Acórdão Nº 5043278-53.2020.8.24.0023 do Terceira Câmara de Direito Público, 08-11-2022

Número do processo5043278-53.2020.8.24.0023
Data08 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5043278-53.2020.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - IPREV (INTERESSADO) APELADO: DANIEL PIRES NEVES (IMPETRANTE) APELADO: JOAO MARIA SOARES (IMPETRANTE) APELADO: RONALD DA SILVEIRA (IMPETRANTE) APELADO: WILSON CARLOS ALVES LOURENCO (IMPETRANTE) APELADO: VILSON BELMIRIO DA SILVA (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Na Comarca da Capital, Daniel Pires Neves, João Maria Soares, Ronald da Silveira, Vilson Belmírio da Silva, Wilson Carlos Alves Lourenço impetraram mandado de segurança contra ato coator do Presidente do Instituto de Previdência Social - IPREV, alegando que são policiais da reserva remunerada e contribuíam à previdência no percentual de 14% (quatorze por cento) sobre a parcela de proventos que superava o limite máximo estabelecido para os benefícios do RGPS, de acordo com o art. 92, da Lei Complementar n. 412/2008; que a situação perdurou até dezembro de 2019, quando foi criado o Sistema de Proteção dos Militares, instituindo a contribuição para a pensão militar, devida por ativos, inativos e pensionistas; que a autoridade coatora passou a cobrar e descontar a contribuição de proteção social dos militares no percentual de 9,5% sobre o total dos proventos para pensão dos militares e pensionistas; que as alíquotas cobradas pelo impetrado são ilegais, porque, inexiste lei estadual específica a tratar da matéria; que à União compete apenas a criação de normas gerais e aos Estados cabe legislar sobre matéria específica; que a cobrança é ilegal, porque não podem os impetrantes ser cobrados por uma contribuição não prevista em lei; que a cobrança deve ser suspensa.

Postularam, assim, pedido liminar "com a finalidade de suspender a eficácia do ato administrativo do Presidente do IPREV manifestamente ilegal que determinou a cobrança e desconto da contribuição de proteção social dos militares (pensão militar) sem previsão em lei estadual específica, violando o princípio da legalidade, do pacto federativo e da reserva de iniciativa de lei do Chefe do Poder Executivo Estadual, em desconformidade com os comandos constitucionais supracitados, determinando que cesse a ilegalidade, suspendendo a cobrança e desconto da contribuição de proteção social dos militares (contribuição para pensão militar) no percentual de 9,5% sobre o total dos proventos dos impetrantes até 90 dias após a publicação da lei específica que instituir o tributo" e, ao final, "confirmada a liminar, concedendo a segurança para declarar a ilegalidade da cobrança e desconto da contribuição de proteção social dos militares sem previsão de lei estadual específica, no percentual de 9,5% sobre o total dos proventos dos impetrantes, declarando, desta forma o direito líquido e certo dos impetrantes de não serem obrigados a pagar o tributo (contribuição para pensão militar) até 90 dias após a publicação da lei específica estadual que o instituir".

O pedido liminar foi parcialmente concedido. Contra essa decisão, o IPREV interpôs recurso de agravo de instrumento n. 5030629-28.2020.8.24.0000, que foi desprovido.

Notificado, o IPREV apresentou informações (defesa) destacando que o Estado deve ser incluído no polo passivo da lide na condição de litisconsorte passivo necessário; que "a pretensão incorre em flagrante transgressão à Lei Federal n. 13.954/2019, uma vez que há disposição expressa (art. 25) vedando a aplicação do art. 92 da LCE 412/08, invocado como espeque da impetração"; que a aplicação atual da alíquota de contribuição social dos Militares de 9,5% trouxe elevação ao incremento na arrecadação do Estado; que a alteração das alíquotas atingiu em torno de 96% dos Militares da Reserva; que deve ser "denegada a segurança, mantendo-se as alíquotas da Lei Federal até a regulamentação, por lei específica Estadual, do Regime de Proteção Social dos Militares Estaduais".

Após, foi proferida sentença que concedeu, em parte, "a segurança, para o fim de determinar à autoridade impetrada que se abstenha de aplicar o art. 24-C do Decreto-Lei n. 667/1969, com redação dada pela Lei n. 13.954/2019, para o cálculo da contribuição previdenciária, restaurando a eficácia do disposto no art. 17 da Lei Complementar estadual n. 412/2008, tornando definitiva a medida deferida initio litis e extinguindo o processo com resolução de mérito, forte no art. 487, I, do CPC".

Contra essa decisão, os impetrantes opuseram embargos declaratórios, que não foram acolhidos.

