágrafo 2º, incisos I e II, artigo 19-U, da Lei n. 8.080/1990; artigo 22, da LINDB.".

O pedido liminar recursal foi indeferido.

Apresentadas contraminutas pelos agravados, em seguida, os autos foram conclusos a julgamento.

VOTO

Na ação civil pública originária (fornecimento de medicamento - autos nr. 5000336-66.2021.8.24.0024) ajuizada pelo Ministério Público Estadual contra o Estado de Santa Catarina e o Município de Fraiburgo, o órgão ministerial pretende a condenação dos demandados ao fornecimento do remédio Ustequinumabe (Stelara), necessário à manutenção do estado de saúde do paciente, Sr. Jean Ramos dos Santos, porquanto portador de Doença de Crohn Fistulizante (CID 10 - K.50).

O Estado, citado na lide, apresentou contestação alegando que é imprescindível a presença da União no polo passivo da lide e, por isso, compete à Justiça Federal julgar a lide. O Município, em sua defesa, também ofertou alegação nesse sentido.

No entanto, o MM. Juiz, Dr. Felipe Nobrega Silva, afastou a preliminar levantada pelos demandados, nos seguintes termos:

2. Das Preliminares e Prejudiciais

2.1 Do Litisconsórcio Passivo

Afirma a parte ré que a inclusão da União no polo passivo é imprescindível, tendo em vista o que dispõe o TEMA n. 793 do STF.

Não assiste razão ao réu.

É que, embora, a União seja, de fato, responsável pelo financiamento do medicamento constante do Grupo 1A do RENAME, no caso concreto, há uma peculiaridade que, a meu ver, afasta a inclusão do Ente no polo passivo da demanda.

O medicamento em questão já é padronizado no SUS, ou seja, o financiamento, por parte da União, para a aquisição do referido fármaco já está sendo realizado, o que se discute, no caso, é apenas o fornecimento do mesmo para o tratamento da patologia que acomete o interessado.

Sendo assim e levando-se em consideração que a distribuição do medicamento é de competência do Estado de Santa Catarina, REJEITO a preliminar arguida (Evento 44, Despadec 1).

Inconformado com a decisão, o agravante interpôs o presente recurso de agravo de instrumento afirmando que a União deve ser citada para compor o polo passivo da lide, com as seguintes alegações:

i) A hipótese dos autos cuida de tecnologia não incorporada ao SUS. A legislação sanitária contém dispositivos sobre as atribuições dos entes federados no SUS. A sua observância contribui para o funcionamento do SUS, e passa longe de imputar à União a criação de estrutura federal de saúde em 5.570 municípios brasileiros (Evento 1, INIC1, p. 04).

ii) Portanto, que o proceder do juízo, ao negar indevidamente a inclusão do ente federal no feito e manter o processo na Justiça Estadual, gera danos ao ente público estadual, sendo ato judicial que merece correção (Evento 1, INIC1, p. 06).

Formulou, assim, pedido de provimento do recurso "para que a parte agravada seja intimada para pedir a citação da União e o consequente encaminhamento do presente feito à Justiça Federal" (Evento 1, INIC 1, p. 08).

Razão assiste ao recorrente.

Da análise dos autos originários, observa-se que o medicamento pleiteado pelo paciente, "Ustequinumabe", é atualmente padronizado e incluído na Relação Nacional de Medicamento do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica - CEAF para a doença de psoríase, conforme se extrai da informação prestada pela Secretaria Estadual de Saúde; todavia, não é padronizado para a enfermidade de que o agravante é portador (Doença de Crohn Fistulizante (CID 10 - K.50), veja-se:

"O medicamento ustequinumabe está padronizado pelo Ministério da Saúde para portadores de Psoríase - CID 10 L 40.0, L 40.1 L 40.4, L 40.8, por meio do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF), na apresentação de 45mg/0,5 ml (injetável), sendo necessário o preenchimento dos critérios de inclusão definidos pelo Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas - PCDT da doença" (Evento 1, OUT3, autos originários).

Por isso, torna-se necessário analisar a questão com base em tratamento médico não padronizado pelo SUS, eis que o remédio não está padronizado para a enfermidade do paciente e, em razão disso, merece reforma a decisão proferida em caráter liminar no presente agravo, porquanto, conforme entendimento que passou a ser adotado por esta Câmara, a União, de fato, deve ser inclusa no polo passivo da lide e, consequentemente, os autos haverão de ser remetidos à Justiça Federal.

Explica-se.

O art. 23, inciso II, da CF/88, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios no que tange a saúde e assistência pública, razão pela qual a responsabilidade, entre os integrantes do sistema, é solidária.

Além disso, a Lei Federal n. 8.080/90, estabelece serem solidárias todas as esferas do Poder Público para o cumprimento das obrigações relativas à saúde. Ainda, o art. 15, da referida lei, dispõe que o Sistema Único de Saúde delegou aos Estados da Federação a administração dos recursos orçamentários e financeiros destinados à saúde. Por sua vez, o art. 17, inciso VIII, atribui competência "à direção estadual do Sistema Único de Saúde (SUS)" para "em caráter suplementar, formular, executar, acompanhar e avaliar a política de insumos e equipamentos para a saúde" (inciso VIII), sem afastar a legitimidade passiva do Município, dado que, consoante o art. 18, compete "à direção municipal do Sistema de Saúde (SUS) .... V - dar execução, no âmbito municipal, à política de insumos e equipamentos para a saúde" do que se pode concluir, mais uma vez, que a responsabilidade relativa aos cuidados com a saúde da população é solidária, incluindo também a União.

Nesse contexto, o Supremo Tribunal Federal adotou posicionamento de que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, é de responsabilidade solidária dos entes Federados, conforme denota-se do entendimento firmado com repercussão geral no Recurso Extraordinário n. 855.178 (Tema 793). Veja-se:

"Tema 793 - Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro" (tese firmada em 23.05.2019).

Não obstante, ao julgar e rejeitar os embargos declaratórios opostos contra o...

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