Acórdão Nº 5044136-39.2020.8.24.0038 do Quinta Câmara Criminal, 18-08-2022

Número do processo5044136-39.2020.8.24.0038
Data18 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 5044136-39.2020.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: MAURO MENDES (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Mauro Mendes, imputando-lhe o cometimento do delito previsto no art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990, por 12 (doze) vezes, na forma do art. 71 do Código Penal, conforme os fatos narrados na peça acusatória (doc. 2 da ação penal):

O denunciado, na condição de titular de 'MEQ SERVIÇOS DE USINAGEM EIRELI ME.', CNPJ n. 03.775.086/0001-12 e Inscrição Estadual n. 25.553.667-4, estabelecida na Rua Brasília, n. 136, Bairro Nova Brasília, em Joinville, deixou de efetuar, no prazo legal, o recolhimento de R$ 126.595,27 (cento e vinte seis mil quinhentos e noventa e cinco reais e vinte e sete centavos) a título de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS cobrado de consumidores, locupletando-se ilicitamente mediante este tipo de apropriação de valores em prejuízo ao estado de Santa Catarina, conforme declarado pelo sujeito passivo da obrigação por meio do PGDAS-D (Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional - Declaratório) quanto aos meses de dezembro de 2015, fevereiro, março, junho, julho, agosto, novembro e dezembro de 2016 e setembro, outubro, novembro e dezembro de 2017, documentos geradores da Dívida Ativa n. 19046680439, inscrita em 07/08/2019.

É de se registrar que os débitos relacionados aos meses de apuração de dezembro de 2015 e fevereiro, março, junho, julho e agosto de 2016 foram objetos do Parcelamento n. 001 (vide extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 24/10/2016 a 16/01/2017. Também, os débitos correspondentes aos períodos de apuração de dezembro de 2015 e fevereiro e março de 2016 foram alvo do Parcelamento n. 9001 (vide extrato anexo), o qual foi cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 16/01/2017 a 28/01/2018. Por fim, os débitos referentes aos meses de junho, julho, agosto, novembro e dezembro de 2016 foram objetos do Parcelamento n. 002 (vide extratos anexos), também cancelado, ocorrendo a suspensão da pretensão punitiva do Estado e do curso prescricional no período de 06/02/2017 a 14/01/2018, tudo conforme preceitua o §2º do art. 83 da Lei n. 9.430/96, com nova redação dada pelo art. 6º da Lei n. 12.382/11.

Recebido o libelo (doc. 6 da ação penal) e encerrada a instrução processual, sobreveio sentença, julgando procedente a pretensão estatal para condenar o réu à detenção de 10 (dez) meses, em regime aberto, bem como ao pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, valorados no mínimo legal. A sanção corporal findou substituída por uma restritiva de direitos. (doc. 27 da ação penal)

Irresignado, apelou a defesa (doc. 30 da ação penal).

Em síntese, com vistas à absolvição, alegou que: a) as provas amealhadas são incapazes de provocar a responsabilização criminal do empresário; b) o dispositivo normativo incidente afronta o texto constitucional; c) a ação carece de tipicidade; d) não havia como se exigir conduta diversa. De modo subsidiário, sustentou que o agentivo desconhecia a legislação aplicável e perpetrou a infração por motivo de relevante valor social ou moral, fatores que devem atenuar a reprimenda, além de pleitear a redução da pena de multa. Por fim, aventou a hipótese de recorrer em liberdade. (doc. 32 da ação penal)

O órgão ministerial apresentou contrarrazões (doc. 33 da ação penal).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Excelentíssimo Senhor Doutor Jorge Orofino da Luz Fontes, o qual se manifestou pelo conhecimento parcial e, nesta extensão, desprovimento do recurso (doc. 3).

Este é o relatório.

Documento eletrônico assinado por ANTONIO ZOLDAN DA VEIGA, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2538223v16 e do código CRC 3a283518.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): ANTONIO ZOLDAN DA VEIGAData e Hora: 1/8/2022, às 17:41:57





Apelação Criminal Nº 5044136-39.2020.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador ANTÔNIO ZOLDAN DA VEIGA

APELANTE: MAURO MENDES (ACUSADO) APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)

VOTO

1. Admissibilidade

A apelação comporta conhecimento parcial, uma vez que falta interesse jurídico ao pedido para recorrer em liberdade. Afinal, a providência sucedeu adotada na instância originária.

