Acórdão Nº 5038522-19.2021.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 13-04-2023

Número do processo5038522-19.2021.8.24.0038
Data13 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5038522-19.2021.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN


APELANTE: ELI ROSA TIL RODEN (AUTOR) APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


1.1) Da inicial
ELI ROSA TIL RODEN ajuizou Ação Declaratória e Indenizatória em face de BANCO BMG S.A., alegando, em síntese, que buscou a casa bancária para realizar um mútuo bancário na modalidade de empréstimo consignado mas, para sua surpresa e sem seu conhecimento, fora pactuado um contrato de cartão de crédito consignado, com inclusão de reserva de margem consignável em seu benefício previdenciário. Falou, ainda, que a conduta do Banco lhe causou prejuízos materiais e morais.
Pugnou pela declaração de nulidade do negócio jurídico, pela repetição do indébito e pela condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Por fim, acostou documentos, requerendo a concessão da justiça gratuita e a procedência dos pedidos inaugurais.
1.2) Da contestação
Citada, a parte ré ofereceu resposta, em forma de contestação (eventos 10, 11 e 13). Como preliminar, alegou defeito de representação. Como prejudiciais de mérito, suscitou decadência e prescrição. No mérito, defendeu que a parte autora solicitou a emissão de cartão de crédito, sendo lícitas todas as cláusulas pactuadas, bem como sua contratação. Falou sobre a legalidade do cartão de crédito consignado e a inexistência de responsabilidade civil e dano moral. Apontou o uso predatório da jurisdição pelo advogado da parte autora, a impossibilidade de inversão do ônus da prova e o não cabimento da repetição de indébito. Requereu a extinção do feito com o acolhimento da preliminar ou das prejudiciais de mérito e, de forma subsidiária, a improcedência dos pedidos formulados na inicial. Pleiteou, no caso de procedência, a fixação moderada do quantum indenizatório com incidência dos encargos legais a partir da data do arbitramento e a devolução do montante creditado à parte autora ou a compensação de valores. Pediu a oitiva da parte autora para ratificar a sua ciência e anuência quanto ao ajuizamento desta demanda e, em caso de resposta negativa, o oficiamento ao Ministério Público e à Ordem dos Advogados do Brasil para apurar eventual prática de conduta típica e infração administrativa.
Juntou documentos (eventos 12/13).
1.3) Do encadernamento processual
Certificado nos autos pelo Cartório do juízo a quo "que, em consulta ao SAJ e ao EPROC, não foi verificada conexão na presente demanda" (evento 3).
Deferido o benefício da justiça gratuita e ordenada à parte ré a exibição de documentos (evento 5).
Manifestação sobre a contestação (evento 17).
1.4) Da sentença
Prestando tutela jurisdicional, o Juiz de Direito Fernando Seara Hickel afastou as prejudiciais de mérito arguidas pela parte ré e exarou sentença resolutiva de mérito para julgar parcialmente procedentes os pleitos formulados na peça inicial (evento 20), nos seguintes termos:
III - Pelo exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo PROCEDENTE EM PARTE os pedidos formulados por ELI ROSA TIL RODEN contra BANCO BMG S.A e, em consequência, i) declaro a ilegalidade da reserva de margem consignável no benefício previdenciário da parte autora; ii) condeno o réu à restituição dos valores debitados do benefício previdenciário da parte autora, quantia essa que deverá ser corrigida monetariamente pelo INPC-IBGE, a partir da data do desembolso, com incidência de juros moratórios desde a citação, mediante compensação, tudo a ser apurado em execução de sentença. Eventuais valores obtidos com o mútuo e passíveis de compensação deverão observar o mesmo índice de correção monetária, ou seja, o INCP-IBGE a partir da data do desembolso; iii) condeno a instituição financeira ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 8.000,00 (oito mil reais), valor este acrescido de correção monetária a partir do arbitramento e juros de mora desde o evento danoso (03/02/2017, evento n. 1, comprovante n. 5); iv) determino que o banco requerido se abstenha de efetuar limitação à margem crédito da parte autora a título de reserva de margem de cartão de crédito (RMC), devendo comprovar nos autos, em 15 dias, o cancelamento da limitação acima citada, sob pena de multa diária de R$ 200,00, limitada ao montante de R$ 25 mil. O termo inicial para incidência da multa será após o trânsito em julgado e deverá observar a súmula 410 do STJ.Em virtude da sucumbência recíproca, as custas processuais deverão ser suportadas na proporção de 80% pelo réu e 20% pelo autor, arbitrando-se os honorários em 10% do valor atualizado da condenação, cabendo 80% desse montante ao procurador do autor e 20% ao procurador do banco réu. Todavia, deferidos os benefícios da gratuidade de justiça a parte autora, suspendo a exigibilidade das referidas verbas em relação a esta por cinco anos, conforme art. 98, § 3º do CPC. (grifos do original)
1.5) Dos recursos
Irresignadas, as partes interpuseram recurso de Apelação (eventos 24 e 29).
Em suas razões recursais, a parte ré reitera os argumentos lançados na origem, com o que pretende a reforma total da sentença para extinguir o feito com acolhimento das prejudiciais de mérito e, de forma subsidiária, julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial e atribuir a sucumbência à parte autora. Pugna pela oitiva da parte autora para ratificar a sua ciência e anuência quanto ao ajuizamento desta demanda e, no caso de resposta negativa, a condenação do seu advogado por litigância de má-fé e o oficiamento ao Ministério Público, à Ordem dos Advogados do Brasil e à Autoridade Policial competente para apurar eventual prática de conduta típica e infração administrativa. Formula prequestionamento.
Já a parte autora requer a reforma parcial da sentença para determinar a repetição de indébito em dobro, a majoração do quantum indenizatório e a alteração do dies a quo de incidência dos encargos legais sobre tais montantes.
1.6) Das contrarrazões
Apresentadas (eventos 35 e 37).
É o relatório

VOTO


2.1) Do objeto recursal
A discussão é sobre decadência, prescrição, litigância de má-fé, uso predatório da jurisdição, validade do negócio jurídico, indenização por dano moral, repetição de indébito e sucumbência.
2.2) Do juízo de admissibilidade
Conheço dos recursos porque presentes requisitos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos, porquanto ofertados a tempo e modo, recolhido o preparo pela parte ré e dispensado à parte autora o seu recolhimento (art. 1.007, § 1º, CPC) evidenciados o objeto e a legitimação.
2.3) Das prejudiciais de mérito
2.3.1) Da prescrição
Alega a parte ré a ocorrência da prescrição por força do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil.
A discussão neste processo diz respeito essencialmente ao prazo prescricional aplicável a pretensão de declaração de inexistência de débito, cumulada com pedido de indenização por danos morais, originárias de contratos de reserva de margem consignáveis - RMC.
Pois bem, é indiscutível que tanto a pretensão declaratória, quanto o pedido condenatório, seja por repetição de indébito, seja por indenização por danos morais, advém da tese de inadimplemento contratual, decorrente de vício de consentimento, isto é, possuem a mesmo origem.
Sobre a prescrição nestas hipóteses, o Superior Tribunal de Justiça, por certo tempo, aplicou dois entendimentos distintos, um tomando o prazo quinquenal, consoante citado na decisão combatida, e outro com base no prazo decenal, na forma do artigo 205 do Código Civil.
Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, colocou fim a celeuma e uniformizou a incidência da prescrição decenal para responsabilidade civil contratual.
Vejamos:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL.INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS.I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual.II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador.III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual.IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico.V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado.VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do ...

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