Inconformado, o IPREV interpôs recurso de apelação alegando que a alíquota cobrada dos militares e discutida no processo deve ser tida como legal, pois está expressa na legislação federal, em especial, no art. 24-C, do Decreto-Lei 667/69, com redação incluída pela Lei Federal n. 13.954/2019; que referida lei vedou a aplicação do art. 92 da Lei Complementar Estadual n. 412/08; que é cabível a cobrança da alíquota discutida nos autos, levando-se em consideração a constitucionalidade da incidência da lei tributária sobre fatos posteriores à sua vigência (art. 150, inciso III, da CF/88); que a União possui competência para legislar sobre normas gerais da previdência dos militares estaduais; que "a LC Estadual 773/2021 que reformou a previdência aqui em SC, as contribuições previdenciárias da LC 412/08 foram alteradas e, a partir de 11/11/2021, incidirá a contribuição previdenciária de inativos e pensionistas em 14% sobre o que exceder 01 (um) salário mínimo e não mais o que exceder o teto do Regime Geral de Previdência Social".

Com as contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal e foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça que, no parecer da lavra do Exmo. Sr. Procurador de Justiça, Dr. João Fernando Quagliarelli Borrelli, manifestou-se pelo desprovimento do recurso.

VOTO

Inicialmente, convém esclarecer que o inciso LXIX do art. 5º da Constituição Federal de 1988, reproduzido em termos pelo art. 1º da Lei Federal n. 1.533, de 31/12/1951 e mais recentemente pelo art. 1º da Lei Federal n. 12.016, de 7/8/2009, efetivamente garante a todos a concessão de "mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".

No entanto, o direito líquido e certo a ser amparado por mandado de segurança deve vir comprovado desde logo com a impetração, porquanto nessa via processual não se admite dilação probatória para a sua comprovação.

HELY LOPES MEIRELLES, acerca do que se deve entender por direito líquido e certo, ensina:

"Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais.

"Quando a lei alude a direito líquido e certo, está exigindo que esse direito se apresente com todos os requisitos para seu reconhecimento e exercício no momento da impetração. Em última análise, direito líquido e certo é direito comprovado de plano. Se depender de comprovação posterior, não é líquido nem certo, para fins de segurança" (Mandado de Segurança. 33. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 37).

VICENTE GRECO FILHO, acerca da impossibilidade de dilação probatória em mandado de segurança, leciona:

"O pressuposto do mandado de segurança, portanto, é a ausência de dúvida quanto à situação de fato, que deve ser provada documentalmente. Qualquer incerteza sobre os fatos decreta o descabimento da reparação da lesão através do mandado, devendo a parte pleitear seus direitos através de ação que comporte a dilação probatória. Daí dizer-se que o mandado de segurança é um processo sumário documental, isto é, um processo rápido, concentrado, fundado em prova documental. No caso de não ser possível a apreciação do pedido por haver dúvida quanto à matéria de fato, por outro lado, pode o interessado propor a demanda adequada, não ocorrendo contra ele o fenômeno da coisa julgada" (Direito processual civil brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 308).

Então, a via do "writ of mandamus" é destinada à proteção de direito líquido e certo, cuja comprovação dos fatos e situações concretas para exercício do direito é verificada de plano, por prova pré-constituída incontestável, para que não pairem dúvidas ou incertezas sobre esses elementos.

No caso dos autos, os impetrantes alegam na vestibular que "o presente writ tem por objeto a cobrança e desconto ilegal da contribuição para pensão militar instituída pela Lei Federal 13.954/2020 que criou o sistema de Proteção de Social dos Militares, ante a inexistência de lei específica estadual" (Evento 1, INIC1, p. 02 - autos na origem).

Diante disso, formularam o seguinte pedido:

"Seja ao final, confirmada a liminar, concedendo a segurança para declarar a ilegalidade da cobrança e desconto da contribuição de proteção social dos militares sem previsão de lei estadual específica, no percentual de 9,5% sobre o total dos proventos dos impetrantes, declarando, desta forma o direito líquido e certo dos impetrantes de não serem obrigados a pagar o tributo (contribuição para pensão militar) até 90 dias após a publicação da lei específica estadual que o instituir"(Evento 1, INIC1, p. 12).

A ordem foi concedida de forma parcial pelo juízo para "o fim de determinar à autoridade impetrada que se abstenha de aplicar o art. 24-C do Decreto-Lei n. 667/1969, com redação dada pela Lei n. 13.954/2019, para o cálculo da contribuição previdenciária, restaurando a eficácia do disposto no art. 17...

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