Senão vejamos (doc. 27 da ação penal):

Permito o recurso em liberdade (art. 387, § 1º, do CPP), já que, para além da incompatibilidade da custódia com a reprimenda aplicada, "segundo o entendimento desta Corte, aquele que respondeu solto à ação penal assim deve permanecer após a condenação em primeira instância, se ausentes novos elementos que justifiquem a alteração de sua situação" (STJ, HC nº 384831/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca).

Logo, não se admite o recurso na espécie, conquanto as demais teses ventiladas na insurgência devam ser analisadas em seguida, posto que concentram os pressupostos necessários.

2. Míngua probatória

Não obstante tenha asseverado a defesa que o arcabouço probatório deixa margem à dúvida razoável acerca da prática delituosa, vale salientar que há elementos suficientes para a lavratura de édito condenatório em face do acusado, dada sua efetiva incorrência no art. 2°, II, da Lei n. 8.137/1990.

A materialidade está amparada em notícia-crime (doc,. 3, p. 2, da ação penal), termo de inscrição de dívida ativa (doc. 3, p. 3, da ação penal), demonstrativo de débitos (doc. 3, p. 4, do inquérito policial), extratos do PGDAS-D (doc. 3, p. 5-16, da ação penal) e de parcelamentos (doc. 3, p. 20-22, da ação penal), sendo que a autoria se encontra estampada no contrato social da sociedade empresária (doc. 3, p. 23-31, da ação penal) e na própria confissão do réu (doc. 22 da ação penal).

A Lei Estadual n. 10.297/1996, que trata do "Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias", dispõe: "Art. 32. O imposto a recolher será apurado mensalmente, pelo confronto entre os débitos e os créditos escriturados durante o mês, em cada estabelecimento do sujeito passivo." Já o art. 60 do RICMS/SC determina que "o imposto será recolhido até o 10° (décimo) dia após o encerramento do período de apuração".

De maneira inconteste, as evidências apontam que Mauro Mendes, enquanto titular da companhia MEQ Serviços de Usinagem EIRELI, por 12 (doze) meses entre 2015 e 2017, deixou de recolher ICMS cobrado de terceiro na qualidade de sujeito passivo, gerando aos cofres públicos prejuízo estimado em, pelo menos, R$ 126.595,27 (cento e vinte seis mil quinhentos e noventa e cinco reais e vinte e sete centavos).

3. Inconstitucionalidade do tipo penal

Consoante fundamentado no inconformismo, o corretivo extremo imposto ao denunciado caracteriza constrangimento ilegal, porquanto reina em solo nacional a vedação à prisão civil por dívida, entabulada no art. 5°, LXVII, da Constituição Federal.

Sem razão.

Isso pois a Suprema Corte assentou posição, em sede de repercussão geral, de que a norma sob exame não ofende a Carta Magna, visto que possui caráter penal, tutela a ordem tributária e reprime a sonegação fiscal, em nada se relacionando com a medida outrora banida do ordenamento jurídico pátrio.

A propósito:

PENAL E CONSTITUCIONAL. CRIMES PREVISTOS NA LEI 8.137/1990. PRISÃO CIVIL POR DÍVIDA. OFENSA AO ART. 5º, LXVII, DA CONSTITUIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. I - O Tribunal reconheceu a existência de repercussão geral da matéria debatida nos presentes autos, para reafirmar a jurisprudência desta Corte, no sentido de que a os crimes previstos na Lei 8.137/1990 não violam o disposto no art. 5º, LXVII, da Constituição. II - Julgamento de mérito conforme precedentes. III - Recurso extraordinário desprovido. (STF, ARE n. 999.425, rel. Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, j. 2-3-2017 - grifou-se)

Destarte, não há falar em inconstitucionalidade do art. 2°, II, da Lei n. 8.137/1990.

4. Atipicidade da conduta

Superada a questão da compatibilidade entre o tipo penal violado e a Lei Maior, o próximo argumento concerne à atipicidade da conduta. Segundo o raciocínio exposado, o mero inadimplemento de imposto declarado não constitui crime, tão somente obrigação pecuniária passível de execução, dado que o empresário não manifesta o indispensável dolo de assenhoreamento, tampouco se traduz em devedor contumaz.

Melhor sorte, contudo, não lhe assiste.

O ICMS é classificado como imposto indireto. Portanto, a ausência de arrecadação excede o simples descumprimento...

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