Acórdão Nº 5040938-63.2022.8.24.0930 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 04-05-2023

Número do processo5040938-63.2022.8.24.0930
Data04 Maio 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 5040938-63.2022.8.24.0930/SC



RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN


APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU) APELADO: NICANOR RODRIGUES DOS SANTOS (AUTOR)


RELATÓRIO


1.1) Da inicial
NICANOR RODRIGUES DOS SANTOS ajuizou Ação Declaratória e Indenizatória em face de BANCO BMG S.A alegando, em síntese, que buscou a casa bancária para realizar um mútuo bancário na modalidade de empréstimo consignado mas, para sua surpresa e sem seu conhecimento, fora pactuado um contrato de cartão de crédito consignado, com inclusão de reserva de margem consignável em seu benefício previdenciário. Falou, ainda, que a conduta do Banco lhe causou prejuízos materiais e morais.
Pugnou pela declaração de nulidade do negócio jurídico, pela repetição do indébito e pela condenação ao pagamento de indenização por danos morais. Por fim, acostou documentos, requerendo a concessão da justiça gratuita e a procedência dos pedidos inaugurais.
1.2) Da contestação
Citada, a parte ré ofereceu contestação (evento 13) alegando, preliminarmente, a inépcia da inicial e a ocorrência de prescrição e decadência. Requereu providências quanto à atuação do causídico da parte requerente.
No mérito, defendeu que a parte autora solicitou a emissão de cartão de crédito, sendo lícitas todas as cláusulas pactuadas, bem como sua contratação. Falou sobre a legalidade do cartão de crédito com margem consignável, da inexistência de responsabilidade civil e de danos morais. Por fim, reiterou sobre a inexistência de prova do dano moral e pugnou pela improcedência dos pedidos iniciais.
1.3) Do encadernamento processual
Concedido o pedido de justiça gratuita (evento 4).
1.4) Da sentença
Prestando a tutela jurisdicional, a Dra. Ana Luisa Schmidt Ramos proferiu sentença resolutiva de mérito (evento 19), nos seguintes termos:
ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedentes os pedidos para:
1) anular o contrato de empréstimo via cartão de crédito com margem consignável (RMC);
2) determinar que a parte autora devolva o valor creditado em seu favor por força do contrato, com correção monetária pelo INPC desde a data do creditamento;
3) condenar a parte ré à restituição em dobro eventual valor que tenha sido descontado em seu favor com esteio no contrato, com correção monetária pelo INPC desde a data de cada desconto, com juros simples de mora de 1% a.m., desde a citação;
4) condenar a parte ré ao pagamento de indenização de R$ 5.000,00 por danos morais, corrigidos pelo INPC desde o arbitramento (Súmula 362 do STJ), com juros simples de 1% a.m., contados da citação (por se tratar de inadimplemento contratual).
5) As partes são reciprocamente credoras e devedoras, o que autoriza o encontro de contas com a extinção das obrigações na medida em que se compensarem (art. 368 do CC).
Diante da sucumbência mínima da parte autora, condeno a parte ré ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% do proveito econômico obtido.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.
1.5) Do recurso
Irresignada, a parte ré interpôs recurso de Apelação Cível (evento 26) alegando, inicialmente, a ocorrência de prescrição. No mérito, reiterou a existência do pacto e a legalidade do contrato de cartão de crédito consignado, bem como a ausência de danos morais e de valores a repetir. Alternativamente, discorreu sobre a necessidade de minorar a indenização fixada e falou que a devolução deve ser na forma simples. Assim, requereu a reforma do julgado.
1.6) Das contrarrazões
Ausente (evento 36).
É o relatório

