Acórdão Nº 5044237-53.2022.8.24.0023 do Primeira Câmara de Direito Público, 18-10-2022

Número do processo5044237-53.2022.8.24.0023
Data18 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão
Apelação / Remessa Necessária Nº 5044237-53.2022.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FERNANDO BOLLER

APELANTE: ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: PLAXMETAL S/A - INDUSTRIA DE CADEIRAS CORPORATIVAS (IMPETRANTE)

RELATÓRIO

Cuida-se de Reexame Necessário, e de Apelação interposta por Estado de Santa Catarina, em objeção à sentença prolatada pela magistrada Cleni Serly Rauen Vieira - Juíza Substituta lotada e em exercício na 3ª Vara da Fazenda Pública da comarca da Capital -, que no Mandado de Segurança Preventivo n. 5044237-53.2022.8.24.0023, impetrado por Plaxmetal S/A. - Indústria de Cadeiras Corporativas, concedeu a segurança pleiteada, nos seguintes termos:

Trata-se de Mandado de Segurança preventivo, com pedido liminar, impetrado por PLAXMETAL S/A - INDÚSTRIA DE CADEIRAS CORPORATIVAS contra ato a ser atribuído ao Diretor de Administração Tributária - ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis.

Aduziu a parte impetrante, em suma, que: a) em decorrência do julgamento da ADI nº 5.469 e do RE nº 1.287.019/DF pelo STF (Tema 1.093), foi editada a Lei Complementar nº 190/2022, publicada em 05/01/2022, regulamentando a cobrança do DIFAL em operações de envio de mercadorias destinadas a consumidor final não contribuinte do ICMS; b) a referida LC estabeleceu, em seu art. 3º, que devem ser observadas a anterioridade anual e a nonagesimal, previstas no art. 150, III, alíneas "b" e "c", da Constituição Federal; c) o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) autorizou a cobrança pelos estados no exercício de 2022, por meio do Convênio 236/2021; d) a cobrança do DIFAL no exercício de 2022 é inexigível. Em razão disso, postulou a concessão da liminar para que seja suspensa a exigibilidade do Diferencial de Alíquota de ICMS no exercício de 2022. No mérito, requereu a concessão da ordem para determinar que a autoridade coatora se abstenha de exigir da impetrante, antes de janeiro de 2023, o ICMS decorrente do diferencial de alíquota (DIFAL) nas operações interestaduais de circulação de mercadorias destinadas a consumidores finais não contribuintes do imposto. Valorou a causa e juntou documentos (ev. 1).

[...]

Ante o exposto, confirmo a liminar e, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, CONCEDO a segurança pleiteada para DETERMINAR que o impetrado se abstenha de exigir da parte impetrante o diferencial de alíquota de ICMS (DIFAL), nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto, no Estado de Santa Catarina, até que a lei complementar federal nº 190/2022 seja plenamente eficaz (a partir do exercício de 2023), observando-se a anterioridade nonagesimal e anual.

Malcontente, o Estado de Santa Catarina argumenta que:

[...] o argumento de que a Lei Complementar Federal nº 190/22 deve respeito aos princípios da anterioridade tributária anual não tem fundamento jurídico.

Em primeiro lugar deve ser registrado que a respeitável Sentença é extra petita, pois o Impetrante não formulou pedido expresso para observar o princípio da anterioridade em relação à Lei Federal 190/22, de modo que tal determinação deve ser excluída da parte final dispositiva por Vossa Excelências.

[...] apenas a legislação estadual deve observância às anterioridades anual e nonagesimal, uma vez que se trata de norma que realmente instituiu o DIFAL-ICMS, sendo que, caso a lei do Estado já tenha respeitado tais princípios, deve produzir imediatamente os seus efeitos no momento da publicação da LC nº 190/22 que, no caso em comento, ocorreu no dia 05 (cinco) de janeiro de 2022.

[...] a própria EC nº 87/15 estabeleceu um prazo dilatado de vacatio legis que, inclusive, equipara-se ao período determinado para a observância das anterioridades anual e nonagesimal.

Não bastasse isso, para dar cumprimento à nova Ordem Constitucional, foi editada no Estado de Santa Catarina a Lei nº 16.853/2015, que alterou a redação do artigo 4º da Lei nº 10.297/96, objetivando normatizar a cobrança do DIFAL-ICMS na prestação de serviços e operações "iniciadas em outra Unidade da Federação com destino a consumidor final não contribuinte do imposto, localizado neste Estado" (XV e XVI). [grifou-se].

[...] o Excelso Pretório NÃO declarou a inconstitucionalidade das legislações estaduais que tratam da matéria, editadas após a EC 87/15 (ressalvada a cobrança do tributo em relação às micro e pequenas empresas, a qual não se está aqui a debater), entendendo ser necessária, no que concerne à EFICÁCIA do regramento produzido pelos Estados e Distrito Federal, a prévia edição de lei complementar federal estabelecendo normas gerais, uma vez que plenamente VÁLIDAS.

