Acórdão Nº 5044672-67.2020.8.24.0000 do Primeira Câmara de Direito Público, 13-12-2022

Número do processo5044672-67.2020.8.24.0000
Data13 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualAção Rescisória
Tipo de documentoAcórdão
Ação Rescisória Nº 5044672-67.2020.8.24.0000/

RELATOR: Desembargador JORGE LUIZ DE BORBA

AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RÉU: MARIA LEONILDA MARAFIGO

RELATÓRIO

O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS deflagrou ação rescisória almejando a desconstituição da sentença lavrada nos autos da ação previdenciária que lhe moveu Maria Leonilda Marafigo. Relatou que houve ofensa a literal dispositivo de lei, pois foi concedido auxílio-acidente para empregada doméstica, o que fere o artigo 18, § 1º, da Lei n. 8.213/1991. Rogou pela concessão da tutela antecipada para sustar a execução da sentença rescindenda e, ao final, pela desconstituição do julgado para que seja reconhecida a improcedência do pedido de implementação de auxílio-acidente.

A antecipação da tutela postulada foi deferida (evento 2).

Devidamente citada, a ré deixou de apresentar contestação (evento 15).

Vieram os autos à conclusão para julgamento.

VOTO

A ação atende aos requisitos genéricos, a decisão rescindenda é de mérito, ocorreu trânsito em julgado e não escoou o prazo previsto no art. 975 do Cânone Processual. Quanto ao cabimento, está fundada no inciso V do art. 966 do CPC. Logo, passa-se à análise da quaestio.

Pretende o autor rescindir a sentença que julgou procedente o pedido da segurada para determinar a implementação de auxílio-acidente no valor de 50% do salário-de-benefício, a contar de abril de 2015.

Diz que houve ofensa ao art. 18, § 1º, da Lei n. 8.213/1991, pois a segurada era empregada doméstica à época do infortúnio, modalidade que não fazia jus à concessão de benefícios de natureza acidentária.

Extrai-se das ponderações bem lançadas na análise liminar realizada pelo Exmo. Des. Ronei Danielli:

Compulsando os autos originários n. 0302038-15.2015.8.24.0139, depreende-se que: a) a autora era empregada doméstica e encontrava-se com capacidade laboral reduzida desde agosto de 2013; b) a autarquia concedeu, na via administrativa, o benefício de auxílio-doença na espécie previdenciária, entre 23.12.2013 e 31.05.2015; c) a autora propôs ação acidentária visando ao restabelecimento do auxílio-doença, à implementação de aposentadoria por invalidez ou à concessão de auxílio-acidente; d) a sentença foi julgada parcialmente procedente, e confirmada por este Tribunal (decisão rescindenda), para determinar a concessão de auxilio-acidente a contar da data de interrupção do auxílio-doença.

Sem embargo, infere-se da sentença e da decisão monocrática terminativa afeta à lide que os magistrados de Primeira e Segunda Instância não examinaram a qualidade de segurada da autora à luz da legislação vigente na data de ocorrência da incapacidade laboral.

A questão resultava imprescindível na hipótese porquanto os empregados domésticos não eram contemplados dentre as categorias alcançadas pelo benefício do auxílio-acidente, conforme redação do art. 18, § 1º, da Lei n. 8.213/1991 dada pela Lei n. 9.032/1995 - vigente no momento de eclosão das causas de redução da capacidade laborativa (segundo semestre de 2013).

Os empregados domésticos somente passaram a fazer jus à percepção de auxílio-acidente a partir da promulgação da Lei Complementar n. 150, de 1º de junho de 2015, a qual modificou a redação do citado art. 18, § 1º, da Lei n. 8.213/1991, sem nenhuma previsão de retroatividade de efeitos, de sorte que o novo dispositivo somente incide sobre as relações acidentárias supervenientes à sua vigência.

O INSS, é bem verdade, não invocou a referida questão na contestação ou nas razões recursais da apelação n. 0302038-15.2015.8.24.0139, o que, sem dúvida, prejudicou a amplitude do debate judicial originário. Essa circunstância, porém, não impede a veiculação da tese na via rescisória.

Com efeito, as Cortes Superiores e o Grupo de Câmaras de Direito Público deste Tribunal possuem entendimento consolidado no sentido de ser aplicável, na espécie, a lei vigente à época em que o segurado reuniu os requisitos para a concessão do beneficio acidentário, sendo rescindível a sentença proferida em desacordo com o princípio tempus regit actum, por violar manifestamente norma jurídica, ainda a matéria não tenha sido deduzida ou enfrentada na lide originária.

Esta a compreensão do Supremo Tribunal Federal: "Salvo disposição legislativa expressa e que atenda à prévia indicação da fonte de custeio total, o benefício previdenciário deve ser calculado na forma prevista na legislação vigente à data da sua concessão." (RE 415454, rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJ 26.10.2007); isto é, "em matéria previdenciária, a lei de regência é a vigente ao tempo em que reunidos os requisitos para a concessão do benefício ('princípio tempus regit actum')" (AgR no RE n. 577827/RJ, rela. Mina. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe 10.06.2011).

Idêntico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: "Os benefícios previdenciários devem ser regulados pela lei vigente ao tempo do fato que lhe determinou a incidência, momento em que se produziu o direito subjetivo à percepção do benefício." (REsp 1634484/RS, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 02.02.2017).

Como visto, somente a contar de junho de 2015, momento em que a LC n. 150 alterou o então art. 18, § 1º, da Lei n. 8.213/1991, é que os empregados domésticos passaram a ser inseridos no rol dos segurados que fazem jus à concessão de benefícios acidentários. Logo, se a lesão que ensejou a concessão do auxílio-acidente ocorreu em agosto de 2013, de fato não há falar em implementação de benefício de natureza acidentária, pois ausente o direito à época.

Desta Corte, a propósito:

RETORNO DOS AUTOS. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO ACIDENTÁRIA. AUXÍLIO-ACIDENTE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CATEGORIA NÃO ABARCADA PELA LEI N. 8.213/91. EXEGESE DO ARTIGO 19 DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. DEMAIS CONTRIBUIÇÕES, REALIZADAS COMO EMPREGADA DOMÉSTICA, ANTES DA EDIÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N. 150/2015. BENEFÍCIO INDEVIDO, NA MODALIDADE ACIDENTÁRIA. SENTENÇA REFORMADA, PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO INAUGURAL. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. ACLARATÓRIOS DA AUTARQUIA FEDERAL REJEITADOS. PRETENSA CONDENAÇÃO DO ESTADO DE SANTA CATARINA AO PAGAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. ENCARGOS DA PROVA TÉCNICA ADIANTADOS PELO ENTE ANCILAR. DEVOLUÇÃO. POSSIBILIDADE. TEMA N. 1.044 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PARTE REQUERENTE SUCUMBENTE E BENEFICIÁRIA DA ISENÇÃO DE ÔNUS SUCUMBENCIAIS. INTELECÇÃO DO ARTIGO 129...

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