VOTO


2.1) Do objeto recursal
A discussão é sobre a validade do negócio jurídico entabulado entre as partes.
2.2) Do juízo de admissibilidade
Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, recolhido o devido preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.
2.3) Da prejudicial de mérito
2.3.1) Da prescrição
Pois bem, é indiscutível que tanto a pretensão declaratória, quanto o pedido condenatório, seja por repetição de indébito, seja por indenização por danos morais, advém da tese de inadimplemento contratual, decorrente de vício de consentimento, isto é, possuem a mesmo origem.
Sobre a prescrição nestas hipóteses, o Superior Tribunal de Justiça, por certo tempo, aplicou dois entendimentos distintos, um tomando o prazo quinquenal, consoante citado na decisão combatida, e outro com base no prazo decenal, na forma do artigo 205 do Código Civil.
Contudo, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos Embargos de Divergência n. 1.281.594, em 15/05/2019, colocou fim a celeuma e uniformizou a incidência da prescrição decenal para responsabilidade civil contratual.
Vejamos:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. DISSENSO CARACTERIZADO. PRAZO PRESCRICIONAL INCIDENTE SOBRE A PRETENSÃO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL.INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205, DO CÓDIGO CIVIL, SALVO EXISTÊNCIA DE PREVISÃO EXPRESSA DE PRAZO DIFERENCIADO. CASO CONCRETO QUE SE SUJEITA AO DISPOSTO NO ART. 205 DO DIPLOMA CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS.I - Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência tem como finalidade precípua a uniformização de teses jurídicas divergentes, o que, in casu, consiste em definir o prazo prescricional incidente sobre os casos de responsabilidade civil contratual.II - A prescrição, enquanto corolário da segurança jurídica, constitui, de certo modo, regra restritiva de direitos, não podendo assim comportar interpretação ampliativa das balizas fixadas pelo legislador.III - A unidade lógica do Código Civil permite extrair que a expressão "reparação civil" empregada pelo seu art. 206, § 3º, V, refere-se unicamente à responsabilidade civil aquiliana, de modo a não atingir o presente caso, fundado na responsabilidade civil contratual.IV - Corrobora com tal conclusão a bipartição existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual, advinda da distinção ontológica, estrutural e funcional entre ambas, que obsta o tratamento isonômico.V - O caráter secundário assumido pelas perdas e danos advindas do inadimplemento contratual, impõe seguir a sorte do principal (obrigação anteriormente assumida). Dessa forma, enquanto não prescrita a pretensão central alusiva à execução da obrigação contratual, sujeita ao prazo de 10 anos (caso não exista previsão de prazo diferenciado), não pode estar fulminado pela prescrição o provimento acessório relativo à responsabilidade civil atrelada ao descumprimento do pactuado.VI - Versando o presente caso sobre responsabilidade civil decorrente de possível descumprimento de contrato de compra e venda e prestação de serviço entre empresas, está sujeito à prescrição decenal (art. 205, do Código Civil).Embargos de divergência providos. (EREsp 1281594/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Rel. p/ Acórdão Ministro FELIX FISCHER, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/05/2019, DJe 23/05/2019).
Logo, quando a pretensão deriva de inadimplemento contratual, de regra, tem-se a prescrição decenal. Contudo, se presente regra específica sobre o caso, possível a discussão.
Ocorre que, em hipóteses de inadimplemento contratual decorrente da ausência de informação, como nos casos em que se debate, o vício de consentimento não pode ser tomado como característico de um fato de consumo, isto é, um defeito, haja vista que a parte sequer, conforma suas alegações, queria tal serviço.
Desta forma, porque não caracterizado um fato de consumo, é equivoca contar o prazo prescricional sob a ótica do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, de modo que prepondera a regra geral da Lei Civil.
Colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. FATO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO. NÃO OCORRÊNCIA. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL.PRESCRIÇÃO DECENAL. DECISÃO MANTIDA.1. O prazo prescricional quinquenal do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor restringe-se às ações de reparação de danos decorrentes de fato do produto ou do serviço, o que não é o caso dos autos.2. Segundo decidido por esta Corte Superior, "O prazo de prescrição de pretensão fundamentada em inadimplemento contratual, não havendo regra especial para o tipo de contrato em causa, é o decenal, previsto no art. 205 do Código Civil" (AgInt no AREsp 459.926/MG, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 26/2/2019, DJe 6/3/2019).3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1435600/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 06/05/2020).
No mesmo prumo:
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL....

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