Vale ressaltar que, justamente por não vislumbrar qualquer invalidade das legislações estaduais, mas tão somente ausência de condição de eficácia pela falta de lei complementar federal, o e. Supremo Tribunal Federal entendeu ser imprescindível a modulação dos efeitos da decisão, para que as respectivas leis dos Estados e do Distrito Federal continuassem a ter eficácia até o final do exercício financeiro de 2021.

[...] a melhor exegese a ser conferida ao dispositivo, é de que a referida lei complementar entra em vigor na data de sua publicação, estando imediatamente apta a produzir os efeitos que lhe são próprios e que, em verdade, são unicamente aqueles concernentes à veiculação de normas gerais, além de repisar o já anteriormente estabelecido na Constituição Federal, de que os Estados e Distrito Federal devem observância à anterioridade (anual/nonagesimal) quando da instituição do DIFAL-ICMS.

Desse modo, caso se mantenha a validade ou a errônea exegese dada ao artigo 3º da LC nº 190/22, haverá uma total afronta ao Princípio da Supremacia da Constituição, uma vez que resultará na interpretação de preceito estabelecido na Carta Magna com base em legislação infraconstitucional, em especial ao se ampliar o alcance do princípio da anterioridade.

Ademais, o diferencial de alíquota nunca foi critério de materialidade de ICMS, constituindo o inciso VII, do §2º, do artigo 155 da Constitução, apenas uma regra de repartição de receitas tributárias, a dar concretude ao Pacto Federativo objetivando a diminuição das desigualdades regionais, não possuindo nenhum status de garantia constitucional dos contribuintes e, muito menos, dever de observância ao Princípio da Anterioridade.

No que concerne especificamente à cobrança do DIFAL-ICMS pelo Estado de destino, em operações e prestações interestaduais com consumidor final não contribuinte do imposto, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/15, não há que se falar em instituição ou majoração de tributo em relação às Unidades Federativas que já anteriormente cobravam o diferencial de alíquota com base em sua legislação estadual, a exemplo do Estado de Santa Catarina, de modo que resta afastada, in casu, a incidência do Princípio da Anterioridade.

Finalmente, deve-se dizer que, na remota hipótese de provimento da Ação, a atuação fiscal para observância de obrigação acessória é formal (art. 113 e §§ do CTN), perfazendo-se com a simples verificação da discrepância entre os conteúdos do livro de apuração do ICMS e da GIA e há multa por descumprimento da obrigação acessória (vide, v.g., art. 51 e ss. da Lei estadual n. 10297/96).

Assim, a respeitável Sentença deve ser parcialmente reformada por Vossas Excelências, a fim de que possa ser exigido o DIFAL da Impetrante/Apelada desde o início do exercício de 2022.

Assim, até que o Supremo Tribunal Federal emita pronunciamento final sobre a questão, é prudente que os Tribunais e juízos de instância inferior suspendam os processos sob seus cuidados e aguardem o julgamento da Excelsa Corte, para evitar a prática de atos processuais desnecessários e decisões divergentes.

Por derradeiro, o Estado requer, ainda, a reforma da sentença pois concedeu a segurança para declarar o direito à compensação de valores referentes a fatos geradores ocorridos antes da impetração.

Isto posto, o efeito da coisa julgada produzida no mandamus deverá ser ex nunc, ou seja, a partir de sua impetração, tal como há muito assentado pelo Supremo Tribunal Federal ao editar os Enunciados 269 e 271 de sua Súmula de jurisprudência, posto que a via mandamental não comporta a devolução de valor pago indevidamente.

Nestes termos, brada pelo conhecimento e provimento do apelo.

Na sequência sobrevieram as contrarrazões, onde Plaxmetal S/A. - Indústria de Cadeiras Corporativas refuta uma a uma as teses manejadas, exorando pelo improvimento do reclamo.

Em Parecer do Procurador de Justiça Alex Sandro Teixeira da Cruz, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e parcial provimento da insurgência, bem como do provimento do Reexame Necessário.

Em apertada síntese, é o relatório.

VOTO

Conheço do recurso porque, além de tempestivo, atende aos demais pressupostos de admissibilidade.

O Estado de Santa Catarina aponta, em preliminar, a nulidade da sentença por julgamento extra petita, sob o argumento de que Plaxmetal S/A. - Indústria de Cadeiras Corporativas não formulou pedido expresso para observar o princípio da anterioridade em relação à Lei Federal n.190/22.

No tocante ao mérito, defende a legalidade da cobrança do Diferencial de Alíquota de ICMS-DIFAL a partir do exercício de 2022.

Subsidiariamente, requesta que a concessão da segurança abranja somente as prestações que venceram a partir do protocolo da inicial.

Pois bem.

Sem delongas, antecipo: a irresignação prospera, mas apenas em parte!

Vis-à-vis a pertinência e adequação, trago à lume a interpretação lançada pelo notável Desembargador Hélio do Valle Pereira, quando do julgamento da congênere Apelação Cível n. 5016663-55.2022.8.24.0023, que parodio, imbricando-a ipsis verbis em meu voto, nos seus precisos termos, como ratio decidendi:

1. Destaca-se que a decisão não é extra ou ultra petita, na medida em que a impetrante requereu expressamente a aplicabilidade da anterioridade anual, ou menos o respeito ao período nonagesimal, de sorte que a...

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