Acórdão Nº 5041952-87.2022.8.24.0023 do Primeira Câmara de Direito Público, 28-03-2023

Número do processo5041952-87.2022.8.24.0023
Data28 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão










Apelação / Remessa Necessária Nº 5041952-87.2022.8.24.0023/SC



RELATOR: Desembargador PAULO HENRIQUE MORITZ MARTINS DA SILVA


APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: CSL BEHRING COMERCIO DE PRODUTOS FARMACEUTICOS LTDA (IMPETRANTE)


RELATÓRIO


CSL Behring Comércio de Produtos Farmacêuticos Ltda. impetrou mandado de segurança contra ato do Sr. Diretor da Administração Tributária da Secretaria de Estado da Fazenda de Santa Catarina.
Sustentou que: 1) em decorrência do julgamento da ADI n. 5.469 pelo STF (Tema 1.093), foi editada a Lei Complementar n. 190/2022, publicada em 5-1-2022, regulamentando a cobrança do DIFAL em operações de envio de mercadorias destinadas a consumidor final não contribuinte do ICMS; 2) a referida LC estabeleceu, em seu art. 3º, que devem ser observadas a anterioridade anual e a nonagesimal, previstas no art. 150, III, alínea "b", da Constituição Federal; 3) o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) autorizou a cobrança pelos estados no exercício de 2022, por meio do Convênio 236/2021 e 4) a cobrança é inexigível.
Postulou:
iv) Confirmar, ao final, a medida liminar, a fim de CONCEDER A SEGURANÇA pleiteada na presente ação, para:
a) reconhecer o direito líquido e certo da Impetrante em não se sujeitar à incidência/cobrança/apuração do diferencial de alíquota de ICMS (ICMS-DIFAL) e, por consequência, do Fundo de Combate à Pobreza (FCP), instituído pela Lei Complementar nº 190/2022 e, no Estado de Santa Catarina, pela Lei Estadual nº 16.853/2015, em todas as operações interestaduais realizadas até a edição de nova norma estadual regulamentadora, especialmente durante o exercício financeiro de 2022, ou, de maneira subsidiária, durante os 90 (noventa) dias de vacatio legis do artigo 3º da LC nº 190/2022, observando-se os princípios da anterioridade anual e/ou da anterioridade nonagesimal;
b) reconhecer o direito de crédito da Impetrante e, por ato conseguinte, o direito à devolução, mediante restituição, creditamento ou compensação após o trânsito em julgado, dos valores indevidamente recolhidos a título de ICMS-DIFAL e, por consequência, do Fundo de Combate à Pobreza (FCP), montante a ser atualizado monetariamente pelo índice de correção monetária em vigor na legislação de regência ou para outro índice que venha a substitui-lo e que reflita a real inflação do período, desde a data da efetiva apuração até a sua utilização, nos termos dos artigos 165, I, 168, I, 170 e 170-A, todos do CTN, ressalvado o direito da D. Autoridade Coatora de, tão somente, averiguar a exatidão do quantum. [...] (autos originários, Evento 1)
Em informações, o Estado disse que: 1) inexiste prova pré-constituída do ato coator; 2) a CF autoriza e estabelece os critérios necessários para a cobrança e 3) em relação à produção dos efeitos da Lei Complementar n. 190/2022, defendeu a necessidade de aplicação da anterioridade nonagesimal (autos originários, Evento 37).
Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:
Ante o exposto, confirmo a liminar e, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, CONCEDO a segurança pleiteada para:
a) DETERMINAR que o impetrado se abstenha de exigir da parte impetrante o diferencial de alíquota de ICMS (DIFAL), nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final, não contribuinte do imposto, no Estado de Santa Catarina, até que sobrevenha o termo inicial da vigência da Lei Complementar Federal nº 190/2022 (1º de janeiro de 2023), observada a anterioridade nonagesimal e anual.
b) DECLARAR o direito à compensação (ou creditamento) de créditos ainda não atingidos pela prescrição, nos termos da Súmula 213 do STJ.
O ente público é isento do pagamento da taxa de serviços judiciais.
Sem honorários advocatícios (art. 25, Lei n. 12.016/2009; Súmulas nº 105 do STJ e nº 512 do STF).
Decorrido o prazo de recurso, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina para reexame necessário (Lei 12.016/09, art. 14, § 1º). (grifos no original) (grifos no original) (autos originários, Evento 44)
O ente público, em apelação, arguiu, preliminarmente, nulidade da sentença, por ser extra petita, tendo em vista que "o Impetrante não formulou pedido expresso para observar o princípio da anterioridade em relação à Lei Federal 190/22". No mérito, alegou que: 1) a decisão do STF na ADI 5.469 e o Tema 1.093 só atingiram as cláusulas do Convênio 93/2015 do Confaz e não as leis estaduais editadas após a EC 87/2015; 2) a LE n. 16.853/2015 produz efeitos imediatos após a publicação da LC 190/2022, na linha do que decidiu o STF no Tema 1.094; 3) não se pode permitir que "uma lei complementar federal estabeleça lapso temporal para cobrança do DIFAL-ICMS por outro Ente Federativo, sob pena de patente vício de inconstitucionalidade pela imposição de indevido obstáculo ao exercício de competência tributária outorgada constitucionalmente aos Estados"; 4) a LC 190/2022 cuida apenas de repartição de receitas entre os estados, de modo que não se submete à garantia da anterioridade anual ou nonagesimal; 5) a MP 250/2022 apenas adaptou a Lei Estadual n. 16.853/2015 aos balizamentos definidos pela LC 190/2022, "de modo que não houve aumento da carga tributária"; 6) a segurança não poderia ter sido concedida para autorizar a produção de efeitos patrimoniais pretéritos, o que encontra óbice nas súmulas 213 do STJ e 269 e 271 do STF (autos originários, Evento 51).
Com as contrarrazões (autos originários, Evento 61), a d. Procuradoria-Geral de Justiça entendeu ausente o interesse ministerial (Evento 7)

VOTO


1. Mérito
Caso praticamente idêntico foi recentemente julgado por esta Corte:
MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO - TRIBUTÁRIO - ICMS - INCONSTITUCIONALIDADE DO DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS DESTINADAS AO CONSUMIDOR NÃO CONTRIBUINTE DO IMPOSTO - ADI 5.469 - MODULAÇÃO DOS EFEITOS PARA 2022, RESSALVADAS AS AÇÕES EM CURSO - MARCO TEMPORAL DEFINIDO PELO STF COMO DATA DO JULGAMENTO - IMPETRAÇÃO POSTERIOR - LC 190/2022 - PRODUÇÃO DE EFEITOS QUE SE SUBMETE APENAS À ANTERIORIDADE NONAGESIMAL - COMPREENSÃO CONVERGENTE COM A DECISÃO DE INDEFERIMENTO DA CAUTELAR NA ADI 7.066 - ORIENTAÇÃO MAJORITÁRIA DESTE TRIBUNAL - COMPENSAÇÃO - INTERESSE DE AGIR - CONCESSÃO DA ORDEM PARCIALMENTE MODIFICADA.1. A partir da EC 87/2015, o ICMS incidente sobre circulação interestadual de mercadorias e serviços passou a ser repartido entre os Estados de origem e destino, competindo a este o valor correspondente à diferença entre as alíquotas interestadual e interna (Difal do ICMS). Só que o Convênio 93/2015 do Confaz que tratou do tema foi declarado inconstitucional ante a necessidade de edição de lei complementar nacional veiculando normas gerais (STF, ADI 5.469 e Tema 1.093). 2. Houve, ainda, modulação dos efeitos para manter a validade da cobrança com base nesses diplomas e nas leis estaduais até o início de 2022, ressalvadas as ações em curso. Quanto ao marco temporal, o STF, por conta de embargos de declaração na ADI 5.459, compreendeu que corresponde à data de julgamento, de sorte que o caso concreto não está abrangido pela ressalva derradeira.3. Lei Estadual 16.853/2015 (posterior à EC 87/2015, mas anterior à LC 190/2022) foi convalidada pela superveniência da lei federal regulamentadora, embora com efeitos limitados a data de vigência desta. Compreensão convergente com a tese jurídica fixada pelo STF no Tema 1.094.4. Regulamentação da EC 87/2015 efetuada pela LC 190 publicada em 5-1-2022, cuja produção de efeitos não está subordinada à anterioridade anual, uma vez que apenas equalizou a distribuição do ICMS devido em operações interestaduais para compartilhar o resultado da arrecadação entre os estados de destino e de origem da mercadoria, hipótese que já havia sido prevista anteriormente pela EC 87/2015. Modificação do sujeito ativo que não tratou do aumento da carga tributária ou mesmo da criação de novo tributo, razão pela qual não é capaz de surpreender o contribuinte a ponto de justificar, por questão de segurança jurídica, o transcurso de um exercício financeiro para que possa ser implementada.Interpretação, aliás, que converge com a decisão do Min. Alexandre de Moraes que indeferiu a cautelar na ADI n. 7.066, mantendo a eficácia do art. 3º da LC n. 190/2022 que prevê a aplicação exclusiva da anterioridade nonagesimal.Orientação majoritária deste Tribunal no mesmo sentido.Possibilidade de cobrança do Difal no exercício de 2022 após decorridos 90 dias da data de publicação da LC 190/2022, que justifica a modificação parcial da sentença que afastou a exigência até 1º-1-2023.5. Mandado de segurança não é ação de cobrança, não sendo cabível a impetração para fazer o papel de repetição de indébito tributário (Súmulas 269 e 271 do STF). O vencedor em ação de repetição de indébito pode optar na fase de execução pela mera compensação; mas variação semelhante não cabe nos limites da eficácia do writ.Aqui, porém, o pedido é voltado exclusivamente à compensação. Não se busca que o juízo diga quais parcelas podem ser compensadas, mas o comando imperativo para que o Fisco permita o encontro de contas, afastando algum possível empecilho.Bem por isso, não existe necessidade de incursionamento a respeito da situação de fato, mas apenas uma demonstração genérica do interesse de agir, como por exemplo a revelação de uma única operação que seja passível do encontro extrajudicial de contas.Em tese, porém, se já houver controvérsia a respeito de dado de fato, é também possível decisão judicial a propósito dessa específica situação. Compreensão que converge com o Tema 118 do STJ.6. Recurso do Estado parcialmente provido.(AC/RN n. 5016663-55.2022.8.24.0023, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 6-9-2022)
Mudando o que deve ser mudado, a lide é igual.
Em resumo, em ambos os casos, a impetrante pretende...

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